Celebrações em torno de Pedro Moraleida.

27/mar

Organizada pela curadora e crítica de arte Lisette Lagnado, a mostra que homenageia Pedro Moraleida Bernardes ocupará dois endereços – até 21 de junho – da nova Almeida & Dale, São Paulo, SP, como parte das celebrações pelos 25 anos da morte do artista mineiro, que partiu precocemente aos 22 anos de idade. Intitulada Nossa Senhora do Desejo, a exposição propõe diálogos entre sua obra, artistas que o influenciaram e uma nova geração que compartilha de sua inquietação e irreverência.

A produção intensa de Pedro Moraleida, marcada pela desobediência, escatologia e crítica social, segue sendo revisitada e reinterpretada ao longo do tempo. Graças ao empenho de seus pais, Luiz Bernardes e Nilcéa Moraleida, junto a professores e artistas, seu acervo sempre esteve acessível a pesquisadores, estimulando novos estudos sobre a obra. Desde setembro de 2024, a Academia Mineira de Letras (AML), em parceria com o Instituto Pedro Moraleida Bernardes (iPMB), o Viaduto das Artes e o Grupo Oficina Multimedia, tem promovido seminários e exposições em Belo Horizonte, ampliando a reflexão sobre o seu legado. Em 2019, o Instituto Tomie Ohtake realizou a primeira retrospectiva do artista fora de sua cidade natal, com curadoria de Paulo Miyada.

Embora frequentemente associada, de maneira simplista, ao neoexpressionismo alemão, a prolífica obra do artista – que abrange desenhos, pinturas, textos e experimentos sonoros – vai muito além dessa influência. Pedro Moraleida teve acolhida entusiasmada por parte de curadores brasileiros e estrangeiros, e, segundo Lisette Lagnado, “ainda há muito a ser explorado sobre as fontes que o inspiraram”.

Nossa Senhora do Desejo mergulha em temas recorrentes em sua produção, como capitalismo, patriarcado, saúde mental, guerra planetária, direito à vida e vida artificial. Dentre os vários nexos iluminados pela mostra, destaca-se aquele que o aproxima do poeta francês Antonin Artaud: a opção por “uma existência que se recusa a anestesiar as emoções”. Como sintetiza a curadora, “…ambos examinam uma sociedade abusiva e tóxica, vociferando contra o pecado católico e a perversão acumulativa da burguesia”.

Num movimento tentacular, outros elos vão se desenhando, como a sintonia entre sua força insubmissa e a arte de Jaider Esbell e Arthur Bispo do Rosario (em registros flagrados pela lente do mestre da cor Walter Firmo), que brota da violência institucional e a transmuta poeticamente em “energia de combate”. O caráter iconoclasta e a mordacidade política conectam a produção de Pedro Moraleida à de Leon Ferrari, figura fundamental do conceitualismo latino-americano, presente na exposição com a série “Releituras da Bíblia”. Figuras como Jean-Michel Basquiat e José Leonilson, usualmente lembradas como influências para Pedro Moraleida, também fazem parte dessa constelação de referências evidenciadas pela exposição. Além dessas relações de caráter mais histórico, há na seleção proposta por Lisette Lagnado a presença importante de duas artistas que conheceram Pedro Moraleida, a mineira Cinthia Marcelle e a hispano-brasileira Sara Ramo – da mesma geração surgida no final do século passado, elas prestaram uma assessoria especial no processo de pesquisa e concepção da mostra. O conjunto inclui ainda produções recentes que ecoam a mesma inquietude, como as da paulistana Lia D Castro e do suíço-carioca Guerreiro Do Divino Amor, cuja instalação “Civilizações Super Superiores” foi originalmente apresentada no Pavilhão da Suíça da 60ª edição da Bienal de Veneza.

A expografia dos dois espaços é assinada pelo arquiteto e urbanista Tiago Guimarães, formado pela Universidade Federal do Ceará e atuante em São Paulo desde 2005. Além dos nomes já citados, completam a mostra obras de Castiel Vitorino Brasileiro, desali, Flávio de Carvalho, ⁠ Francisco de Almeida, Lia D Castro, ⁠Linga Acácio, Trojany, ⁠Marta Neves, Regina Parra – artista que apresenta uma performance na abertura da exposição – e ⁠Thiago Martins de Melo. O poeta floresta participa da publicação que será lançada durante a exposição com uma seleção de sete poemas extraídos de seu livro rio pequeno (ed. Fósforo, 2022).

Artistas participantes.

Antonin Artaud, Castiel Vitorino Brasileiro, Cinthia Marcelle, desali, Flávio de Carvalho, floresta, Francisco de Almeida, Guerreiro do Divino Amor, Jaider Esbell, Jean-Michel Basquiat, José Leonilson, León Ferrari, Lia D Castro, Linga Acácio e Trojany, Marta Neves, Pedro Moraleida, Regina Parra, Sara Ramo, Thiago Martins de Melo, Walter Firmo.

Classificação indicativa: mão recomendado para menores de 18 anos. Esta exposição contém imagens com teor sexual, sexo explícito e nudez. Acesso mediante a presença do responsável ou acompanhante com autorização por escrito.

Galatea na SP-Arte 2025.

25/mar

A Galatea anuncia sua participação na SP-Arte 2025, que acontecerá no Pavilhão da Bienal, no Parque Ibirapuera, entre os dias 02 e 06 de abril, de quarta-feira a domingo. A galeria apresentará um conjunto de obras que refletem o seu programa, reunindo artistas que representa, como Allan Weber, Bruno Novelli, Gabriela Melzer e Marília Kranz, além de nomes fundamentais da cena moderna e contemporânea como Anna Maria Maiolino, Ascânio MMM, Francis Alÿs, Ione Saldanha, Lygia Clark, Lygia Pape, Mira Schendel, Rubem Valentim, Ubi Bava, Waltercio Caldas e Wanda Pimentel.

Concebido como a simulação de um apartamento, nosso estande estabelecerá um diálogo entre as obras expostas e mobiliários assinados, em um projeto de expografia desenvolvido por Lucas Jimeno. A ideia é explorar a relação entre Arte e Arquitetura, investigando como a experiência estética se desdobra no ambiente doméstico. Mais do que um simples suporte expositivo, a estrutura do estande propõe uma vivência onde Arte, Design e Arquitetura se entrelaçam, aproximando as obras do cotidiano e sugerindo novas formas de interação.

Tarsila na Espanha.

17/mar

O Museu Guggenheim Bilbao, Espanha, em colaboração com grandes coleções internacionais, inaugurou em fevereiro uma exposição inédita de Tarsila do Amaral. O foco da mostra é a formação de Tarsila do Amaral no Cubismo e a transição para um estilo único, profundamente influenciado pela cultura brasileira.

A exposição no Guggenheim, que vai até 1º de junho, inclui um raro exemplar de “Nu cubista”, da década de 1920 – existem apenas três, todos em coleções privadas e de difícil acesso. A obra integra um conjunto da exposição sobre a formação de Tarsila do Amaral no Cubismo enquanto “escola de invenção”, fundamental para um estilo pessoal classificado pela própria artista como “brasileiro” e “moderno”.

O público, no entanto, nota na mostra a ausência de “A Negra”, uma das obras mais emblemáticas de Tarsila do Amaral, que esteve na exposição “Pintando o Brasil moderno”, no Museu de Luxemburgo, em Paris, entre outubro de 2024 e fevereiro, mas não seguiu para o Guggenheim de Bilbao.

O Guggenheim informa que “A Negra” é uma tela muito requisitada em mostras nacionais e internacionais e está no centro do novo esquema de apresentação da exposição permanente do Museu de Arte Contemporânea da USP. A mostra foca a representação do negro na arte moderna. Em novembro de 2024, enquanto esteve na capital francesa, a icônica obra de Tarsila do Amaral foi tema de dois dias de estudos sobre sua história e recepção desde a década de 1920 até aos dias de hoje.

Fonte: O Globo.

Os 4 de Bagé em Brasília.

11/mar

A Caixa Cultural Brasília e a Fundação Iberê Camargo apresentam o legado do Grupo de Bagé. Mostra com mais de 180 obras de Carlos Scliar, Danúbio Gonçalves, Glauco Rodrigues e Glênio Bianchetti, abre no dia 18 de março e permanecerá em cartaz até 29 de junho.

Uma trincheira em defesa da liberdade na arte e na vida, cavada com as armas da inteligência e do bom humor na região sul do Rio Grande do Sul e conectada com os principais polos culturais do país. É o que caracteriza o legado de Pedro Wayne (1904-1951), escritor, poeta e jornalista e agitador cultural com enorme capacidade de articulação, inclusive nacional. Baiano que passou a infância em Pelotas, na metade sul do Rio Grande do Sul, chegou em Bagé em 1927, e lá exerceu uma extensa gama de atividades. Carlos Scliar (1920-2001), que tinha parentes morando em Bagé e ideias semelhantes às de Pedro Wayne, frequentava sua casa e o tinha como bom amigo.

Foi em torno deste importante personagem da cultura local que, na metade da década de 1940, Glauco Rodrigues (1929-2004) e Glênio Bianchetti (1928-2014), com 16 e 17 anos respectivamente, começaram a desenhar e a pintar. Pedro Wayne “adotou os guris” e mostrou a eles o que havia de mais avançado nas artes visuais na Europa. Mais tarde, o escritor introduziu Danúbio Gonçalves (1925-2019) ao “ateliê”, que trouxe para o Grupo, a partir de sua experiência na França. Já a influência da pintura moderna veio com a passagem do artista carioca José Moraes, que ficou um período na cidade quando ganhou uma bolsa de viagem de estudos.

Carlos Scliar, quando voltou de sua estada na Europa e participação na II Guerra Mundial, se interessou pelo movimento daqueles jovens e passou a frequentar, e praticamente liderar as atividades do Grupo interessados em realizar uma crítica social, levando-os a se envolver, na década de 1950, na criação do Clube de Gravura de Porto Alegre (1950) e do Clube de Gravura de Bagé (1951).

Inspirados no movimento do Taller de Gráfica Popular do México, os Clubes (que posteriormente foram unidos) criaram um importante e independente sistema de divulgação dos artistas regionais. Contar essa história é o objetivo principal da exposição. A versatilidade e a rica produção dos quatro artistas serão exibidas através de gravuras, pinturas, aquarelas e capas de revistas, a partir de novas leituras e percepções acerca do trabalho do Grupo. Com curadoria de Carolina Grippa e Caroline Hädrich, a exposição reúne mais de 180 itens como obras, ilustrações dos clubes de gravura de Bagé e de Porto Alegre, além de exemplares raros das revistas Horizonte, Senhor.

Sobre os artistas.

Carlos Scliar (1920-2001) – Nasceu em Santa Maria, interior do Rio Grande do Sul, e foi ainda pequeno para Porto Alegre, onde, com 11 anos, colaborou com as seções infanto-juvenis de jornais locais e, mais tarde, frequentou o departamento gráfico da Revista do Globo. Em 1940, foi para São Paulo e começou a fazer parte da Família Artística Paulista, mas após quatro anos foi para a Itália a serviço da Força Expedicionária Brasileira (FEB) na Segunda Guerra Mundial, entre 1958 e 1961, trabalhou como diretor artístico na Revista Senhor. Comprou, em 1964, um sobrando em Cabo Frio, RJ, onde morou e trabalhou por quarenta anos. No ano de seu falecimento, foi criado o Instituto Cultural Carlos Scliar, na cidade de Cabo Frio, e seu acervo se encontra atualmente tombado pela municipalidade.

Danúbio Gonçalves (1925-2019) – Nasceu em Bagé, fazendo parte de uma tradicional família de estancieiros da campanha. Aos sete anos, partiu para o Rio de Janeiro onde mais tarde teve aulas no ateliê de Cândido Portinari, manteve contato com outros pintores modernistas e participou de diversas edições do Salão Nacional de Belas Artes, recebendo prêmios e menções honrosas. Em 1950, foi estudar em Paris. Com um espírito imbuído dos ideais revolucionários e uma ligação com o Partido Comunista, Danúbio Gonçalves voltou ao Brasil e se juntou a Carlos Scliar, Glênio Bianchetti e Glauco Rodrigues, formando o Clube de Gravura de Porto Alegre e, posteriormente, o de Bagé. A partir de 1962, a convite do escultor Francisco Stockinger, passou a trabalhar no Ateliê Livre da Prefeitura de Porto Alegre, chegando a ser diretor. Lá, durante trinta anos ensinou litografia (técnica que aprendeu com Marcelo Grassmann, em 1962) e formou muitos artistas gravadores, atualmente reconhecidos no âmbito regional e nacional.

Glaudo Rodrigues (1929-2004) – Nasceu em Bagé e foi colega de escola de Glênio Bianchetti, com quem dividiu o interesse pela pintura. Recebeu ensinamentos sobre pintura de José Moraes e aproximou-se da gravura e, junto com Glênio, Danúbio e Scliar fundou, em 1951, o Clube de Gravura de Bagé e iniciaram suas viagens de estudos a estâncias da região. Com a união do Clube de Bagé ao de Porto Alegre, Glauco mudou-se para a capital gaúcha e, depois, em 1958, seguiu para o Rio de Janeiro.  Glauco Rodrigues participou da primeira Bienal de São Paulo, entrou na equipe da revista Senhor e começou a sua produção abstrata, que perdurou por 10 anos. Em 1962, viajou a Roma a convite do embaixador Hugo Gouthier para trabalhar no setor gráfico da embaixada brasileira, e ficou alguns anos na Itália. Nesse período, participou da delegação brasileira na Bienal de Veneza (1964), no mesmo ano em que os estadunidenses chamaram atenção pela sua produção pop. Retornou ao Brasil em 1966 e, aos poucos, a figuração voltou à sua obra, que seguiu até a sua morte.

Glênio Bianchetti (1928-2014) – Nasceu em Bagé, oriundo de uma família ligada ao comércio na cidade. Foi a mãe de sua namorada, Ailema (com quem posteriormente casou-se), que passou ensinamentos iniciais de pintura para ele e Glauco Rodrigues, que depois foram aperfeiçoados com a chegada de José Moraes a Bagé. Interessado pela pintura, ingressou no Instituto de Belas Artes em Porto Alegre no ano seguinte – mas não chegou a finalizar o curso.   Fundou, em 1951, ao lado de Glauco Rodrigues, Danúbio Gonçalves e Carlos Scliar, o Clube de Gravura de Bagé, tendo Bianchetti a maior produção de gravuras da época. Na década de 1960, mudou-se com sua família para Brasília (cidade onde viveu o resto de sua vida), devido ao convite de Darcy Ribeiro para lecionar na recém-inaugurada Universidade de Brasília, mas sendo afastado devido à perseguição na ditadura militar, sendo reintegrado apenas em 1988. Atualmente, sua casa-ateliê, com seu grande acervo, é mantida por sua família.

Encontros entre arte e design.

“Afinidades ancestrais” é uma ativação-exposição que interroga e celebra o vocabulário herdado de nossa situação afro-atlântica.

Na Semana de Design de São Paulo, a ProArte Galeria, Jardim América, São Paulo, SP, recebe o lançamento da coleção de vasos de cerâmica chinesa Serengeti, inspirada na riqueza cultural e paisagística da África Oriental. A idealização é de Marcelo Felmanas que, junto a J. Wair de Paula Jr., tenta produzir um diálogo entre os objetos de design e a arte brasileira – notoriamente donatária da cultura afro-brasileira.

Serengeti, que significa “lugar infinito” ou “planície sem fim”, remete à majestosa região que abriga o Parque Nacional de Serengeti, santuário natural de beleza inigualável. Assim como a paisagem da região africana, os vasos da coleção evocam uma estética orgânica e atemporal, refletindo a grandiosidade da fauna, o brilho das estrelas no céu do continente e as tradicionais cercas das aldeias Maasai. Referência na importação de móveis e objetos de design, a 6F Decorações coloca em destaque nesta mostra peças feitas à mão que dialogam com as expressões artísticas brasileiras ligadas às matrizes africanas. A pequena ativação-exposição, feita para a Semana de Design, acontece até 14 de março.

Esta pequena mostra procura traçar um paralelo entre as culturas dos povos africanos e a arte brasileira, explicitada através de nomes como Di Cavalcanti, Heitor dos Prazeres, Emanoel Araújo, Franz Krajcberg e outros. Busca-se demonstrar visualmente as possíveis ligações (assumidas ou não) entre estes grandes criadores e as culturas africanas.

Lugares na pintura de Emeric Marcier.

26/fev

A Galeria Evandro Carneiro Arte apresenta a exposição Lugares na pintura de Emeric Marcier que estará aberta ao público de 11 a 29 de março no Shopping Gávea Trade Center, salas 108 e 109.

Esta exibição traz 22 obras distribuídas em pinturas a óleo e aquarelas de Emeric Marcier que é considerado um dos mais importantes pintores modernos no Brasil. Artista romeno naturalizado brasileiro, esteve radicado no Brasil por quase meio século; dedicou grande parte de sua vida e obra à produção de pinturas de arte sacra, retratos, paisagens mineiras e aquarelas de paisagens europeias. A curadoria da exposição é de Evandro Carneiro.

Sobre o artista.

Emeric Marcier (Cluj 1916 – Paris 1990), um dos mais importantes pintores modernos do Brasil, nasceu em 21 de novembro de 1916, na Romênia. Judeu de origem, converteu-se ao catolicismo já no Brasil, por influência de seus amigos, Murilo Mendes, Jorge de Lima e Lucio Cardoso, que foi seu padrinho de batismo. De personalidade intensa, na primeira página de sua autobiografia, Deportado para a Vida (escrita entre 1988-1990 e publicada em 2004 pela Francisco Alves) se declara humanista e algo anarquista. Sua história confirma que a liberdade e a vocação artística sempre o guiaram. Aos 20 anos deixou Bucareste para estudar em Milão – na Academia de Belas Artes de Brera, onde após realizar a graduação, defendeu sua tese de final de curso sobre Picasso, em plena ascensão fascista. Com a deterioração das condições políticas na Itália, foi para a França, em 1939, onde montou um ateliê na Cité Falguière e cursou uma cadeira na Escola Nacional Superior de Belas Artes de Paris. Nesta cidade, conheceu e conviveu com muitos artistas, alguns dos quais continuaram amigos pela vida inteira, tais como os conterrâneos e surrealistas, Victor Brauner, Jacques Herold, Arpad Szenes, bem como a mulher deste, Maria Helena Vieira da Silva, portuguesa de origem. Quando a França entrou na guerra, foi para Lisboa, hospedando-se na casa de Arpad Szenes e Vieira da Silva, com a intenção de seguir para os EUA, destino de muitos judeus naquele momento. Em Lisboa trabalhou no ateliê do também surrealista António Da Costa. Relacionou-se com os escritores portugueses da época e ilustrou alguns números da Revista Presença, importante veículo de expressão dos intelectuais naquele momento. Com a negativa do visto para os Estados Unidos, resolveu partir para o Brasil. Em sua chegada ao Rio de Janeiro, em 1940, trouxe cartas de apresentação para José Lins do Rego, Mario de Andrade e Portinari. Logo nos primeiros momentos conheceu também Jorge de Lima e Lucio Cardoso que juntamente com José Lins do Rego, tornaram-se seus grandes amigos e o introduziram na vida intelectual carioca e teve a chance de realizar sua primeira exposição individual, no tradicional Salão do Palace Hotel, sede da Associação de Artistas Brasileiros. Guignard desistira de apresentar-se por ter tido uma de suas telas censuradas, retratando um fuzileiro naval negro. Assim, a sorte abriu-se para Marcier. A crítica foi muito favorável ao seu talento. Ainda um jovem artista surrealista europeu, mas já com prenúncios paisagísticos, como relata seu filho Matias (Depoimento oral à autora, em 2018): “em uma carta dirigida ao casal Arpad Szenes e Maria Helena Vieira da Silva (apelidada de “Bicho” por papai), na maneira como ele relata a viagem ao Brasil transparece o futuro paisagista…”.

Em 1942, o artista foi contratado pela Revista O Cruzeiro para fazer uma viagem às cidades históricas mineiras e compor uma reportagem ilustrada com suas telas. Uma edição histórica, com textos de Drummond, Aires da Matta Machado e outros.  Desde então, retratou o Brasil, a sua gente e seus costumes. As paisagens de Minas, Bahia, Pernambuco e Rio de Janeiro foram diversas vezes pintadas por ele e a expressão de nosso barroco o marcou desde a primeira viagem a Minas. Ainda segundo Matias, “Marcier era o típico pintor viajante”, tendo representado muitos lugares da Europa, com foco especial para Itália, França e Portugal. Trazia sempre com ele sua caixa de aquarelas e seus blocos de papel especial para ir retratando os lugares e as pessoas que o marcavam pelo mundo afora. Retornou várias vezes aos mesmos lugares, para repintá-los em diversas épocas, como por exemplo a Toscana e a Normandia, que são muito recorrentes em sua obra, como demonstram as aquarelas ora expostas.

Em 1948, o artista fixou residência no sítio de Barbacena, onde criou, com Julita, os seus sete filhos. Tempos felizes com a família na casa que construiu para acalmar as dores do exílio e dedicar-se à sua arte. No ateliê rural de grandes proporções, investiu com todo o empenho em telas de grandes dimensões, com temas sacros, à luz do sofrimento da humanidade e realizou as suas espetaculares “Paixões de Cristo” e “Via Sacra”. Experimentou de forma ainda mais efetiva os seus estudos sobre a luz na obra de arte: “Tinha aplicado uma técnica onde procurava separar o branco do resto, tratando-o simplesmente como luz. Preparava tudo com um branco que eu mesmo triturava, conforme uma fórmula do tempo de Rembrandt. Perdi mais de 15 anos com essas pesquisas, onde o impulso criador sempre ficava entravado por uma ideia fixa. Pintar escuro, mas luminoso. (…)” (Marcier, 2004, p. 134). Uma luz que ele buscava incansavelmente e sempre o acompanhou, tal qual um típico renascentista. Segundo Affonso Romano de Sant’Anna: “Na verdade, nessas telas aí há um ponto de luz, que só os mestres sabem produzir.” (Sant’Anna, 1983, p.46). Ainda nas palavras de Affonso Romano, a Paixão tão pintada por Marcier é a sua e não somente a de Cristo. “Pois ele também está no tempo. Estar no tempo ou no templo é estar na axis da história, no coração do ser. No tempo estamos crucificados. No tempo estamos esquartejados pela paixão”. (Sant’Anna, 1983, p. 29-30). Como humanista declarado, os horrores da Segunda Guerra o afligiam e a confluência entre a história sagrada e a profana em sua pintura revelam “as mágoas de um exílio” (Marcier, 2004, p.97) e os “traços sumários exprimindo a dor” (Idem, p.105). Há algo demasiadamente humano que se expressa em meio às cenas bíblicas pintadas, como os aviões da Segunda Guerra Mundial na obra Torre de Babel (1947) da Capela de Mauá (SP) e os capacetes modernos – lembrando os de soldados fascistas – dos guardas que prendem Jesus Cristo. Ou, ainda, quando ele mesmo surge retratado em seu Ecce Homo (1982/1983). Ao longo dos anos, Marcier fez dezenas de exposições individuais no Brasil e no mundo, mas destacamos aqui a mostra inaugural da Galeria Relevo, em 1961, com a temática dos 25 anos de seus desenhos. Famoso por suas pinturas sacras (Marcier é considerado o mais importante pintor sacro do Brasil), o artista foi um grande paisagista. Além de pintar em suportes de grandes dimensões, ele também aquarelava as paisagens por onde passava, em formatos menores. A exposição que ora se realiza pela Galeria Evandro Carneiro Arte selecionou um conjunto dessas aquarelas, além de alguns óleos importantes de paisagens típicas do pintor.

Laura Olivieri Carneiro, fevereiro de 2025.

Artista emblemático do Modernismo Brasileiro.

12/fev

O Farol Santander São Paulo, centro de cultura, lazer, turismo e gastronomia, exibe a exposição Cícero Dias – com açúcar, com afeto. Com 42 obras, a mostra, que tem curadoria de Denise Mattar, produção de MG Produções e consultoria de Sylvia Dias (filha do artista), faz parte da programação comemorativa pelos sete anos do Farol Santander São Paulo. O público poderá visitar a exposição que ocupa toda a galeria do 22º andar, até 27 de abril.

“O Farol Santander tem orgulho em apresentar ao público a obra de Cícero Dias, artista emblemático do Modernismo Brasileiro, cujo trabalho transcende fronteiras e dialoga com as vanguardas internacionais. Sua arte, marcada por uma paleta de cores vibrante, reflete as paisagens e a cultura nordestina, evocando a essência lírica do Estado de Pernambuco”, comenta Maitê Leite, Vice-presidente Executiva Institucional Santander.

A exposição sustenta como proposta realçar a trajetória do artista, contextualizando sua história e evidenciando sua profunda relação às origens pernambucanas. Embora tenha vivido a maior parte de sua vida em Paris, onde foi amigo de Pablo Picasso, Paul Éluard, Alexander Calder entre outros, Cícero Dias nunca deixou de fato o Engenho Jundiá, onde nasceu.

O percurso circular da mostra apresenta as aquarelas oníricas da década de 1920. Exibe também as pinturas memorialistas dos anos 1930, atravessa o surrealismo dos anos 1940, aponta a abstração da década de 1950, e traz sua produção dos anos 1960 a 1990, quando ele retorna à figuração, incorporando toques nostálgicos dos anos 1930, acentos surrealistas da década de 1920 e as conquistas estruturais da abstração.

“Lírico, agressivo, caótico, sensual, poético e emocionante, o trabalho de Cícero Dias, no final dos anos 1920, era muito diverso de tudo o que se produzia na época. Ele sacudiu os nossos incipientes modernistas, estonteados pela força, a estranheza e a espontaneidade de sua obra”, diz Denise Mattar curadora da mostra.

Um dos destaques da exposição é a obra inédita Cabaré, década de1920, uma aquarela sobre papel. Este trabalho foi adquirido por um colecionador francês nos anos 1930, após uma exposição de Cícero Dias em Paris, permanecendo na Europa desde então. Recentemente, a obra foi adquirida pelos colecionadores brasileiros que a cederam para esta mostra.

Outro significativo trabalho de Cícero Dias exibido nesta exposição é a tela aquarelada Casa grande do Engenho Noruega (1933). Esta obra é uma das principais da carreira do artista e ilustrou a capa de diversas edições do livro Casa-Grande e Senzala, de Gilberto Freyre, um marco na literatura brasileira.

O ambiente também conta com duas obras táteis, com recurso de acessibilidade, incluindo Baile no Campo (1937), da Coleção Santander Brasil, e Sem Título (s.d.), da Coleção Marcos Ribeiro Simon, São Paulo, SP.

Entre as telas que integram o espaço, há peças provenientes de algumas das principais instituições, como o Santander Brasil, Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro (RJ), Museu de Arte Moderna de São Paulo, Museu de Arte Brasileira da FAAP (SP), Instituto São Fernando (RJ), além de colecionadores particulares, como Gilberto Chateaubriand (RJ), Waldir Simões de Assis (PR), Marta e Paulo Kuczynski (SP), Leonel Kaz (RJ), Marcos Simon (SP), entre outros.

Evento inédito na Casa Museu Carlos Scliar

Com o objetivo de promover e dar visibilidade ao movimento LGBTQIAPN+, será realizado nos dias 20, 21 e 22 de fevereiro de 2025, o festival “Scliarizando – todos temos nome e sobrenome”, na Casa Museu Carlos Scliar, em Cabo Frio, RJ. O evento oferece ao público a oportunidade de assistir obras que tratam da cultura e da arte do movimento LGBTQIAPN+, tendo como pauta um mundo menos discriminatório e preconceituoso. A programação contará com exposição de trabalhos inéditos de Carlos Scliar (1920 – 2001), apresentações musicais, exibição de filmes e mesas de conversa com psicólogos, médicos, historiadores, etc. O evento é uma realização Governo Federal, Ministério da Cultura, Prefeitura de Cabo Frio, Secretaria Municipal de Cultura através da Lei Paulo Gustavo e toda a programação é gratuita.

“O evento transforma a Casa Museu Carlos Scliar em palco da arte LGBTQIAPN+, conferindo ao espaço museal responsabilidade na atuação por um mundo menos discriminatório”, diz a curadora do evento e coordenadora da Casa Museu Cristina Ventura.

Desenhos e estudos inéditos de Scliar, produzidos entre 1940 e 1960, estarão na exposição “Nus”. Artista plástico de personalidade multifacetada, humanista, Carlos Scliar participou ativamente de importantes manifestações sociais e acontecimentos culturais e políticos ocorridos ao longo do século XX. “A trajetória de Scliar nos permite afirmar que sua obra é decorrente do trabalho ininterrupto, compreendido pelo comprometimento com que tratava questões sociais de liberdade e respeito”, afirma Cristina Ventura, que completa: “Atento às relações humanas, onde há disciplina e provocação, liberdade e luta, beleza e cotidiano, valores raros encontrados no respeito ao homem, Scliar foi artista de trajetória singular, a ser revisitado”.

Também como parte do evento, será realizada uma oficina de gravura, utilizando frases presentes em obras de Scliar do período da ditadura militar, tais como: “Pergunte quem”, “Pergunte onde”, “Pergunte ainda” e “Pão e rosas para todos”, que serão impressas em tecido com as cores do arco-íris.

A programação também será animada com shows de Raisa Alves, Zarinho Mureb e das drag queens Rodrigo Rodrigues como Monayra Manon, Lenival Dantas como Susan Marx e Hugo Belford como PVC. Hugo Belford também será responsável pela oficina de Vogue, que, mais do que um estilo de dança, é um movimento de reafirmação de identidade de gêneros e sexualidade.

Haverá, ainda, a mesa de conversa “Instabilidade política e social”, com a participação da psicóloga autista Claridad Geraldel, que faz um trabalho clínico voltado à população queer e neurodivergente, e do médico psiquiatra David M. Achaval, especialista em ansiedade, depressão e deteriorações cognitivas. Também será realizada palestra com a doutora em história Eliza Toledo, que tem pesquisas voltadas para gênero, violência, história das mulheres, histórias das ciências e da saúde com ênfase na história da psiquiatria.

A programação também inclui a exibição dos filmes “Cabaré Eldorado: O Alvo dos Nazistas”, de Benjamin Cantu, “Retrato de uma Jovem em Chamas”, de Celine Sciamma, e do curta-metragem “Point 44”, de Marcio Paixão.

Sobre a Cas Museu Carlos Scliar.

O Instituto Cultural Carlos Scliar (ICCS) foi criado em 2001, mesmo ano da morte de seu patrono. O processo para criação da instituição foi acompanhado pelo artista, um acordo que fez com o filho Francisco Scliar para manter sua memória. Fundada por Francisco Scliar junto com os amigos: Cildo Meireles, Thereza Miranda, Anna Letycia, Regina Lamenza, Eunice Scliar, entre outros conselheiros, a instituição, aberta ao público em 2004, está sediada na casa/ateliê do pintor, em Cabo Frio, Rio de Janeiro. Trata-se de um sobrado oitocentista, com cerca de 1000m², adquirido em ruínas por Scliar, reformado em 1965 para abrigar seu ateliê e ampliado na década de 1970, com projeto de Zanine Caldas. A casa mantém a ambientação dos espaços deixada por Scliar, com seus objetos pessoais, acervo documental, bibliográfico, gravuras, desenhos e obras. A coleção resulta da produção do próprio artista ao longo de sua vida, somado a uma expressiva e representativa coleção de obras originais dos mais importantes artistas do cenário brasileiro do século XX, os amigos José Pancetti, Djanira, Cildo Meireles, Di Cavalcanti, Aldo Bonadei, entre outros, além de cerca de 10 mil documentos datados desde a década de 1930. Reforçando seu compromisso sociocultural, ao longo dos últimos três anos foram atendidos mais de 1000 estudantes do estado do Rio de Janeiro,em projetos educativos. Em 2023, a instituição foi agraciada com o Prêmio Darcy Ribeiro de Educação Museal, promovido pelo IBRAM.

 

Modernismo Brasileiro em Londres.

27/jan

Uma exposição na Royal Academy of Arts em Londres apresenta 130 obras do Modernismo brasileiro, incluindo artistas como Tarsila do Amaral, Portinari, Lasar Segall e Djanira. A mostra abrange 60 anos da Arte Brasileira, com influências europeias e destaca a diversidade cultural, ficará aberta ao público até 21 de abril.  Uma seleta de mais de 130 obras de dez artistas do Modernismo Brasileiro, movimento cultural iniciado no país no começo do século XX.

Roberta Saraiva Coutinho, uma das curadoras da exposição “Brasil! Brasil! The birth of Modernism” (“Brasil! Brasil! O nascimento do modernismo”), apresentada para a imprensa na Royal Academy of Arts, de Londres, resumiu à agência de notícias AFP a importância da mostra: – Um momento único para ver as obras-primas de um país magnífico. A mostra é uma espécie de relato narrativo que abrange cerca de 60 anos da história da arte brasileira – explica Adrian Locke, da Royal Academy of Arts, um dos outros curadores da exposição, que reúne trabalhos produzidos entre 1910 e 1970. O movimento nasceu com a chegada de correntes culturais e artísticas iniciadas na Europa, como o Cubismo, o Futurismo, o Dadaísmo, o Expressionismo e o Surrealismo, mas com foco nos elementos da cultura brasileira.

A exposição, principalmente de pinturas e com artistas de renome reúne Tarsila do Amaral, Anita Malfatti, Alfredo Volpi, Lasar Segall, Vicente do Rego Monteiro, Flávio de Carvalho, Cândido Portinari e Djanira conta também com fotografias de Geraldo de Barros e esculturas de Rubem Valentim.

 

Curso no Instituto Ling.

07/jan

O “Minicurso Trama e Laçada: história e técnicas têxteis”, com Vera Felippim será apresentado no Instituto Ling, Bairro Três Figueiras, Porto Alegre, RS.  O evento dura 2 dias em 2 horas, na terça-feira,  28 de janeiro às 19hs. até quinta-feira, 30 de janeiro, às 21hs.

A história dos têxteis é quase tão antiga quanto a nossa própria civilização. Neste curso, veremos um amplo panorama sobre a criação e o desenvolvimento dos tecidos, tratando da sua evolução histórica e técnica no decorrer dos séculos. De agulhas e teares milenares, passando por tapeçarias que narram histórias e conquistas no período medieval europeu, tecidos de trajes e ornamentos marcantes como as rendas, revoluções e guerras que alteraram práticas e costumes, veremos diferentes descobertas e invenções que mostram como os têxteis estiveram e estão presentes, impactando e influenciando até os dias de hoje. Imagens dos acervos de importantes museus do mundo ajudarão a ilustrar o passado, com representações em pinturas, achados arqueológicos, documentos e objetos preservados. Amostras físicas de fibras, fios e tecidos serão apresentadas em aula para contribuir com a compreensão técnica

Sobre a ministrante.

Vera Felippi é pesquisadora e designer têxtil. Possui pós-doutorado pela Faculdade de Belas-Artes na Universidade de Lisboa, na linha de investigação Ciências da Arte e do Patrimônio com ênfase em têxteis africanos. Doutora em Design (UFRGS), tese que resultou na criação do Museu Moda e Têxtil UFRGS. Mestre em Design e graduação em Artes Visuais (UFRGS). Experiência na gestão de projetos de resgate e salvaguarda de patrimônio cultural têxtil e conservação preventiva de têxteis. Como docente, possui experiência em cursos de extensão, professora convidada em programas de Pós-Graduação (lato sensu) e cursos livres. Atuou como coordenadora de desenvolvimento de produto em indústria têxtil (Fiateci) durante 15 anos e atelier de criação de têxteis por 25 anos. Autora do livro “Decifrando rendas: processos, técnicas e história”, finalista na categoria Economia Criativa do Prêmio Jabuti em 2022. Integra o grupo de estudos História da Arte e Cultura de Moda (HACM), a Associação Nacional de Pesquisadores em Tecnologia e Ciência do Patrimônio (ANTECIPA) e o Coletivo de Pesquisadores em Indumentária e Museus.