Arte e Inteligência Artificial

28/mar

Em “Das tripas coração”, individual que a artista visual Katia Wille apresenta na Galeria do Lago, Museu da República, Rio de Janeiro, Catete, RJ, apesenta obras com características originais. A ideia é estabelecer uma simbiose sensorial entre obras de arte e o espectador. Para que isso fosse possível, a artista desenvolveu, em parceria inédita com a Microsoft, um conceito que integra inteligência artificial ao ambiente, que será mostrado pela primeira vez em uma exposição de arte no Brasil. Utilizando a capacidade da inteligência artificial na nuvem, as obras reagem à presença de pessoas, se movimentam a partir da análise de sentimento do visitante e interagem por meio de movimentos diante de estímulos visuais, faciais e sonoros.

 

“Quero expor ao máximo a vulnerabilidade das relações humanas, e questiono como seria esticar-se para além do nosso ponto de ruptura? Fazer das tripas coração representa a eterna busca pelo impossível, alcançar o outro e estabelecer relações de ressonância. As membranas em látex são estruturas que reluzem, se movimentam, provocam sensações e se espalham pelo espaço como se quisessem respirar o ar que respiramos e pulsar com a frequência do nosso coração, indo além do diálogo entre obra e espectador. O objetivo final é começar a criar um espelho de nós mesmos nas obras: o corpo seria representado pelos braços robóticos e sensores responsáveis pelos movimentos, a mente pela inteligência artificial que aprende com os nossos sentimentos e dá os comandos para que os movimentos aconteçam e a alma é representada pela arte das membranas de eco látex pintadas como uma pele frágil e reluzente. Está estabelecida assim uma relação de confiança e imersão entre o artista, obra e público”, afirma Katia Wille.

 

A curadoria é de Isabel Sanson Portella, coordenadora e curadora da Galeria do Lago: “As obras de Katia Wille se espalham pelo espaço, suas figuras brilham com paixão e fúria. Os corpos incham em cor, elas balançam e torcem, pernas se estendem em uma dança que quer aproveitar e amplificar a vulnerabilidade das relações humanas, não suavizar”.

 

“A IA já não é algo distante do dia a dia das pessoas e a possibilidade de integração da inteligência artificial ao ambiente artístico, modificando a forma como interagimos com uma obra e a experiência que temos em uma exposição, mostra justamente isso. A Microsoft assumiu o compromisso de democratizar a IA e esse é um projeto que dialoga com esse propósito”, diz Maisa Penha, diretora de tecnologia para parceiros e IA na América Latina.

 

A ocupação do espaço expositivo se dá de forma fluida, com pinturas em painéis de grandes dimensões em tecido metalizado, dialogando com instalações em eco látex (material desenvolvido pela própria artista a partir da mistura de látex líquido, reciclado com tecidos e outros materiais). As obras em eco látex ficam suspensas pelo teto ou onduladas nas paredes. Trata-se de um material poroso, ora em forma de bolhas, ora esticado ou ondulado, o que permite destacar texturas e o brilho acobreado da superfície. As cores dos tecidos de base para as pinturas, em tons primários como o azul, vermelho e amarelo, contrastam com os tons metálicos das instalações.

 

As obras foram divididas em três momentos que se interconectam: encantamento, simbiose e irradiação. Marcado por tons de azul, o primeiro momento tem a intenção de mostrar uma mudança; a ordem das coisas foi invertida, os pés estão para o alto, algumas nadadoras e nadadores – figuras retratadas pela artista -, caindo, fazendo referência ao momento do Encantamento, ao “cair de amores”, à busca e ao encontro. A cor vermelha e seus sobretons pontuam o segundo momento: o desdobramento e a formação de amálgamas humanos, seres simbióticos, quando existe a busca pelo outro. Já o terceiro momento assinala o encontro do equilíbrio com a cor amarela, selando a formação do duplo perfeito onde não é necessário mais esforço, muito menos caber no outro, cada um com a sua identidade, irradiando- se mutuamente.

 

 

Sobre a artista

 

Katia Wille nasceu no Rio de Janeiro. É formada em artes visuais pela Universidade de Amsterdam, Holanda, e passou os últimos dez anos morando e trabalhando entre a Europa, a Ásia e o Brasil. As questões do feminino, da busca de sua essência e transformações, sempre povoaram as obras da artista, que pensa movimento e cor integrados ao todo. A delicadeza das formas, a ação que se desenvolve tanto em círculos e entrelaces, convida o espectador a mergulhar em águas míticas e se deixar levar pelos encantos do olhar de suas ninfas, pelo poder das deusas, pela força da mulher. Exposições individuais: “Mas Afinal: Quem tem medo de tamanha liberdade?” – Galeria VillaNova/SP; “Fluxofloração” – Centro Cultural da Justiça Federal/RJ; “Maria dos olhos de piscina” – H.Contemporaneo/RJ; “O Tudo Do Todo” – Z42 Arte Contemporanea/RJ ; “E daí? Eu adoro voar” – Tramas Arte Contemporânea/RJ; “CompulsArt” – Casa Ipanema/RJ; “As Nadadoras – Livre Galeria/RJ. Exposições coletivas:  “Um dia de sol” – Galeria Sal/RJ; “Arte brasileira na contemporaneidade” – InnGaleria/SP; “Para Todos” – Galeria Carpintaria/Fortes D’Aloia & Gabriel/RJ”; “Olhar Feminino” – Galeria André/SP; “Somos todos Clarisse” – Museu da República/Galeria do Lago/RJ; “A Máquina do Mundo – residência artística” – Z42/RJ; “Weel Chair Fest/ Rio Olympic Games” –  Boulevard Olímpico/RJ.  Publicações: “Arte brasileira na contemporaneidade” – Volume: III, Ornitorrinco – São Paulo, Brasil. Agosto 2018 Autora: Carmen Pousada; Prêmios e programas de residência artística: “European Union Visual Arts and Design Awards” – Tokyo (Japão), Março 2010; Z42 – Rio de Janeiro, Brasil.

 

Até 31 de maio.

Visões de Iberê Camargo 

Para celebrar os 247 anos da cidade de Porto Alegre, a Fundação Iberê inaugurou a exposição “Visões da Redenção”. A mostra traz um recorte de 77 obras de Iberê Camargo (66 desenhos, três gravuras e oito pinturas), produzidas no início dos anos 1980 – quando o artista retornou à Capital gaúcha, após um período de 40 anos vivendo no Rio de Janeiro. Frequentador assíduo do Parque da Redenção, o artista gostava de observar o ir e vir das pessoas: anônimos, músicos, palhaços, ciclistas, moradores de rua e performers. De simples registros desses passeios, logo as anotações do artista ganharam um significado maior. Os “personagens” da Redenção foram convidados para aturem como modelos vivos em seu ateliê, e, muitos deles, desdobraram-se nas séries “Fantasmagoria”, “Ciclistas” e “Ecológica” (Agrotóxicos).

 

 

Teatro de rua 

 

Em 1985, Iberê Camargo assistiu a performance “A dúzia suja”, do grupo Ói Nóis Aqui Traveiz, se encantou com a apresentação e, durante um final de semana, transformou a Terreira da Tribo – como é chamado o espaço do grupo – em ateliê. Lá desenhou os atores vestidos com o figurino do espetáculo para a série “Ecológica”. A única exposição individual com o conjunto completo da série (mais de 20 guaches) foi realizada em 1986. Parte dela foi exposta em outras capitais do Brasil e Uruguai e, hoje, encontra-se em coleções particulares.

 

Para este trabalho, o artista expressou as formas da natureza e da condição humana, atingidas pela vida, por meio de árvores fantasmagóricas e de figuras que habitavam a cena, sem rumo. O parque mais tradicional da cidade – e palco para as mais diversas manifestações sociais, culturais e políticas – revelou-se como um portal, um deslocamento da realidade para outra ordem no tempo. Delírio e devaneio – um novo estar no mundo.

 

“Não há um ideal de beleza, mas o ideal de uma verdade pungente e sofrida, que é minha vida, e tua vida, é nossa vida nesse caminhar no mundo. Pinto porque a vida dói.” (Iberê Camargo).

 

“Acompanhei inúmeras jornadas de Iberê pela procura dessas imagens que nos ferem com delicadeza, cheias de visualidade e significados. Esses rascunhos, por si só, são maravilhosos, mas serviam para recriações na volta ao estúdio. Surgiam daí guaches sobre papel, elementos novos nas pinturas e potentes gravuras em metal. Foi num dia desses, quando o artista ainda morava na rua Lopo Gonçalves, que saímos a pé para mais um percurso no Parque da Redenção. Chegamos na fonte entre árvores, naquele momento riscada pela luz do sol: um cenário de filme. À volta dela vários mendigos conversavam e lavavam as suas roupas. O artista pareceu iluminado. Apenas com os olhos e a mão em movimento, executou desenhos lindos e fluidos como música. Depois num gesto de gratidão pagou os modelos: entregou uma nota de dinheiro a cada um deles e fomos embora. Nesse dia uma figura me provocou a atenção: o homem flagrado de frente, curvado sobre o espelho d’água da fonte, com o olhar fixo no artista e suas costas acima da própria cabeça, passava uma sensação simultânea de dignidade e sofrimento, como se estava pronto para carregar o peso do mundo”, conta o artista plástico Gelson Radaelli.

 

 

 

Até 21 de abril.

 

 

 

Pesquisas de Miro PS

19/mar

O artista Miro PS inaugura “Metamorfose”, no Espaço Cultural Correios, Niterói, RJ. Em quatro grandes salas, a mostra reúne cerca de 50 obras do artista visual, que vão de instalações a pinturas. O nome da exposição refere-se à profunda transformação no modo de vida do homem frente aos avanços tecnológicos, e como essas mudanças interferem em seus hábitos e comportamentos. A mostra fica em cartaz de 23 de março a 25 de maio de 2019, com curadoria de Lia do Rio.

 

Em suas obras, Miro PS utiliza códigos binários, placas e componentes eletrônicos, que o acompanharam em sua experiência profissional na área de tecnologia da informação. Partindo de intrincados sistemas de criptografia ou obsoletos cartões perfurados, passando por deep web e inteligência artificial, Miro PS aborda temas como identidade, linguagem, fragilidade, obsolescência…Numa área de 320 m2, a mostra é composta de duas instalações, objetos, fotografias, gravuras digitais, pinturas, além de vídeo arte e colagens.

 

“Miro reflete sobre a condição humana no mundo tecnológico, no qual a linguagem das máquinas conduz e controla silenciosamente as regras, numa velocidade vertiginosa e incontrolável. Seus trabalhos falam dos prazeres, angústias e idiossincrasias do indivíduo contemporâneo ao coabitar dois mundos, o virtual e o físico”, explica Lia do Rio. Todas as obras possuem identificação em braile e a exposição contará com visitas guiadas para cegos.

 

Sobre o artista e a curadora

 

Miro PS: Nasceu em São Paulo, vive e trabalha no Rio de Janeiro. Bacharel em Sistemas e informações, com MBA em Gestão de Projetos pelo PMI (USA). Aos 20 anos começou a trabalhar na área de tecnologia da informação, que no futuro lhe daria base para as artes plásticas. Desde 2010, desenvolve trabalhos de arte contemporânea, nos quais apresenta a necessidade e dependência da sociedade na tecnologia. Participou de exposições coletivas e individuais no Brasil e no exterior. Em 2015, criou com outros dois artistas um grupo de arte pública.

 

Lia do Rio: Nasceu em São Paulo, vive e trabalha no Rio de Janeiro. É Bacharel pela Escola Nacional de Belas Artes da UFRJ; tem Pós-Graduação em Arte e Filosofia, e Pós-Graduação em Filosofia Antiga, PUC-RIO. Participou de exposições individuais, coletivas, palestras e trabalhos em acervos, no Brasil e exterior. Coordena exposições, workshops e palestras. É professora de arte. Seu livro “Lia do Rio: Sobre a Natureza do Tempo” foi editado, em 2015, pela editora Fase 10, e lançado na Livraria Argumento no RJ e SP.

Coletiva na Simone Cadinelli

18/mar

A Simone Cadinelli Arte Contemporânea reúne em exibição coletiva artistas mulheres de diferentes gerações, estilos e trajetórias.  “Passeata”, que inaugura no dia 18 de março, na galeria Simone Cadinelli Arte Contemporânea, Ipanema, Rio de Janeiro, RJ, é uma exposição que convida o público a vivenciar as plataformas poéticas de 15 artistas mulheres do panorama da arte contemporânea brasileira. Desde a consagrada Anna Bella Geiger a novos nomes como Ana Hortides e Marcela Cantuária, a curadora Isabel Sanson Portella propõe um passeio por várias gerações, estilos e gênero, como é o caso da artista “gender fluid” (não-binária) Lyz Parayzo.

 

“São diferentes vozes e mídias de expressão, mas o que predomina é o pulsar da liberdade conquistada, do direito de levantar bandeiras e mostrar a que vieram. Longe está o tempo em que o espaço artístico, cultural e social era ocupado exclusivamente por artistas homens. Preconceitos de gênero e ausência de reconhecimento mantiveram as mulheres fora do cenário artístico por séculos. Mas a trajetória das conquistas femininas no decorrer dos últimos 100 anos foi marcada por lutas e crescentes vitórias. Não é o fator gênero que define os atributos artístico-estéticos das obras, mas sim o potencial criativo de quem as executa”, afirma Isabel Sanson Portella.

 

Amanda Baroni, Fernanda Sattamini, Helena Trindade, Laura Gorski, Leandra Espírito Santo, Livia Flores, Patrizia D’Angello, Renata Cruz, Roberta Carvalho, Sani Guerra e Ursula Tautz completam a coletiva que fica em cartaz até o dia 29 de maio. No dia da abertura, a artista visual Roberta Carvalho fará uma exibição de vídeo mapping, com imagens de ribeirinhos da floresta amazônica, pesquisadas desde 2007 pela artista, no jardim da vila que faz parte do imóvel que abriga a galeria, que no mês de março inaugura um novo espaço dedicado a palestras e encontros com colecionadores, críticos, artistas, arquitetos e pesquisadores. A programação é bastante diversificada e ainda abrange visitas guiadas.

 

“Nosso objetivo, com essa coletiva, é lançar o olhar sobre a produção das mulheres na arte contemporânea. A proposta aqui é conduzir o visitante em um passeio por diferentes suportes, experiências profissionais e fases variadas de criação, evidenciando as potencialidades de cada artista selecionada”, analisa Simone Cadinelli.

 

 

Descrições das obras e algumas curiosidades

 

Amanda Baroni – Série “Elementos da Natureza” -Fotografia.Moradora da Maré, a jovem fotógrafa Amanda Baroni, desenvolveu a série fotográfica “Elementos da Minha Natureza” buscando inter-relacionar arte, danças urbanas e natureza com o espaço de favelas cariocas (Complexo da Maré, Mangueirinha e Morro da Providência). Este projeto conecta os quatro elementos, fogo, terra, água e ar, com os dançarinos Felipe e Thamires Cândida, do Passinho, Luana Luara, do Hip Hop Dance, Agatha Alves, do Dance Hall e Hugo Oliveira, do House Dance, todos oriundos da periferia.

 

Anna Bella Geiger – “Orbis Discriptio n.33”, 1999. Gaveta de arquivo de ferro, encáustica, folha de flandres, fios de cobre, metais e gesso. A partir da década de 1990, a premiada Anna Bella Geiger emprega novos materiais e produz formas cartográficas vazadas em metal, dentro de caixas de ferro ou gavetas, preenchidas por encáustica. Suas obras situam-se no limite entre pintura, objeto e gravura.

 

Ana Hortides – “Cor de pele”, 2017. 78 bebês compostos da combinação de 12 gizes de cera de cores de pele. Ed. 3/5. Ana Hortides descobriu a existência de uma caixa de giz de cera de cores de pele produzida por uma ONG brasileira, a UneAfro, que propõe 12 cores. A partir disso, a artista derreteu os lápis, sempre combinando uns com os outros e colocou-os em moldes de bebês. A partir das misturas foram criados 78 bebês com cores e tons de pele diversos.

 

Fernanda Sattamini – Sem título, 2018. Série “Das marés e correntezas”. Cianotipia em linho e bordado. Edição única. Sem título, 2018. Série “Das marés e correntezas”. Cianotipia em linho e bordado. Edição única. Na série “Das marés e correntezas”, Fernanda Sattamini usa a técnica de cianotipia em linho desfiado, um processo artesanal de impressão fotográfica em tons azuis, que produz uma imagem em ciano. Foi descoberto em 1842 e utilizado até o século XX, é também conhecido como blueprints. O processo utiliza dois produtos químicos: Citrato de amônio e ferro (III) e Ferricianeto de potássio, que ao serem misturados se torna fotossensível e reage à luz ultravioleta. A exposição à luz provoca mudanças na cor do composto final resultando no azul da Prússia.

 

Helena Trindade – “VÍRUS (de chão)”. Escultura de teclas de máquinas de escrever e suas hastes. “Vírus” são estruturas orgânicas articuladas que se assemelham a uma espinha dorsal em movimento, criadas a partir de teclas de máquinas de escrever pelas mãos de Helena Trindade. Como a própria artista afirma privilegiar a materialidade da letra em detrimento do sentido, fazendo um jogo poético. Seu trabalho aborda diferentes aspectos do funcionamento da linguagem no tocante à sua perpétua rearticulação.

 

Laura Gorski e Renata Cruz – Sem título, da série “Dias úteis”, 2016. Fotografia. A dupla de artistas Laura Gorski e Renata Cruz apresenta um trabalho que aborda as relações entre o tempo interno e o pessoal de cada pessoa em relação ao tempo organizado pelo calendário oficial de dias considerados úteis ou não. O calendário de 21 dias úteis apresenta, por um lado, objetos ambíguos que são utilizados em momentos em que as pessoas escolhem o que fazer com o tempo ocioso. Ao lado dos objetos estão espaços internos de uma casa, submersos em um líquido escuro que também está presente na banheira em que estão as artistas. Nela, Laura e Renata compartilham um tempo poético que conseguem habitar juntas.

 

Lenadra Espírito Santo – Série “Registro”. Placas de gesso. A instalação “Registro” aborda o tema da auto-representação: é feita a partir de um mesmo molde do rosto da artista Leandra Espírito Santo, com um semi-sorriso. A partir deste molde, ela retira algumas réplicas do próprio rosto em gesso e faz placas com o mesmo material, que são reproduzidas de modo a preencher a parede da galeria, criando uma relação com a arquitetura, tanto por conta do material usado nelas (o gesso), quanto pela maneira como ocupa o espaço. Na exposição, são cerca de 30 placas.

 

Lívia Flores – “Trabalho de greve”, 2012. Escultura em tecido e gesso. Dimensões variáveis. Nessa série, a artista Lívia Flores retoma o interesse pela pesquisa de materiais e processos, desdobrando-os em sua relação com o tempo, com a história e com o trabalho coletivo ao utilizar um material (cobertor cinza/feltro) que acumula muitos usos e sentidos, tanto na vida quanto na arte. A artista acredita que este material é portador de história e condensa de forma espectral uma história de todos e de ninguém, anônima e comum, constituída pelos muitos fios das infinitas peças de roupa que algum dia já tocaram nossos corpos. Os cobertores em cinza são matéria escultórica em tensão com elementos construtivos moldados em gesso. Oscilando entre vontade construtiva, entropia e ruína, essas peças erigem-se como “contramonumentos”, cujo gesto se completa no momento de sua instalação no espaço de exibição.

 

Lyz Parayzo – Série “Slut Terrorist”. Vídeo. Flyers de prostituição (site specific) com números telefônicos e endereços de instituições de arte. “Gargantilha Lança”, 2018. Alumínio. “Top Dentado”, 2018. Alumínio. “Braceletes lança, 2018 Alumínio.  Uma das poucas artistas não-binárias presentes em coleções de museus brasileiros – está no Museu de Arte Contemporânea de Niterói (MAC) e no Museu de Arte do Rio (MAR) -, Lyz Parayzo tem o corpo como principal suporte de trabalho. Em “Passeata”, a artista expõe um vídeo da performance “Slut Terrorist #5”, além dos objetos escultóricos denominados “joias bélicas”.

 

Marcela Cantuária – “Gigantes Pela Própria Natureza”, 2018. Óleo, acrílica e spray s/ tela. “Maria Bonita”, 2018. Óleo e acrílica s/ tela. Marcela Cantuária se interessa por reimaginar episódios de importância histórica através da perspectiva das mulheres, onde elas estavam nos conflitos por terras, nas guerrilhas, disputas por ideologia, no campo da estratégia, como se estivesse construindo outra versão. Assim, ela acredita que está encorajando as mulheres através de figuras femininas que em algum momento tiveram importância. Isso se reflete também nas cores vivas de seu trabalho.

 

Patrizia D´Angello – “Dramalhão”. Através do bom humor, as obras de Patrizia D’Angello inserem a questão do feminino no mundo contemporâneo, explorando a estética kitsch do exagero, do colorido exuberante, dos temas que confrontam diretamente outras formas de dominação. A mulher guerreira é também aquela que enfrenta forno e fogão, que levanta bandeiras assim como vassouras e aspiradores de pó, mas que não esquece a sua natureza e seus desejos.

 

Roberta Carvalho – Sua instalação é composta por uma imagem fotográfica e por um outro elemento, que é uma garrafa (com imagem projetada). A fotografia proposta é da série “submersos”. Seguindo a linha do trabalho desenvolvido por Roberta Carvalho, a fotografia trará o rosto de uma mulher ribeirinha projetada nas margens do rio. Seu rosto estará metade dentro d’água, metade na floresta. A garrafa, que pende ao lado da imagem, será preenchida de água: barrenta amazônica, água que pela sua opacidade funciona como tela. Nesta garrafa preenchida de água uma projeção mapeada dialoga com a imagem fotográfica.

 

Sani Guerra – “Três Picos”, 2016. Óleo e folha de ouro sobre tela. “Floresta dos cervos”, 2018. Óleo sobre tela. Em março de 2018, Sani Guerra começou uma residência artística de sete meses no Rio de Janeiro, explorando espaços que abrigam parte da Mata Atlântica, tais como a Escola de Artes Visuais do Parque Lage, a Colônia Juliano Moreira (onde funciona o Museu de Arte Contemporânea Arthur Bispo do Rosário) e o Campus da Fiocruz Mata Atlântica, entre outros espaços públicos que se relacionam com a mata. Partindo dessa pesquisa, seu material histórico e o seu entorno, a artista deu início a uma série de pinturas e três delas podem ser vistas em Passeata.

 

Ursula Tautz – Sem título, 2019. Móvel em madeira, rádica, lentes redoma de vido, prumo dourado, bola de vidro. Sem título, 2019. Móvel em madeira, rádica, redoma de vidro, funil de vidro, balão de vidro, arame dourado, prumos dourados, lente. Temas recorrentes no trabalho de Ursula Tautz, antropologia, história e memória se desdobram aqui em um novo estudo que ela apresenta em criações permeadas pelo tempo e materializadas na madeira que é a base para os dois móveis em exposição. A partir do objeto-balanço desenvolveram-se duas pesquisas: do movimento pendular e do material, a madeira. A madeira remete à casa, acolhe, aconchega e protege. A rádica é um corte da raiz da árvore, já tem em si uma cartografia intrínseca. São mapas de enraizamento, de pertencimento, são também camadas de tempo, história. Os móveis-objetos oferecem o lugar almejado, imaginado, ouvido nas histórias. Indicado com um prumo, protegido na redoma, bolas de neve.

 

 

Sobre as artistas

 

Amanda Baroni teve seu primeiro contato com fotografia através do Hip Hop, do qual é participante desde 2007. Em 2012, formou-se pela Escola Popular de Fotógrafos, do Observatório de Favelas, Complexo da Maré, Rio de Janeiro. Após a formação, começou fotografando o movimento Hip Hop e se dedicou a realizar trabalhos artísticos e comerciais. Atualmente, segue documentando o Hip Hop, produzindo ensaios fotográficos e coberturas de espetáculos de dança, além de desenvolver seus projetos autorais como o “Ensaio Draw”, “Baixa Velocidade – Altas Luzes”, “B.Woman,  B.Girl”,   “ Minha imagem e semelhança” e “‘Elementos da minha natureza”. Expôs seu trabalho “B.Woman, B.Girl”, sobre as mulheres no Hip Hop, no Largo das Artes, Rio de Janeiro, e no evento Batom Battle, em Brasília. Outras atividades no campo das artes e exposições envolvem a formação em Design de Exposição no Parque Lage, em 2014, em impressão Fine Art e montagem de molduras no estúdio Barracāo de Imagens.

 

Anna Bella Geiger (Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 1933). Estudou Letras Anglo-Germânicas na Faculdade Nacional de Filosofia (UFRJ) e Sociologia da Arte com Hanna Levy Deinhardt na New York University e na New School for Social Research (anos 50). Realizou exposições individuais e participou de coletivas no Brasil e no Exterior, como nas Bienais Internacionais de São Paulo, Veneza e de Liverpool. Seus trabalhos integram coleções como a do MoMA (Nova York), do Centre Georges Pompidou (Paris), Tate Modern e Victoria and Albert Museum (Londres), Getty Institute (Los Angeles), The FOGG Collection (Boston) entre outras. Em 2004, Anna Bella recebeu a insígnia da Ordem do Cruzeiro do Sul, do Ministério das Relações Exteriores, e em 2010, recebeu a insígnia da Ordem do Mérito Cultural por representar a tradição, a vanguarda e as diferentes correntes de criação cultural e artística do País.

 

Ana Hortides. Nasceu em 1989 no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha. Artista visual e mestre pelo Programa de Pós-Graduação em Estudos Contemporâneos das Artes da Universidade Federal Fluminense (UFF – RJ) na qual se Graduou em Produção Cultural. Estudou na Escola de Artes Visuais do Parque Lage (EAV). Caracterizado pela delicadeza, o seu trabalho permeia o corpo, a intimidade e a vulnerabilidade das relações.

 

Fernanda Sattamini. Sua produção explora processos experimentais e alternativos, transitando entre fotografia, gravura e objetos. Tomando como ponto de partida imagens apropriadas e suas próprias fotografias, a pesquisa que desenvolve aborda questões acerca da memória, intimidade, afetos e controle.

 

Helena Trindade. Cores vivas e formas geométricas são as principais características do trabalho de Helena Trindade. Formada em arquitetura e urbanismo pela Universidade de Brasília em 2013, Helena optou por continuar os estudos com um Mestrado de Arquitetura em Oxford, lá Helena desenvolveu projetos de instalações espaciais, como o seu projeto final, exposto na St. John’s College ao final do curso, e de esculturas abstratas, feitas com o uso do corte a laser. No ano seguinte à conclusão do curso, em 2016, a arquiteta mudou-se para a Holanda a trabalho, onde entrou em contato com o design gráfico e aprofundou a sua experiência com projetos arquitetônicos e instalações espaciais. Dentre os trabalhos mais importantes desse período estão os projetos dos espaços elaborados para receber as exposições dos Dutch Invertuals na Semana de Design da Holanda em 2016, na Semana de Design de Milão em 2017, e no Festival D’Days em Paris, no mesmo ano. De volta ao Brasil, Helena se divide entre a arquitetura e o design. Além dos projetos arquitetônicos, ela dedica o seu tempo aos objetos confeccionados com o corte a laser, que compõem a sua marca HT.

 

Laura Gorski e Renata Cruz. Laura Gorski é nascida em São Paulo em 1982. Formada em Desenho Industrial pelo Centro Universitário Belas Artes, realizou as exposições individuais “Paragem”, na Zipper Galeria, em 2011; “Arquipélago de lugares imaginários”, no Estúdio Buck, em 2013, e “Dias úteis”, com Renata Cruz, no 20º Cultura Inglesa Festival, em 2016. Participou de residências na Alemanha e em Portugal e tem obras em coleções em Brasília, Bahia, São Paulo e Porto Alegre. Já expôs em Ribeirão Preto, Santo André, Santos, Goiás, Salvador, Campinas, Porto Alegre, Jundiaí, Rio de Janeiro, Brasília, além de Cazaquistão, Portugal, Japão e Alemanha.

 

Renata Cruz, em seu trabalho, explora as relações entre textos literários e imagens, valendo-se muitas vezes do envolvimento de diversas pessoas com suas histórias e lugares onde habitam. Em suas instalações propõe a criação de narrativas abertas no espaço, que se constroem enquanto se caminha. Formada em Comunicação Visual, UNESP, Bauru SP; Educação Artística, UNAERP, Ribeirão Preto, SP, com cursos como aluna estrangera na Facultad de Bellas Artes de la Universidad Complutense de Madrid, Espanha, atualmente participa de grupos de estudos como no Ateliê Fidalga em São Paulo.

 

Leandra Espírito Santo. Mestre e doutoranda em Artes Visuais pela Escola de Comunicações e Artes da USP, São Paulo, SP. Graduada em Comunicação Social pela Universidade Federal Fluminense, Rio de Janeiro, RJ. Seu trabalho artístico transcorre por diversas mídias, como performance, fotografia, vídeo, escultura, intervenção urbana. Por meio de linguagem cômica e irônica, a artista faz reflexões sobre nossos procedimentos cotidianos, dos mais complexos aos mais comuns, investigando a relação entre a arte e as diversas técnicas e tecnologias, relativizando seus usos e pensando na relação que mantemos com elas em nível de corpo e comportamento. Em 2017, iniciou pesquisa focada nas relações entre identidade, corpo e máquina, série de trabalhos em que pensa a auto representação dentro das redes sociais. Em 2016, foi indicada ao Prêmio Pipa MAM-RJ, tendo sido finalista do Pipa Online. Em 2014, recebeu o Prêmio Estímulo no 42º Salão de Arte Contemporânea Luiz Sacilotto e ganhou a Chamada Artes Visuais da Secretaria de Cultura de Niterói. Entre suas principais exposições, prêmios e eventos estão: “Instauração”- Sesc Belenzinho (SP, 2017); “Agora somos mais de mil” – EAV Parque Lage (RJ, 2016); “Quando o tempo aperta” – Palácio das Artes (BH, 2016) e Museu Histórico Nacional (RJ, 2016); “Novíssimos” – Galeria Ibeu (RJ); 37° Salão de Artes de Ribeirão Preto (SP, 2013); 2º Prêmio EDP nas Artes (SP, 2010).

 

Marcela Cantuária. A artista nasceu em 1991, vive e trabalha no Rio de Janeiro. É graduada em pintura pela Escola de Belas Artes da UFRJ. Atualmente, leciona em seu ateliê questões práticas da pintura contemporânea. Considera o viés filosófico materialista histórico-dialético como ponto de partida de sua investigação, observando, assim, o mundo e os fatos. A artista usa desde referências de arquivos digitais que gravita entre passagens históricas, frame de documentários até fotos autorais do cotidiano desigual do Rio de Janeiro. Em seu processo, muitas vezes trabalha a composição a partir do conflito entre as referências e a oposição entre as cores.

 

Lívia Flores (Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 1959). Pintora, escultora, videoartista. Participa do ateliê de xilogravura da Escolinha de Arte do Brasil, com José Altino (1946), entre 1974 e 1976, e estuda também com Maria Luíza Saddi (1952), em 1976. Em 1978, faz o Curso Intensivo de Arte Educação (Ciae), além de iniciar sua graduação na Escola Superior de Desenho Industrial da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Esdi/Uerj), concluída em 1981. Entre 1979 e 1980, frequenta ateliê livre da Armação Oficinas de Arte (artes plásticas), com Marília Rodrigues (1937-2009) e Ana Cristina Pereira de Almeida. Participa de curso teórico sobre arte contemporânea com Anna Bella Geiger (1933) em 1981 e, no ano seguinte, assiste a outro curso teórico, sobre arte brasileira, com Fernando Cocchiarale. Contemplada, em 1984, com uma bolsa de estudo para a Alemanha, estuda na Academia de Artes de Düsseldorf de 1985 e 1990 e vive em Colônia até 1993. Recebe o título de mestre em comunicação e tecnologia da imagem na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), em 1998.

 

Lyz Parayzo.Iniciou seus estudos na Escola de Artes Visuais do Parque Lage e começou a invadir galerias de arte com intervenções estético políticas. Como um vírus subverteu os protocolos de poder dos espaços institucionais borrando as fronteiras do que é oficial. Tem o corpo como principal suporte de trabalho e sua performance diária como plataforma de pesquisa. Suas bombas-plásticas desestabilizam as tecnologias heteronormativas e coloniais, são projeções anabolizadas da sua existência. Vem desenvolvendo videoinstalações com conteúdo pós-pornográfico, joias bélicas e atualmente está pesquisando as performances de gênero e classe a partir da cor em seu “Salão Parayzo”, dispositivo itinerante onde atua como manicure.

 

Patrizia D’Angello. Formada em Artes Cênicas pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro – Unirio, também estudou na Escola de Moda da Universidade Cândido Mendes, no Rio de Janeiro. Participou de cursos na Escola de Artes Visuais do Parque Lage e foi aluna de nomes como Charles Watson, Fernando Cocchiarale, Luiz Ernesto, Franz Manata, Pedro França e Fred Carvalho. Em 2012, foi contemplada com projeto de exposição individual do Ibeu. Indicada ao Prêmio PIPA 2012. Desde 2008 Patrizia D’Angello tem trabalhado o cruzamento da fotografia com os cinco gêneros existentes da pintura: retrato, autorretrato, natureza-morta, paisagem e nu. Porém, em algumas obras é possível encontrar a interseção destes gêneros, com as quais a artista nos revela que esta formalidade pode ser subvertida. A sua preferência pela pintura a óleo, pastel seco e aquarela se dá pela possibilidade de manuseio e alterações durante o período em que está elaborando imagens com irônico realismo, a partir de referências de seus registros fotográficos ou apropriados de terceiros. Cenas corriqueiras adquirem uma determinada sofisticação com o olhar protagonista da artista, que aponta para os detalhes banais de algum canto de sua residência ou até mesmo as sobras de um prato de comida em uma churrascaria.

 

Roberta Carvalho é artista visual nascida em Belém do Pará. Estudou artes visuais na Universidade Federal do Pará (UFPA). Desenvolve trabalhos na área de imagem, intervenção urbana e videoarte. Já participou de várias exposições, coletivas e individuais, no Brasil, França, Espanha e Martinica. Foi vencedora de diversos prêmios, entre eles, o Prêmio FUNARTE Mulheres nas Artes Visuais (2014), Prêmio Diário Contemporâneo (2011) e Prêmio FUNARTE Microprojetos da Amazônia Legal (2010). Foi bolsista de pesquisa e criação artística do Instituto de Artes do Pará, por duas vezes, em 2006 e 2015. Suas obras integram acervos como o do Museu de Arte Contemporânea Casa das 11 Janelas (PA) e Museu da Universidade Federal do Pará. Dentre as exposições coletivas e festivais de arte que já participou, em destaque estão: Periscópio – zipper Galeria (São Paulo, 2016), 7ª Mostra SP de Fotografia (São Paulo, 2016), Visualismo – Arte, Tecnologia, Cidade (Rio de Janeiro, 2015), SP ARTE/FOTO (2014), Grande Área Funarte (São Paulo 2014), Pigments (Martinica, 2013), Festival Paraty em Foco (Paraty, 2012), Tierra Prometida (Barcelona, 2012), e Vivo Art.Mov (Belém, 2011).

 

Sani Guerra transita pela fotografia, escultura, instalação e pintura. As atmosferas irreais criadas pela artista revelam as estranhezas criadas por gestos não coincidentes, ângulos improváveis e estampas exageradas. Sani provoca atrito na relação entre tempo e espaço. Retrata figuras fragmentadas, organizadas a partir do universo particular da artista. Venceu o Prêmio Interações Estéticas da Funarte em 2009 e o concurso Garimpo da Revista Dasartes em 2013. Em 2008, a artista iniciou o Projeto Construção, criando peças escultóricas tendo como molde monumentos históricos e arquitetônicos. As intervenções foram exibidas no MAM, no Parque Lage e outros espaços, no Rio.

 

Ursula Tautz nasceu no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha. Utiliza diversos suportes em seu trabalho como fotografia, vídeo, objetos e instalações. Cursou a ESPM, além de ter frequentado oficinas da “School of Visual Arts /NY”, e a partir de 2005 a Escola de Artes Visuais do Parque Lage. Em 2013 integrou o Programa Projeto de Pesquisa, coordenado por Glória Ferreira e Luiz Ernesto. Participou de várias exposições coletivas, como “Intervenções Urbanas Bradesco ArtRio 2015” e e “Aquilo que nos une” no Centro Cultural da Caixa Federal com curadoria de Isabel Portella. Além das individuais “Frestas por onde Muros escoam” reinaugurando o Jardim da Reitoria da Universidade Federal Fluminense/RJ; “Lugar familiar” no projeto Zip’Up na Zipper Galeria/SP e “Fluidostática” na Galeria do Lago (Museu da República/RJ). Foi também selecionada pelo crítico Fernando Cocchiarale para o “Programa Olheiro da Arte” e finalista do Prêmio Mercosul das Artes Visuais Fundação Nacional de Arte – FUNARTE, com seleção de Luiza Interlenghi, Jorge Luiz Miguel e Izabel Machado da Costa.

Obras de Paul Klee no Brasil

20/fev

O Centro Cultural Banco do Brasil, CCBB, Centro, São Paulo, deu início a temporada brasileira da exposição “Paul Klee – Equilíbrio Instável”, artista cuja obra possui ligações com diversos movimentos artísticos do século passado, como o Cubismo, o Expressionismo, o Construtivismo e o Surrealismo. Esta é a primeira vez da exibição retrospectiva de sua obra na América Latina, totalizando mais de 100 peças. Ao todo, são 16 pinturas, 39 papéis, cinco gravuras, cinco fantoches – que criou, por uma década, para seu filho Felix, com carretéis de linha, tomadas e ossos de boi fervidos -, 58 desenhos e objetos pessoais do artista, todos selecionados pela curadora Fabienne Eggelhöfer, do Zentrum Paul Klee, de Berna, na Suíça. Sediada na cidade onde Klee nasceu, viveu a infância e parte significativa da vida adulta, o museu mantém atualmente sob sua guarda mais de 4 mil obras produzidas pelo artista.

 

Saliente-se em sua biografia que além de Picasso, Paul Klee cruzou, durante sua vida, com outras personalidades de renome, como Kandinsky. Klee e Kandinsky tornaram-se colegas na Bauhaus, a escola fechada pelo governo nazista – o mesmo regime autoritário que classificou como “degenerado” o trabalho do pintor suíço. Dado a explorar os recônditos da mente e das emoções, Klee buscou sempre franquear a liberdade de suas expressões – seja ao não desistir das artes plásticas, ao prosseguir em seu processo formativo mesmo tendo sua inscrição na academia rejeitada na Alemanha, seja ao questionar tendências da arte pictórica, acolhendo o que qualificasse pertinente para o que entendia como equilíbrio.

 

“Ele é um artista super importante, que deu origem a vários movimentos, mas que nunca recebeu um rótulo, uma sigla com a qual tenha se identificado. É uma espécie de pai de todos, um artista fundamental para a arte moderna no mundo”, diz Roberta, destacando a natureza independente de Klee. “É a primeira vez que ele, tão fundamental, chega aqui de fato com uma retrospectiva. Quem visitar (a exposição) vai saber quem ele é, qual o seu percurso.”

 

Viabilizada pela Lei Rouanet, a exposição terá nas três unidades do CCBB – São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte.

 

Exposição “Paul Klee – Equilíbrio Instável”

CCBB São Paulo: até 29 de abril

CCBB Rio de Janeiro: de 15 de maio a 12 de agosto

CCBB Belo Horizonte: de 28 de agosto a 18 de novembro

“Cobra Criada”, mostra na Athena

19/fev

A Galeria Athena, Botafogo, Rio de Janeiro, RJ, inaugurou a exposição “Cobra Criada”, com cerca de 20 obras inéditas de Frederico Filippi, que ocupam todo o espaço expositivo da galeria. Os trabalhos tratam da questão do desmatamento e dos conflitos gerados pelo embate entre o poder econômico e os modos de vida não hegemônicos, em desenhos e uma instalação que enfatizam os materiais utilizados – metal e madeira – e os atritos geradores de fluxos invisíveis, como uma metáfora política. “De alguma forma esse confronto entre materiais enseja choques comuns nas paisagens amazônicas”, afirma o antropólogo, jornalista e curador Fábio Zuker no texto que acompanha a mostra.

 

As obras da exposição são um desdobramento da pesquisa que o artista vem desenvolvendo há alguns anos com temáticas relativas às fricções presentes nas relações invisíveis dos processos civilizatórios. A pesquisa, que antes era focada na América, atualmente tem se concentrado na Amazônia. Os trabalhos surgem a partir da reflexão sobre a constante disputa de território causada pelo desmatamento desenfreado das reservas ambientais, pela industrialização, pela exploração mineral e pelas rotas de contrabando de drogas.

 

“Frederico rejeita o problemático lugar de ‘falar sobre’, para experimentar pensar esses processos de destruição a partir dos próprios materiais; como se as próprias palavras não bastassem, fossem insuficientes, ou mesmo desprovidas de significado”, diz Fábio Zuker.

 

 

Trabalhos em exposição

 

No grande salão da galeria, que tem 140m² e pé direito de 6,5m, estarão trabalhos feitos em metal. Dez grandes chapas de aço da série “Se uma lâmina corta um olho uma selva azul escorre dele” estarão neste espaço, apoiadas na parede. As chapas são pintadas com spray preto e arranhadas com metais, formando desenhos abstratos a partir do atrito dos materiais. “Esses trabalhos têm um caráter abrasivo, de atrito, como uma metáfora da situação atual de conflito”, afirma o artista, que diz, ainda, que a abstração é proposital para enfatizar os materiais.

 

“A escolha dos materiais não é fortuita. Embora ambos sirvam de suporte ao desenho, território em que Frederico se sente à vontade e se identifica, os materiais estão em patente confronto, e tudo se passa como se os trabalhos fossem resultados desses embates. No caso das lâminas pretas, a agressividade do material libera seus próprios fluxos de imagens, quer como desenhos, aleatórios (próprios ao corte e manejo das chapas), quer pela mão do artista”, ressalta Fábio Zuker.

 

Nas paredes desta mesma sala estará a obra “Cobra Criada”, que dá nome à exposição e é feita com correntes de motosserra dispostas como se fossem palavras. Ao olhar de longe, a sensação é de haver uma frase escrita, mas de perto descobre-se que são objetos cortantes. “Trato do discurso das autoridades em relação à questão do desmatamento e dos projetos de infraestrutura que desestabilizam a ordem anterior. Se a motosserra corta, o trator perfura, o discurso vazio dispara esse processo escondido em relações públicas. Os textos são como uma dissolução da gramática e falam sobre uma linguagem não decifrada”, ressalta o artista.

 

“Ao se aproximar daquilo que de longe aparenta ser um conjunto de frases articuladas na parede da primeira sala da exposição, Cobra Criada, o espectador se depara com diferentes níveis alinhados de correntes de motosserra. Diante dessa ferramenta de destruição e construção (destruição de mundos, e construção de outros sobre as ruínas do que antes existia), os discursos articulados e a palavra escrita, se tornam vazios”, diz Fábio Zuker.

 

Na sala menor da galeria estarão os trabalhos em folhas de madeira, feitos com carvão e tinta asfáltica. Diversas lascas de madeira recebem desenhos pretos. “Nesses trabalhos utilizo materiais primários. O carvão é a transformação da madeira e a tinta asfáltica é o subsolo, de onde vem o metal”, conta o artista. “É como se cada fragmento de folhas de madeiras nativas fossem um fragmento de lembrança, uma testemunha viva. Ou, como diz o ditado, ‘a floresta tem mais olhos que folhas’”, ressalta.

 

 

Sobre o artista

 

Frederico Filippi nasceu em São Carlos, SP, 1983. Vive e trabalha em São Paulo). Dentre suas principais exposições individuais destacam-se: “O sol, o jacaré albino e outras mutações” (2016), na Athena Contemporânea, “Fogo na Babilônia”(2015), “Pivô”, em São Paulo e “Próprio Impróprio,” (2016), na Galeria Leme. Dentre as exposições coletivas mais recentes estão: “Com o ar pesado demais para respirar” (2018), na Galeria Athena; “Caixa Preta” (2018), na Fundação Iberê Camargo, em Porto Alegre; “in Memoriam” (2017), na Caixa Cultural Rio de Janeiro; “Cities and Memory – Biennial for photography and film” (2016), na Dinamarca; “Aparição” (2015), na Caixa Cultural Rio de Janeiro, entre outras. Realizou diversas residências na Costa Rica, Bolívia, e da 5a edição da Bolsa Pampulha (2013/2014), no Museu de Arte da Pampulha, em Belo Horizonte; La Ene (2013/2014), em Buenos Aires, Argentina; Ateliê Aberto #6 (2011/2012), na Casa Tomada, em São Paulo.

 

 

Até 06 de abril.

Alex Flemming, exposição inédita 

13/fev

A partir do dia 14 de fevereiro, a Emmathomas Galeria, Jardim Paulista, São Paulo, SP, recebe “Alex Flemming – Ecce Homo”, individual inédita do artista paulistano radicado em Berlim. Nesta exposição, Alex Flemming apresenta seus trabalhos mais recentes, frutos da série que também dá nome à exposição. O artista brasileiro, radicado em Berlim, reflete sobre cenário político do País, fazendo uso de metáfora bíblica.

 

Com curadoria de Ricardo Resende, a mostra reúne 27 trabalhos que tomam como suporte pias de banheiro fabricadas nos anos 1970 e 1980. Sobre elas, Alex Flemming desenha com o auxílio de um esmeril – ponta de diamante capaz de marcar a superfície da louça. Preciso, os traços gravados na cerâmica rasgam a camada de tinta que cobre as pias, trazendo à tona uma materialidade em traços brancos sob as cores vívidas e esmaltadas das louças. No ato, ganham forma mãos de amigos e pessoas próximas do artista, que, antes de registrá-las, primeiro as fotografou.

 

“Flemming grava o gesto do cotidiano em que se lava as mãos da imundice que carregamos e faz referência ao cenário político brasileiro, assolado pela corrupção e malfeitos da sociedade mancomunada com os políticos”, afirma o curador, para quem, simbolicamente, o artista trata daquela sujeira oculta encontrada na alma humana: a da hipocrisia, da falsa moral e da falsa religiosidade. “O trabalho, de certo modo, desmascara esse antagonismo moral entre o bem e o mal da vida social, feita hoje de perversão, de decadência, de fraquezas, de mentiras, do escárnio, da negação e da imoralidade. No gesto poético de lavar as mãos, busca-se encontrar a pureza: a limpeza não só das mãos, mas também da moral e da sanidade mental”, completa Resende.

 

No espaço expositivo, as obras são mostradas de forma não convencional: os lavatórios ganham pedestais, tais como os altares domésticos típicos do Barroco brasileiro. O tom sacro, inclusive, surge daquela que foi a inspiração da exposição: a passagem bíblica que antecede a crucificação de Jesus Cristo.

 

“Ecce Homo” (Eis o homem, em latim) teria dito Pôncio Pilatos, em um momento crucial para a humanidade: a entrega do homem de Nazareth ao povo judeu, ordenando à multidão que escolhesse o destino do filho de Deus, lavando então suas mãos para o destino que Ele teria e eximindo-se da responsabilidade por sua posterior crucificação.

 

“Esta série propõe uma reflexão plástica do fato de lavarmos nossas mãos em questões nacionais importantes, deixando-as para serem decididas por políticos e outros poderosos, invertendo assim a relação bíblica”, comenta Alex Flemming, para quem os conflitos e as questões sociais são caras e, muitas vezes, estopim para suas criações artísticas. Idealizada em 2018, ainda em Berlim, a série foi realizada ao longo de um mês, em um ateliê que o artista improvisou na Fábrica de Arte Marcos Amaro, sede da Fundação Marcos Amaro, em Itu, interior de São Paulo.

 

 

Sobre o artista
Alex Flemming é pintor, escultor e gravador. Nasceu em 1954 em São Paulo e, desde 1993, reside em Berlim, na Alemanha. Entre 1972 e 1974, frequentou o curso livre de cinema na Fundação Armando Álvares Penteado (Faap). Cursou também serigrafia e gravura em metal. Na mesma década, realizou curtas-metragens e participou de festivais variados. A partir dos anos 1990, realizou intervenções em espaços expositivos e pinturas de caráter autobiográfico. Passou a recolher móveis para utilizar em seus trabalhos, aplicando sobre eles tintas e letras ou textos. Apesar da vivência na Alemanha, sempre expôs no Brasil. Em 1998, realizou painéis em vidro para a Estação Sumaré do Metrô de São Paulo, com fotos de pessoas comuns, às quais sobrepõe com letras coloridas trechos de poemas de autores brasileiros. A representação do corpo humano e os mapas de regiões em conflito estão na série Body Builders, 2001-2002. Também de 2002, a série “Flying Carpet”, que toma como ponto de partida o atentado terrorista de 11 de setembro de 2001, nos Estados Unidos. Já a série “Anaconda”, de 2016, uma reflexão plástica sobre os horrores da ditadura do Estado Islâmico e o seu cruzamento com as tradições culturais do Oriente.

Modernos & Arte Sacra no MAS/SP

18/jan

O Museu de Arte Sacra de São Paulo – MAS-SP, Luz, São Paulo, SP, instituição da Secretaria de Cultura e Economia Criativa do Estado de São Paulo, exibe “O Sagrado na Arte Moderna Brasileira”, com obras de Agostinho Batista de Freitas, Alberto Guignard, Aldo Bonadei, Alex Flemming, Alfredo Volpi, Anita Malfatti, Antonio Poteiro, Arcângelo Ianelli, Cândido Portinari, Carlos Araújo, Clóvis Graciano, Cristina Barroso, Emeric Marcier, Fé Córdula, Fúlvio Pennacchi, Galileu Emendabili, Glauco Rodrigues, Ismael Nery, José Antonio da Silva, Karin Lambrecht, Marcos Giannotti, Mestre Expedito (Expedito Antonio dos Santos), Mick Carniceli, Miriam Inês da Silva, Nelson Leirner, Nilda Neves, Oskar Metsavaht, Paulo Pasta, Raimundo de Oliveira, Raphael Galvez, Rosângela Dorazio, Samson Flexor, Sérgio Ferro, Siron Franco, Tarsila do Amaral, Vicente do Rego Monteiro, Victor Brecheret e Willys de Castro, sob curadoria de Fábio Magalhães e Maria Inês Lopes Coutinho. A mostra expõe cerca de 100 obras – entre esculturas, desenhos, gravuras e pinturas – que formam um conjunto expressivo de artistas cujas produções abordam poéticas que aludem à fé e à religião, algumas de modo claro e explícito, outras, por meio de metáforas.

 

Até 1808, a temática religiosa dominou por completo a produção artística no país, entre o período que engloba o século 16 até a primeira década do século 19 – com exceção das obras de Franz Post e Albert Eckhout, que retrataram a paisagem, a flora, a fauna, a dança dos índios Tapuias, os tipos humanos e os empreendimentos açucareiros em Pernambuco. A partir de 1808, com a chegada da família real ao Brasil, os temas profanos passaram a ser adotados pelos artistas brasileiros, e algumas décadas depois já prevaleciam nas artes plásticas em nosso país.  “No século XIX, com a presença da missão francesa de arquitetos e artistas no Brasil, também ocorreu a representação do país e de sua sociedade por artistas como Debret e Taunay, entre outros. No correr do segundo império, os temas das pinturas brasileiras serão sobretudo patrióticos. Com o advento da semana de Arte moderna em 1922, inverteu-se a situação com o predomínio do profano e nossos modernistas e depois nossos contemporâneos se fizeram conhecidos do grande público por obras que não expressavam o sentimento religioso”, comenta o diretor executivo do MAS-SP, José Carlos Marçal de Barros.

 

Este conjunto de obras que compõem a nova mostra temporária do MAS-SP pode ser dividido entre os artistas modernos – Anita Malfatti, Tarsila do Amaral, Victor Brecheret, Vicente do Rego Monteiro, Ismael Nery, Cândido Portinari, entre outros -, os populares – entre eles José Antonio da Silva, Agostinho Batista de Freitas, Antonio Poteiro – e os artistas contemporâneos, como Alex Flemming, Marcos Giannotti, Nelson Leirner, Oskar Metsavaht, entre outros. Nos dizeres de Fábio Magalhães e Maria Inês Lopes Coutinho: “Os modernistas foram, antes de tudo, transgressores e não apenas na expressão artística, também adotaram novos modos de vida, muitos deles, incompatíveis com os hábitos da sociedade brasileira, ainda fortemente rural. Influenciados pela grande metrópole francesa que vivia sua “folle époque”, esses jovens transgressores trouxeram novas ideias que tumultuaram os costumes até então estabelecidos na conservadora sociedade brasileira”.

 

A expressão do artista popular parte na maioria das vezes de experiências vividas, das crenças, dos rituais e das festas da sua comunidade. Procissões, as festas juninas, tão populares no Nordeste, e o folclore regional nutrem, muitas vezes, os temas religiosos. Em relação à arte contemporânea, os curadores destacam a presença não rara do tema religioso, “se o entendemos como manifestação de poéticas do sagrado, do sobrenatural, como forças da natureza que inquietam a cultura, ou mesmo os aspectos intangíveis que pressentimos nas coisas e nas pessoas, ou como apropriação de símbolos consagrados”. “Lograram o magnifico resultado que o Museu de Arte sacra apresenta nesta mostra, pois todos e cada um de nossos grandes artistas continuaram mantendo dentro de si a antiga religiosidade com que conviveram desde a sua infância”, conclui José Carlos Marçal de Barros.

 

 

Sobre o museu

 

O Museu de Arte Sacra de São Paulo, instituição da Secretaria de Cultura e Economia Criativa do Estado de São Paulo, é uma das mais importantes do gênero no país. É fruto de um convênio celebrado entre o Governo do Estado e a Mitra Arquidiocesana de São Paulo, em 28 de outubro de 1969, e sua instalação data de 28 de junho de 1970. Desde então, o Museu de Arte Sacra de São Paulo passou a ocupar ala do Mosteiro de Nossa Senhora da Imaculada Conceição da Luz, na avenida Tiradentes, centro da capital paulista. A edificação é um dos mais importantes monumentos da arquitetura colonial paulista, construído em taipa de pilão, raro exemplar remanescente na cidade, última chácara conventual da cidade. Foi tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, em 1943, e pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Artístico e Arquitetônico do Estado de São Paulo, em 1979. Tem grande parte de seu acervo também tombado pelo IPHAN, desde 1969, cujo inestimável patrimônio compreende relíquias das histórias do Brasil e mundial. O Museu de Arte Sacra de São Paulo detém uma vasta coleção de obras criadas entre os séculos 16 e 20, contando com exemplares raros e significativos. São mais de 18 mil itens no acervo. O museu possui obras de nomes reconhecidos, como Frei Agostinho da Piedade, Frei Agostinho de Jesus, Antônio Francisco de Lisboa, o “Aleijadinho” e Benedito Calixto de Jesus. Destacam-se também as coleções de presépios, prataria e ourivesaria, lampadários, mobiliário, retábulos, altares, vestimentas, livros litúrgicos e numismática.

 

 

 

De 26 de janeiro a 31 de março.

Memorial por Tulio Dek

07/jan

O Memorial Municipal Getúlio Vargas, Glória, Rio de Janeiro, RJ, apresenta, a partir de 12 de janeiro,a exposição “Memorial por Tulio Dek”, uma grande instalação do multiartista no susolo da instituição. No percurso do salão circular, 50 pinturas do artista, de 1m x 1,40m, suspensas do teto, de modo a que o público caminhe em meio a elas. No lugar de telas, o artista mandou imprimir em tecido cru uma padronagem semelhante ao pijama usado por Getúlio Vargas, na madrugada de 24 de agosto de 1954. Tulio Dek fará intervenções com pintura em cada um dos recortes de tecido, usando palavras ou frases que discutem aquele momento marcante na história brasileira. A escrita, uma característica do trabalho de Tulio Dek, que também é poeta e compositor, busca “remeter à dor que Getúlio vivenciou naquele dia”, conta o artista.

 

Em um espaço anexo ao salão circular, Tulio Dek colocará uma porta, para o público atravessar. Do outro lado estará um púlpito. “É como se Getúlio quisesse dizer algo depois de sua morte”, comenta o artista. Atrás do púlpito, visível apenas para quem contornar o púlpito, estará um projétil do mesmo calibre usado pelo presidente em sua morte.

 

O jornalista, escritor e dramaturgo Luis Erlanger é o curador. No texto que acompanha a exposição, ele afirma que “Tulio Dek levou a inquietação da sua veia poética para o caminho das artes plásticas. Abrindo, com vigor, espaço para seus pensamentos e dúvidas, manifestados na sua estética bonita de se ver e, ao mesmo tempo, contundente”. “O Memorial Getúlio Vargas virou um cenário ideal, logo após as eleições que dividiram o país de forma assustadoramente radical, para aprofundar dilemas sobre os quais, mesmo que inconscientemente, o Brasil se debruçou, de forma beligerante. Uma de nossas maiores lideranças políticas, em capítulos que contribuíram a dar um toque ficcional à história do Brasil, Vargas conquistou o poder pelos dois lados da balança: como ditador, flertando com o nazi-fascismo, e pelo voto popular”, observa o curador.

 

 

REFLEXO

 

Nascido em 1985, em Goiânia, e radicado no Rio de Janeiro, Tulio Dek está com obras em exibição também na exposição “Reflexo”, na TNT Arte Galeria, em São Conrado, com esculturas e pinturas inéditas. Com curadoria de Marco Antonio Teobaldo, estão na exposição doze pinturas, e duas esculturas da série “Reflexo”, em que centenas de cápsulas de munição compõem as formas de duas mulheres e um torso de uma menina. Em setembro último, Tulio Dek participou durante um mês de uma residência artística no Thomaz Hipólito Studio, em Marvila, Lisboa, que resultou em uma exposição no mesmo local. Obras suas integram uma mostra coletiva em cartaz na Square One Contemporary Art Agency, na capital portuguesa, com curadoria de Rui Afonso Santos, do Museu de Arte Contemporânea do Chiado, que também fará a curadoria da individual do artista programada para o primeiro trimestre de 2019, também na Square One Contemporary Art Agency. Desde 2012, Tulio Dek voltou seu processo criativo para o desenho e para a pintura, sem abandonar seus textos. De 2015 a 2017 morou na Itália, onde dividiu um ateliê com um escultor ligado à Academia de Arte de Florença (Florence Academy of Art). “Meu processo de criação é muito solto, e não acredito na perfeição. O que me interessa é o processo em si e o que eu quero dizer. Não me identifico com a formação acadêmica, onde se exige uma perfeição de formas e acabamento que não tem a ver comigo”, conta.

 

 

Memorial TD

 

Luis Erlanger

 

Tulio Dek levou a inquietação da sua veia poética para o caminho das artes plásticas. Abrindo, com vigor, espaço para seus pensamentos e dúvidas, manifestados na sua estética bonita de se ver e, ao mesmo tempo, contundente.

 

 

Tulio faz política com tinta.

 

Suas causas trafegam muito além de qualquer discussão ideológica, rejeitando a divisão simplista entre esquerda e direita. Um artista que expõe e provoca reflexão com uma visão humanista do mundo.

 

O Memorial Getúlio Vargas virou um cenário ideal, logo após as eleições que dividiram o país de forma assustadoramente radical, para aprofundar dilemas sobre os quais, mesmo que inconscientemente, o Brasil se debruçou, de forma beligerante. Uma de nossas maiores lideranças políticas, em capítulos que contribuíram a dar um toque ficcional à história do Brasil, Vargas conquistou o poder pelos dois lados da balança: como ditador, flertando com o nazi-fascismo, e pelo voto popular.

 

 

Um expoente do populismo – “o pai dos pobres”. 

 

Para culminar, seu suicídio é um dos episódios mais marcantes e traumáticos da nossa vida pública.

 

Como político, pode ter entrado para a história. Como ser humano, agiu contra um instinto básico (a sobrevivência) e preferiu matar-se a perder o poder.
Sem uma desnecessária conexão, este projeto de TD vem impregnado de elementos, tanto no conteúdo quanto na plasticidade, que estiveram presentes na trajetória de Vargas, e que, ainda hoje, com mais intensidade, inquietam a sociedade e as famílias. Um convite a passear por um labirinto de ideias fácil de se sair. Difícil é ultrapassar os impasses que trazemos do nosso passado, ainda mais contundentes na nossa contemporaneidade. Dos brasileiros e da humanidade.

 

Obras para o prazer visual mas também para fazer pensar. Numa viagem lúdica que reforça a tese de que a arte redime o ser humano.E o que fica na história mesmo é a arte.

 

PS: coincidentemente, as iniciais do artista formam a sigla TD –  abreviação da expressão norte-americana “TrueDat”, corruptela de “truethat”, que significa que o fato é verdadeiro. Na era de “fakenews”, precisamos mais ainda da verdade.
Luis Erlanger é jornalista e escritor

 

 

Até 05 de maio.

 

Vanderlei Lopes na Athena

22/dez

A Galeria Athena, Botafogo, Rio de Janeiro, RJ, exibe a exposição “Arena”, de Vanderlei Lopes, com cerca de 30 trabalhos inéditos, feitos em bronze, que ocupam todo o espaço expositivo da galeria. Produzidas este ano, as obras se unem em torno da questão do tempo e da construção cultural. Feitas a partir de moldes dos objetos originais, o que as torna muito próximas ao real, não parecendo, em um primeiro olhar, serem em bronze. Em muitas delas, há a questão do movimento, como se o tempo tivesse sido congelado durante a ação.

 

“Factualidade e ficção, pensamento e ação, colidem-se nesse constante processo. Aqui, perpetuados em bronze, situações cotidianas e transitórias surgem como esculturas, monumentos que desejam discutir tais fenômenos”, conta Vanderlei Lopes.

 

Um grande tronco de árvore cortada, fundida em bronze, com cerca de 3,60m de diâmetro por 1,25m de altura, com uma arena vazia em seu topo, estará na sala menor da galeria, que mede 50m². A arena foi construída a partir das linhas circuncêntricas da madeira, que podem ser vistas em um corte, através dos quais é possível calcular a idade da árvore. A arena é um local de acontecimentos por princípio, um lugar de espetáculos desde os tempos mais antigos, mas neste trabalho ela aparece vazia. “Construída escalonada, faz eco aos movimentos circuncêntricos do crescimento da árvore e sobrepõe ao tempo natural de seu crescimento o tempo cultural, aludido pela arena. De outro lado, o trabalho relaciona o corte à construção cultural, ao acontecimento civilizatório. O teatro vazio, alusão ao palco social onde se desenrolam os acontecimentos, a atuação cotidiana”, afirma Vanderlei Lopes.

 

No salão maior, que tem 140m² e pé direito de 6,5m, estarão cerca de 20 esculturas em bronze, simulando primeiras páginas de jornais, que estarão espalhadas pelo chão, com noticias relacionadas à construção cultural. “Trata-se de jornais fixados em bronze – esses elementos cotidianos que de tão transitórios, passam a ser passado no dia mesmo em que foram impressos, aqui, convertidos ao estatuto de monumento”, conta o artista. Os jornais trazem imagens de explosões, objetos ou situações cotidianas incendiadas que colidem com frases de origens diversas, apropriadas ou transformadas, manifestos e fragmentos reflexivos, escritos por figuras emblemáticas e constitutivas de uma elite cultural. Nos jornais criados pelo artista há imagens de diversos incêndios, como o recente que atingiu o Museu Nacional e outros mais antigos, como o do MAM, no Rio de Janeiro, e do Museu da Língua Portuguesa, em São Paulo, além de imagens de disputas de poder e de território, como a Bomba de Hiroshima e o ataque às Torres Gêmeas, no dia 11 de setembro de 2001. “Os jornais têm a fixação do tempo, e esses trazem imagens de transformações. Uma espécie de tragédia perpassa os jornais espalhados pelo chão, que intenta friccionar um repertório de matriz construtiva a outro, de cunho mais trágico”, ressalta o artista, que data os jornais de acordo com a data de feitura das obras.

 

Nesta mesma sala, estará a obra “Demiurgo”, uma sacola de bronze azul, que flutua no ar rente à parede, como o resíduo de um vento que passou, materializando em estado de suspensão o voo desse objeto. Complementa a exposição a obra “Insônia”, um travesseiro, também em bronze, cuja ponta é dobrada, dando a impressão de ser realmente um travesseiro de tecido maleável, com um redemoinho modelado em sua superfície. Na parede, há a fotografia de um tornado, em diálogo com a escultura. “Ambos os trabalhos, sobrepõem a fixação dos fenômenos naturais a que aludem ao modo como as obras surgem instaladas fisicamente no espaço expositivo”, diz o artista.

 

Ao articular as duas salas da galeria, Vanderlei Lopes cria um jogo de contrastes em que o espaço físico menor está ocupado por um único trabalho de grandes dimensões, que o torna denso, enquanto o espaço maior, ocupado por outros de menor escala, dispostos no chão, apresenta aspecto mais esparso, criando uma inversão, assim como a arena, que aqui surge vazia, contrapondo-se ao seu sentido original, que é um lugar de acontecimentos, de movimento, de fatos. O nome da exposição surge desta visão mais ampla do que seria arena, esse lugar de acontecimentos, onde uma árvore acaba de ser cortada, jornais estampam noticias recentes, pedaços de papéis rasgados voam com o vento, assim como uma sacola azul e um travesseiro após a passagem de um tornado.

 

 

Sobre o artista

 

Vanderlei Lopes nasceu em Terra Boa, PR, em 1973. É formado em artes plásticas pela UNESP. Possui obras em importantes coleções públicas, como Pinacoteca Municipal e Pinacoteca do Estado de São Paulo; Coleção Itaú; Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro; Museu de Arte Moderna de São Paulo; Museu de Arte do Rio; Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo; Instituto Figueiredo Ferraz, Ribeirão Preto. Entre suas principais exposições individuais destacam-se: “Domo” (2016), na Capela do Morumbi; “Monumento” (2016), na Galeria Athena Contemporânea; “Grilagem” (2014), no Museu de Arte Moderna, Rio de Janeiro; “Transitorio” (2014), na Galeria nueveochenta, em Bogotá; “Voo, Maus Hábitos” (2007), no Porto, Portugal.

 

Entre as exposições coletivas estão: “Gold Rush” (2016), no De Saisset Museum, nos EUA; “Uma coleção particular – Arte Contemporânea no Acervo da Pinacoteca” (2015/2016), na Pinacoteca do Estado de São Paulo; “Realidades – Desenho Contemporâneo Brasileiro” (2011), no SESC-SP; “Les Cartes Blanches du Silo à l’Emsba” (2009), no Beaux-Arts de Paris, l`école nationale supérieure, em Paris; “Loop Videoart Barcelona” (2009), no Centre Civic Pati Llimona, em Barcelona; “Nova Arte Nova” (2008/2009), no CCBB Rio de Janeiro e São Paulo, entre outras.

 

 

Até 26 de Janeiro de 2019.