Esculturas de Advânio Lessa

08/mar

A Gomide&Co e a Galeria Marco Zero apresentam “Redemoinho não leva pilão”, primeira individual de Advânio Lessa em São Paulo, SP. Com curadoria de Valquíria Prates, a mostra inaugura o programa anual de exposições da Gomide&Co em 2024. Advânio Lessa (1981) nasceu e vive em Lavras Novas, distrito de Ouro Preto (MG). Tanto o seu local de origem, marcado pela herança quilombola, quanto os ofícios de seus pais (cesteira e tropeiro) são partes fundamentais do universo no qual se baseia sua poética como artista e agricultor desde a adolescência. Realizando esculturas em escala humana a partir de troncos de madeira de árvores mortas, raízes e trançados de cipó, o artista vincula os conhecimentos da cestaria e da marcenaria com madeiras e fibras encontradas nas matas da região de Ouro Preto, como cipó-alho, cipó-de-são-joão, candeia, jacarandá, folha miúda e alecrim. É em estreito diálogo com esse repertório que Lessa realiza suas obras, nas quais a natureza é uma espécie de coautora. Em entrevista concedida a Valquíria Prates, pesquisadora de sua obra, o artista afirma: “As sensações impressionantes que eu já tive, seja de estética, de energia, de movimento, de equilíbrio, de textura, eu nunca vi nada mais vibrante que a própria natureza. Então, para mim, tudo já está aí. A gente precisa compreender e ser humilde o suficiente para conectar mais com o que já está aí.” (Valquíria Prates, “Em tudo que é grande, a emenda é pequena: uma conversa caminhada com Advânio Lessa”, 2023).

Sempre interessado na capacidade humana de transformar contextos, lugares, situações e relações, Lessa tem em sua pesquisa artística o foco no trabalho, nos saberes e nas espiritualidades dos povos sequestrados da África e trazidos para o Brasil. Para “Redemoinho não leva pilão”, o artista convida os visitantes a um profundo processo de reflexão em torno de uma das plantas mais importante ligadas à história da Avenida Paulista: o café. A exposição consiste em um circuito composto por seis esculturas, tramas e flores de cipó-de-são-joão, pilões e milhares de grãos de café em côco que se interligam, formando uma grande instalação que pretende abordar os sistemas de produção em torno do cultivo desta que é uma planta tão comum no cotidiano de pessoas que vivem em todo o país. Planta de caráter mágico em algumas tradições religiosas, o café está presente nas mesas de casas, padarias, restaurantes, escritórios, salas de trabalho, além de nas bancas espalhadas pelas calçadas da cidade, movimentando esforços econômicos e interferindo nos ciclos de atenção há séculos, passando pelas mãos de quem planta e de quem bebe e gerando recursos em abundância.

O título da exposição é inspirado no provérbio Yorùbá “Ijì kìí kó gbódó” (O redemoinho não leva o pilão), retirado do livro Òwe – Provérbios, de Mãe Stella de Oxóssi, e que celebra a força dos que não são derrotados mesmo em condições e contextos adversos. Procura assim fazer alusão àqueles que são responsáveis pela construção e geração de riquezas, sob todo tipo de violência, opressão e injustiça, em todas as áreas de atuação humana do país. As esculturas a serem apresentadas de maneira inédita na exposição fazem parte da série Nascimento e vêm sendo trabalhadas por Lessa desde 2010, realizadas com madeiras de árvores e épocas diversas das matas de Lavras Novas, no que carregam em si “as histórias dos minerais, insetos e animais que com elas coexistiram temporariamente, camadas abaixo da terra, sobre ela e debaixo das estrelas e planetas que estão sendo com a gente, agora”, segundo palavras do artista. Encontros e conversas sobre modos de produção do café, a possibilidade de instaurar sistemas de bem viver integrados à produção de comida, além de estudos de caso entre a arte e a agricultura, fazem parte da programação pública da exposição.

A proposta de Advânio Lessa para sua primeira individual em São Paulo é uma continuidade de seu processo de pesquisa sobre sistemas de transformação pelo trabalho entre espécies em contextos específicos, que se iniciou com a exposição Se quiser saber do fim, preste atenção no começo (2023), com curadoria de Valquíria Prates. Apresentada no Museu da Inconfidência, em Ouro Preto, a exposição foi realizada pelo Instituto de Arte Contemporânea de Ouro Preto (IA) no contexto do Programa Raiz, que investiga a arte contemporânea produzida por artistas da região com mais de 20 anos de carreira.

Sobre a curadora

Valquíria Prates é curadora, pesquisadora e educadora. É mestre em Políticas Públicas de Acessibilidade (USP) e doutora em Artes e Mediação Cultural (UNESP). Atualmente, é curadora do Instituto de Arte Contemporânea de Ouro Preto (IA), consultora de Arte e Mediação Cultural do Museu de Arte Moderna de São Paulo (MAM SP) e colaboradora em projetos do Pólo Sociocultural Sesc Paraty, do Centro Cultural do Cariri (CE), do Instituto Moreira Salles (SP) e da Fundação Roberto Marinho (RJ).

Sobre o artista

Advânio Lessa nasceu em 1989 e vive até hoje em Lavras Novas, distrito de Ouro Preto (MG). Tanto a sua terra de origem, marcada pela herança quilombola, quanto os ofícios de seus pais (tropeiro e cesteira), são partes fundamentais do universo que irriga a sua poética. Realizando esculturas de grande escala a partir de troncos de madeira de árvores mortas, raízes etrançados de cipó, o artista vincula os conhecimentos da cestaria e da marcenaria com as madeiras e fibras encontradas nas matas da região de Ouro Preto: Cipó Alho, Cipó São João, Candeia, Jacarandá, Folha Miúda e Alecrim. É em estreito diálogo com esse repertório que Lessa, que também é agricultor, realiza suas peças. Nesse sentido, não nos parece enganoso afirmar que a natureza aqui é uma espécie de coautora de suas obras. A produção do artista ganha o mundo munida, a um só tempo, de uma intensa eloquência formal e de uma relevante conotação discursiva. Suas esculturas, cujas escalas se aproximam àquela do corpo humano, atestam uma relação de reciprocidade entre nós e tudo aquilo que é vivo ao nosso redor. Nesse sentido, ressoam uma tendência importante da atualidade: no lugar de epistemologias caras a um modo Ocidental de conceber o mundo, para as quais nós humanos estamos sempre em posição superior, entram em cena cosmologias onde testemunha-se uma relação não hierárquica entre todos os seres vivos. O trabalho de Advânio Lessa foi apresentado, entre individuais e coletivas, em instituições como o Espaço Cultural CEFET – Ouro Preto (Ouro Preto, Brasil, 1998); Galeria Clélia Valadares (Belo Horizonte, Brasil, 2008); Galeria da FIEMG (Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais, Ouro Preto, Brasil, 2010); Galeria Graphos Brasil (Rio de Janeiro, Brasil, 2013); Museu Afro Brasil (São Paulo, Brasil, 2013); Fundação Clóvis Salgado – Palácio das Artes (Belo Horizonte, Brasil, 2015); IA – Instituto de Arte Contemporânea de Ouro Preto e Museu da Inconfidência, com curadoria de Valquíria Prates (Ouro Preto, Brasil, 2023), entre outras. Sua obra compõe a coleção da Pinacoteca do Estado de São Paulo (São Paulo, Brasil).

Até 04 de maio.

Expressão e extravasão de Maxim Malhado

29/fev

Estará aberta ao público a partir do dia 05 de março, na Paulo Darzé Galeria, Rua Chrysippo de Aguiar 8, Corredor da Vitória, Salvador, BH, com o título de “Até onde a vista alcança”, a exposição de pinturas e esculturas de Maxim Malhado.

Para o crítico e curador Ricardo Resende, “…a arte para Maxim é sua maneira de desver o mundo, como também era para o poeta, artista mesmo, Manoel de Barros. Era também uma maneira de subverter a vida enfadonha daquele interior de Sítio Novo, cidade onde cresceu na Bahia. Sonhar, desenhar, pintar e esculpir são a sua forma de expressão e extravasão máxima dos sentimentos. Os que despertavam sua curiosidade pelo mundo e os que o afligiam. Um mundo que é só imagem, e até mesmo imagem de uma imagem, nada de nada. Os homens, por sua vez, não passam de imagens, sonhos…”, e concluindo na apresentação no catálogo da exposição que a sua obra “…é a de um menino que via coisas e imaginava mais coisas ainda depois das coisas que via, um claro desejo de sustentar espaços”. A mostra, cumprirá temporada até 05 de abril.

A obra de Eliane Duarte na Central Galeria

28/fev

Em 2023, a Central Galeria, Vila Buarque, São Paulo, SP, em colaboração com a família da artista Eliane Duarte, iniciou uma pesquisa para resgatar sua obra. Duarte nasceu em 1943 no Rio de Janeiro e teve uma produção artística breve, mas intensa, até seu falecimento prematuro em 2006. Agora, de 09 de março até 11 de maio, Eliane Duarte terá a exposição individual “Reza” na Central Galeria, acompanhada por um texto crítico de Catarina Duncan. A mostra não apenas destaca a relevância ainda hoje do trabalho de Eliane Duarte, mas também enfatiza a importância de sua obra ser compartilhada com novas gerações.

Ao conhecer sua prática, acessamos fundamentos da Natureza, formas orgânicas, flores, cachos e vestes que se materializam em suas obras através de um processo de costura visceral. A costura é uma prática ancestral mas frequentemente associada ao universo feminino domesticado. Entretanto, a voracidade com que Eliane Duarte trabalhou com essas técnicas aproximam o fazer artesanal ao cirúrgico. Suas metodologias explicitam também a urgência de se comunicar de outra forma, tridimensional mas não escultórica,  com costura em pele e não só em tecido, sempre driblando das conformidades práticas do mercado de arte. Sua obra é um legado à prática artística de mulheres no Brasil, que seguem sem o devido reconhecimento na memória coletiva de sua geração, evidenciando os processos patriarcais das decisões históricas sobre quem é reconhecido. Acessamos um conjunto de trabalhos que nunca foram apresentados juntos e assim resgatamos e honramos a memória não só dessa grande artista mas de todas as mulheres, artistas que seguem sem o devido reconhecimento.

Sobre a artista

Eliane Duarte nasceu em 1943 no Rio de Janeiro. Suas obras expandem os limites da tela como suporte e ganham corpo como objetos-amuletos-rezos. Feitos com tecidos, algodão, pigmentos naturais, cera, sementes, corda, penas, moedas e outros elementos que, habitam uma mística, ganhando corpo como entidades e forças únicas. Conforme relato da artista: “Meu trabalho é quase uma reza, no sentido de fazê-los de forma lenta e por uni-los uns aos outros, costurando-os como se fossem patuás. Queria uma coisa que desse sorte às pessoas e tudo que eu coloco tem a função de amuletos”. Eliane Duarte estudou na Escola de Artes Visuais do Parque Lage, no Rio de Janeiro, de 1987 a 1989. Começou a se destacar no cenário artístico ao ganhar o 1º Prêmio do Salão Nacional de Artes Plásticas da Funarte em 1994, com a obra “Veste”. Desde então, o sentido de maceração associado à ideia de gerar pele tornou-se um tema proeminente em sua poética. Além de inúmeras individuais nas galerias Anna Maria Niemeyer, no Rio, e Camargo Vilaça, em São Paulo, expôs no MAC Niterói; MAM Rio de Janeiro; Paço Imperial; Museu de Belas Artes do Rio de Janeiro; Itaú Cultural de São Paulo. No exterior participou de coletivas no Museu Solomon R. Guggenheim, Nova Iorque; Centro Cultural de Arte Contemporâneo, Cidade do México; Museo Alejandro Ottero, Caracas; Centro Cultural Culturgest, Lisboa; Museo del Barrio, Nova Iorque; Museo de Arte Latino-Americana, Buenos Aires; Coconut Grove Center, Miami; BildMuseet, Umea, Suécia; Fondation Cartier pour l’art contemporain, Paris. Suas obras integram as mais importantes coleções brasileiras, como a de João Sattamini/MAC-Niterói; Gilberto Chateaubriand/MAMRio de Janeiro; Coleção do MAC São Paulo; e internacionais como a Coleção Fondation Cartier pour l’art contemporain, Paris, Bernard Soguel, Basel; Cisneros e Museo Alejandro Otero, Caracas.

Curadoria de Theo Monteiro com doze artistas

27/fev

A Nara Roesler, Ipanema, Rio de Janeiro, RJ,  apresentaá, no dia 29 de fevereiro, das 18h às 21h, a exposição “Essa cidade ‘sempre’ maravilhosa”, com trabalhos de doze artistas selecionados pelo curador Theo Monteiro. As obras discutem questões ligadas à cidade do Rio de Janeiro, como a paisagem, lazer, violência, sexualidade, o sagrado, em toda a complexidade que envolve esta metrópole que “desempenha papel decisivo na formação cultural e política do país”. O título da exposição é retirado da apresentação que o grande compositor Ismael Silva (1905-1978) fez antes de cantar seu clássico “Antonico”, no disco “Se você jurar”, de 1973.

Os artistas participantes da exposição são: Alberto Baraya (1968, Bogotá), Ana Hortides (1989, Rio de Janeiro), André Griffo (1979, Barra Mansa; vive no Rio de Janeiro), Arthur Chaves (1986, Rio de Janeiro), Celo Moreira (1986, Rio de Janeiro), Elian Almeida (1994, Rio de Janeiro), Jaime Lauriano (1985, São Paulo), Marcos Chaves (1961, Rio de Janeiro), Priscila Rooxo (2001, Rio de Janeiro), Raul Mourão (1967, Rio de Janeiro), Vik Muniz (1961, São Paulo; vive e trabalha no Rio de Janeiro e em Nova York), Yohana Oizumi (1989, Rubiataba, Goiás; vive e trabalha em São Paulo).

A palavra do curador

No térreo da Nara Roesler Rio de Janeiro, estão os trabalhos que “dialogam diretamente com questões de natureza mais cotidiana….Se fazer presente em uma cidade espremida entre mares, morros e mares de morros requer capacidade humana, técnica, trabalho e estratégia. Paisagens idílicas convivem ao lado de elementos como violência, sexualidade, arquitetura, lazer, propaganda, cultura de massa, histórias e memórias…Falamos de uma urbe que conjuga uma natureza de aparência intocada com a agitação característica de uma metrópole latino-americana. E existe todo um universo no meio e por causa disso. No piso superior, “…afloram os temas ligados ao espírito, aqueles que só a lógica, a sociologia e o intelecto não dão conta de explicar….Em uma cidade onde a vida se faz veemente, só o cotidiano não dá conta. E aí entram o metafísico, o onírico, o sagrado e o celestial…A religião, por exemplo, e seus desdobramentos, afinal, falamos de uma metrópole em que a fé é um destacado agente social e político, mas não somente. Também o futebol (o que é o Maracanã senão um grande templo devotado ao nobre esporte bretão?), o carnaval e a ficção dão as caras por aqui, mostrando uma cidade cujo imaginário se enraiza não só geograficamente, mas também nas almas”.

Em cartaz até 06 de abril.

Conversa com artista e curador no Paço Imperial

 

No dia 02 de março, às 16h, será realizada uma conversa gratuita e aberta ao público com a artista Ana Holck e o curador Felipe Scovino na exposição “Entroncados, Enroscados e Estirados”, no Paço Imperial, Centro, Rio de Janeiro, RJ. Na ocasião, também será lançado o catálogo da mostra em formato e-book, com 37 páginas, texto do curador, fotos da exposição montada e das obras, com design do Estúdio Afluente. O catálogo terá visualização gratuita no novo site da artista: www.anaholck.com, que também será lançado no sábado.

Em cartaz até o dia 24 de março, a exposição apresenta obras inéditas de Ana Holck, que marcam uma nova fase na sua reconhecida e destacada trajetória de 22 anos nas artes. São apresentados oito trabalhos, pertencentes às três séries que dão nome à mostra. As obras, que foram produzidas este ano, em porcelana e aço inox – materiais até então nunca utilizados pela artista -, transitam entre a ideia de pintura e escultura.

Eliane Prolik e José Bechara

21/fev

A Simões de Assis, Balneáreo Camboriú, PR, exibe “Intersecções obtusas: Eliane Prolik e José Bechara”.

Eliane Prolik e José Bechara: Intersecções obtusas

Deitando dois conceitos matemáticos e dispondo-os como ferramentas poéticas, a exposição Intersecções obtusas busca aproximar trabalhos recentes de Eliane Prolik (Curitiba, 1960) e José Bechara (Rio de Janeiro, 1957), artistas que operam dispositivos geométricos a fim de tecer narrativas essencialmente humanas, contemplativas e questionadoras acerca de seu tempo. Suas produções, portanto, se interseccionam: não de maneira incisiva e cortante, mas em múltiplos caminhos obtusos, vastos e irrestritos. Nessa ocasião, Eliane Prolik apresenta esculturas metálicas resultantes de processos de dobras, angulações e obliquidades em tubos de aço inoxidável. Linhas se constroem e se metamorfoseiam em entidades escultóricas que provocam o espectador e ativam o espaço. Em oposição a uma geometria cartesiana e hermética, a artista endereça possibilidades experimentais na prática escultórica, a confluir atento rigor, sensibilidade e profunda erudição. Suas obras desobedecem a uma ortogonalidade limitante e se relacionam com leituras abertas do mundo contemporâneo: embora registrem as torções do dia-a-dia, os impasses e embates que incidem sobre as formas, ensaiam uma expansão com seus múltiplos cotovelos a romper o espaço modular. Em suas esculturas de parede, nota-se um avanço: as obras se projetam, em um ímpeto passional a inflamar a tranquilidade dos planos arquitetônicos. Sinal outro da atenção da artista à polivalência contemporânea é o combate a uma frontalidade estrita: suas obras resistem a um ponto de vista oficial, a uma tentação disciplinar que poda o olhar e que restringe as propriedades múltiplas da tridimensionalidade. Formam-se e deformam-se fractalmente, com várias faces ao passo que nenhuma oficial. Seja nas dinâmicas entre obra e espaço expositivo, seja nos aspectos intrínsecos à arquitetura transpostas à escultura, suas obras enfatizam as relações com o espaço arquitetônico. A superfície polida e espelhada do aço inoxidável mimetiza o espaço e amalgama o observador, replicando suas imagens em seus reflexos distorcidos. Esse aspecto reforça fluxos fenomenológicos dos trabalhos, dispondo-os abertos e penetráveis espacial e visualmente, incentivando o movimento do espectador ao seu redor e a fruição em vários ângulos. Desse modo, o olho percorre o objeto e o identifica em seu próprio reflexo mutável. As discussões espaciais movimentadas por José Bechara em suas grandes esculturas e instalações são canalizadas, nessa exposição, em suas pinturas com oxidação de emulsões metálicas, cobre e ferro, tinta acrílica e lonas usadas de caminhão. A variação de plataformas reitera a constância de uma preocupação sobre o acúmulo e o vazio, o excesso e a síntese, limítrofe às compreensões virtuais do espaço. Em suas obras, o dinamismo formal veloz colide radicalmente com um processo demorado, com etapas que guardam semelhanças com meticulosas práticas laboratoriais, ao passo que são igualmente contemplativas, existenciais. Há, portanto, uma declaração imediata: o espaço não é estático, mas é habitado, revirado, corroído. O artista propõe arranjos entrópicos orquestrados, onde o acaso não se encontra por sorte, mas por exaustão experimental. Infiltrações e embaralhamentos em espaços puros através de composições dramáticas e inquietas questionam pressupostos acerca da espacialidade – não de modo a solucioná-la, mas a questioná-la, a negar as imposições cisalhantes que lhe foram historicamente atreladas. Desse modo, Bechara revisita cânones do abstracionismo geométrico sem a milimétrica frieza minimalista, mas em uma pulsão expansora e rompante. De forma conciliatória, o artista emprega meticulosas práticas químicas a serviço de investigações acerca da existência, da impermanência do tempo, da inconstância do espaço, das oportunidades contemplativas em meio a turbilhões. Sensivelmente, decreta a vida ativa nos óxidos, nas reações químicas, assim como a ação do tempo e as histórias imantadas nas lonas de caminhão que utiliza como suporte discursivo. Além das convergências metálicas, da materialidade do aço inoxidável maciço das esculturas de Prolik às oxidações metálicas das pinturas de Bechara, os trabalhos atestam expansões poéticas dos consagrados artistas que comungam um cerne gramatical. Arestas, encontros e quinas tornam-se afáveis pela inflexão poética, na afirmação de experimentações a geometrias sensíveis, humanas e vivenciáveis.

Mateus Nunes

Duração da mostra: de 22 de fevereiro até 06 de abril.

Tunga no MAM SP

07/fev

O MAM, Parque do Ibirapuera, São Paulo, SP, anuncia a permanência em exibição na Sala de Vidro de “…uma das últimas obras criadas por Tunga  (1952 – 2016), a instalação Eu, Você e a Lua. Inédita no Brasil, a obra reúne elementos frequentes da poética do artista como pedras, espelhos, garrafas de cristal e de gesso e pratos presos em aros e hastes”.

“Eu, Você e a Lua” está entre as últimas obras realizadas pelo artista que iniciou sua produção na segunda metade dos anos de 1960. Ao longo de sua trajetória, Tunga se interessou pela alquimia, pela psicanálise, pelas ciências e pela filosofia. Ele construiu uma mitologia singular com imagens simbólicas e materiais em que as noções de permanência e transformação são fundamentais. É recorrente em sua obra a ideia de que “o trabalho é um conjunto de trabalhos”.

A palavra do curador

Mesmo com a profusão de objetos e materiais, em Eu, Você e a Lua há uma forte coerência entre as partes. Alguns elementos são recorrentes no vocabulário poético do artista, como garrafas de cristal, de gesso ou de resina, tanto ocas como sólidas. Espelhos, cristais, pedras, pratos presos em aros e hastes, além de correntes ou alças de couro fixadas em tripés também aparecem em outras obras de Tunga. Ao lado de um tronco petrificado de milhares de anos, o uso desses materiais pode evocar o orgânico e o inorgânico ou o natural e o artificial. O fóssil de uma árvore que se manteve intacto, como se o tempo estivesse suspenso, convive com uma essência de âmbar, uma fragrância com toques amadeirados que goteja como se uma ampulheta marcasse a passagem do tempo e a transformação da matéria. Recorrendo ao olfato e à visão, os elementos originários e pré-históricos na obra de Tunga se fundem ao contemporâneo e à presença efêmera do perfume. Fragmentos agigantados de um corpo humano, dedos polegares de bronze patinado apontam para baixo, enquanto espelhos arredondados e prateados como a lua refletem a luz que vem de cima. Escultura de dedos, como se estivessem duplicados, apontam para lados contrários, para o céu e para o solo. Uma delas de pedra, na horizontal, alinhada ao tronco, indica sentidos opostos e apontam para o eu e para o outro. O olhar de dois sujeitos pode atravessar o fóssil e se encontrar num único. Os dois lados já não parecem se opor. Na poética de Tunga, o que está no planeta Terra ou fora dele, o interno e o externo, assim como eu, você e a lua, formam um todo indivisível.

Cauê Alves (curador-chefe do MAM São Paulo)

Sobre o artista

Antônio José de Barros Carvalho e Mello Mourão, o Tunga, nasceu em 1952, em Palmares, Pernambuco, viveu e trabalhou no Rio de Janeiro. Foi o primeiro artista contemporâneo a exibir sua obra na pirâmide do Louvre, além de ter participado de exposições como a Bienal de Veneza, em 1982, e Documenta de Kassel, em 1992. Hoje o trabalho do artista está nos acervos do MoMA, em Nova York; do Museum of Fine Arts de Houston; do Centre Pompidou, em Paris; do Barcelona Museum of Contemporary Art, e da Tate Modern, em Londres.

Sobre o Instituto Tunga

Criado em 2017 logo após o falecimento do artista, o Instituto Tunga é uma entidade sem fins lucrativos cujo objetivo é estudar, preservar e difundir o legado do artista. Fundado por seu filho Antônio Mourão, diretor executivo, e por Clara Gerchman, gestora do acervo, o Instituto Tunga transformou em realidade uma vontade que o artista manifestava em vida. O Instituto Tunga é formado por uma equipe de profissionais composta por pesquisadoras, museólogas, montadores, arquivista, bibliotecária e gestores que cuidam do acervo que Tunga deixou, contemplando desde as obras de arte até seus materiais e ferramentas de trabalho, cadernos de anotações, fotografias, cromos, publicações e uma importante biblioteca do artista.

Performances e exposição

31/jan

A Gentil Carioca, Centro, Rio de Janeiro, RJ, convida para a abertura da 19ª edição do Abre Alas, primeira mostra do calendário de atividades da galeria em 2024 que ocorrerá no dia 03 de fevereiro. Além da exposição e do tradicional concurso de fantasias, o evento contará com uma programação de DJs e performances.

Os 28 artistes participantes desta edição são:

BELLACOMSOM, Brenda Cantanhede, Bruno Pinheiro, Carlos Matos, Cynthia Loeb, Emilia Estrada, Guilherme Kid, Jeff Seon, Joelington Rios, Jorge Cupim, Jota Carneiro, LYV, Luiz Pasqualini, Marlon de Paula, Matheus Pires, Mauricio Igor, Medusa, Nalu Rosa, Natha Calhova, Naomi Shida, Rafael Simba, RHAY, Silia Moan, Sofia Ramos, Thaís Iroko, Thiago Modesto, Uma Moric e Virgínia Di Lauro.

A comissão de seleção – composta por Agrade Camíz e Daniela Castro – exerceu uma espécie de ausculta de um corpo social, cuja respiração entendem serem as artes, que reverberou a partir e através dos projetos e práticas artísticas recebidos para compor o 19º ABRE ALAS. Uma respiração coletiva, viva, pulsante. Saúde! Evoé!

Novos artistas selecionados

A Anita Schwartz Galeria de Arte, Gávea, Rio de Janeiro, RJ, convida para a abertura, em 02 de fevereiro, às 19h, da exposição “Alvorada”, com 51 trabalhos de 32 artistas selecionados pela chamada pública Projeto GAS – Chamada Aberta de Verão, lançada em agosto do ano passado, e que recebeu 770 inscrições de artistas brasileiros e estrangeiros. Na noite de abertura, às 20h, a artista Carolina Kasting fará a performance “Corpo-Memória”, com a criação de duas pinturas que serão integradas à exposição. “Alvorada” ficará em cartaz até o dia 09 de março.

Cenas do cotidiano; a cultura popular brasileira; a história da arte revista sob a ótica de questões atuais; reflexões do campo político, a natureza e os impactos das ações humanas; gênero e sexualidade são alguns dos assuntos tratados nas obras da exposição. Os trabalhos reunidos em “Alvorada” são resultados de interesses, realidades e práticas distintas entre si. Há artistas que moram no exterior (Gustavo Riego e Graziela Guardino) vivendo em diferentes culturas, enquanto outros convivem com o dia a dia de zonas centrais e periféricas de cidades brasileiras.

Os 32 artistas, que ocuparão todo o espaço expositivo da galeria Anita Schwartz Galeria de Arte são: Ana Raylander (SP), Badu (PB/GO), Bruna Snaiderman (RJ), Bruno Lyfe (RJ), Caetano Costa (PE), Caio Borges (SP), Carolina Kasting (SC/RJ), Cela Luz (RJ), Clarice Rosadas (RJ), Desirée Jaromicz Feldmann (DF), Diego Castro (SP), Flávia Metzler (RJ), Fogo (RJ), Graziela Guardino (SP/Sydney), Guilherme Kid (RJ), Gustavo Riego (Bruxelas/Assunção), Janaína Vieira (SE/SP), Jorge Cupim (RJ), Julia Ciampi e Tiago Lima (MG), Luiz Eduardo Rayol (RJ), Malvo (RJ), Maria Victoria Santos (MG/RJ), Maryam Souza (BA/SP), Michele Martines (RS), Myriam Glatt (RJ), Nita Monteiro (RJ/SP), Rafael Amorim (RJ), Tetê Lian (MG/SP), Thales Pomb (DF/SP), Thix (RS/RJ), Vera Schueler (RJ) e Vinicius Carvas (RJ).

A sede da Galatea em Salvador

29/jan

Cais é a exposição coletiva que inaugura a sede de Salvador da Galatea, galeria fundada em 2022 em São Paulo, que escolheu a capital do Estado da Bahia e primeira capital do Brasil para sua morada fora do Sudeste.

Estar em Salvador parte do desejo da galeria de ampliar o seu público para além do contexto sudestino e expandir suas trocas e conexões com artistas, curadores e intelectuais sobretudo do Nordeste, mas também para outros locais além do eixo Rio-São Paulo. Nesse sentido, este gesto reflete e rearticula os pilares conceituais fundadores do programa da Galatea: ser um ponto de fomento e convergência entre culturas, temporalidades, estilos e gêneros distintos, gerando uma fricção, um embaralhamento e uma mistura entre o antigo e o novo, o canônico e o não-canônico, o formal e o informal, o erudito e o popular.

​O título Cais nos remete às ideias de deslocamento, de viagem, de troca e de intercâmbio, que envolvem o conceito da chegada da Galatea em Salvador e, ao mesmo tempo, remetem à localização da galeria. Situada no térreo do edifício de arquitetura modernista Bráulio Xavier (que abriga um importante painel de Carybé, artista argentino radicado em Salvador), localizado na rua Chile, a primeira rua do Brasil, a galeria encontra-se na região do antigo Portal de Santa Luzia, uma das portas de acesso de Salvador no período em que era murada, que ligava o porto (cais) à cidade alta pela Ladeira da Conceição da Praia. Este último logradouro, por sua vez, é o local onde se encontra a oficina de José Adário, o ferreiro de ferramentas de orixá mais antigo em atividade na cidade de Salvador. Zé Adário foi o artista escolhido pela Galatea para inauguração de seu espaço em São Paulo, onde o artista realizou a primeira individual de sua carreira.

O recorte curatorial parte justamente dessa relação estabelecida com a obra de José Adário e o contexto cultural e geográfico em que ela está inserida e agrega os demais artistas nordestinos representados e trabalhados pela Galatea – Aislan Pankararu, Chico da Silva e Miguel dos Santos – para a partir de elementos e temas-chave da produção destes artistas derivar os conteúdos dos quatro núcleos que constituem a mostra: Fantasias de fauna e flora; Geometrias afro-indígenas e brasileiras; Representações da religiosidade e cultura afro-indígena e brasileira; e seu subnúcleo Máscaras Expandidas, localizado na sala do cofre.

Justapondo e friccionando nomes históricos e contemporâneos, artistas de formação tradicional e autodidata, a exposição conta com obras de 60 artistas nascidos ou radicados no Nordeste e organiza-se em torno de três temas chave: a estratégia da representação fantasiosa e estilizada da fauna e flora brasileira; as diversas elaborações e usos da abstração no contexto do Brasil, passando pelo modernismo, pelas raízes indígenas e afro-brasileiras; as representações da rica e complexa religiosidade do nosso país, mesclando imagens e referências das religiões de matriz africana com as do catolicismo popular. Desta forma, Cais pede licença para chegar em Salvador e convida para conhecer seus trabalhos e suas histórias.

Curadoria: Alana Silveira, diretora, Galatea Salavador; e Tomás Toledo, sócio-fundador, Galatea.