Lançamento Projeto GAS

10/ago

 

Anita Schwartz Galeria de Arte, Gávea, Rio de Janeiro, RJ, lança o “Projeto GAS 2024 – Chamada Aberta de Verão”, que busca impulsionar a circulação de artistas jovens ou com até 20 anos de carreira, nas diversas linguagens da arte contemporânea. As inscrições vão até o dia 28 de agosto, em formulário online, de acordo com as instruções que estão no site www.anitaschwartz.com.br.

Um comitê irá selecionar até 30 artistas – ou coletivos artísticos – brasileiros, ou estrangeiros. O resultado será anunciado até 04 de novembro.

Os artistas selecionados participarão de uma exposição coletiva no próximo verão, entre fevereiro e março de 2024, que ocupará todo o espaço da Anita Schwartz Galeria de Arte.

O nome do projeto foi inspirado no fato de que Gás é a matéria em estado fluído, tem qualidade expansiva, e pode preencher totalmente um determinado espaço.  Atendo-se à ideia da criação como uma materialidade formada por partículas que impulsionam o movimento do sistema das artes, o projeto, por meio da chamada aberta, tem o objetivo de ser uma espécie de força motriz para a escuta e a amplificação de novas vozes da arte contemporânea brasileira.

O Projeto Verão, inicialmente uma coletiva pensada a partir da própria programação do ano na galeria, foi lançado em 2020.  Após duas edições neste formato, se tornou uma chamada pública, que resultou na exposição “Saravá”, em fevereiro de 2022, com obras de 39 artistas – desenhos, esculturas, pinturas, instalações e videoarte -, selecionados dentre os mais de 500 portfólios inscritos de todo o Brasil e do exterior. O Projeto GAS 2024 – Chamada Aberta de Verão é a quarta edição da iniciativa.

Exposição Sem Barreiras

Paulo Branquinho abre coletiva inédita com pinturas, gravuras, fotografias, esculturas e objeto. Após um hiato de três anos, a Galeria Paulo Branquinho acaba de voltar à cena artística, abrindo nova coletiva no dia 12 de agosto, sábado. “Sem Barreiras”, a nova exposição na casa do século XVIII, Lapa, Rio de Janeiro, RJ, contará com a participação de 16 artistas, que, apresentarão obras empregando diferentes suportes, estilos, técnicas e materiais. Alessandro Caròla, Ana Pose, Analu Nabuco, Eda Miranda, Edna Kauss, Gustavo Alves, Ira Etz, Istefânia Rubino, Jacqueline Dalsenter, José Senna, Laura Bonfá Burnier, Marcia Rommes, Maria Cecília Leão, Maria Eugênia Baptista, Maria Lúcia Maluf e Teresinha Mazzei, têm em comum a proposta de buscar o olhar atento dos visitantes e causar emoções diversas. Em cartaz até 02 de setembro.

Sobre os artistas

De origem belga, Alessandro Caròla monta um painel em azulejos empregando a mesma técnica tradicional de pintura usada no século XVII em Portugal. Inspirado no barroco português, o tema mistura inquisição, erotismo e história em quadrinhos.

Realizadas no motel onde o pai vivia e trabalhava, onde foi praticamente criada, as fotografias de Ana Pose desbravam lembranças de menina através dos quartos que registrou.

Analu Nabuco agracia o público com seus totens, erguidos com objetos, pedras, madeira, sementes e diferentes materiais garimpados em seus caminhos.

Na série intitulada “Multiplicai-vos”, que faz alusão ao corpo, ao feminino, à reprodução (e tudo mais que envolva esta poética), Eda Miranda constrói objetos com caixa acrílica, papelão, papel Canson e impressão a jato de tinta.

Edna Kauss compôs um quadro de luz colorida com lâmpadas eletroluminescentes, MDF, tinta acrílica e equipamentos elétricos. A peça, camuflada atrás de uma cortina, desperta a curiosidade do público.

Gustavo Alves, com pinceladas sutis de guache sobre papel, imprime força no que irá expor, pinturas: os corpos de uma mulher de perfil, em tons de negro e marrom, e outro, sentado, em negro e amarelo.

Usando camadas de cor, Ira Etz busca levar o espectador à indagação; construindo e desconstruindo surgem formas inesperadas que se abrem para novas direções.

Jacqueline Dalsenter pretende, com “O Peso da Força”, sair de um círculo vicioso para um círculo virtuoso da imagem alcançada. Busca em suas pinturas o resgate da energia feminina contemporânea (honrando as conquistas de suas ancestrais diante de um patriarcado exacerbado). Investiga, em suas obras, suas próprias camadas e atravessamentos.

José Senna traduz em duas fotografias as belezas de cores, textura e formas encontradas no mundo vegetal.

Nas esculturas de Laura Bonfá Burnier, com sua arquitetura orgânica, a artista brinca com a sobreposição e interatividade das formas coloridas criadas em EVA.

Marcia Rommes propõe um diálogo entre as “Barreiras e Não Barreiras”, entre a pintura e outras linguagens, utilizando pinturas em acrílica sobre tela colocadas em caixas de acrílico na série “Tela Objeto”.

Maria Cecília Leão expõe autorretratos feitos em junho de 2022 e editados esse ano. Durante a pandemia, observando a luz vinda da janela do quarto, teve a ideia de fazer uma série em que expressou sentimentos como angustia, insegurança, desejo por um tempo melhor e esperança de um recomeço.

Obras da série “Vísceras da terra”, de Maria Eugênia Baptista, falam do quanto todos estão interligados, entrelaçados na trama da vida. Pintadas com as suas próprias mãos, a artista usou argila, óleos e resinas naturais, pigmentos e água de nascente, trazidas de imersões na natureza.

Maria Lúcia Maluf interpreta, à sua maneira, na gravura em metal, o tema “Pixels”.

Artista convidada de Vitória/ES, Teresinha Mazzei, apresenta seu trabalho de fotografia e arte digital com base nas pesquisas e uso de imagens de fios de seu cabelo ampliadas e transformadas.

E como já é tradição, Paulo Branquinho transforma suas inaugurações em uma grande festa entre amigos, artistas e apreciadores de arte, movimentando a tranquila Rua Morais e Vale. No dia 12 não será diferente: a partir das 17h, haverá apresentação do Trio Flor Amorosa, com muito choro, maxixe, polca e música instrumental brasileira. Composto por Luís Palumbo (flauta transversal), Juan (violão de sete cordas) e Rodrigo Sebastian (percussão), o grupo irá interpretar composições memoráveis de Pixinguinha, Chiquinha Gonzaga, Ernesto Nazareth, Zequinha de Abreu, entre outros.

Territórios, encontros e narrativas

19/jul

A mostra “Chão da praça: obras do acervo da Pinacoteca” inaugurou a sala expositiva da Pinacoteca Contemporânea, a Grande Galeria, Luz, São Paulo, SP. Com coordenação curatorial de Ana Maria Maia, curadora chefe da Pinacoteca, e Yuri Quevedo, a mostra reúne cerca de 60 trabalhos do acervo de arte contemporânea, em montagem pautada pelo desejo de falar sobre territórios, encontros e narrativas de atravessamento. Desenhos, pinturas, fotografias, vídeos e performances compõem a narrativa que é orientada por três grandes ideias: travessias, vizinhanças e transcendências. Em exibição até 30 de julho.

Travessias, Vizinhanças e Transcendências

A ideia de travessia e seu espectro é contemplada nas obras Irruptivo Series (Série irrompimento) (2010), de Regina Silveira (Porto Alegre – RS, 1939), e Galinha d´Angola (2017), de Paulo Nazareth (Governador Valadares – MG, 1977) e na performance Modificação e apropriação de uma identidade autônoma (1980), de Gretta Sarfaty (Atenas – Grécia, 1954).

Já a ideia de vizinhança ganha força pela localização do edifício Pinacoteca Contemporânea, que amplia o perímetro urbano com o qual o museu dialoga diretamente. Além disso, situações de encontro e afeto dão a tônica de uma longa parede, ocupada em uma montagem de obras de Lúcia Laguna (Campos de Goytacazes – RJ, 1941), Bené Fonteles (Bragança – PA, 1953), Matheus Rocha Pitta (Tiradentes – MG, 1982), Yuli Yamagata (São Paulo – SP, 1989), entre outros.

Por fim a ideia de transcendências é apresentada com Parede da memória (1994-2005), de Rosana Paulino (São Paulo – SP, 1967), que elabora uma identidade coletiva entremeando exercícios de lembrar e imaginar. Além de obras como Quebranto (2021), de Jonas Van (Fortaleza – CE, 1989) e Juno B. (Fortaleza – CE, 1982), e Yiki Mahsã Pâti (Mundo dos espíritos da floresta) (2020), de Daiara Tukano (São Paulo – SP, 1982).

Os Artistas

Analívia Cordeiro (SP), Antonio Poteiro (Portugal), Bené Fonteles (BA), Brígida Baltar (RJ), Carmela Gross (SP), Carmézia Emiliano (RO), Castiel Vitorino Brasileiro (ES), Claudia Andujar (Suíça), Claudio Tozzi (SP), Cristiano Mascaro (SP), Daiara Tukano (SP), Delson Uchôa (AL), Djanira (SP), Duhigó (AM), Emanoel Araújo (BA), Emmanuel Nassar (PA), Ernesto Neto (RJ), Gisela Motta e Leandro Lima (SP), Gretta Sarfaty (Grécia), Hudinilson Jr (SP), Ilê Sartuzi (SP), Jonas Van e Juno B (CE), Laura Lima (MG), Lucia Laguna (RJ), Lygia Pape (RJ), Lygia Reinach (SP), Marepe (BA), Maria Bonomi (Itália), Martinho Patrício (PB), Matheus Rocha Pitta (MG), No Martins (SP), Paula Garcia (SP), Paulo D’Alessandro (SP), Paulo Nazareth (MG), Paulo Pjota (SP), Regina Silveira (RS), Renina Katz (RJ), Rommulo Vieira Conceição (BA), Rosana Paulino (SP), Sandra Cinto (SP), Sara Ramo (Espanha), Sidney Amaral (SP), Tiago Sant’Ana (BA), Vera Chaves Barcellos (RS), Yuli Yamagata (SP) e Zica Bérgami (SP).

A exposição “Chão da praça: obras do acervo da Pinacoteca” tem patrocínio do Bradesco, na cota Apresenta, e da Bloomberg, na cota Prata.

Curadoria: Ana Maria Maia e Yuri Quevedo, com colaboração de Ana Paula Lopes, Horrana de Kassia Santoz, Pollyana Quintella, Renato Menezes, Thierry Freitas e Weslei Chagas.

A arte de Chico da Silva

18/jul

Sob o título de “Chico da Silva e a Escola do Pirambu” acontece na Pinacoteca do Ceará, a maior mostra já realizada sobre o artista em Fortaleza.

Em parceria com a Pinacoteca de São Paulo, a mostra reúne 148 obras entre pinturas e desenhos, além do filme em super-8 da performance “Homens Trabalhando”, digitalizado e com cores recuperadas pelo Museu da Imagem e do Som do Ceará.

A exposição destaca a Escola do Pirambu, um ateliê coletivo na casa de Chico da Silva, onde ele apresentava aos jovens da vizinhança sobre o ofício da pintura a partir do universo fabulado de suas criaturas.

A exposição no Ceará tem curadoria de Thierry Freitas e Flávia Muluc. Com obras de acervos como o do Governo do Ceará, do Museu de Arte da UFC (Mauc) e do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro (MAM-Rio), além de coleções particulares de várias partes do país, a mostra é ampliada com trabalhos das décadas de 1970 e 1980 assinados por Chico da Silva e um vaso de flores pintado pelo artista.

Sobre o artista

Nascido no Acre entre 1910 e 1922 (a data é incerta), Chico da Silva vem para o Ceará ainda na infância e constrói sua trajetória artística no Pirambu, bairro da periferia costeira de Fortaleza onde morou até falecer, em 1985. Das pinturas com carvão e cacos de telha nos muros da Praia Formosa, até a composição do ateliê coletivo com jovens da comunidade em que vivia, o imaginário fantástico do pintor que criava seres míticos da fauna e da flora é a marca de sua obra, reconhecida com a menção honrosa na Bienal de Veneza de 1966. Por volta de 1963, ele incorpora novos elementos, figuras, tamanhos e formatos nas obras, que crescem em dimensão e passam a ter a colaboração direta de artistas como Babá (Sebastião Lima da Silva), Chica da Silva (Francisca Silva) – sua filha -, Claudionor (José Claudionor Nogueira), Ivan (Ivan José de Assis) e Garcia (José dos Santos Gomes), único integrante ainda vivo.

Sobre o filme

O filme “Homens Trabalhando” é o registro da obra-performance de mesmo nome, produzida pelo Grupo de Estudos “Chico da Silva e a Escola do Pirambu”, formado por Gilberto Brito, Hélio Rôla e David Silberstein. O trabalho – selecionado para o Salão de Abril de 1977 – foi registrado em fotografia e em filme super-8 por Marcus Vale e João Vale. A película original passou por higienização, recuperação de cores e digitalização em 2k pelo Museu da Imagem e do Som do Ceará em 2023 para a exposição na Pinacoteca do Ceará. A obra audiovisual foi doada pelo artista Hélio Rôla para o acervo do MIS-CE

MAM Rio em cinco perspectivas

12/jul

A mostra “Museu-escola-cidade: o MAM Rio em cinco perspectivas” propõe um exercício de memória no 75º aniversário do museu: um ato de olhar para o passado, para o que já foi feito e as coisas que lá aconteceram, como convite para pensar o que o MAM Rio pode ser hoje e no futuro. Focando nas primeiras três décadas de sua história, a exposição apresenta cinco áreas que ancoram as ações do MAM Rio, e um evento que marcou seu curso. Educação, design, cinema, o experimental e os movimentos de criação artística que atravessaram a existência do museu são os campos de atuação escolhidos, os quais cimentam a relevância de uma instituição intimamente ligada às dinâmicas da cidade.

Como evento, o incêndio ocorrido em 1978 no museu representa um momento de mudanças caracterizado pelo engajamento coletivo de profissionais da cultura e da população, e pela revisão institucional. Em cada um desses eixos, obras do acervo do MAM Rio são apresentadas junto com documentos provenientes, em sua maior parte, dos arquivos do museu, escrevendo histórias por meio de objetos, imagens e impressos.    .

Até 03 de dezembro.

Heitor dos Prazeres no CCBB Rio

29/jun

Retrospectiva no CCBB, Centro, Rio de Janeiro, RJ, destaca perfil multimídia de Heitor dos Prazeres e a importância histórica de sua obra. A exposição “Heitor dos Prazeres é meu nome” reúne mais de 200 trabalhos, entre pinturas, desenhos e esboços, mobiliário, indumentárias, partituras e acervo documental

Décadas antes de o termo multimídia (ou mesmo “mídia”) se popularizar, Heitor dos Prazeres (1898-1966) já atuava em várias frentes artísticas, da música à pintura, da cenografia ao figurino, passando pelo mobiliário. Nascido dez anos após a abolição da escravatura, registrou, em suas composições e, a partir da década de 1930, com pincéis, tintas e suportes variados, da madeira à tela, crônicas do Rio suburbano da primeira metade do século XX.

Da mesma forma que frequentou as casas das tias da Praça Onze, como a da célebre Tia Ciata, e colaborou na fundação das primeiras escolas de samba da cidade, a exemplo de Mangueira, Portela e Deixa Falar (que originou a Estácio de Sá), sua produção nas artes visuais retratou temas ignorados na época pela academia, como os cultos de matriz africana, as primeiras rodas de samba e a transformação do subúrbio rural em cenário urbano, com o surgimento das primeiras favelas.

Com curadoria de Raquel Barreto, Pablo León de la Barra e Haroldo Costa, a seleção reúne obras de coleções particulares, incluindo telas pouco vistas, e de instituições como o Masp, a Pinacoteca de São Paulo, o MAM do Rio, o Ipeafro e os Museus Castro Maya.

Entre as raridades, estão duas de suas obras mais antigas, criadas poucos anos após seu início na pintura, em 1937: “O sonho” (1939) e “Caboclo”, da década de 1940. O título da mostra é retirado de uma fala do próprio pintor no documentário que leva seu nome, dirigido por Antônio Carlos da Fontoura em 1965. Uma apresentação que o situa entre os grandes nomes das artes brasileiras no século XX e, ao mesmo tempo, introduz sua produção ao público mais jovem.

– O título o reafirma como um homem negro que se coloca como sujeito de sua própria história e a representa assim. Ele foi nomeado de naïf, mas, se não fosse o racismo estrutural, um artista desta grandeza seria considerado um pintor moderno – acredita Raquel Barreto. – Outra importância da sua obra foi ter retratado a religiosidade afro-brasileira, que, neste momento, está sob ataque. Heitor era ogã, o responsável, no candomblé, por tocar para que o orixá desça à Terra. É uma função de mediador, um trânsito que ele também desempenhou em sua vida artística.

Curador de arte latino-americana do Guggenheim, de Nova York, Pablo León de la Barra destaca a importância histórica da mostra.

– A História da Arte tratou artistas como Heitor por muito tempo como primitivos ou ingênuos, o que é mais grave num país como o Brasil, onde o racismo dificulta o acesso à educação, o que tem de ser considerado numa releitura como a que estamos propondo – ressalta o curador. – A própria Tarsila (do Amaral) poderia ter sido considerava uma pintora naïf, pela forma como abordava os temas, como romantizava a realidade brasileira, mas isso não aconteceu, como no caso do Heitor.

Autodidata, Heitor começou a ser reconhecido também na pintura a partir da década de 1950, quando fica com o terceiro lugar para artistas nacionais na 1ª Bienal Internacional de São Paulo, em 1951, e ganha uma sala especial na 2ª Bienal, em 1953. Em 1966, participou do I Festival de Artes Negras em Dakar, no Senegal, meses antes de sua morte (a retrospectiva traz obras de Heitor e outros dois brasileiros na seleção, uma tela de Rubem Valentim e uma escultura de Agnaldo dos Santos). O evento marcou a memória de Haroldo Costa, que sentou ao lado do pintor no voo.

– Tive o privilégio de fazer parte da delegação brasileira para Dakar, e outro maior ainda de ir sentado ao lado do Heitor. Fomos conversando durante todo o voo e passei a admirá-lo ainda mais desde então – recorda Costa. – Ele é o melhor exemplar que conheço do “milagre brasileiro”. Tinha tudo para dar errado, mas foi grande em várias áreas. Muito graças à ultrassensibilidade que teve ao longo da vida, como pioneiro na observação do cotidiano da população negra e periférica, com a qual ele convivia.

Fundadora da MT Projetos de Arte, pela qual captou recursos para a exposição via Lei Federal de Incentivo à Cultura, a colecionadora Margareth Telles começou a planejar a mostra durante a pandemia, mas só no início do ano teve o projeto contemplado. Além de mostrar a uma nova geração de espectadores a obra de Heitor dos Prazeres, ela desejava fazer um paralelo com o momento atual da arte contemporânea brasileira, no qual questões sociais e relacionadas à diáspora africana estão no centro do debate.

– Além de ser apaixonada por seu trabalho, achava necessário fazer um recorte de sua produção agora, para colocá-lo em diálogo com artistas da nova geração, como o Dalton Paula, o Arjan Martins, o Maxwell Alexandre. Ele foi pioneiro em tudo, foi o primeiro artista negro a ser premiado numa Bienal, em 1951, ao lado do (suíço) Max Bill – contextualiza Margareth. – Foi o artista que abriu este caminho, retratando essa modernidade negra, da transição do rural para o urbano, das rodas de samba, do Brasil pós-abolição.

Ralação com a moda

Entre os legados da mostra, está a restauração da tela “Praça XV” (1965), da coleção Castro Maya, apresentada em 1966 no 1° Festival Mundial de Artes Negras, em Dakar, e do figurino do Balé do IV Centenário de São Paulo (1954), criado pelo pintor. Além das peças exibidas ao público pela primeira vez no CCBB, outra indumentária assinada por Heitor para a companhia de dança pode ser vista no Museu de Arte do Rio (MAR), na mostra “Carolina Maria de Jesus: um Brasil para os brasileiros”, que tem Raquel Barreto como uma das curadoras.

– Mostramos um pouco deste envolvimento dele com a moda, assinando o figurino do balé, uma coleção de tecidos da Rhodia, além do fato de ser um homem muito elegante, que se vestia sempre de forma impecável – destaca Raquel.

Para a curadora, a obra de Heitor dos Prazeres faz um registro precioso da realidade da população negra do Brasil em seu tempo, mas de forma diferente de outros pintores modernos que se debruçavam sobre o tema, como Di Cavalcanti e Portinari.

– Um dos aspectos que a gente quis destacar foram as cenas que ele pintou da infância de crianças negras. Isso era uma ideia muito nova, porque não existia durante a escravidão, e no pós-abolição essa infância era abreviada pela necessidade do trabalho – comenta Raquel. – E em várias telas com brincadeiras, vemos muito a imagem da pipa, do balão no céu, o que traz uma ideia de liberdade.

Fonte: Veja – por Por Nelson Gobbi.

Wilma Martins no Paço Imperial

26/jun

 

 

Um panorama da importante e consistente obra da artista Wilma Martins (Belo Horizonte, 1934 – Rio de Janeiro, 2022) será apresentado até 20 de agosto, e partir do dia 28 de junho, no Paço Imperial, Centro, Rio de Janeiro, RJ, na exposição “Wilma Martins – Território da memória”. Esta será a primeira mostra póstuma da artista falecida no ano passado, aos 88 anos. Com curadoria de Frederico Morais, crítico de arte e marido da artista, e a historiadora de arte Stefania Paiva, que conviveu intensamente com Wilma nos seus últimos anos de vida, a mostra será composta por 37 obras, além de estudos, em um conjunto nunca antes reunido, incluindo trabalhos pouco conhecidos da artista, desde suas primeiras produções até a última. São gravuras, pinturas, desenhos e cadernos, que mostram a potência e as diversas facetas da obra de Wilma Martins.
A exposição apresentará desde os primeiros trabalhos da artista – pequenas gravuras da década de 1960 -, passando por xilogravuras maiores, pinturas e desenhos, chegando até a última obra feita por ela – “Dona Marta 24h” (2016), composta por 25 desenhos, que representam o Mirante Dona Marta, no Rio de Janeiro, em cada hora do dia e da noite, durante um período de 24 horas.

Xilogravuras

No início dos anos 1960, Wilma Martins produziu gravuras em preto e branco, em pequenos formatos, que apresentam, sobretudo, um exercício de observação da fauna e da flora. Após esse período inicial, Wilma passa a elaborar gravuras em grandes formatos, com formas orgânicas e geométricas, criando cenas místicas, alegóricas, compostas de núcleos onde seres se misturam entre si. “Os temas que Wilma aborda em suas gravuras são aqueles que falam da condição feminina – fecundação, gravidez etc. Mas esses temas aparecem estranhamente mesclados com outros – frequentes na arte medieval, que é sempre religiosa. No entanto, ela não foi buscar essa iconografia nos vitrais coloridos, mas nos psautiers nos quais encontrou toda forma de arcaísmos, anacronismos, de capitulares e iniciais zoomórficas, assim como enorme variedade de tramas gráficas, formas cilíndricas, ovóides, etc”, diz Frederico Morais.
Entre as xilogravuras apresentadas na exposição está o tríptico “O encontro” (1971), “a maior e a mais despojada e impactante xilogravura realizada por Wilma Martins”, segundo Frederico Morais. “É uma releitura do painel central do políptico Adoração do Cordeiro Místico. Uma magistral redução minimalista da obra do pintor flamengo. Wilma começou eliminando o cordeiro (a redenção), mantendo apenas o vermelho do altar, que de retangular se transformou em semicírculo. Na gravura de Wilma, as figuras femininas, escavadas no branco, corresponderiam às “anjas” que circundavam o altar. Agora, bem juntas, buscam ascender até o semicírculo vermelho. As figuras masculinas, negras, em conjuntos simetricamente agrupados, corresponderiam aos dois grupos humanos que aparecem, como que imobilizados, em primeiro plano na pintura de van Eyck – prelados com suas vestes vermelhas à direita, os demais representantes da sociedade civil à esquerda. Ambos se movimentam em direção à pirâmide de mulheres, para expulsá-las dali ou, ao contrário, para nelas se fundirem e juntos ascenderem. Desvestidos por Wilma, homens e mulheres, brancos e negros, anjos e humanos todos se igualam em sua humanidade. Ou não”, ressalta Frederico Morais.

 Pinturas e desenhos

Também fará parte da exposição um pequeno núcleo com a produção mais conhecida de pinturas e desenhos de Wilma Martins, incluindo a última obra produzida por ela, “Dona Marta 24h”, um conjunto composto por 25 obras. “Os trabalhos se diferem entre si pela luz que incide nas primeiras horas do dia, a sombra do entardecer ou o cair da noite. O vigésimo quinto desenho que compõe a instalação trata-se da mesma montanha em forma de quebra-cabeça (hobby de Wilma, assim como as palavras-cruzadas e os enigmas), onde cada peça representa uma hora dentre as 24h”, conta Stefania.
Além disso, será apresentado um caderno de bolso, cujas páginas trazem desenhos com paisagens do Rio de Janeiro, acompanhado por um bilhete escrito pela artista com instruções de uso. “Cabe destacar especialmente a série de desenhos focalizando o maciço da Dona Marta e o pequeno caderno de papel artesanal, (11,5×8,5 cm), registrando à maneira dos cicloramas do século XIX, no Rio de Janeiro,  toda a extensão da paisagem captada de sua varanda: Urca, Pão de Açúcar, Botafogo, Laranjeiras,  Silvestre, altos de Santa Teresa, Cristo Redentor”, ressalta Frederico Morais.
Completam a exposição três obras realizadas no início da década de 1980: “Santa Teresa I”, “Santa Teresa II” e “Santa Teresa com elefantes”. São pinturas criadas a partir da janela do ateliê/casa de Wilma, no bairro do Cosme Velho, no Rio de Janeiro. “Da parte mais baixa da cidade, ela pintou uma Santa Teresa suspensa, envolta em árvores e montanhas de cumes verdes. Pouco tempo depois, Wilma foi até o bairro de Santa Teresa, comprou o terreno que pintou tantas vezes, e ali ajudou a projetar a casa que tem uma varanda com vista para o ponto de onde ela olhava inicialmente. Esse deslocamento do ponto de origem criou uma conexão invisível, como um rebatimento da paisagem minuciosamente descrita por ela”, conta a curadora Stefania Paiva. “É a paisagem invadindo a casa, o que não se trata de uma liberdade poética, mas uma sensação real, pois em certas horas do dia, dependendo da luminosidade, essa paisagem se projeta através da porta de vidro dentro da casa, como se desejasse completar a forma circular do ciclorama. Inversamente, a biblioteca projeta-se na paisagem, nos fins de tarde, misturando-se com as árvores. Dupla leitura: livros e árvores”, explica Frederico Morais.

 

Exposição de Mira Schendel

20/jun

A Galatea, Jardins, São Paulo, SP, apresentará a exposição “Mira Schendel:Toquinhos”, que será inaugurada no dia 28 de junho, às 18h. A mostra, em cartaz até 19 de agosto, conta com texto da curadora e crítica de arte Lisette Lagnado e reúne, pela primeira vez, um conjunto tão abrangente de obras – cerca de 60 – que compõem a série “Toquinhos”, produzida por Mira Schendel (1919-1988) principalmente entre 1972 e 1974. São trabalhos que se inscrevem no contexto das múltiplas experimentações com o papel de arroz japonês realizadas por Mira, após ter sido presentada pelo amigo Mario Schenberg, crítico de arte e importante físico brasileiro, com uma enorme quantidade desse material. A série “Monotipias”, produzida principalmente entre 1964 e 1967 e composta por cerca de dois mil desenhos, abre toda uma sequência de criações com o papel japonês que se desdobra, ainda, em trabalhos como as “Droguinhas” e os “Trenzinhos”, produzidos na segunda metade da década de 1960, e os “Objetos Gráficos”, realizados sobretudo entre 1967 e 1973.

Os “Toquinhos” aqui apresentados, vale ressaltar, diferem dos “Toquinhos” que consistem em pequenos retângulos de acrílico colados sobre placas transparentes também de acrílico, produzidos mais ou menos na mesma época (primeira metade da década de 1970). Entre as séries homônimas, os decalques de letraset são o elemento comum. A artista passa a utilizá-los sobretudo a partir da série “Objetos Gráficos”, cujas obras são compostas por folhas de papel de arroz repletas de rabiscos, traçados, rasuras, tipos datilografados e letraset inseridas entre duas placas de acrílico suspensas por fios de nylon e dispersas no espaço, longe das paredes, jogando com a luz, o dentro e o fora, a frente e o verso. Progressivamente, o desenho, a escrita cursiva e a rasura passam por um processo de síntese no trabalho de Mira, chegando ao que o ensaísta alemão Max Bense chama de “reduções gráficas”.

Nos “Toquinhos”, tais reduções são notáveis. A artista cria camadas colando sobre o papel japonês recortes geométricos (tingidos ou não) do mesmo papel, normalmente acompanhados de sinais de pontuação e letras. Ao ser questionada, em 1975, pela jornalista Norma Couri: “Por que letras?”, Mira responde: “São o pré-texto ou o pretexto do pós-texto”. Comentando tal diálogo, o teórico Geraldo Souza Dias afirma, em sua monografia sobre a artista intitulada “Mira Schendel: do espiritual à corporeidade” (2009): “A completa redução da forma a círculos e retas, desenvolvida nos tipos sem serifa da fonte Futura, a preferida da artista, permite considerar a relevância ótica das letras enquanto elementos de um conjunto. Nos trabalhos de Mira, o significado original dos sinais caligráficos – letras e números – transforma-se pela ação da letra autocolante, assumindo um caráter novo, puramente plástico.”

Reflexões de Richard John

12/jun

Richard John apresenta a exposição “Desenhos Miméticos” que inaugura no dia 17 de junho no V744atelier, Porto Alegre, RS. O artista propõe reflexões sobre as limitações da linguagem e a vida em sociedade.

O espaço foi idealizado e coordenado pela artista Vilma Sonaglio. O título da exposição e os trabalhos expostos são o resultado da tese de doutorado de Richard John, chamada “Desenhos Miméticos e A Tirania da Forma”, defendida em 2018. Partindo do antigo conceito grego de mimese, os trabalhos exploram a representação e a cópia como os elementos fundantes da linguagem, tanto visual como escrita.

Sobre a exposição

“O inferno é o outro”, escreveu Sartre. A enigmática frase do famoso filósofo francês resumia, de uma forma um tanto irônica, as diferenças e dificuldades da vida em sociedade. Apontava, também, para questões identitárias e a tendência, muito humana, de projeção no outro. Roland Barthes, outro filósofo francês, tentou algo mais propositivo ao escrever “Como viver juntos?”, um livro de 1977 que traz no título uma pergunta ainda muito atual. A exposição promete abordar estas e outras questões e é o resultado de uma tese de doutorado e mais quatro anos de trabalho. O artista, que desde 1988 vem produzindo experimentos entre pintura e desenho, considera que, mais do que estes quatro anos, a exposição é a culminância de suas reflexões desde a década de 1980.

– “Dizem que um artista sempre circula pelos mesmos temas, como uma forma de obsessão. O fato é que um artista aprofunda suas questões com o benefício do tempo; tudo é somado e levado ao seu desdobramento possível. Tudo isso –  tentativa, incerteza, erro, reelaboração, descoberta e redescoberta, avanços e recuos – são as partes constituintes de um processo artístico e é sua somatória que confere consistência ao trabalho”, observa Richard John.

Formalmente, alguns desenhos lembram livros de colorir ou o jogo dos 7 erros. São os chamados “trabalhos figurados” nos quais as representações de objetos simples trazem uma sensação de nostalgia e algo relacionado à infância. Mas, conceitualmente, eles vão muito além disso. E essa desproporcionalidade é estratégica e intencional porque os trabalhos funcionam em muitos níveis de leitura. Um dos conceitos utilizados por Richard John é o de inframince, criado por Marcel Duchamp (1887-1968), no qual o sentido artístico é encontrado em elementos praticamente imperceptíveis, nas relações mais sutis entre acontecimentos próximos. – “Duchamp, com o inframince, tentou chegar numa espécie de limite da arte, na qual ela pode residir na sua forma mais sutil, algo que me interessa como maneira de questionar, também, os limites da linguagem”, revela o artista.

Outra série também presente na exposição lida diretamente com a palavra. São os chamados “desenhos escritos”. Um desses desenhos traz listado mais de 10 mil nomes e sobrenomes. São amigos, parentes e pessoas conhecidas na sociedade e no meio artístico gaúcho, mas também artistas e filósofos de fama internacional. A ideia é render uma homenagem a cada um deles e, ao mesmo tempo, pensar as relações interpessoais na sociedade. Para o artista, a questão proposta por Barthes continua a nos desafiar: “Como viver juntos?”. Com os nomes, lado a lado, temos a impressão de células que formam um tecido e que perdem sua individualidade à distância, formando um todo abstrato.

Dividida entre “desenhos escritos” e “desenhos figurados” a exposição propõe um questionamento, tanto da linguagem escrita quanto desenhada, tratando dos elementos que formam tanto uma alfabetização verbal como visual. “- Não podemos esquecer que tanto a palavra como a imagem são elementos de linguagem e representação, como tal elas precisam ser aprendidas e são sujeitas a falhas. Minha ideia é justamente aproveitar estas falhas para encontrar novos sentidos na sua utilização e no nosso entendimento do mundo. Toda vez que se inventa uma nova linguagem se cria um novo mundo, uma nova vida”, conclui o artista.

“As linguagens e representações estruturam as relações sociais, culturais, econômicas, ideológicas e elas as reproduzem e as multiplicam”. Richard John opera nesse universo de reproduções e de cópias no qual vivemos imersos. Suas obras “enfatizam que as representações podem, também, representar a cópia ou os processos envolvidos em sua constituição”, escreveu Helio Fervenza, autor do texto de apresentação da exposição.

“Desenhos Miméticos” fica em cartaz até o dia 11 de agosto. Visitação de quartas as sextas-feiras, das 14h às 17h. Outros horários serão contemplados com agendamento pelo direct do Instagram do V744atelier.

Sobre o artista

Richard John (Bom Princípio-RS, Brasil, 1966) é artista plástico e professor. De 2013 a 2018 foi coordenador do Espaço Cultural ESPM, onde organizou exposições individuais de importantes artistas do cenário local e nacional, tais como Mario Röhnelt, Patrício Farias, Helio Fervenza e Maria Ivone Santos, Eduardo Haesbaert, Frantz, Dione Veiga Vieira, entre outros. Richard John é formado em Pintura (1992) e Desenho (1995) pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs). Em 1998 defendeu sua dissertação de Mestrado na mesma instituição. Em 2022, também pela Ufrgs, defendeu a tese “Desenhos Miméticos e A Tirania da Forma”, cujos trabalhos práticos deram origem à corrente exposição. Richard John participou de várias exposições coletivas a partir do final dos anos 1980, dentre as quais se destacam 49° Salão Paranaense (1992), XVI Salão RBS do Jovem Artista (1996) e a mais recente, Próxima Pintura, Pintura Próxima (2022), exposição em homenagem ao colega e artista Gelson Radaelli. “Desenhos Miméticos” é sua terceira exposição individual. As individuais anteriores foram “Cosmogonia” de 1994 (Galeria Espaço Institucional, Casa de Cultura Mario Quintana) e “O Objeto Flutuante” de 2014 (Estúdio Clio).

Sobre o V744atelier

Idealizado e administrado pela artista visual Vilma Sonaglio, o V744atelier é um local para criar e expor arte contemporânea. Abriga exposições de artistas convidados, mas também aceita propostas de criadores que estejam desenvolvendo sua pesquisa e produção em todas as linguagens na arte contemporânea. Inaugurado em 18 de setembro de 2021, com a exposição “ViCeVeRSa…pode não ser o que é”, de Sonaglio, o Atelier já sediou a exposição “Paisagem sem Volta”, de André Venzon e Igor Sperotto, “Be-a-bá”, de Maria Paula Recena e Marcos Sari, “C+asa”, de Marcelo Silveira; “Tripadeiras”, de Téti Waldraff, “Desvio/Provas”, de Helena Martins-Costa, “Sem peso e Cem medidas”, de José Spaniol. “Desenhos Miméticos”, de Richard John, é a oitava mostra do espaço expositivo.

Em seu segundo ano de atividades ininterruptas, o V744atelier vem se consolidando como um local para criar e expor arte contemporânea. A cada exposição, um novo desafio é proposto ao público, que é convidado a pensar e a refletir, seja apreciando as obras, seja participando das tradicionais “Conversa com o Artista”, encontros que ganham apreciadores desejosos de conhecer mais sobre o artista e seus processos criativos.

Recomenda-se o uso de máscara e álcool em gel à disposição.

Até 11 de agosto.

Representação ousada feminina

07/jun

A exposição “Teresinha Soares: um alegre teatro sério” é o atual cartaz – até 29 de julho – da galeria Gomide&Co, Paulista, São Paulo, SP. Com organização de Luisa Duarte, apresenta um conjunto de obras entre desenhos, pinturas e gravuras da intensa trajetória da artista mineira pelos anos 1960 e 1970. A exposição conta ainda com textos inéditos de Lilia Schwarcz e de Julia de Souza. Inserida no contexto repressor da ditadura militar brasileira, a artista ousou a representar temas feministas e de gênero, por um viés do erótico e de grande contestação das relações do corpo com os costumes morais, o consumo e a máquina política.

“Minha arte é realista precisamente porque condeno os falsos valores de uma sociedade a que pertenço. Realista e erótica, minha arte é como a cruz para o capeta” – Teresinha Soares

O aspecto ousado está tanto na temática quando no tratamento formal empregado pela artista, com traços e cores que transitam e se relacionam com os movimentos artísticos da época, como a arte pop, o noveau réalisme e a nova objetividade brasileira.

“Em “Um alegre teatro sério”, trabalho que dá nome à exposição, o corpo feminino aparece duplicado – ora mais curvado e talvez reprimido; ora expansivo e sem amarras. Frases como “de luz apagada”, que aparece logo abaixo de um abajur iluminado, ou “há os outros naturalmente” e “recebe até na cama e o governado” contracenam com rostos que se beijam e o que parece ser uma máscara de teatro. A obra faz pensar no teatro da corporalidade feminina, sujeita a tantas proibições, jogos de simulação e não ditos. Permite introduzir também o imaginário erotizado dessa artista numa súmula bem-feita e que faz performance dentro e fora das telas” – trecho do texto de Lilia Schwarcz para exposição.

Antes de ser artista, Teresinha Soares foi a primeira vereadora eleita em sua cidade natal, Araxá, onde foi também miss e professora. Além de artista, é também escritora e ativista dos direitos da mulher e ambiental.   Nos últimos anos, seu trabalho tem sido revisto e reinscrito na história da arte brasileira, tendo participado de importantes exposições coletivas.

O seu olhar feminista e libertário, a sua capacidade de aliar eloquência formal de energia contestatória, nos endereçam uma obra munida de singular atualidade para pensarmos os caminhos da arte e os desafios políticos da contemporaneidade.

Sobre a artista

Teresinha Soares nasceu em Araxá, Minas Gerais, em 1927. Mudou-se para Belo Horizonte no início da vida adulta, onde iniciou sua carreira artística. Participou de três Bienais de São Paulo (1967, 1971 e 1973) e realizou as exposições individuais “Amo São Paulo” (1968), na Galeria Art-Art, São Paulo, e “Corpo a Corpo in Cor-pus Meus” (1971), na Petite Galerie, Rio de Janeiro. Seu trabalho vem sendo revisitado e inscrito na história da arte brasileira, tendo recentemente feito parte de grandes exposições no Brasil e internacionalmente, como “The World Goes Pop”, na Tate Modern (2015), “Radical Women: Latin American Art”, 1960-1985, no Hammer Museum (2017), Brooklyn Museum (2018), e na Pinacoteca do Estado de São Paulo (2018). Em 2017, o MASP realizou a sua primeira exposição retrospectiva em 40 anos: “Quem tem medo de Teresinha Soares?”.