Pancetti na Casa Fiat de Cultura

04/set

O público brasileiro conhecerá uma das últimas obras de Pancetti – inacabada -, além de documentário inédito e instalação imersiva com experiência poética. O mar sempre provocou fascínio nos homens. Os mistérios escondidos nas águas salgadas atraem, há séculos, o olhar de exploradores, pesquisadores, estudiosos, e de artistas. No Brasil, José Pancetti retratou como ninguém o beijo entre o mar e a areia. Sua poesia e delicada sobriedade serão reveladas na primeira exposição do artista em Belo Horizonte, MG, com pinturas de marinhas, paisagens, retratos e naturezas-mortas. “Pancetti na Casa Fiat de Cultura: o mar quando quebra na praia…”, que fica em cartaz até 17 de novembro.

A exposição tem curadoria de Denise Mattar e apresenta um conjunto de 46 trabalhos realizados entre 1936 e 1956, alguns deles nunca antes exibidos para o público, além de uma cronologia ilustrada e uma instalação imersiva, que reúne músicas de Dorival Caymmi, imagens e sons do mar. Também será apresentado um documentário inédito, produzido por Ula Pancetti, neta do artista. Na abertura ocorreu um bate-papo com a curadora Denise Mattar e Ula Pancetti. Toda a programação da Casa Fiat de Cultura é gratuita.

Entre as obras, o público poderá apreciar “Auto-vida” (1945), autorretrato emblemático de Pancetti, em que o artista mescla realidade, imaginação e ironia; “Retrato de Francisco” (1945), que mostra um menino negro tendo ao fundo a paisagem de um morro de São João del-Rei, cidade onde o artista viveu uma temporada; “O Chão” (1941), obra que deu ao artista o Prêmio de Viagem ao Exterior do Salão de Belas Artes; “Praça Clóvis Bevilacqua” (1949), obra pintada das janelas do Palacete Santa Helena, local onde dividiam o ateliê os artistas Volpi, Rebolo, Mário Zanini, Manoel Martins, entre outros; “Floresta, Campos do Jordão, SP” (1944), cidade onde o artista passou algumas temporadas para tratamentos de saúde e que é frequente em sua obra; “Pescadores” (1956), obra incomum na produção de Pancetti, que retrata a pesca do xaréu, em Salvador; “Lagoa do Abaeté” (1952), obra que retrata o encanto do artista pela cor das águas, da areia e dos panos das lavadeiras; “Paisagem de Itapuã” (1953), obra emblemática de Pancetti, que deu início à Coleção Gilberto Chateaubriand, uma das mais importantes do país; “Coqueiros de Itapuã” (1956), obra da última fase da pintura de Pancetti, momento em que o artista alcança uma plenitude criativa; além de “Composição – Bahia Interior o meu atelier, Itapoan” (1957), obra inacabada, que pertence à família do artista e é inédita para público. As obras provêm de coleções privadas de instituições do Brasil: Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, Museu Nacional de Belas Artes, Museu de Arte Moderna de São Paulo e Museu de Arte Brasileira da FAAP.   

As marinhas são a sua faceta mais conhecida, mas ele também pintava naturezas-mortas, paisagens e retratos, em obras singulares e muito poéticas. Para o presidente da Casa Fiat de Cultura, Massimo Cavallo, a paixão do pintor inspira a instituição a oferecer essa mostra. “A galeria da Casa Fiat de Cultura ganha a leveza, a profundidade e a brisa do mar que sempre estão presentes nas obras de Pancetti. Para sentir, basta contemplar.”

Filho de imigrantes italianos, José Pancetti foi pintor, escultor, desenhista e gravador.  Também foi pintor de paredes e militar da Marinha Brasileira – ofício que influenciou fortemente a sua obra e a relação com o mar. Nasceu em Campinas (SP), mas logo cedo se mudou para São Paulo. Seu pai era pedreiro, mestre-de-obras e músico e a mãe era camponesa. Por causa das dificuldades financeiras, foi enviado à Itália, ainda jovem, onde ingressou na Marinha Mercante. A infância difícil e as privações da adolescência deixaram marcas profundas na personalidade e na saúde de Pancetti, assim, o ingresso na Marinha Brasileira foi um alívio para as suas atribulações. O pintor teve seu talento descoberto na Marinha. Começou pintando um camarote e logo passou a pintar postais e tampas de caixas de charutos. A partir daí, seu interesse pela pintura se intensificou e chegou a estudar por um curto período no Núcleo Bernardelli (Rio de Janeiro), um ateliê livre que tinha orientadores em vez de professores.

A curadora da mostra, Denise Mattar, destaca que Pancetti sempre foi um pintor original e intensamente pessoal. “Seu temperamento solitário e a formação quase autodidata permitiram o surgimento de uma obra particular plena de lirismo, melancolia e poesia – uma obra que emociona. Sem estar preocupado com uma brasilidade teórica, Pancetti retratou amorosamente a nossa gente, a nossa luz e o nosso mar.”

A exposição “Pancetti na Casa Fiat de Cultura: o mar quando quebra na praia…” é uma realização da Casa Fiat de Cultura e do Ministério da Cultura, por meio da Lei Federal de Incentivo à Cultura. Conta com o patrocínio da Fiat, copatrocínio da Stellantis Financiamento, do Banco Stellantis, do Banco Safra, da Usiminas e da Sada. O evento tem apoio institucional do Circuito Liberdade, além do apoio do Governo de Minas e do Programa Amigos da Casa.

Paisagens de Cris Ioschpe

03/set

A Ocre Galeria, Cidade Baixa, Porto Alegre, RS,  convida para a abertura da exposição “Quietude”, de Cris Ioschpe, com curadoria de Maria Alice Milliet e participação especial do artista plástico Walmor Corrêa. A inauguração ocorrerá no dia 05 de setembro, marcando o início de um período de visitação que se estenderá até o dia 01 de outubro. Além disso, no dia 06 de setembro, às 18h30, haverá uma conversa com os artistas Cris Ioschpe e Walmor Corrêa, mediada por Paula Ramos.

O texto da curadora Maria Alice Milliet para a exposição “Quietude” de Cris Ioschpe destaca a profundidade emocional e o contexto pessoal e geográfico que influenciam as obras da artista. As paisagens retratadas nas obras remetem às dunas e banhados do Taim, uma reserva ecológica no Rio Grande do Sul, e ao litoral norte de São Paulo. A curadora observa que a natureza apresenta-se como referência primordial, como resíduo arcaico de um tempo mítico. As obras emergem de um processo lento e maduro, onde não há pressa nesse trabalho, apenas expectativa do que está por vir. O movimento suave do pincel cria ondulações que evocam montanhas, banhados, ilhas e baías de águas calmas, revelando a dualidade entre as séries “Taim” e “Serra do Mar”. Maria Alice Milliet também explora a evolução artística de Cris Ioschpe, que iniciou sua trajetória na gravura e depois se aprofundou na pintura. Ela destaca a importância do aprendizado da artista com Maria Tomaselli e Iberê Camargo, e menciona sua aproximação com Paulo Pasta nos últimos anos. A curadora pontua que Cris Ioschpe chegou a uma pintura singular, num contexto onde a pintura de paisagens, embora tradicionalmente vista como menor, continua a atrair artistas contemporâneos.

Em suas obras, Cris Ioschpe evolui das naturezas-mortas para as paisagens. Na série “Taim”, ela constrói com gestos e pinceladas generosas o que pode ser lido como montanhas baixas e alagados, utilizando uma paleta de azuis, roxos e verdes que reforçam a continuidade da paisagem para além do quadro. Já na série “Serra do Mar”, a artista adota uma abordagem pictórica mais incisiva, com contornos definidos e um cromatismo menos sombrio. A pintura aproxima-se do desenho, à medida que os limites entre céu, terra e mar tornam-se mais nítidos, sublinha a curadora.

Por fim, Maria Alice Milliet conclui que, em ambas as séries, o foco não está na identificação precisa do local, mas naquilo que a paisagem transmite: na quietude da observação, a natureza inspira o artista e, na contemplação da pintura, ela nos toca.

Sobre a artista

Cris Ioschpe, nascida em Porto Alegre em 1967, é uma artista plástica que vive e trabalha em São Paulo desde o ano 2000. Formada em Artes Plásticas pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul em 1992, desenvolveu sua prática artística inicialmente estudando pintura e gravura com mestres como Maria Tomaselli, Anico Herskovits, Paulo Pasta, e Claudio Mubarac. Na década de 1990, expandiu sua formação vivendo em Buenos Aires onde trabalhou no Museo del Grabado e em Porto Alegre na Fundação Iberê Camargo, colaborando com Eduardo Haesbaert. Com seu ateliê em São Paulo, continuou a se aperfeiçoar sob a orientação de Evandro Carlos Jardim e Ernesto Bonato, e participou de diversos projetos de gravura, incluindo o “Projeto Lambe-lambe”. Além de coordenar workshops de gravura no SESC Pompeia e oficinas na Chapel School, desde 2013 frequenta o curso de Paulo Pasta no Instituto Tomie Ohtake. A artista possui um extenso currículo de exibições individuais e coletivas, destacando-se “Passos que imaginei” na Galeria Gravura, em Porto Alegre, RS, no ano 2000, “Funil” na Galeria Bolsa de Arte de Porto Alegre em 2004  e “da gravura e além” na Galeria Arteedições em 2017 em São Paulo. Suas obras integram coleções públicas em instituições de prestígio, como a Bibliotheca Alexandrina, o Museo del Grabado em Buenos Aires, e diversos museus no Brasil, incluindo o Museu de Arte Contemporânea do Rio Grande do Sul e o Museu Nacional de Belas Artes, Rio de Janeiro, RJ.

Sapos, lagartixas, jacarés, ratos e cobras de borracha.

A artista Lia Menna Barreto exibe na OCRE Galeria, Cidade Baixa, Porto Alegre, RS, uma exuberante instalação composta de bichos de plásticos.

A incessante fábrica de Lia Menna Barreto

Tapetes de jacaré, bobinas de sapo, pizzas de lagartixa. Produtos variados: vende-se a metro ou a granel, no varejo ou no atacado. Há 21 anos, a fábrica de Lia Menna Barreto segue funcionando incessantemente, nunca parou. Lia se insere na esteira diversa da ousada Geração 80 da arte brasileira. Propondo experimentações de materiais e linguagens possíveis à criação artística, coube a essa turma de jovens artistas reinventar modos de pensar e fazer em arte, subvertendo formas de pintar, gravar, desenhar e esculpir, ampliando-se para uma cartela infinita de meios e procedimentos. Em Fabricados, a artista apresenta parte da coleção de produtos derivada da instalação in situ Fábrica, obra emblemática da 4ª. Bienal do Mercosul (Porto Alegre/Brasil, 2003). Na proposição, instalou uma sala de produção no meio do Armazém A5 do Cais do Porto. Quadrado, com divisórias de PVC e vidro, o chão de fábrica mantinha um regime de produção onde nós, operários-assistentes, produzíamos, em série, dezenas, senão centenas, de objetos modulares, a partir de bichinhos de brinquedo. Para a realização das tarefas do dia, repetindo uma técnica de prensagem criada pela artista utilizando ferros de passar roupa, água e papel manteiga, montávamos objetos de aparência estranhamente familiar a partir da manipulação de sapos, lagartixas, jacarés, ratos e cobras de borracha, famosos itens de preço barato das saudosas lojas de 1,99 ou made in China. Construíamos tapetes, mandalas, estrelas, flores, bolos e pizzas. Na ocasião, a obra viva exibia ao público, do horário de abertura ao encerramento de suas operações fabris, o pensamento de uma artista inquieta, revelado no labor e na fantasia do processo criativo. Temporária e efêmera, a fábrica se apresentava como um trabalho continuamente inacabado e, ao mesmo tempo, múltiplo em si. Nenhum dia era o mesmo dia na linha de produção pois, a cada 24 horas, acontecia de um jeito diferente, revelando-se como uma obra de difícil apreensão. Não diferente, a mostra que se apresenta hoje, continua fugindo da obviedade. Na esperança de encontrarmos obras docilizadas no ambiente da galeria, a montagem e a exibição das peças subvertem a lógica de exposição e atualizam as regras de apreciação e consumo de obras de arte. Os fabricados de Lia voltam ao circuito como produtos, vendidos a metro ou em peças únicas, separados ou combinados, grandes ou pequenos, ao gosto do freguês. Um tanto irônico, a artista nos apresenta mais um desdobramento de sua constante, irreverente e espetacular produção. Com 40 anos de carreira, a produção da artista atualiza o repertório singular de conceitos operatórios que traz em sua caixa de ferramentas: derreter, grudar, misturar e prensar ampliam-se para cortar, medir, negociar e outros tantos verbos de ação que seu trabalho demande inventar. Revela, portanto, que há sempre uma surpresa no caminho a surgir, que reconfigura continuamente as rotas do trabalho da artista. Pois, mesmo no ato insistente de uma comprometida e incessante produção, sempre abre-se espaço para o desvio. Surpresas do processo: o começo de uma nova linha de produção.

Sandro Ka/artista visual, professor e pesquisador (EBA/UFMG), ex-operário-assistente da Fábrica.

Marcos Scorzelli apresenta megaescuturas coloridas.

Está em cartaz a exposição “Megabichos – Matemática Poética, Geometria Selvagem”, do designer e artista plástico Marcos Scorzelli, na CAIXA Cultural Fortaleza, Praia de Iracema, CE. Com curadoria de Guto Nobre, a mostra conta com 14 megaesculturas coloridas, produzidas em chapas de aço, todas expostas nos jardins do equipamento cultural. Com patrocínio da CAIXA e do Governo Federal, a mostra poderá ser visitada até o dia 03 de novembro, com acesso gratuito.   

Durante o período da exposição, o público de todas as idades poderá ver e interagir com a girafa de três metros de altura, cavalo, touro, beija-flor, ema, polvo e outros bichos. São obras que retratam uma selva vibrante em formas tridimensionais, nascidas a partir de figuras bidimensionais planas como triângulo, círculo e quadrado. A ideia é provocar surpresa para o olhar que desperta a criança dentro de cada espectador.

As obras evocam a infância e as memórias da convivência familiar do artista. Isso porque Marcos Scorzelli reinterpretou as antigas criações de papel que fazia junto com seu pai, Roberto Scorzelli, também artista plástico, transformando-as agora em megaesculturas. Originalmente, essas peças eram feitas com cortes e dobras precisas, sem desperdício de material – uma prática que perdurou ao longo do tempo, fortalecendo o vínculo entre pai e filho. Com Marcos, essa tradição foi renovada sob uma nova perspectiva.

“A exposição é uma matemática mágica e divertida, com imensa força educativa. A aparente simplicidade da transformação de uma forma geométrica plana em um volume espacial, criando figuras de bichos coloridos, dinâmicos e cheios de personalidade, faz sonhar e vai, certamente, encantar toda a família”, destaca Scorzelli.

Sobre o artista

Carioca, formado em design pela PUC Rio, Marcos Scorzelli começou a carreira inovando em projetos arquitetônicos, trabalhando como designer de interiores corporativos e desenvolvendo soluções cenográficas diferenciadas. Em 1993, criou com seu pai a Scorzelli Arquitetura e Design, que já recebeu prêmios por projetos desenvolvidos para empresas. Fotógrafo amador, é apaixonado pelo Rio e desenvolveu sua linguagem vivenciando a natureza exuberante da cidade maravilhosa.

Exposição inédita de Alex Flemming

27/ago

A exposição inédita “Alex Flemming 70 Anos”, a mais nova realização do Museu Oscar Niemeyer (MON), Curitiba, PR, será inaugurada no dia 29 de agosto, na Sala 3. Com curadoria de Tereza de Arruda, a mostra reúne mais de 80 obras, algumas de grandes dimensões. Alex Flemming é um artista brasileiro reconhecido internacionalmente e que vive há décadas entre a Alemanha e o Brasil.

“Alex Flemming é, sem dúvida, um dos maiores artistas brasileiros de sua geração e ao longo de sua carreira teve conexões e presenças importantes no Paraná. Para nós, é uma honra apresentarmos uma mostra que celebra seus 70 anos aqui no Museu Oscar Niemeyer”, afirma Luciana Casagrande Pereira, secretária de Estado da Cultura do Paraná.

A diretora-presidente do MON, Juliana Vosnika, informa que ‘”a mostra comemorativa de Alex Flemming leva nosso público a entrar em contato direto com o melhor da produção contemporânea”. Ela comenta que Alex Flemming, artista sempre irreverente e observador, traz em suas obras um retrato atual que vai além da simples representação do que vê. ‘”Ele traduz sua visão aguçada e atenta ao falar sobre um mundo caótico e cheio de vertentes. Aborda diversas questões sociais com a sutileza que só a arte permite”, diz Juliana Vosnika.

Na exposição estão trabalhos realizados de 1982 a 2023. As obras, impregnadas de símbolos e mensagens, convidam o espectador a extrapolar o senso comum. São camadas que ganham significado próprio a partir do olhar singular de cada visitante. Por meio de técnicas inovadoras e abordagens conceituais, como as presentes no universo de Alex Flemming, tem-se a expansão dos limites do retrato e do retratado, desafiando o espectador a reconsiderar suas percepções sobre o artista, sobre si mesmo e sobre os outros. A exposição reúne em suas obras técnicas variadas, como fotografia sobre vidro, óleo sobre tela, esmalte sobre madeira, acrílica sobre tecido e pintura sobre porcelana.

O tema “Retrato” foi intencionalmente selecionado para esta mostra comemorativa porque a representação humana é o eixo fundamental e seminal da pesquisa plástica de Alex Flemming. Segundo a curadoria, a mostra apresenta a recorrência do retrato em sua vasta produção. “Historicamente, ao longo dos séculos, o gênero do retrato evoluiu de uma representação fiel da aparência física para uma exploração profunda da identidade e da subjetividade do retratado”, explica Tereza de Arruda. “O retrato contemporâneo, como pode ser visto nesta mostra, explora frequentemente a identidade de maneiras complexas, abordando questões de gênero, raça, sexualidade, classe social e cultural”. Ainda segundo a curadora, ‘”deixou de ser uma simples representação da aparência externa para se tornar uma investigação profunda das complexidades da identidade humana – um espelho da sociedade -, refletindo suas tensões, transformações e diversidades”.

Sobre o artista

Alex Flemming nasceu em 1954, em São Paulo, SP. Vive e trabalha em São Paulo e Berlim. Estudou Cinema na FAAP e Arquitetura na USP, e é autodidata em artes visuais. Realizou vários curtas-metragens em Super-8, com participação em festivais. A partir do final da década de 1970, passa a se dedicar exclusivamente às artes plásticas. Realiza sua obra sempre em séries, e a primeira delas denuncia a violência da tortura nos porões da ditadura militar brasileira (série ‘”Natureza Morta”, 1978). Sua arte é basicamente política e vem, no decorrer dos anos, abordando temas como a guerra (série ‘”Body Builders”, 2000), o 11 de Setembro (série ‘”Flying Carpets”, 2003) ou o terrorismo (série “Apocalipse”, 2015). Outro tema sempre presente é o corpo humano, “o ser humano como centro do universo”, como o próprio artista diz, é o foco da mostra “Alex Flemming 70 Anos”.

Sobre a curadoria

Tereza de Arruda é mestre em História da Arte pela Universidade Livre de Berlim e acompanha, desde 1991, a produção de Alex Flemming, expondo suas obras em inúmeras mostras no Brasil e no exterior. Entre elas, a exposição individual “Flying Carpets”, realizada em 2005, no Chicago Cultural Center; “Alex Flemming: Sistema Uniplanetário”, em 2008, na St. Johannes Kirche, em Berlim e no MAM – Museu de Arte Moderna no Rio de Janeiro”, “Alex Flemming: Galileu Galilei”, em 2011, no Museu Nacional de Belas Artes em Santiago no Chile, além da mostra coletiva “Brasilidade Pós-Modernismo”, realizada de 2021-2022, no circuito CCBB no Rio de Janeiro, São Paulo, Brasília e Belo Horizonte.

A riqueza cultural de Eduardo Ver

Devido às dificuldades logísticas causadas pelas enchentes que atingiram o estado do Rio Grande do Sul, a abertura da exposição “Sacro Ofício” de Eduardo Ver foi primeiramente adiada. E agora, vale conhecer a riqueza cultural e simbólica do Brasil através das 16 xilogravuras únicas de Eduardo Ver, que destacam as influências e tradições indígenas, negras e caboclas no Espaço Força e Luz, no Centro Cultural CEEE Erico Verissimo, Centro Histórico, Porto Alegre, RS.

Sobre o artista

Eduardo Ver nasceu em 1979, em São Paulo-SP. Vive e trabalha em São Paulo-SP. Desde muito jovem, Eduardo Ver já praticava o desenho como uma ferramenta lúdica para se conectar com outras histórias. O interesse pela Xilogravura, seu principal foco de pesquisa, deu-se a partir da sua experiência na Universidade Cruzeiro do Sul, no começo dos anos 2000. Foi também durante esse período que o artista bateu a porta do Atelier Piratininga, onde permaneceu por mais de sete anos, até 2012. Sob orientação do artista gravador Ernesto Bonato, Eduardo Ver aperfeiçoou-se na técnica e produção da gravura, encontrando de fato a prática que o guiaria na sua trajetória como artista. A técnica utilizada por Eduardo Ver aplica diversas camadas de impressão sobre o papel, ou seja, para cada xilogravura, ele produz várias matrizes, que são sobrepostas até atingir um certo grau de tridimensionalidade. Segundo o artista o objetivo é atribuir ritmo às obras, fazendo com que todos os elementos convivam em harmonia, num verdadeiro estado de confraternização. A “magia” dessa complexidade processual proporciona ao espectador um tipo de transe visual, proposto pelo artista para estabelecer uma relação direta com os rituais de Umbanda, religião de matriz africana e brasileira, que abriga o mesmo sincretismo identificado no trabalho de Eduardo Ver. Essa mistura de referências nos trabalhos do artista geralmente está associada a elementos da natureza, como plantas e animais, figuras de Orixás e de santos católicos, além de objetos alegóricos. Símbolos da Geometria Sagrada também são identificados, juntamente com outros que fazem alusão tanto aos povos originários do Brasil, quanto ao Sufismo, religião mística do Islamismo, como os arabescos, por exemplo. A todo esse inventário cultural diversificado, o artista atribui uma paleta elegante de cores, inspirada pelos exercícios de observação das plantas que encontra na natureza e nas floriculturas próximas da sua residência, na zona leste da cidade de São Paulo. Nos seus quase vinte anos de produção artística, Eduardo Ver desenvolveu uma cadência conceitual bastante original e um rigor técnico e formal apurado, muito dos quais adquiridos a partir da sua experiência com projetos gráficos. De seu estúdio, chamado por ele de “Gráfica talhando em silêncio”, saem por exemplo ilustrações para publicações, como livros de cordéis, cartazes e lambes, que podem ser encontrados nos espaços urbanos de São Paulo.

German Lorca mestre da fotografia

26/ago

A exposição “German Lorca, Mestre da Fotografia” resgata a trajetória artística do fotógrafo, reconhecida nacional e internacionalmente. Exibindo desde os seus primeiros trabalhos como fotógrafo amador, em 1947, a mostra conta com cerca de 160 fotografias, além de câmeras e outros itens pessoais. Até 27 de outubro no MON, Museu Oscar Niemayer, Curitiba, PR.

Com curadoria de Adriana Rede e José Henrique Lorca, filho do fotógrafo, a exposição é organizada em oito núcleos que evidenciam o olhar afetivo do fotógrafo para o mundo. Ao longo de sua carreira, German Lorca experimentou diversas modalidades de fotografia, desde o analógico ao digital, sempre mantendo sua linguagem única nas cenas que registrou.

“German Lorca é simplesmente um dos maiores nomes da fotografia brasileira”, afirma a secretária de estado da Cultura do Paraná, Luciana Casagrande Pereira. “Nossa expectativa para esta exposição de Lorca no MON é de que ela será um marco para o Museu por conta da grandeza de sua trajetória, que merece ser vista, revista e conhecida pelo grande público aqui no Paraná”. Segundo a diretora-presidente do Museu Oscar Niemeyer, Juliana Vosnika, a mostra nos faz viajar no tempo e no espaço. “São imagens geniais que têm poesia, que tocam e inspiram, que permitem um diálogo silencioso com cada visitante”. Ela comenta que, “com essa exposição, o MON confirma sua vocação de, entre outras vertentes artísticas, colecionar e expor fotografias, levando-as até o imenso e interessado público espectador”.

Dividida em núcleos, a exposição compreende a retrospectiva de sua obra, incluindo desde seus primeiros trabalhos como fotógrafo amador, em 1947. São cerca de 160 fotografias, além de câmeras e outros itens pessoais. A mostra percorre a trajetória de Lorca como artista e profissional na fotografia, por mais de 70 anos, com excepcional dedicação, conquistando diversas premiações e reconhecimento, no Brasil e no exterior.  “Sua obra compõe um grande recorte da história da fotografia brasileira, acompanhando um novo movimento, uma nova forma de expressão fotográfica e o alvorecer de uma estética moderna na nossa fotografia brasileira”, informam os curadores.

Os oito núcleos que compõem a exposição são: “Lorca na coleção do MoMA”, “Primeiros tempos: Foto Cine Clube Bandeirante”, “Um olhar livre”, “E fez-se a cor”, “New York e seus personagens”, “A geometria das sombras”, “Sobreposição do tempo” e “O Mago dos Anúncios”.

Sobre o artista

German Lorca nasceu em São Paulo, SP (1922-2021) foi um dos poucos a vivenciar de modo pleno a fotografia, em suas mais diversas modalidades: de amador a profissional, do analógico ao digital, das câmeras aos smartphones. Com uma visão peculiar sobre os mais variados temas, estabeleceu sua linguagem de maneira única. Sua obra faz parte dos mais importantes acervos do mundo, como o do Museu de Arte Moderna de Nova Iorque (MoMA), entre muitos outros. Sete de suas fotografias fazem parte da coleção permanente do Museu Oscar Niemeyer. No final dos anos 1940, Lorca afiliou-se ao Foto Cine Clube Bandeirante, em São Paulo, hoje objeto de estudo internacional por seu vanguardismo. “Quando a fotografia moderna toma impulso e vem revolucionar a cena brasileira, ele se destaca com seus cortes e enquadramentos, tanto na captura da foto quanto no ato da revelação”, esclarecem os curadores.  German Lorca passou por uma fase chamada “concreta”, em que explorou planos inusitados e ângulos diferenciados. Na fotografia publicitária, foi pioneiro. Incessantemente atrás de novidades, com audácia nas buscas cromáticas, nos ângulos ousados e nos temas irreverentes e provocativos, conquistou o mercado publicitário, que se iniciava no Brasil. Com trajetória reconhecida, nacional e mundialmente, nunca parou. Seguiu com seu olhar atento, formando gerações de fotógrafos que se inspiraram, não só em sua técnica, mas em seu jeito afetivo de olhar o mundo. “Sempre atemporal, seguiu fotografando até os últimos dias de sua vida extraordinária”, explica a curadoria.

Acontece em Brasília

21/ago

A Cerrado Galeria, localizada na QI 5 do Lago Sul, sediou o lançamento de um novo projeto dedicado ao fomento da cultura e da educação em artes visuais: a Cerrado Cultural. O evento foi marcado pela inauguração de duas exposições: “Mito, rito e ritmo interior: Rubem Valentim fazer como salvação”, com curadoria de Lilia Schwarcz, e “O centro é o oeste insurgente”, com curadoria de Divino Sobral e Lilia Schwarcz.

Rubem Valentim é considerado um dos mestres do construtivismo brasileiro e conhecido pelas composições geométricas com emblemas afro-brasileiros, o pintor, escultor e gravador baiano Rubem Valentim terá o legado exposto no espaço Cerrado Cultural, projeto de expansão da Cerrado Galeria. A mostra segue em cartaz até 1º de novembro.

Batizada de “Mito, rito e ritmo interior: Rubem Valentim fazer como salvação”, a exposição vai explorar as diferentes fases da carreira de Rubem Valentim, além de expor fotos e fontes originais. A mostra tem curadoria de Lilia Schwarcz, uma das principais pesquisadoras de história e de arte do país, além de estudiosa do artista desde 2018, quando participou da mostra “Rubem Valentim: Construções afro-atlânticas” no Masp, SP.

As obras ficarão divididas em salas a partir de uma ordem cronológica. A mostra inicia-se com as produções em que Rubem Valentim está testando a geometria com os elementos das religiões de matrizes africanas. Na sequência vem os trabalhos tridimensionais, com esculturas e obras mais rígidas e concretas, mas também sob a influência religiosa. O terceiro momento mostra a explosão de cores e paletas. A exposição continua com uma sala que apresenta o ateliê de Rubem Valentim, cedido pelo Instituto Rubem Valentim, e segue para o quinto e último ambiente, uma sala projetora inspirada num projeto expográfico do baiano. Cada um dos espaços é norteado por conteúdos e documentos que dão um panorama histórico. O objetivo é trazer os impasses contextuais do artista trazendo para o público as questões presentes nas obras.

A mostra é uma homenagem ao artista que escolheu a capital federal para morar durante um período de sua vida, fato que influenciou diretamente na inclusão do tridimensionalismo em sua obra. “Essa exposição, sediada em Brasília, pretende explorar o local da cidade como momento de inflexão e de agigantamento do trabalho mágico e emblemático de Valentim. Jovem como o artista, a nova capital federal se erguia de maneira monumental, a partir dos traçados retos e concretos, e o desafio acabou por fisgar o artista que nunca deixou de fato a cidade e seu convívio”, explica Lilia Schwarcz no texto curatorial da exposição.

Cerrado Cultural

Novo projeto da Cerrado Galeria, o espaço Cerrado Cultural nasce para ampliar a vocação da marca de dar visibilidade aos artistas e à produção do Centro-Oeste, por meio de um local para exposições, residências artísticas e formações educativas. Está localizado em uma chácara no Lago Sul em um espaço amplo – com mais de 1,6 mil metros quadrados. Duas exposições inauguram o espaço. Uma delas é a individual dedicada ao artista Rubem Valentim, a outra é uma coletiva com 15 artistas do Distrito Federal, Goiás e do Mato Grosso, intitulada “O centro é o oeste insurgente”, com curadoria de Divino Sobral e Lilia Schwarcz.

Tramas, rendas e bilros

15/ago

Chama-se “Tramas, rendas e bilros”, a exposição e bate-papo com a artista plástica Beatriz Dagnese no Espaço Cultural HPM. Localizado no Centro Histórico de Porto Alegre, RS, o Espaço Cultural do Hotel Praça da Matriz (HPM) hospedará entre 22 de agosto e 13 de outubro a exposição da artista plástica Beatriz Dagnese com mais de 20 desenhos já conhecidos ou inéditos, ressaltando a marca particular da autora: o uso de nanquim e grafite sobre papel na criação de imagens que transitam entre o figurativo e o abstrato.

Em paralelo à mostra, a artista participará de três encontros da série de bate-papos “Roda de Cultura”, com mediação por protagonistas do setor cultural. Estão programadas três edições do evento, ao longo de três quartas-feiras, sempre às 17h30min: 28 de agosto, 25 de setembro e 9 de outubro. A entrada é franca e aberta ao público em geral, porém com vagas limitadas – mediante inscrição pelo whatsapp (51) 9859-55690.

Sobre a artista

Nascida e criada em uma família de agricultores de ascendência italiana na zona rural de Nova Bassano (Serra Gaúcha), Beatriz Dagnese iniciou sua trajetória nas artes plásticas de modo intuitivo, aos 24 anos, ao ter sua atenção despertada por ilustrações publicadas na imprensa de Porto Alegre, para onde havia migrado na juventude, por conta do trabalho como enfermeira. Ela relembra hoje, aos 70 anos: “Desde a adolescência eu tinha muito claro que não queria para mim a vida agrícola, e sim estudar e trabalhar em outra área. Sempre me interessei por arte e queria fazer algo, mesmo sem saber exatamente o quê e imaginando que não tinha como sobreviver da atividade na época, até deparar com desenhos de Vera Lúcia Didonet nas páginas de um dos jornais deixados pelos médicos em uma sala de hospital onde eu cumpria expediente, em 1978”. A descoberta impactou Beatriz de tal forma que ela imediatamente passou a rabiscar a lápis uma série de esboços sobre folhas de receituários. “Eu achava que desenhava”, brinca. “Não parei mais. Fui experimentando outros materiais, técnicas e imagens que acabaram definindo um estilo, ao mesmo tempo em que continuava no setor da saúde. Já dividindo meu tempo entre Porto Alegre e Canela, montei um ateliê em minha casa no interior.”O encorajamento constante pelos amigos a levou a socializar pela primeira vez a sua obra, inscrevendo-se na edição 2008 do Salão do Jovem Artista, promovido pela RBS e Secretaria Estadual da Cultura. Resultado: o primeiro lugar na região da Serra Gaúcha. Dali em diante, Beatriz teria o seu trabalho reconhecido em outros certames, como o Salão da Câmara de Vereadores de Porto Alegre (Menção Honrosa) e Bienal do Mercosul de 2015. Aposentada da enfermagem e hoje totalmente dedicada ao trabalho com desenho, seu trabalho tem sido compartilhado em mostras individuais e coletivas dentro e fora do Rio Grande do Sul. A artista faz um balanço de seu ingresso e projeção na atividade: “Entrei na hora certa, com cinquenta e poucos anos, sem jamais me sentir incomodada por ter começado na arte em um momento que muitos podem considerar tardio”, avalia. “Para mim, criar é fazer o que os outros não fizeram.”

Sobre o Espaço cultural HPM

Inaugurado como imóvel residencial no final da década de 1920, o palacete do Largo João Amorim de Albuquerque nº 72 abriga há quase 50 anos o Hotel Praça da Matriz. O empreendimento passou por ampla revitalização e, sob o comando da família Patrício desde 2014, hospeda anônimos e famosos (a artista plástica Magliani residiu por três meses em seu retorno à cidade, em 1998), além de abrigar o Espaço Cultural HPM. No foco estão exposições, saraus, lançamentos de livros e outros eventos, em parceria com a empresa Práxis Gestão de Projetos. A origem do imóvel remonta a Luiz Alves de Castro (1884-1965), o “Capitão Lulu”, dono do cabaré-cassino “Clube dos Caçadores”, instalado de 1914 a 1938 na rua Andrade Neves (a poucas quadras dali) e enaltecido por cronistas e escritores como Erico Verissimo. A fortuna amealhada pelo empresário com a atividade ainda bancou, na mesma época, a construção do imponente edifício que hoje sedia o Espaço Cultural Força e Luz (Rua da Praia). Contratado por Lulu, o engenheiro e arquiteto teuto-gaúcho Alfred Haasler projetou quatro andares com subsolo, pátio interno e dois diferenciais naquele tempo: garagem e sistema francês para calefação de água, tudo em estilo eclético, com mármores, azulejos e outros materiais importados. O conjunto está inventariado como de interesse histórico pelo município e contemplado com o programa Monumenta, permitindo a recuperação de fachada, cobertura e estrutura elétrica. O proprietário não teve muito tempo para aproveitar tamanho requinte, pois migrou no início da década de 1930 para o Rio de Janeiro, ampliando atividades (foi sócio do Cassino da Urca e dono de diversos empreendimentos). Com o decreto federal que em 1946 proibiu os jogos-de-azar, Lulu se desfez do seu patrimônio em Porto Alegre. O palacete junto à Praça da Matriz – até então alugado a terceiros – trocou de mãos até ser adquirido em 1949 por um comerciante cuja nora, Ilita Patrício, mantém hoje o estabelecimento hoteleiro.

Carmela Gross na Fundação Iberê Camargo

01/ago

Denominada de “Boca do Inferno”, série de monotipias produzidas por Carmela Gross no Ateliê de Gravura da Fundação Iberê Camargo, Porto Alegre, RS, entrará em exibição a partir do dia 10 de agosto. Destaque da 34ª Bienal de São Paulo, a obra composta por 160 imagens foi escolhida para a primeira exposição individual da artista na Fundação Iberê Camargo.

Entre 2017 e 2018, a artista colecionou diversas fotos de vulcões publicadas em jornais e livros. A partir dessas imagens, ela desenvolveu a visualidade de cada uma, utilizando operações digitais para ampliar, recortar e simplificar suas formas em manchas compactas em preto e branco. Isso serviu de base para um exercício diário de reprodução dessa visualidade por meio de desenhos a nanquim e lápis sobre papel.

Com esses esboços em mãos, em 2019, Carmela Gross escolheu o Ateliê de Gravura da Fundação Iberê Camargo para uma imersão de duas semanas nos processos gráficos da monotipia, com a colaboração do artista e impressor Eduardo Haesbaert. Durante esse período, desenvolveu centenas de trabalhos: manchas escuras de tinta que seriam impressas sobre papel e seda, remetendo à ideia de uma grande explosão. “As formas de vulcão têm uma concentração na forma e no gesto dela, do traço, que deixa aquilo pulsante, parecendo que vai explodir”, recorda Eduardo Haesbaert, que foi impressor de Iberê Camargo nos últimos quatro anos de vida e produção do pintor.

Esse processo no Ateliê de Gravura ainda estava em andamento quando os curadores da 34ª Bienal de São Paulo, Paulo Miyada e Jacopo Crivelli Visconti, convidaram a artista para expor os trabalhos na Bienal. “Cento e sessenta vezes, Carmela Gross repete esse ciclo. A cada vez, uma nova erupção, uma nova silhueta, uma nova densidade do pigmento. Cada uma não é necessariamente melhor ou pior que a anterior. Com o acúmulo do fazer, entretanto, o movimento se desvencilha da tendência ao triângulo escaleno, adquirida no desenho repetido dos vulcões. A mancha se torna mais e mais uma mancha, conforme a artista insiste em seu labor. De tanto ser mancha, entretanto, torna-se também pedregulho, meteorito, buraco, tumor”, escreveu Paulo Miyada.

Agora, Carmela Gross apresenta integralmente as monotipias da série. A obra evoca o desabafo e a crítica social feroz do poeta baiano Gregório de Matos, conhecido como “Boca do Inferno”, no século XVII. Portanto, “Boca do Inferno” representa o produto de um processo poético de apreensão e elaboração, remetendo às ideias de vulcão, explosão e impacto, gerando uma verdadeira erupção visual.

“As obras de Carmela Gross parecem ser um exercício premonitório dos tristes acontecimentos recentes em nossa região. Vulcões, em vez das águas que também nos trouxeram destruição, como um retrato em negativo”, destaca Emilio Kalil, diretor-superintendente da Fundação Iberê Camargo, que precisou rever o cronograma de exposições devido à tragédia climática no Rio Grande do Sul: “Boca do Inferno” estava prevista para início de junho, mas Porto Alegre ainda não estava pronta para abrir algumas de suas instituições, nem mesmo para receber visitantes. Tudo havia sido tomado pelas águas, como uma lava”.

A exposição ocupará o terceiro andar da Fundação Iberê Camargo até o dia 17 de novembro.