Na Casa de Cultura Laura Alvim

07/mar

 

Exposição de Nelly Gutmacher – de 15 de março a 07 de maio – reúne séries produzidas desde a década de 1970, destacando o questionamento de gênero. Deusas gregas emergem andróginas das profundezas do oceano. Vênus dotadas de falos revelam-se hermafroditas. Fragmentos moldados no corpo dão origem a esculturas em cerâmica, metal e pó de pedra. Vulvas em diferentes formatos e cores fazem alusão à História da Arte e ao ícone pop Madonna. Colagens e fotomontagens ecoam influências do cenário social em que foram criadas, da década de 1970 aos dias atuais.

Este recorte da carreira de Nelly Gutmacher, 81 anos, foi reunido em “Absoluto Falho”, revelando toda a inquietude fértil que permeia a carreira da artista. Sua individual, sob curadoria de Marcus de Lontra Costa e Rafael Fortes Peixoto, inaugura no dia 14 de março, segmentada entre quatro séries que ocupam o segundo andar da Casa de Cultura Laura Alvim, Ipanema, Rio de Janeiro, RJ, tendo como cerne principal o questionamento de gênero, abalizando diferentes momentos históricos desta trajetória, iniciada na década de 1960.

“Absoluto Falho” aborda as questões de corpos e gêneros, apontando uma provocação poética no surgimento de novas identificações e de um futuro mais plural. Reunindo obras de diversos períodos da produção da artista, a mostra parte de inspirações em formas elementares e narrativas mitológicas para repensar as estruturas binárias que ainda fundamentam as nossas sociedades”, avalia Marcus Lontra.

Abrindo a exposição e resgatando imagens e formas que habitam o inconsciente coletivo, os curadores apresentam uma série de colagens analógicas já ambientalizando o espectador num espaço de referências estéticas, históricas e poéticas onde toda a criação artística de Nelly Gutmacher acontece. “Nas salas ocupadas pela mostra, monta-se uma narrativa não-linear onde a artista constata a obsolescência das definições entre homem e mulher e provoca sobre o aparecimento de novas formas de vida híbridas, nascidas da lama profunda do oceano”, diz Rafael Fortes Peixoto.

 

Espaço expositivo

A proposta de Nelly Gutmacher é a de provocar novos e múltiplos olhares, investigando (e instigando) questões relativas aos gêneros, aos corpos e à sexualidade. Na sala de entrada, apresenta colagens e fotomontagens que produziu desde a década de 1970, em plena Ditadura Militar, até 2021, através de uma perspectiva onírica e intimista; no salão central, estão expostas séries que se relacionam com uma espécie de arqueologia criada pela artista, como as “Hermafroditas” dos anos 1980, pequenas esculturas em porcelana, bronze e metal que seriam facilmente confundidas com as Vênus do período Neolítico, não fosse por um detalhe: todas são dotadas de falos. A sala lateral, separada por uma cortina do resto da exposição, divide-se em duas séries distintas, de diferentes épocas, em que Nelly Gutmacher parte de seu próprio corpo para a criação do corpo artístico externo e simbólico. Na primeira série, “Fragmentos”, realizada aos longo dos anos 1970/80, a artista moldava seu próprio corpo, propondo intervenções materiais. Já na série “Like a Virgin”, criada aos 80 anos, mostra vaginas em diferentes formatos e cores, com citações tanto à História da Arte, com Courbet e Man Ray, como ao ícone do pop e do “Pussy Power”, Madonna. Na sala frontal, que conta com um grande vidro e com a vista da praia de Ipanema, Nelly Gutmacher apresenta as obras da série “Tálassa”, a mais recente (2022 e 2023), propondo o surgimento de seres andróginos e multigêneros que surgem da lama do fundo do oceano, em uma montagem que mistura instalação e esculturas criadas em cerâmica e resina.

 

Saiba mais sobre Nelly Gutmacher

Filha de imigrantes judeus, Nelly Gutmacher possui formação junguiana e interesses como mitologia e arquétipos. Natural do Rio de Janeiro (1941), começou sua trajetória na década de 1960, com Ivan Serpa, no MAM-RJ. Nos anos 1970, frequentou diversos ateliês experimentando técnicas e materiais. Nessas vivências teve contato com Celeida Tostes, com quem dividiu ateliê e estabeleceu uma relação de cumplicidade poética, introduzindo na cerâmica a temática feminina no Brasil, ao longo de 1970, tendo atuado em vários suportes com diferentes técnicas, sempre de forma pulsante e conduzindo o público por questões que transcendem o mero simbolismo. Na década de 1980, passou a dar aulas no Parque Lage e, no mesmo período, investigou a experimentação artística como processo terapêutico, aprofundando-se nas questões psicanalíticas que passam a influenciar sua produção. Em paralelo à prática artística, atuou também como terapeuta, numa trajetória semelhante à de Lygia Clark. Nas décadas seguintes, como elaboração conceitual, o corpo e as formas orgânicas estruturam suas obras e articulam-se sobre os conceitos de gênero, sexualidade e erotismo através de referenciais arquetípicos e ancestrais, sendo pioneira no Brasil na abordagem desses temas e aproximando-se de importantes nomes da escultura como Louise Bourgeois e Maria Martins.

Apoio cultural: Danielian Galeria

 

 

Artistas de diversos estados no Memorial

01/mar

 

Abrindo o calendário de exposições de 2023 do Memorial Getúlio Vargas, Glória, Rio de Janeiro, RJ, a exposição coletiva “Memória do Futuro” apresenta no dia 04 de março, das 12h às 17h, e exibe até o dia 16 de abril, pinturas, instalações, fotografias, desenhos, esculturas e objetos de 23 artistas de diferentes estados do Brasil, que refletem o lastro temporal da memória como condutor de um futuro possível e de suas subjetividades.

Com curadoria de Shannon Botelho, “Memória do Futuro” tem a memória como construção de identidade, invenção de si, de coletividade, de singularidade e de sociedade. A mostra traz os artistas Consuelo Vezarro, Cristina Canepa, Danielle Cukierman, Débora Rayel Eva, Federico Guerreros, Gláucia Crispino, Leda Braga, Lili Buzolin, Lucy Copstein, Marcia Rosa, Michaela A F, Odette Boudet, Renata Carra, Riyosuke Komatsu, Rosa Hollmann, Rosana Spagnuolo, Rose Aguiar, Sandra Gonçalves, Sheila Riente, Suzana Barbosa, Tuca Chicalé Galvan, Vitória Kachar, Yohana Oizumi.

 

A intensidade luminosa de Marilia Kranz

28/fev

 

A Galatea, Jardins, São Paulo, SP, tem o prazer de anunciar a mostra que inicia o seu programa de 2023: “Marilia Kranz: relevos e pinturas”, com abertura no dia 09 de março, às 18h.

Marilia Kranz nasceu e viveu na cidade do Rio de Janeiro, cuja paisagem é assunto recorrente em sua obra. Desenhando desde a infância, inicia aos 17 anos seus estudos formais em arte, cursando pintura no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro. Em 1956, ingressa na Escola Nacional de Belas Artes, onde estuda durante três anos. Passa, ainda, pelos ateliês de Catarina Baratelli (pintura, 1963-66) e Eduardo Sued (gravura, 1971).

Em um primeiro momento de sua produção, até meados da década de 1960, Kranz se dedica ao desenho e ao estudo da pintura. Na sequência, começa a produzir relevos abstratos em gesso, papelão e madeira, que integraram a sua primeira exposição individual, em 1968, na Galeria Oca, no Rio de Janeiro. Em 1969, ao retornar de viagens que fez à Europa e aos Estados Unidos, passa a produzir os relevos a partir da técnica de moldagem a vácuo com poliuretano rígido, fibra de vidro, resina e esmaltes industriais; além das esculturas com acrílico cortado e polido, chamadas de Contraformas.

Kranz inova ao produzir quadros-objetos a partir da técnica de vacum forming, pouco difundida no Brasil naquela época, até mesmo no setor industrial. Além disso, o conteúdo dos trabalhos também guarda forte caráter experimental. Segundo o crítico de arte Frederico Morais, as formas abstratas e geométricas exploradas nestas obras e na produção de Marilia como um todo se aproximariam mais de artistas como Ben Nicholson, Auguste Herbin e Alberto Magnelli do que das vertentes construtivistas de destaque no Brasil, como o Concretismo e o Neoconcretismo.

A partir do ano de 1974, Kranz retoma a prática da pintura, trazendo para o centro da tela elementos constituintes das suas paisagens preferidas no Rio de Janeiro. Comparada a artistas como Giorgio de Chirico e Tarsila do Amaral, os seus cenários e figuras geometrizados, beirando a abstração, contêm solenidade e erotismo ao mesmo tempo. Os tons pasteis, por sua vez, tornam-se a sua marca. “A cor cede diante da intensidade luminosa”, diz Frederico Morais. Ao observarmos as flores e as frutas que protagonizam com grande sensualidade várias de suas pinturas, pensamos também em Georgia O’Keeffe, considerada por Kranz sua “irmã de alma”.

A artista carioca é também conhecida pela defesa da liberação sexual feminina e da liberdade política durante a ditadura militar no Brasil, além da luta pelas causas ambientais, atuando como uma das fundadoras do Partido Verde em 1986.

Marilia Kranz expôs em galerias e instituições nacionais e internacionais e recebeu inúmeros prêmios pelas suas pinturas e esculturas, entre eles: o prêmio em escultura do 13º Panorama de Arte Atual Brasileira, em 1981, e o prêmio de aquisição do Salão de Artes Visuais do Estado do Rio, em 1973. Em 2007, contou com a exposição retrospectiva Marilia Kranz: relevos e esculturas no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, ocasião em que foi lançada a monografia Marilia Kranz, escrita pelo crítico de arte Frederico Morais, que acompanhou a artista durante toda a sua carreira.

 

Até 29 de abril.

Manifestações divinas e profanas

14/fev

 

Anita Schwartz Galeria de Arte, Gávea, Rio de Janeiro, RJ, apresenta de 02 de março até 15 de abril, a exposição “Dialetos do Firmamento”. A artista belga de origem turca Shen Özdemir traz em sua primeira viagem ao Brasil seu universo particular de carnaval, em que cria esculturas que nos lembram os bonecos de Olinda. Para abrir a mostra coletiva em que estará junto com os artistas Bonikta, Ivan Grilo, Jeane Terra, Rochelle Costi, Thiago Costa, e Zé Tepedino.

Shen Özdemir fará um cortejo com seus estandartes, e seis músicos integrantes do Céu na Terra, que percorrerá as ruas do bairro da Gávea até a Anita Schwartz. A exposição discute as diferentes cosmovisões, mundos inventados, o encantamento e os mistérios que transitam entre o céu e a terra.

A exposição será aberta por um cortejo/performance com oito bandeiras desenhadas e confeccionadas pela artista belga de origem turca Shen Özdemir, em sua primeira visita ao Brasil, e a participação de seis músicos integrantes do tradicional Céu na Terra. A concentração será a partir das 18h30, na Praça Santos Dumont, na Gávea, e o cortejo percorrerá algumas ruas do bairro até a Anita Schwartz, na Rua José Roberto Macedo Soares, 30. Por meio de suas linguagens e modos sensíveis de compreensão, os trabalhos dos artistas de “Dialetos do Firmamento” constelam imaginários, desenhando novas direções para modos plurais da existência, integrada à imensidão dos poderes ocultos do universo.

A exposição inaugura o programa de 2023 da galeria e convida o público a imaginar novas possibilidades de cuidar de um futuro ancestral, em conexão com o campo da arte e da espiritualidade, construindo percursos e diálogos entre manifestações divinas e profanas. O projeto de um Brasil inventado é revisto pelas potências do intangível, as expressões primárias e as subjetividades da memória, atravessando o tempo e o espaço visível/invisível do mundo moderno organizado pela racionalidade.

Bonikta (Caio Aguiar), nascido em 1996, em Ourém, Pará, e radicado em Salvador, estará na exposição com as fotografias “Kurumins do Rio” (2023) e “Ygarapé das Bestas” (2023), cada um medindo 45 x 60 cm. Sua produção que desenha um universo encantado inspirado no imaginário ribeirinho amazônico, reflexos de vivências que traçam travessias entre o interior e a cidade, entre a rua e a floresta. Bonitka se dedica a processos de criações e encantarias em diversas linguagens e tecnologias, do grafite, lambe-lambe, ilustrações, pinturas, fotografias, vídeos, animações, tatuagens, máscaras a desenhos digitais, entre outros. Bonikta é bicho que vira gente e gente que vira bicho. Atualmente ele é estudante do Bacharelado Interdisciplinar em Artes na UFSB (Universidade Federal do Sul da Bahia).

Ivan Grilo (1986, São Paulo) mora em Itatiba, São Paulo, e tem sua produção reconhecida no circuito da arte a partir de seu interesse em investigar tradições orais, ou pesquisar história brasileira a partir de arquivos públicos. A escrita é um elemento importante em seu trabalho, de várias maneiras, e na exposição a obra “Fazer juntos um trecho de céu no chão” (2022) traz a frase entre linhas, em bronze, medindo 8cm x116cm.

O tríptico “Santuário do Sertão” (2022), uma monotipia feita sobre pele de tinta – material desenvolvido pela própria artista – foi criado a partir da vivência de Jeane Terra no final de 2021 nas cidades baianas inundadas pelo Rio São Francisco em 1970, para a criação da represa de Sobradinho. A obra retrata, a partir de um registro fotográfico feito pela artista, a Igreja de Santo Antônio, do século XVIII, na margem do rio em Pilão Arcado. Jeane Terra nasceu em 1975 em Minas, e é radicada no Rio de Janeiro.

Rochelle Costi (1961-2022), artista atuante em exposições no Brasil e no exterior, deixou um legado poético de sua coleção amorosa de registros do que a cercava – objetos, paisagens, cenas do cotidiano. Sua obra que integra a exposição “Escada Palavrada – Céu” (2014), em jato de tinta sobre papel de algodão, de 105cm x 70cm, é também uma homenagem a ela.

A artista belga de origem turca Shen Özdemir (1996) criou um universo de carnaval a partir das lendas de gigantes, na Bélgica, e das marionetes da Turquia. Na série de trabalhos Karnavalo, sua intenção é criar uma comunidade humana internacional através do sincretismo cultural. Seu carnaval é composto por uma multidão de trupes, concebidas como núcleos familiares, ressaltando a ideia de parentalidade, e seguindo a tradição das alegorias dos desfiles de carnaval. Suas “cabeças” nos lembram, entre outros personagens de festas populares, os tradicionais Bonecos de Olinda. Criadas com espuma, papel, tinta acrílica, gesso e tecido, e medindo aproximadamente 90cm x 90cm, duas obras “Cabeças” (2023), que representam metaforicamente dois membros de uma mesma família, sem definição de gênero ou faixa etária. Com a participação de integrantes do Céu da Terra, será a primeira vez que os desfiles feitos por Shen Özdemir com seu carnaval imaginário terão música. O conjunto de bandeiras do cortejo integrará a exposição.

As esculturas-ferramentas “Exercícios para suspensão” (2022) – solda sobre vergalhão, com 50cm x 20cm cada – do paraibano Thiago Costa (1994, Bananeiras, residente em João Pessoa), faz parte de sua pesquisa da escrita em relação com a imagem a partir das filosofias Bantu e Yorubá. “O gesto de assentar e seus métodos fazem parte de saberes milenares onde se acessa as temporalidades do que é intencionado, que possibilita comunicação e relação da forma com o corpo”, diz. Ele investiga a relação das formas com as corporações e incorporações.

Na instalação “Sem título” (2023), em madeira, nylon, tecido, areia e pedra, o artista carioca Zé Tepedino (1990) dá seguimento à sua série “Vários verões”, em que objetos de praia são destituídos de sua função original, e ao serem desmembrados e rearranjados são pensados a partir de cor e forma.

 

A Natureza das Coisas

10/fev

 

Radicada em São Paulo desde 1998, a escultora cubana Alina Fonteneau já teve duas de suas obras expostas no jardim do Museu Brasileiro de Escultura. Feitas de fibra de vidro, às vezes, suas peças levam dois meses ou três meses para ficar prontas. “Inspiro-me na natureza”, explica a artista e complementa: “As cores vivas que utilizo são as das frutas e das flores.”

Agora o próximo passo de Aline Fonteneau obedece a curadoria do crítico Marcus Lontra Costa e entra em cartaz a partir de 11 de fevereiro com a exposição individual “A Natureza das Coisas” na Galeria Dila Oliveira, Jardim Paulista, São Paulo, SP.

Encontro de escultor e crítico

07/fev

 

A Mul.ti.plo Espaço Arte, Leblon, Rio de Janeiro, RJ,  promove no dia 14 de fevereiro um encontro entre o escultor José Resende, um dos maiores nomes da arte contemporânea brasileira, e o crítico e professor Ronaldo Brito, um dos mais respeitados pensadores do país. O bate-papo gira em torno da exposição “Rotação e translação”, que apresenta 14 obras inéditas em latão, mola latonada, cobre e cabo de aço de Resende. Ronaldo Brito, que possui uma parceria profissional de longa data com o artista, é quem assina o texto da mostra, que termina no dia 24 de fevereiro, na Mul.ti.plo.

A entrada é franca e o encontro acontece em 14 de fevereiro, uma terça-feira, às 18h30, como desdobramento da mostra na galeria.

Aos 77 anos de idade e com mais de 50 de uma sólida e exitosa carreira, José Resende está de volta à capital carioca depois de uma década. Em sua última exposição na cidade, em 2011, ele ocupou o saguão monumental do MAM. Dessa vez, o desafio foi criar obras que conversassem com o espaço da galeria no Leblon.

A exposição abre-se em dois tempos. No primeiro, estão obras maiores, que se desdobram delas mesmas, como uma experiência de multiplicação. São cinco esculturas de parede (de cerca de 260 x 80 x 40 cm) e duas de chão (de aproximadamente 45 x 42 x 115 cm), elaboradas a partir de tubos de latão articulados com cabo de aço. “Uma peça sai da outra, mas cada uma tem uma unidade diferente e uma relação de mobilidade com o espaço da galeria”, explica o artista. Em contraponto, estão seis esculturas menores, de cerca de 45 x 42 x 115 cm, que trabalham a questão da tensão e também do movimento a partir de hastes e molas.

O nome da exposição, “Rotação e translação”, partiu do texto crítico de Ronaldo Brito e se refere a uma frase do artista norte-americano Carl Andre. “Em resposta à perplexidade diante de suas peças literais, o escultor minimalista insistia que elas tinham, sim, base: a terra. José Resende pontuaria – a terra, em movimento de rotação e translação”, escreve Ronaldo, que também assinou o texto da exposição no MAM-RJ em 2011.

Conhecido por suas obras em grande escala, como a monumental instalação com vagões pendurados com cabo de aço, em São Paulo, em 2011, José Resende tem várias obras em locais públicos no Rio de Janeiro. Uma delas é a escultura apelidada de “O passante”, no Largo da Carioca, e “A Negona”, no corredor cultural do Centro. “José Resende é um criador de exceções. Sua poética, sempre renovada, traz uma potência que se revela a cada novo trabalho”, diz Maneco Müller, que comanda a Mul.ti.plo em parceria com Stella Ramos.

 

Sobre o artista

José Resende nasceu em São Paulo, SP, em 1945. Vive e trabalha em São Paulo, SP. Formado em Arquitetura pela Universidade Mackenzie, São Paulo, cursou gravura na FAAP. Em 1963 estudou com Wesley Duke Lee e, entre 1964 e 1967, foi estagiário no escritório do arquiteto Paulo Mendes da Rocha. Em 1966, fundou com Nelson Leirner, Wesley Duke Lee, Geraldo de Barros, Carlos Fajardo e Frederico Nasser a Rex Gallery and Sons. Em 1967, ganha o Prêmio de Aquisição da 9ª Bienal de São Paulo. Em 1970, realiza exposição individual no MAM-RJ e no MAC-USP. No mesmo ano, funda com Carlos Fajardo, Frederico Nasser e Luís Baravelli o centro de experimentação artística Escola Brasil, onde lecionou por quatro anos. Em 1974, realiza exposição individual no MASP, São Paulo. Em 1980, recebe menção honrosa na representação do Brasil na 11ª Biennale de Paris. No mesmo ano, edita a publicação sobre arte “A Parte do Fogo” junto com um grupo de críticos e artistas. Em 1984, recebe bolsa da John Simon Guggenheim Memorial Foundation, residindo em NY até 1985. Em 1988, participa da 43ª Bienal de Veneza. Em 1992, Participa da Documenta 9, Kassel, Alemanha. José Resende desenvolveu ao longo de sua carreira uma atuação pungente dentro do debate da arte e da cultura no Brasil, sobretudo entre 1960 e 1980, época da Ditadura militar. A partir da década de 1990, desenvolve inúmeros projetos, permanentes e temporários, especialmente para espaços urbanos. Além de expor diversas vezes na Bienal Internacional de São Paulo (9ª, 17ª, 20ª e 24ª) e em importantes instituições nacionais e internacionais ao longo dos seus mais de 50 anos de carreira. Seus trabalhos figuram em importantes coleções públicas como o MoMA (Museum of Modern Art), Museu de Arte Moderna de São Paulo e Pinacoteca do Estado de São Paulo. Sua última exposição foi na Fundação Iberê Camargo, Porto Alegre, em dezembro de 2021.

 

O Pequeno Grande Mundo de Flavio Papi

06/fev

 

“O Pequeno Grande Mundo de Flavio Papi” começou a ser construído muito cedo, ainda na infância, quando já produzia maquetes e mini esculturas. Aos seis anos de idade, começou a desenhar com Augusto Rodrigues, na “Escolinha de Artes do Brasil”, e logo em seguida com Ivan Serpa, no MAM, dos 7 aos 12 anos. Seu know-how em arquitetura, já que além de artista plástico e maquetista é também arquiteto, favoreceu bastante seus projetos em menor escala; hoje, Flavio Papi é considerado o maior maquetista brasileiro, elencando uma extensa e respeitável lista de trabalhos para publicidade, cinema e televisão (TV Globo, a extinta Manchete e Record). No dia 09 de fevereiro, “O Pequeno Grande Mundo de Flavio Papi”, faz uma retrospectiva sobre sua trajetória de mais de 60 anos -, reunindo desenhos, pinturas, esculturas e maquetes, sob curadoria de Dinah Guimarães, no Centro Cultural CorreiosRJ.

 Entre as maquetes mais curiosas, estão a do “Teatro” da novela Mandala (TV Globo), a do “Banheiro”, criada para o clipe do grupo “Paralamas do Sucesso”, dirigido por Andrucha Wadington e vencedor na MTV Awards Brasil, em 1996. São destaques também na exposição a maquete oficial da “Rio 2016” e a recente série “Floresta” (bastante oportuna no momento atual de devastação da Amazônia), criada para uma peça publicitária sobre o Dia do Meio Ambiente.

 

A palavra da curadora

“Será a arte capaz de transportar imaginariamente o espectador para um universo paralelo? A obra de Flávio Papi se insere, inegavelmente, em uma criatividade transcendental, que logra decodificar informações novas ao introduzir elementos estranhos (“ruídos”) em dados cotidianos. É aqui possível perceber uma distinção capital entre “arte formalizada” (arte criada pelos artistas) e “arte em estado bruto” (capacidade humana de fruir esteticamente objetos ou fenômenos naturais como crepúsculos)? A atual retrospectiva revela artefatos ecléticos, que mesclam valores artesanais da arte do passado com uma ruptura estética radical. Peças artísticas criadas a partir de maquetes com técnica mista (madeira, mdf, acrílico, plastique, papel, arame, pvc, plástico, poliuretano, resina, gesso, pintura acrílica ou automotiva) simbolizam obras intuitivas, espontâneas, sem projeto prévio. Fugindo da premissa ingênua de obras cuja facilidade se disfarça sob a ideia do difícil, a exposição revela desenhos, pinturas, esculturas e maquetes produzidos desde a infância do artista até a atualidade, em mais de 60 anos de trabalho ininterrupto. Começou Flávio Papi a desenhar com Augusto Rodrigues na Escolinha de Artes do Brasil e, em seguida, com Ivan Serpa no MAM-Rio. Maquetes, mini esculturas e desenhos originais dos anos 1960 constam da exposição, ao lado de esculturas recentes com temática ecológica, destruição e renascimento do planeta, assim como temas ligados à violência humana. Sua mão artística, em um gesto surrealista, expressa a criação/destruição humana do planeta e a esperança de retomada do bem comum verde, com a presença maciça de uma ecologia que possa nos redimir nesse terrível momento de crise ambiental brasileira na Amazônia. Enfatizam-se maquetes para publicidade, cinema e televisão, como aquelas feitas para novelas: “Teatro”, da novela “Mandala”, ao lado de obras para a TV GLOBO, Record e a extinta Manchete, além de filmes como “Outras estórias”, de Pedro Bial e “Lili Carabina”, de Lui Farias. Juntam-se maquetes usadas em vídeoclipes para bandas de rock e shows musicais para o programa “Fantástico”, com artistas como Djavan, Martinho da Vila, Zizi Possi, Ângela Maria e o programa “Os Trapalhões”. Destaca-se a maquete do “Banheiro” para o grupo “Paralamas do Sucesso”, vencedor do melhor vídeoclipe do ano (1996) na MTV Awards Brasil e dirigido por Andrucha Waddington. Derivando de uma família de artistas plásticos como Luiz Alphonsus e Domingos Guimaraens, foi sua obra influenciada pela poesia de Alphonsus de Guimaraens Filho, Afonso Henriques Neto e Augusto de Guimaraens Cavalcanti, devendo sua estética de connoisseurship à exímia modista Sônia Papi, sua mãe, ao bom gosto e escritos da tia Hymirene Papi de Guimaraens, às esculturas e poemas do tio Luiz Papi e ao apoio imprescindível do irmão Pedro Papi. Trata-se de ter olho e gosto, pois o bom gosto é um juiz intemporal perante o qual as obras comparecem, à espera de julgamento…”.

 

Sobre o artista

Flavio Papi nasceu no Rio de Janeiro em junho de 1954, Formado em Arquitetura pela FAU-UFRJ. Em seu currículo, há cursos de maquetes ministrados na década de 1980 no MAM. Em 1982, trabalhou por dois anos em Nova York na Maloof Architectural Models. Retornando ao Rio de Janeiro, voltou  a ministrar cursos no  IAB, E.A.V. (Parque Lage) e em seu Ateliê, na Lapa. Desde então, produz e faz maquetes para Arquitetura, Cinema, Televisão, Fotografia, Publicidade, Engenharia, Música, Artes Gráficas. Entre os seus principais projetos, “Os 100 anos de Oscar Niemeyer”, a exposição sobre os 50 anos de Brasília com a obra de Lúcio Costa, Burle Marx, Petrobrás, comerciais para Skol e Motorolla, e projetos para TV Globo e TV Record (maquetes de novelas e seriados).

Até 02 de abril.

 

 

 

Texturas, entrelaçamentos e urdiduras

01/fev

 

A primeira coletiva de 2023 da Simões de Assis em São Paulo reflete sobre as possibilidades têxteis dentro da produção visual latino-americana.

“Tramas e Tecituras” reúne diversos artistas que, em suportes distintos e a partir de processos variados, exploram os caminhos da costura, do bordado, da apropriação, sobreposição e colagem têxtil, e de todas as histórias contadas a partir de fios, lenços, telas, panos, texturas, entrelaçamentos e urdiduras.

A mostra traz obras inéditas e recentes de André Azevedo, Elizabeth Jobim, Ernesto Neto, Mariana Palma, Martin Soto Climent, Mestre Didi, Yuli Yamagata, além de artefatos criados pelos artesãos haitianos Georges Valris e James Recule, que exploram a natureza narrativa das bandeiras e tapeçarias historicamente desvalorizadas pela produção contemporânea.

Exibição da coleção de Vera e Miguel Chaia

30/jan

 

A Arte 132 Galeria, Moema, São Paulo, SP, exibe exposição “Tridimensional: Entre o sagrado e o estético”, um recorte da coleção particular de Vera e Miguel Chaia, que reúne um conjunto de 46 obras. Entre telas, objetos e esculturas de 35 diferentes artistas brasileiros. A mostra apresenta desde nomes consagrados a jovens talentos do cenário artístico brasileiro. A curadoria é assinada por Miguel Chaia, Laura Rago e Gustavo Herz.

Dividida em dois pilares, o sagrado e o estético, Tridimensional mescla de forma não-linear os temas centrais. Supõe-se que cada artista ou obra se aproxima ora mais ora menos do sagrado ou do estético; em algumas obras, o sagrado pode ser mais explícito e, em outras, menos. O conceito de sagrado é aqui entendido no seu significado amplo de religioso, venerável, ritualístico, mítico, alquímico e metafísico – centrado nas questões do corpo e da sociabilidade, e aparece representado por cinco elementos – sangue, vinho, água, fogo e alimento. O estético é compreendido como a linguagem que, no desenvolvimento histórico da arte, em um processo autônomo e profano, opera revoluções nas formas de expressão, rompendo claramente vínculos com áreas externas à própria arte. O tridimensional aparece em restrito relacionado à forma das telas, objetos e esculturas – todas as obras apresentam três dimensões e/ou perspectivas de relevo.

 

Sobre o processo curatorial

Três questões nortearam as reflexões abordadas pelo conjunto de obras expostas: Será possível perceber na arte contemporânea vestígios do sagrado? O que pode haver em comum entre a arte e o sagrado? E, ainda, a arte contemporânea, ao ganhar autonomia, fortalecendo seu significado estritamente estético, abandona o mítico, a religiosidade e a religião na busca da revolução da linguagem?

Entre os destaques da exposição, aparecem Artur Lescher, Carmela Gross, José Resende, José Leonilson, Leda Catunda, Marcelo Cidade e Tunga.

A história da coleção de Vera e Miguel Chaia se confunde com a própria história da arte contemporânea brasileira. O casal começou a colecionar há 45 anos e, durante esse período, reuniu um acervo ímpar. Eles se conheceram em 1969, quando cursavam a Faculdade de Ciências Sociais da PUC-SP, e logo descobriram o amor em comum pelas artes, passando a visitar, juntos, exposições. Começaram adquirindo gravuras e nunca mais pararam. Assim surgia uma das mais importantes coleções de arte contemporânea brasileira. “Tridimensional – Entre o sagrado e o estético” será uma oportunidade para que os espectadores conheçam um recorte desse acervo.

Evento de encerramento: Recital de piano, em 11 de março, sábado, às 11h30.

Até 11 de março.

 

Obras de Ivens Machado na Carpintaria

26/jan

 

“Tucci Russo, Torino, 1983” apresenta pela primeira vez no Brasil, na Carpintaria, Jardim Botânico, Rio de Janeiro, RJ, cinco esculturas de Ivens Machado que foram expostas originalmente na Galleria Tucci Russo, em Turim.

Tucci Russo foi um antológico marchand italiano dedicado a promover expoentes da Arte Povera, e as obras de Ivens Machado compartilham com o movimento a fusão da fatura manual com procedimentos industriais, a reabilitação de materiais da construção civil, e a reintrodução de uma fisiologia corporal e carga libidinal nos espaços de arte. Após a exposição na Tucci Russo, Ivens Machado expõe na Nouvelle Biennale de Paris a convite do crítico e curador italiano Achille Bonito Oliva.

As quatro esculturas de chão são como livros abertos de concreto sobre finas pernas de metal. As “páginas” são abas espessas que se abrem em três ou quatro facetas. Cada faceta exibe uma determinada consistência, estabelecendo um contraste tanto cromático quanto textural entre o concreto cru e aquele pigmentado com óxido em tons terrosos, avermelhados. As variações em dimensões, tratamentos e distribuições de informação sobre a escultura dá a cada uma um caráter específico, como se fossem criaturas de uma mesma matriz que ganham autonomia própria.

A única escultura de parede da presente exposição traz a primeira incorporação de Ivens Machado das telas de arame que se tornaram recorrentes em seu trabalho. A variedade cromática das esculturas de chão passa a uma paleta ascética de preto e cinza. O concreto e o óxido reaparecem como o material principal, mas a tela de arame de onde pendem pedaços de concreto dá à obra uma mobilidade e leveza contraditórias com o seu peso.

O uso que Machado fez de materiais da construção civil – a tela de arame, o aço, o concreto, fragmentos de azulejo e cacos de vidro – e o caráter estrutural-arquitetônico que as esculturas apresentam, aproxima a exposição de uma casa suspensa entre a construção e a demolição. À época, a crítica italiana Luciana Rogozinski descreveu os trabalhos como “flores da ruína”, expressão que encerra bem a coexistência sempre contraditória, frequentemente violenta, entre a fluência orgânica das formas de Ivens e o seu material bruto, os escombros de onde parte sua elaboração plástica.