Obras recentes e inéditas de Luiz Zerbini.

04/set

Celebrando a mudança de nome da galeria, a Maneco Müller | Mul.ti.plo, Leblon, Rio de Janeiro, RJ, abriu uma exibição individual com a produção mais recente de Luiz Zerbini, que acaba de apresentar no CCBB Rio uma grande mostra retrospectiva, atraindo mais de 70 mil visitantes. A exposição “Pedra, metal e madeira” reúne cerca de 20 obras recentes do artista, entre gravuras em metal, litogravuras e monotipias, sendo a maioria inédita. Quem assina o texto crítico é Fred Coelho. A mostra, que vai até 1º de novembro, inclui o lançamento de um livro de grandes dimensões, impresso manualmente, a ser apresentado na ArtRio. A mudança de nome da galeria simboliza a sociedade entre Maneco Müller e Stella Ramos na Mul.ti.plo, desde 2018.

Atravessando seus quase 50 anos de produção, a poética de Luiz Zerbini destaca-se por uma voluptuosa e desconcertante paisagística, combinando vegetação, ambientes urbanos, fabulação, memória e alegorias. A recente produção em monotipia e gravura em metal do artista é fruto do encontro dele com o Estúdio Baren, criado pelo editor e impressor carioca João Sánchez. Há quase uma década, Zerbini e João pesquisam diversas formas de imprimir monotipias, misturando técnicas e materiais, papéis, matrizes e pigmentos. Mais recentemente, o artista carioca Gpeto passou a colaborar também com o Estúdio Baren, juntando-se à produção de monotipias de João Sánchez e Luiz Zerbini.

O destaque da mostra na galeria são as gravuras em metal inéditas nas quais Luiz Zerbini se debruça sobre uma das mais tradicionais técnicas de impressão artesanal do mundo. Há cerca de cinco anos, Zerbini vem se dedicando a experimentações nesse campo graças à proximidade com o Estúdio Baren. A Maneco Müller | Mul.ti.plo surgiu como espaço natural da mostra dessa produção por conta da parceria da galeria com o Estúdio Baren e a amizade de longa data tanto com Luiz Zerbini quanto com João Sánchez.

Na mostra estão cinco obras em água-forte e água-tinta sobre papel de algodão em preto e branco, com edição limitada de 30 exemplares, no formato de 78 X 53 cm. “Num momento de enorme sucesso da sua carreira, Zerbini expande-se por outra frente, com a possibilidade de escapar da demanda permanente da pintura. Nas gravuras em metal, ele está podendo repensar as imagens de suas telas, oferecendo a elas novas dinâmicas, novas camadas, novas possibilidades. Isso leva a um outro caminho de debate sobre sua obra. A oportunidade de se desafiar, de se arriscar, experimentar, traz um incrível frescor e força aos novos trabalhos”, explica Fred Coelho. Os desenhos de Zerbini, feitos a ponta-seca e buril sobre a superfície do metal, revelam-se no papel com uma incrível sutileza de tons e força da forma. “Aqui o tempo da impressão é outro. O processo em metal é trabalhoso, lento, complexo. Exige muita dedicação. É coisa de um mundo que não existe mais. Sempre tive vontade de me dedicar a isso, mas nunca tive chance. Agora com o João Sánchez encontramos esse caminho”, revela Luiz Zerbini.

Já as 12 monotipias são exemplares únicos, com dimensões de 107 x 80 cm, impressas em papel de algodão. Tirando as obras apresentadas na exposição MASP em 2022, incluindo quatro originais utilizados para ilustrar a edição do livro “Macunaíma, o herói do Brasil”, de Mário de Andrade (Editora Ubu, 2017), e outra sobre a Guerra de Canudos, a coleção de monotipias reunida é inédita. Mais do que representações de vegetação, nas monotipias de Luiz Zerbini são as próprias plantas e objetos entintados que são colocados na prensa, imprimindo e dando relevo com sua textura ao papel. “Quando descobri a possibilidade de utilizar as folhas como matriz, fiquei muito interessado. A partir daí começamos a experimentar outros materiais. Fomos fazendo uma pesquisa enorme”, comenta o artista sobre a parceria com o Estúdio Baren.

Pancetti na Casa Fiat de Cultura

O público brasileiro conhecerá uma das últimas obras de Pancetti – inacabada -, além de documentário inédito e instalação imersiva com experiência poética. O mar sempre provocou fascínio nos homens. Os mistérios escondidos nas águas salgadas atraem, há séculos, o olhar de exploradores, pesquisadores, estudiosos, e de artistas. No Brasil, José Pancetti retratou como ninguém o beijo entre o mar e a areia. Sua poesia e delicada sobriedade serão reveladas na primeira exposição do artista em Belo Horizonte, MG, com pinturas de marinhas, paisagens, retratos e naturezas-mortas. “Pancetti na Casa Fiat de Cultura: o mar quando quebra na praia…”, que fica em cartaz até 17 de novembro.

A exposição tem curadoria de Denise Mattar e apresenta um conjunto de 46 trabalhos realizados entre 1936 e 1956, alguns deles nunca antes exibidos para o público, além de uma cronologia ilustrada e uma instalação imersiva, que reúne músicas de Dorival Caymmi, imagens e sons do mar. Também será apresentado um documentário inédito, produzido por Ula Pancetti, neta do artista. Na abertura ocorreu um bate-papo com a curadora Denise Mattar e Ula Pancetti. Toda a programação da Casa Fiat de Cultura é gratuita.

Entre as obras, o público poderá apreciar “Auto-vida” (1945), autorretrato emblemático de Pancetti, em que o artista mescla realidade, imaginação e ironia; “Retrato de Francisco” (1945), que mostra um menino negro tendo ao fundo a paisagem de um morro de São João del-Rei, cidade onde o artista viveu uma temporada; “O Chão” (1941), obra que deu ao artista o Prêmio de Viagem ao Exterior do Salão de Belas Artes; “Praça Clóvis Bevilacqua” (1949), obra pintada das janelas do Palacete Santa Helena, local onde dividiam o ateliê os artistas Volpi, Rebolo, Mário Zanini, Manoel Martins, entre outros; “Floresta, Campos do Jordão, SP” (1944), cidade onde o artista passou algumas temporadas para tratamentos de saúde e que é frequente em sua obra; “Pescadores” (1956), obra incomum na produção de Pancetti, que retrata a pesca do xaréu, em Salvador; “Lagoa do Abaeté” (1952), obra que retrata o encanto do artista pela cor das águas, da areia e dos panos das lavadeiras; “Paisagem de Itapuã” (1953), obra emblemática de Pancetti, que deu início à Coleção Gilberto Chateaubriand, uma das mais importantes do país; “Coqueiros de Itapuã” (1956), obra da última fase da pintura de Pancetti, momento em que o artista alcança uma plenitude criativa; além de “Composição – Bahia Interior o meu atelier, Itapoan” (1957), obra inacabada, que pertence à família do artista e é inédita para público. As obras provêm de coleções privadas de instituições do Brasil: Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, Museu Nacional de Belas Artes, Museu de Arte Moderna de São Paulo e Museu de Arte Brasileira da FAAP.   

As marinhas são a sua faceta mais conhecida, mas ele também pintava naturezas-mortas, paisagens e retratos, em obras singulares e muito poéticas. Para o presidente da Casa Fiat de Cultura, Massimo Cavallo, a paixão do pintor inspira a instituição a oferecer essa mostra. “A galeria da Casa Fiat de Cultura ganha a leveza, a profundidade e a brisa do mar que sempre estão presentes nas obras de Pancetti. Para sentir, basta contemplar.”

Filho de imigrantes italianos, José Pancetti foi pintor, escultor, desenhista e gravador.  Também foi pintor de paredes e militar da Marinha Brasileira – ofício que influenciou fortemente a sua obra e a relação com o mar. Nasceu em Campinas (SP), mas logo cedo se mudou para São Paulo. Seu pai era pedreiro, mestre-de-obras e músico e a mãe era camponesa. Por causa das dificuldades financeiras, foi enviado à Itália, ainda jovem, onde ingressou na Marinha Mercante. A infância difícil e as privações da adolescência deixaram marcas profundas na personalidade e na saúde de Pancetti, assim, o ingresso na Marinha Brasileira foi um alívio para as suas atribulações. O pintor teve seu talento descoberto na Marinha. Começou pintando um camarote e logo passou a pintar postais e tampas de caixas de charutos. A partir daí, seu interesse pela pintura se intensificou e chegou a estudar por um curto período no Núcleo Bernardelli (Rio de Janeiro), um ateliê livre que tinha orientadores em vez de professores.

A curadora da mostra, Denise Mattar, destaca que Pancetti sempre foi um pintor original e intensamente pessoal. “Seu temperamento solitário e a formação quase autodidata permitiram o surgimento de uma obra particular plena de lirismo, melancolia e poesia – uma obra que emociona. Sem estar preocupado com uma brasilidade teórica, Pancetti retratou amorosamente a nossa gente, a nossa luz e o nosso mar.”

A exposição “Pancetti na Casa Fiat de Cultura: o mar quando quebra na praia…” é uma realização da Casa Fiat de Cultura e do Ministério da Cultura, por meio da Lei Federal de Incentivo à Cultura. Conta com o patrocínio da Fiat, copatrocínio da Stellantis Financiamento, do Banco Stellantis, do Banco Safra, da Usiminas e da Sada. O evento tem apoio institucional do Circuito Liberdade, além do apoio do Governo de Minas e do Programa Amigos da Casa.

Dois artistas amigos

Em comemoração aos dez anos de seu espaço no Rio de Janeiro, Nara Roesler traz à cidade dois renomados artistas internacionais, e amigos de longa data: o suíço Not Vital (1948), escultor, pintor e desenhista, e o inglês Richard Long (1945), um dos pioneiros da land art – obras de arte criadas com elementos da natureza e integradas a ela. A abertura da exposição “Mães”, com trabalhos dos dois artistas, será no dia 10 de setembro, às 18h. A exposição permanecerá em cartaz até 26 de outubro.

Richard Long, único artista a ter sido finalista quatro vezes do Turner Prize, que venceu em 1989, foi eleito em 2001 para a Real Academia de Artes da Inglaterra, e nomeado “Sir”. Ele fará uma instalação criada especialmente para a exposição, com elementos encontrados na cidade. Richard Long costuma usar pedaços de madeira e pedras, em seus trabalhos. Ele e Not Vital têm em comum um espírito nômade, embora sempre ligados às suas raízes familiares. A mãe de Richard Long, Frances, oriunda de uma família de Bristol, Inglaterra, nasceu no Rio de Janeiro, em função do trabalho de seu pai para a fabricante de carros Hispano-Suiza. Richard Long também admirava muito a mãe de Not Vital, Maria, com quem convivia nas visitas ao amigo em sua casa em Sent, no vale Engadine, leste da Suíça. Quando ela fez cem anos, em 2016, Richard Long dedicou a ela uma nova edição de sua célebre série iniciada em 1971, “A Hundred Mile Walk” – uma caminhada de cem milhas, quase 161 quilômetros – e percorreu a distância entre Stonehenge e a nascente do Tâmisa.

“Sou um escultor que pinta”, salienta Not Vital, que desde 2008 pinta retratos, e mais tarde o que chama de “autorretratos”, em que “das muitas aplicações e remoções das camadas de tinta emerge uma imagem”. “Às vezes preciso me pintar três vezes, ou duas, ou apenas uma, porque a cada dia nos vemos de maneira diferente”. Ele explica que inicialmente fazia um rosto “com olhos e cabelo”, mas que depois percebeu que “bastava ter um nariz”. “Quero chegar com essas pinturas a um momento de sentimento. Elas não têm a ver com formas ou cores, e sim muito com as emoções”. “É muito importante o que está em volta, o que alguns chamam de aura”, diz.

Autor de grandes esculturas colocadas ao ar livre, espalhadas pelo mundo, Not Vital também gosta de criar em formatos menores, em vários materiais, como aço ou gesso. “Gosto muito de gesso, pois é o que mais se assemelha à neve. Tenho que trabalhar rápido, porque endurece muito rapidamente”, diz. Uma das esculturas em gesso é “Pão de Açúcar” (2022). “É claro que se você é das montanhas, você sempre está interessado nelas”, afirma Not Vital.

Not Vital é notabilizado também por ter expandido a escultura em direção à arquitetura com a criação de suas “casas-esculturas”. Ele cunhou o termo Scarch, a junção, em inglês, das palavras “escultura” e “arquitetura”, para definir obras construídas ao redor do mundo, com material disponível no local. No Brasil, Not Vital fez exposições individuais no Paço Imperial, Rio de Janeiro, em 2015 – a primeira na América do Sul -, “Saudade”, de novembro de 2018 a março de 2019, e “A vida é um detalhe”, de novembro de 2022 a fevereiro de 2023, ambas na Nara Roesler São Paulo. Ele participou das coletivas “Aberto/01”, na Casa Oscar Niemeyer, em São Paulo, em 2022, “Ar livre: esculturas de grande escala na Fazenda Boa Vista”, entre julho de 2020 a fevereiro de 2021, e “Roesler Hotel #29: Reflectionson Time and Space”, com curadoria de Agnaldo Farias, de 1º de abril a 11 de maio de 2019, na Nara Roesler São Paulo.

Richard Long é descrito no site da Tate, prestigiosa instituição de arte da Inglaterra, como o tendo expandido a ideia de escultura, de modo a integrar a arte conceitual e a performance. Na inauguração da Tate Modern, em Londres, em 2000, a obra “Red Slate Circle”, de Richard Long, uma escultura circular com rochas e limo, esteve na mesma sala que uma grande pintura da série “Water Lilie”, de Claude Monet (1940-1926). Ao invés de se sentir “cooptado” pelo sistema de arte, com as honrarias recebidas, ele disse ao jornal “The Guardian” que achava bom ter “alguém como ele para dar credibilidade” aos conselhos britânicos e de arte. “Estou fazendo um favor a eles”, brincou.

Paisagens de Cris Ioschpe

03/set

A Ocre Galeria, Cidade Baixa, Porto Alegre, RS,  convida para a abertura da exposição “Quietude”, de Cris Ioschpe, com curadoria de Maria Alice Milliet e participação especial do artista plástico Walmor Corrêa. A inauguração ocorrerá no dia 05 de setembro, marcando o início de um período de visitação que se estenderá até o dia 01 de outubro. Além disso, no dia 06 de setembro, às 18h30, haverá uma conversa com os artistas Cris Ioschpe e Walmor Corrêa, mediada por Paula Ramos.

O texto da curadora Maria Alice Milliet para a exposição “Quietude” de Cris Ioschpe destaca a profundidade emocional e o contexto pessoal e geográfico que influenciam as obras da artista. As paisagens retratadas nas obras remetem às dunas e banhados do Taim, uma reserva ecológica no Rio Grande do Sul, e ao litoral norte de São Paulo. A curadora observa que a natureza apresenta-se como referência primordial, como resíduo arcaico de um tempo mítico. As obras emergem de um processo lento e maduro, onde não há pressa nesse trabalho, apenas expectativa do que está por vir. O movimento suave do pincel cria ondulações que evocam montanhas, banhados, ilhas e baías de águas calmas, revelando a dualidade entre as séries “Taim” e “Serra do Mar”. Maria Alice Milliet também explora a evolução artística de Cris Ioschpe, que iniciou sua trajetória na gravura e depois se aprofundou na pintura. Ela destaca a importância do aprendizado da artista com Maria Tomaselli e Iberê Camargo, e menciona sua aproximação com Paulo Pasta nos últimos anos. A curadora pontua que Cris Ioschpe chegou a uma pintura singular, num contexto onde a pintura de paisagens, embora tradicionalmente vista como menor, continua a atrair artistas contemporâneos.

Em suas obras, Cris Ioschpe evolui das naturezas-mortas para as paisagens. Na série “Taim”, ela constrói com gestos e pinceladas generosas o que pode ser lido como montanhas baixas e alagados, utilizando uma paleta de azuis, roxos e verdes que reforçam a continuidade da paisagem para além do quadro. Já na série “Serra do Mar”, a artista adota uma abordagem pictórica mais incisiva, com contornos definidos e um cromatismo menos sombrio. A pintura aproxima-se do desenho, à medida que os limites entre céu, terra e mar tornam-se mais nítidos, sublinha a curadora.

Por fim, Maria Alice Milliet conclui que, em ambas as séries, o foco não está na identificação precisa do local, mas naquilo que a paisagem transmite: na quietude da observação, a natureza inspira o artista e, na contemplação da pintura, ela nos toca.

Sobre a artista

Cris Ioschpe, nascida em Porto Alegre em 1967, é uma artista plástica que vive e trabalha em São Paulo desde o ano 2000. Formada em Artes Plásticas pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul em 1992, desenvolveu sua prática artística inicialmente estudando pintura e gravura com mestres como Maria Tomaselli, Anico Herskovits, Paulo Pasta, e Claudio Mubarac. Na década de 1990, expandiu sua formação vivendo em Buenos Aires onde trabalhou no Museo del Grabado e em Porto Alegre na Fundação Iberê Camargo, colaborando com Eduardo Haesbaert. Com seu ateliê em São Paulo, continuou a se aperfeiçoar sob a orientação de Evandro Carlos Jardim e Ernesto Bonato, e participou de diversos projetos de gravura, incluindo o “Projeto Lambe-lambe”. Além de coordenar workshops de gravura no SESC Pompeia e oficinas na Chapel School, desde 2013 frequenta o curso de Paulo Pasta no Instituto Tomie Ohtake. A artista possui um extenso currículo de exibições individuais e coletivas, destacando-se “Passos que imaginei” na Galeria Gravura, em Porto Alegre, RS, no ano 2000, “Funil” na Galeria Bolsa de Arte de Porto Alegre em 2004  e “da gravura e além” na Galeria Arteedições em 2017 em São Paulo. Suas obras integram coleções públicas em instituições de prestígio, como a Bibliotheca Alexandrina, o Museo del Grabado em Buenos Aires, e diversos museus no Brasil, incluindo o Museu de Arte Contemporânea do Rio Grande do Sul e o Museu Nacional de Belas Artes, Rio de Janeiro, RJ.

Sapos, lagartixas, jacarés, ratos e cobras de borracha.

A artista Lia Menna Barreto exibe na OCRE Galeria, Cidade Baixa, Porto Alegre, RS, uma exuberante instalação composta de bichos de plásticos.

A incessante fábrica de Lia Menna Barreto

Tapetes de jacaré, bobinas de sapo, pizzas de lagartixa. Produtos variados: vende-se a metro ou a granel, no varejo ou no atacado. Há 21 anos, a fábrica de Lia Menna Barreto segue funcionando incessantemente, nunca parou. Lia se insere na esteira diversa da ousada Geração 80 da arte brasileira. Propondo experimentações de materiais e linguagens possíveis à criação artística, coube a essa turma de jovens artistas reinventar modos de pensar e fazer em arte, subvertendo formas de pintar, gravar, desenhar e esculpir, ampliando-se para uma cartela infinita de meios e procedimentos. Em Fabricados, a artista apresenta parte da coleção de produtos derivada da instalação in situ Fábrica, obra emblemática da 4ª. Bienal do Mercosul (Porto Alegre/Brasil, 2003). Na proposição, instalou uma sala de produção no meio do Armazém A5 do Cais do Porto. Quadrado, com divisórias de PVC e vidro, o chão de fábrica mantinha um regime de produção onde nós, operários-assistentes, produzíamos, em série, dezenas, senão centenas, de objetos modulares, a partir de bichinhos de brinquedo. Para a realização das tarefas do dia, repetindo uma técnica de prensagem criada pela artista utilizando ferros de passar roupa, água e papel manteiga, montávamos objetos de aparência estranhamente familiar a partir da manipulação de sapos, lagartixas, jacarés, ratos e cobras de borracha, famosos itens de preço barato das saudosas lojas de 1,99 ou made in China. Construíamos tapetes, mandalas, estrelas, flores, bolos e pizzas. Na ocasião, a obra viva exibia ao público, do horário de abertura ao encerramento de suas operações fabris, o pensamento de uma artista inquieta, revelado no labor e na fantasia do processo criativo. Temporária e efêmera, a fábrica se apresentava como um trabalho continuamente inacabado e, ao mesmo tempo, múltiplo em si. Nenhum dia era o mesmo dia na linha de produção pois, a cada 24 horas, acontecia de um jeito diferente, revelando-se como uma obra de difícil apreensão. Não diferente, a mostra que se apresenta hoje, continua fugindo da obviedade. Na esperança de encontrarmos obras docilizadas no ambiente da galeria, a montagem e a exibição das peças subvertem a lógica de exposição e atualizam as regras de apreciação e consumo de obras de arte. Os fabricados de Lia voltam ao circuito como produtos, vendidos a metro ou em peças únicas, separados ou combinados, grandes ou pequenos, ao gosto do freguês. Um tanto irônico, a artista nos apresenta mais um desdobramento de sua constante, irreverente e espetacular produção. Com 40 anos de carreira, a produção da artista atualiza o repertório singular de conceitos operatórios que traz em sua caixa de ferramentas: derreter, grudar, misturar e prensar ampliam-se para cortar, medir, negociar e outros tantos verbos de ação que seu trabalho demande inventar. Revela, portanto, que há sempre uma surpresa no caminho a surgir, que reconfigura continuamente as rotas do trabalho da artista. Pois, mesmo no ato insistente de uma comprometida e incessante produção, sempre abre-se espaço para o desvio. Surpresas do processo: o começo de uma nova linha de produção.

Sandro Ka/artista visual, professor e pesquisador (EBA/UFMG), ex-operário-assistente da Fábrica.

Marcos Scorzelli apresenta megaescuturas coloridas.

Está em cartaz a exposição “Megabichos – Matemática Poética, Geometria Selvagem”, do designer e artista plástico Marcos Scorzelli, na CAIXA Cultural Fortaleza, Praia de Iracema, CE. Com curadoria de Guto Nobre, a mostra conta com 14 megaesculturas coloridas, produzidas em chapas de aço, todas expostas nos jardins do equipamento cultural. Com patrocínio da CAIXA e do Governo Federal, a mostra poderá ser visitada até o dia 03 de novembro, com acesso gratuito.   

Durante o período da exposição, o público de todas as idades poderá ver e interagir com a girafa de três metros de altura, cavalo, touro, beija-flor, ema, polvo e outros bichos. São obras que retratam uma selva vibrante em formas tridimensionais, nascidas a partir de figuras bidimensionais planas como triângulo, círculo e quadrado. A ideia é provocar surpresa para o olhar que desperta a criança dentro de cada espectador.

As obras evocam a infância e as memórias da convivência familiar do artista. Isso porque Marcos Scorzelli reinterpretou as antigas criações de papel que fazia junto com seu pai, Roberto Scorzelli, também artista plástico, transformando-as agora em megaesculturas. Originalmente, essas peças eram feitas com cortes e dobras precisas, sem desperdício de material – uma prática que perdurou ao longo do tempo, fortalecendo o vínculo entre pai e filho. Com Marcos, essa tradição foi renovada sob uma nova perspectiva.

“A exposição é uma matemática mágica e divertida, com imensa força educativa. A aparente simplicidade da transformação de uma forma geométrica plana em um volume espacial, criando figuras de bichos coloridos, dinâmicos e cheios de personalidade, faz sonhar e vai, certamente, encantar toda a família”, destaca Scorzelli.

Sobre o artista

Carioca, formado em design pela PUC Rio, Marcos Scorzelli começou a carreira inovando em projetos arquitetônicos, trabalhando como designer de interiores corporativos e desenvolvendo soluções cenográficas diferenciadas. Em 1993, criou com seu pai a Scorzelli Arquitetura e Design, que já recebeu prêmios por projetos desenvolvidos para empresas. Fotógrafo amador, é apaixonado pelo Rio e desenvolveu sua linguagem vivenciando a natureza exuberante da cidade maravilhosa.

As pinturas de Heitor dos Prazeres em NY

02/set

A Galatea e a Simões de Assis participam da feira Independent 20th Century, que ocorre esta semana em Nova York, com o estande solo do artista Heitor dos Prazeres (Rio de Janeiro, 1898 – 1966, Rio de Janeiro).

Heitor foi um artista multidisclipinar, pioneiro na formação do samba carioca e autoditada na pintura, prática que iniciou em 1937, aos 40 anos. Suas pinturas exploram temas relacionados à cultura popular brasileira, retratando e celebrando as tradições e o cotidiano da população negra urbana do Rio de Janeiro.

Recentemente, em 2023, o Centro Cultural Banco do Brasil no Rio de Janeiro (CCBB RJ) realizou a maior retrospectiva já dedicada ao seu trabalho, exibindo mais de 200 trabalhos vinculados às artes visuais, à música e à moda. Suas pinturas fazem parte de diversas coleções públicas, tais como: Museum of Modern Art (Nova York); Rennie Museum (Vancouver); Museu de Arte de São Paulo – MASP (São Paulo); Museu Afro Brasil (São Paulo); entre outros.

Exposição e conversa com curadores

30/ago

A Danielian Galeria, Gávea, Rio de Janeiro, RJ, e Fernando Barrozo do Amaral convidam para uma visita guiada seguida de conversa sobre a exposição “Harmonias” no dia 31 de agosto de 2024, às 15h. A mostra é dedicada à obra da artista e marchande Marcia Barrozo do Amaral (1943-2023), que faz parte do conjunto de exposições individuais “Ocupação Mulherio”. A conversa será entre os curadores Viviane Matesco e Rafael Fortes Peixoto, e Viviane Aguiar, que foi assistente da Marcia Barrozo do Amaral por muitos anos. “Harmonias” ocupa o Pavilhão II, espaço com 200 metros quadrados, no segundo andar da construção anexa, com 37 obras – entre pinturas e esculturas em aglomerado de madeira e acrílico – de Marcia Barrozo do Amaral.

“Ocupação Mulherio” é a segunda edição do programa dedicado a mulheres artistas em um formato distinto, com mostras individuais de Nadia Taquary, Nelly Gutmacher, Niura Bellavinha, Sônia Menna Barreto e uma sala especial dedicada à obra da artista e marchande Marcia Barrozo do Amaral, com curadoria de Marcus de Lontra Costa, Viviane Matesco e Rafael Fortes Peixoto, e fica em cartaz até 5 de outubro. “A trajetória artística de Marcia Barrozo do Amaral revela, em meio aos desdobramentos geométricos dos anos 1970 e os cromatismos extravagantes do pop, uma pesquisa das relações entre as cores e os volumes”, escrevem os curadores no texto que acompanha a mostra. “Marcia desenvolveu uma produção com destaque no nosso cenário artístico entre os anos 1960 e 1980, a partir de uma formação sólida, da realização de diversas exposições individuais e da participação em coletivas tanto no Brasil como no exterior. Seus trabalhos privilegiam a geometria no tensionamento e na quebra da bidimensionalidade da pintura. A cor guia um processo de experimentação que assimila diferentes materiais, como o acrílico, e transforma os trabalhos em híbridos entre a pintura e a escultura. A partir de jogos e articulações de fendas, faixas e linhas que buscam o espaço, as investigações de Marcia Barrozo se aproximam tanto de uma tradição neoconcreta brasileira, com Oiticica, Clark, Barsotti e Willis de Castro como também estabelecem diálogos com artistas americanas como Ellsworth Kelly”, afirmam. Em meados dos anos 1980 ela decidiu se dedicar à atividade de marchande, o que eclipsou sua produção artística, que agora ganha visibilidade e destaque na mostra “Harmonias”.

Ocupação Mulherio

O trio curatorial destaca que “Ocupação Mulherio” não parte “de uma premissa ou de um enlace temático, mas tem como principal objetivo demonstrar a importância da trajetória destas mulheres para o ambiente cultural brasileiro, assim como a força e poesia de suas expressões”. “Sem categorizações ou classificações, “Ocupação Mulherio” reafirma “espaços e conquistas, mostrando que a arte representa o poder essencial feminino de criar e acima de tudo, transformar”, afirmam. Marcus de Lontra Costa, Viviane Matesco e Rafael Fortes Peixoto assinalam ainda que “os títulos que diferenciam cada mostra são insinuações para que os visitantes possam conhecer e criar relações sensíveis com as obras expostas”. O título da “Ocupação” tem inspiração no jornal “Mulherio”, que circulou entre 1981 e 1988, e teve um relevante papel dentro do movimento feminista brasileiro, e surgiu como desdobramento dos estudos sobre a condição feminina no Brasil, tendo contado com a participação de mulheres como Lisette Lagnado, Inês Castilho, Lélia Gonzalez, Adélia Borges, Maria Rita Kehl, Ruth Cardoso, Carmen da Silva e Heloisa Teixeira (ex-Buarque de Hollanda) em suas 40 edições. Acompanha a exposição uma publicação em formato de 14cm x 10cm, em papel rosa,  com os textos dos curadores sobre cada uma das mostras.

Exposição de Montez Magno na Galatea

29/ago

A Galatea tem o prazer de anunciar Montez Magno: entre Morandi, Nordeste e Tantra, próxima exposição a abrir em São Paulo. A individual do artista Montez Magno (Timbaúba, PE, 1934 – 2023, Recife, PE) inaugura a nova unidade da galeria na Rua Padre João Manuel, além de também ocupar a sede da Rua Oscar Freire.

A mostra reúne cerca de 80 obras que dão a ver as variadas investigações de Montez Magno no campo da pintura e das operações conceituais. O título faz referência tanto a séries de trabalhos que farão parte da exposição quanto a três universos que compuseram o imaginário do artista. Há as pinturas que partem da admiração de Montez pelo pintor italiano Giorgio Morandi e que representam seu interesse por citar e comentar outros artistas da tradição europeia; há o Nordeste, referência ao seu contexto de vida e à série Barracas do Nordeste (1972-1993), baseada nas geometrias vernaculares; e, por fim, Tantra, referência a um conjunto de trabalhos que exploram com originalidade o universo da filosofia tântrica e os ensinamentos de matrizes de pensamento não ocidental.

A exposição conta com texto crítico assinado por Clarissa Diniz, curadora, pesquisadora e importante divulgadora do trabalho de Montez nos últimos anos. O texto integrará a brochura da mostra, em que será reeditado pela primeira vez o ensaio publicado por Montez Magno em 1978 sob o título de A forma popular construtivista e cujo pensamento é materializado na série Barracas do Nordeste.

Até 21 de setembro.

Exposição individual de Rafael Baron

Anita Schwartz Galeria de Arte, Gávea, Rio de Janeiro, RJ, convida para – dia 04 de setembro – a abertura da exposição “Meu lugar”, de Rafael Baron (1986, Nova Iguaçu). Pintor presente em várias coletivas, no exterior e no Brasil, como “Crônicas Cariocas” e “Funk”, no Museu de Arte do Rio (MAR), Rafael Baron faz agora uma grande individual que ocupará os dois andares expositivos da Anita Schwartz Galeria de Arte, com 21 trabalhos, recentes e inéditos, vários deles em grande formato. Com curadoria de Jean Carlos Azuos, curador assistente do MAR, a exposição apresenta a nova pesquisa do artista, que traz a paisagem para seu trabalho, tanto a rural como a íntima, com cenas de família. “Este lugar que o Baron nos aponta é dele e ao mesmo tempo um lugar de todos. Ele nos faz entender que está falando de pertencimento, dos vínculos, da dimensão forte deste chão, que é o lugar, mas também é a família”, observa o curador.

A exposição, a primeira do artista na Anita Schwartz, apresenta sua nova pesquisa, com a inserção da paisagem em seu trabalho. “Tem a paisagem íntima, do lar, e do entorno, em uma afirmação de pertencimento e de fruição da vida”, diz Rafael Baron. As pinturas, em óleo ou acrílica sobre tela – e muitas vezes os dois materiais – são de formatos variados: desde os grandes, com 3,5 metros de largura, aos médios, em torno de 1 metro, e ainda estão quatro guaches, com 40 cm x 30 centímetros. A pintura “Casa com piscina” (2024) traz aplicados nela dois pares de sandálias havaianas.

O artista vem de um período de exposições nos EUA nos últimos três anos – as individuais “Pose”, na galeria Albertz Benda, em Nova York, e “Rafael Baron: Portraits”, na mesma galeria, em Los Angeles, ambas em 2022; e no ano anterior “Wishyouwerehere”, no espaço The Cabin, em Los Angeles; e as coletivas “Rollwith It”, na galeria Scott Miller Projects, em Birmingham, no Alabama, e “Fragmented Bodies III”, na galeria Albertz Benda, em Nova York, também em 2021 – e, com trabalhos comissionados, nas coletivas “Crônicas Cariocas” e “Funk”, no Museu de Arte do Rio (MAR).

Em “Meu lugar”, Rafael Baron mergulha no universo de Nova Iguaçu, Baixada Fluminense, onde nasceu e trabalha, em que explora cenários nas paisagens rurais – “ora sozinhas, ora com personagens” – como nas pinturas “Primavera” (2023), “Casa de Campo” (2023), “Marapicu” (2024), “Tinguá” (2024), “Serra do Vulcão” (2024), “Casa de Vó” (2024), “Café, fumo e jornal” (2024) e “Pai e filho no parque” (2024).

“A função estruturante da família, o amor, o afeto, momentos de relaxamento no próprio lar” são cenários íntimos que Rafael Baron mostra na exposição. “É um convite para este lugar idílico”, afirma. “A vida não é só confronto, conflito”. As cenas de lar, de paz e alegria estão presentes nos trabalhos “Reunião de Família” (2024), “Dia das mães” (2024), “Fim de tarde” (2023), “Maurício” (2024), “Casa com piscina” (2024), “Primeiro ano” (2024), “Amor e afeto” (2024), “Lar” (2024), “André, Henrique e Leopoldo” (2024), “Mãe” (2024), “Recanto” (2024) e “Cosme e Lourdes” (2024). Jean Carlos Azuos destaca que “lar, afeto, amor, localidade são palavras muito fundamentais para Baron”.

Até 26 de outubro.