A artista paulistana Thais Beltrame, desde pequena, desprezava o lápis de cor e rabiscava compulsivamente os livros de sua mãe com uma caneta bic. Hoje, a artista emprega a sutileza meticulosa do nanquim e aquarela para revelar uma atmosfera peculiar e melancólica, questões existenciais universais representadas de forma ácida, porém extremamente delicada, recriando todo o brilho, escuridão e descobrimentos de uma infância, também com temas de ansiedade adulta e memórias. Seus desenhos, gravuras e instalações, referências de seu trabalho como ilustradora, trazem cenas de florestas, pequenas cidades ou ambientes domésticos, onde animais e pessoas parecem desempenhar um papel no desenrolar de uma história. Mas nos trabalhos da artista não há história precisa; os personagens parecem aguardar, em uma reflexão do que passou e em um momento de espera contemplativa por uma história que está por vir.
A ênfase em uma paleta de cores restrita, porém pensada, que permitem uma poesia única e minimalista, característica do trabalho de Thais Beltrame, ganha novas cores e formatos na mostra inédita que a artista apresenta na Galeria Movimento, Shopping Cassino Atlântico, Copacabana, Rio de Janeiro, RJ, com abertura marcada para o dia 31 de março. Pode-se dizer que a exposição “Primeiro as Florestas,” (assim mesmo, com uma vírgula no final) se coloca como um “antes e depois” na trajetória da artista. O fio condutor da mostra foi inspirado na experiência que Thais Beltrame passou no fim do ano passado na Hill House Residency, onde ela ficou por 15 dias sozinha em uma cabana na floresta, perto de East Jordan, Michigan. Tendo como companhia a natureza e os animais, que segundo a artista só apareceram mesmo no fim da viagem, Thais passou a usar muito mais as cores da aquarela nos trabalhos que estarão na mostra. Entre folhas e pinhos a artista, que levou consigo certas expectativas acerva de estar isolada no meio de uma floresta, teve a destruição desta idealização e percebeu que existe um grande abismo entre humanos e a natureza. O momento de imersão na floresta a levou aos desenhos de observação e experimentação com cores na aquarela. A série “amor fati” foi criada na floresta. Aceitar a vida pelo que ela é. Desenhou aquilo que via e que a rodeava, de certa forma um ambiente inóspito e hostil. Já as obras que contém dobras, sejam elas livros-sanfona, ou assemblages, foram criadas antes da experiência na floresta. São na sua maioria paisagens de montanha ou horizontes com a lua, que ironicamente não faziam parte da paisagem na qual ficou inserida. Tem também a terceira parte, os trabalhos feitos após a volta da floresta. Desenterrar a terra. São desenhos onde o vácuo está presente. Arrancar uma árvore é a única maneira pra se enxergar o céu.
A mostra que apresenta 30 trabalhos inéditos divide-se em antes, durante e depois de Hill House (Que tem como spot o papel, alguns sanfonados, ou em formato de livro de artista. A maioria pequenos, com 60 por 80 cm, alguns mais compridos, de 1m, uma enorme variedade). As sensações como expectativa, romantismo, observação, fragilidade e descobrimento tomam conta das obras que resultaram nesta exposição.
Dentro da estrutura de narrativa de cada trabalho, um vasto repertório de temas como amor, beleza, raiva e solitude são sutilmente introduzidos e elaborados, dando peso à aparência exterior de simplicidade. Atrelado às animais como cavalos, corvos e besouros, que preenchem sua paisagem artística, estas âncoras emocionais salientam a densa capacidade de Thais para contar histórias e conectar os personagens e a vida que eles carregam de um trabalho para o outro.
Sobre a artista
Formada em Artes Plásticas no Columbia College Chicago, a artista vive e trabalha em São Paulo, seus trabalhos já foram expostos em galerias e feiras de arte internacionais na Inglaterra, Estados Unidos e Brasil. Foi publicada uma matéria de doze páginas na revista americana Juxtapoz Arts & Culture sobre a artista. Thais foi convidada a criar uma instalação colaborativa na ilha de St. Barths, no Caribe, e teve seu trabalho selecionado pela Canson para representar o Brasil em um concurso para artistas que trabalham em papel, posteriormente exposto no Petit Palais, Paris, França.
De 31 de março a 30 de abril.