Livro de Fernando Limberger

07/mar

 

A palavra do artista

 

 

Agradeço ao Museu da Cidade SP, através de Marcus Cartum, Henrique Siqueira, Monica Caldiron e Gabriela Rios, à Automática Produtora, através de Luiza Mello, Marisa S. Mello e Mariana Schincariol de Mello, pela produção do catálogo da exposição RELICTO, realizada no Beco do Pinto e Casa da Imagem, em 2020 e 2021. Agradeço, também, ao Everton Ballardin pelas imagens, e aos Guilerme Wisnik, Ricardo José Francischetti Garcia e Marcelo Zocchio pelos textos, e, ainda, à Monique Shenkels pelo projeto gráfico. Estou muito feliz com a publicação. Lembro que o jardim Retomada permanece no quintal da Casa da Imagem até 2025. Venham observar o desenvolvimento das plantas sentados no banco especialmente criado por marcenaria quiari.

Livro

 

Apresentando ensaios de Guilherme Wisnik, Ricardo José Francischetti Garcia, Marcelo Zocchio e Everton Ballardin, o livro “Relicto” apresenta em textos e imagens a exposição homônima de Fernando Limberger realizada entre 2020 e 2021 na Casa da Imagem e no Beco do Pinto, São Paulo. Em um exercício arqueológico que proporciona o encontro do espectador com “relictos”, elementos remanescentes que resistiram a um processo de transformação ambiental, o artista tensiona a relação entre o crescimento urbano e o apagamento da história da cidade, destacando na paisagem vestígios que testemunham a permanência de um tempo anterior à configuração urbana atual de São Paulo. Conheça esse projeto e passeie pelas instalações “Cinzas”, “Verde Infinito” e “Retomada”, a partir desta publicação de distribuição gratuita editada pela Automatica.

Jorge Macchi na Luisa Strina

24/fev

 

 

Reunindo um conjunto de obras de Jorge Macchi, artista argentino, “A estatura da liberdade” fica em cartaz até 19 de março na Galeria Luisa Strina, São Paulo e busca uma experiência que subverta a lógica cotidiana e vá além do palavrório conceitual.

Sem direção definida e objetivo claro, uma pequena mala sobre rodas percorre sozinha a galeria. Colidindo com obras, paredes e visitantes, altera seu rumo a cada obstáculo – como um protozoário, que diante de um estímulo reage de forma primária, afastando-se ou aproximando-se. Trata-se de La estrategia de la ameba (A estratégia da ameba, em tradução livre), de Jorge Macchi. Para o artista argentino, a instalação permite, de forma grotesca e bem-humorada, que a aparente diversidade das peças expostas seja “ridiculamente homogeneizada” na mostra A estatura da liberdade, que entrou em cartaz no último dia 9 de fevereiro na Galeria Luisa Strina em São Paulo.

Os trabalhos, feitos em diferentes materiais e com características distintas, parecem reunidos como em um livro de contos, em que cada obra é independente. A maleta automatizada se apresenta como um “objeto voraz e obstinado, que circula criando relações sempre novas entre as peças”, aponta Macchi. Assim, ela corrobora com a intenção primeira do artista: “Que se perceba um rio subterrâneo que perpassa todos os objetos”, conectando-os de alguma forma.

Porém, talvez não seja possível dar nome a esse rio, colocar essa suposta unidade em palavras. “Geralmente, acham que um artista tem que explicar o seu trabalho, mas estamos falando em outra linguagem: a visual. Não é possível traduzir”, explica o argentino. Tal qual La estrategia de la ameba, percorremos a exposição, criando possíveis relações entre as obras e tentando compreendê-las a partir de sua linguagem primeira, ao invés de defini-las numa tentativa de tradução. “Os statements [essas descrições explicativas], tortura a que somos submetidos diariamente em todo o mundo, são tentativas inúteis de simplificar ao extremo a criação artística para torná-la mais acessível. Acho que são pílulas anti-ansiedade que acalmam o espectador, mas roubam a complexidade do evento artístico”, desabafa Macchi; e complementa: “Diante disso, digo que não há como determinar e delimitar a poética. Pode-se sentir que há algo, mesmo que não se possa colocar em palavras. Meu desejo é que o conjunto de obras que compõem esta exposição nos permita perceber aquele fio ou aquele rio que aparentemente não está ali”.

A estatu(r)a da liberdade

Caminhando pela galeria, nos deparamos com diversos objetos que podem aludir à realidade, mas que de alguma forma a alteram. A série Confésion (Confissão, em tradução livre) traz duas caixas de papelão, que antes armazenavam smart TVs e agora estão vazias, cujas superfícies apresentam padrões de cruz que remetem aos confessionários religiosos. Em Debajo de la mesa (Debaixo da mesa), seis mesas de madeira são conectadas por seus pés, criando um espaço central vazio – consequentemente, o título passa a se referir a uma posição que não existe, já que não há mais “debaixo da mesa”, mas sim o centro de um objeto escultórico. Todas las palabras del mundo (Todas as palavras do mundo) é uma parede sem tijolos, em que só resta o cimento que os mantinha unidos, e cuja forma remete ao formato de um teclado de computador.

Apesar da preferência de Jorge Macchi por não estabelecer uma relação rígida entre o título e a mostra, há nessas alterações do real uma relação. Como ele próprio destaca em entrevista à arte!brasileiros: “Há algo na criação deste título que me interessa: como a adição de uma única letra transforma um objeto (A Estátua da Liberdade) em um conceito (a estatura da liberdade). As obras partem da premissa de introduzir mudanças muito pequenas na realidade e, assim, perturbar a forma como a percebemos ou entendemos”. O artista também acredita que o título possa ser visto como uma referência distante a O Fantasma da Liberdade, do diretor de cinema Luis Buñuel. “O filme é uma sucessão de situações aparentemente independentes, caprichosamente ligadas por um personagem ou uma situação, e cujo resultado é um violento ataque à lógica cotidiana.”

Seguindo essa proposta, diversas das obras parecem suscitar as ideias de presença e ausência, permanência e efemeridade. Se na série Presente estruturas feitas de haste de aço reproduzem as dobras de um papel que em algum momento embrulhou uma caixa – que está ausente -, Acorde nos remete simultaneamente à permanência e a efemeridade, ao que reproduz um teclado de piano em que uma sequência de teclas pressionadas congelam o momento de execução de um acorde de sol menor, “cujo som já se desvaneceu, ou cujo som permanece e, justamente sua permanência o torna inaudível”, conforme explica o texto de apresentação da galeria.

No corredor ao fundo da galeria encontramos ainda uma série de aquarelas. Segundo Macchi, elas são o começo da criação artística. “Se uma imagem surge através de uma experiência urbana, ou de um simples desenho, ou de uma memória, a primeira coisa que penso é como ela pode se materializar.” As pinturas são a atitude mais imediata, a ideia diretamente transposta para o papel. Ao que o artista busca uma forma de melhor comunicar essas imagens e extrair suas maiores riquezas, muitas acabam por gerar outra peça, em um suporte diverso. “Se me prendesse a uma técnica ou a um material, deixaria de lado essa premissa”. Isso agrega certa heterogeneidade não só a essa exposição, mas a seu corpo de obras como um todo. “Em geral, não gosto de reconhecer um artista vendo apenas uma obra. Sou contra a ideia de estilo”, conclui Macchi.

 

Fonte: Giulia Garcia para Arte Brasileiros!

Volpi popular no MASP

23/fev

 

 

“Volpi popular” é a terceira de uma série de exposições que o MASP, Paulista, São Paulo, SP, organiza em torno de artistas modernistas brasileiros canônicos do século 20 que empregam referências populares ou vernaculares em seus trabalhos. Em 2016, o MASP organizou “Portinari popular” e, em 2019, “Tarsila popular”.

Alfredo Volpi nasceu em Luca, Itália, 1896 e faleceu em São Paulo, Brasil, 1988, é um artista central da arte brasileira do século 20 e sua pintura é caracterizada por um repertório único de experiências e influências que mesclam tradições modernas e populares, incluindo interesses como: o trabalho artesanal, as festas populares, os temas religiosos e as fachadas da arquitetura colonial e vernacular brasileira.

De família de origem trabalhadora, o artista migrou ainda criança para São Paulo e sua produção inicial era voltada para paisagens urbanas e rurais, distantes do estilo que marcaria sua obra. Na década de 1950, Volpi começou a sintetizar suas composições, tornando sua figuração cada vez mais geometrizada, com padrões, formas e temas recorrentes – como suas famosas bandeirinhas, mastros, faixas, fachadas e ogivas – que desenvolveu até o final de sua carreira.

Assim, a sua obra passou a ganhar as características formais que tanto o tornaram conhecido, com a sua pintura de espaços planificados, com campos cromáticos bem definidos, mas com contornos irregulares, marcados pelo uso sensível e sutil da cor, e pela textura áspera da sua têmpera.

Nesse sentido, a mostra de caráter panorâmico abrangerá diversos períodos da carreira do artista e contará com cerca de 100 pinturas. A exposição foi organizada em torno do contínuo interesse de Volpi pelos temas do imaginário popular brasileiro e estruturada em seções temáticas, como paisagens do campo e do mar; fachadas; bandeiras e mastros; representações religiosas; festas populares; e retratos.

Acompanhando a mostra, será publicado o mais amplo catálogo sobre o artista num único volume, com ilustrações de todas as obras exibidas e mais. O livro conta com textos escritos especialmente para a ocasião por Adele Nelson, Antonio Brasil Jr., Aracy Amaral, Kaira Cabañas, Nathaniel Wolfson, Sônia Salzstein e Tomás Toledo, uma nota biográfica escrita por Matheus de Andrade, e duas entrevistas históricas com o artista feitas por Mario Pedrosa e Walmir Ayala. A publicação em capa dura conta com design de Paulo Tinoco, do Estúdio Campo, duas edições separadas na língua portuguesa e inglesa, e distribuição internacional por meio de Karen Marta Editorial Consultant e Distributed Art Publishers, nos Estados Unidos.

A curadoria é de Adriano Pedrosa, diretor artístico do MASP e Tomás Toledo, curador-chefe, MASP.

Até 05 de junho.

Cores e formas de Abdias Nascimento

 

Artista, intelectual, ativista político, pintor, dramaturgo, ator, escritor e diretor, Abdias Nascimento (1914 – 2011), foi uma figura multifacetada e fundamental da história do Brasil e estará com mostra monográfica no MASP, Paulista, São Paulo, SP. Intitulada “Abdias Nascimento: um artista panamefricano”, trata-se de uma exposição fundamental em torno de sua produção artística e enfatiza sua contribuição para a pintura brasileira. A mostra reunirá cerca de 60 trabalhos de sua fase mais profícua – desde o início de sua produção em 1968 até o ano de 1998 – e enfatizará o repertório de ideias, cores e formas do movimento pan-africanista, com noções, fontes e imaginário latino-amefricano – como cunhou Lélia Gonzalez (1935 – 1994) para se referir à experiência negra na América Latina.

Em 1968, ano que marca o início de sua produção de pinturas e sua mudança para os Estados Unidos, Nascimento já era nome laureado no Brasil, tendo participado da formação da Frente Negra Brasileira, movimento e depois partido político da década de 1930; da fundação do Teatro Experimental do Negro, o TEN, uma das mais radicais experiências de dramaturgia do país, nos anos de 1940; realizado o concurso “Cristo de Cor”, com a participação de artistas diversos, como Djanira, para a representação de um Jesus negro, em 1955; e idealizado o Museu de Arte Negra, na década de 1960, cujo acervo é referência nos debates sobre museus e comunidades.

Seus trabalhos de artes visuais foram mais celebrados em solo estadunidense, onde realizou exposições no conceituado Studio Musem Harlem, em Nova York, no Fine Arts Museum, em Syracuse, e na Crypt Gallery (da Universidade de Columbia). No Brasil sua faceta artista ainda precisa ser afirmada – esta é também uma das razões para esta mostra e o catálogo que a acompanha.

A curadoria é de Amanda Carneiro, curadora assistente, MASP e Tomás Toledo, curador-chefe, MASP.

 

Até 05 de junho.

 

Raio-que-o-parta: ficções do moderno no Brasil

 

 

A exposição reflete sobre a noção de “arte moderna” no Brasil para além da década de 1920 e do protagonismo muitas vezes atribuído pela história da arte a São Paulo. Para tal, são reunidas obras de um arco temporal que vai do final do século XIX a meados do século XX, além da essencial presença de artistas que desenvolveram suas pesquisas em diversos estados brasileiros.

O título da exposição é inspirado em antigas casas de Belém do Pará, com fachadas elaboradas pela justaposição de azulejos quebrados, formando desenhos geométricos angulados e coloridos. Conhecido como “raio que o parta”, este estilo arquitetônico foi influenciado pelo modernismo nas artes plásticas, em uma busca por superação dos modelos neocolonial e eclético, vistos pela elite paraense como ultrapassados. O modismo deste novo estilo não se restringiu às elites locais, sendo logo apropriado por outras camadas da sociedade, que popularizaram a nova arquitetura pelos bairros de Belém do Pará, a partir da década de 1950.

Ao articular a noção de modernidade com o território brasileiro, a exposição “Raio-que-o-parta: ficções do moderno no Brasil” pretende repensar a centralidade desse evento que ficou marcado na escrita da história da arte no país, a partir de uma ampliação não apenas cronológica, mas também geográfica. Trata-se de um projeto que visa dar prosseguimento ao reconhecimento da importância do movimento modernista de São Paulo e, ao mesmo tempo, mostrar ao público que arte moderna já era discutida por muitos artistas, intelectuais e instituições de Norte a Sul do país, desde o final do século XIX, perdurando esse debate até o final da primeira metade do século XX.

A intenção da exposição é dar atenção aos diversos tipos de linguagens e formas de criar e compartilhar imagens nesse período. Para além das linguagens das belas-artes (desenho, pintura, escultura e arquitetura), o projeto traz exemplos importantes de fotografia, do cinema, das revistas ilustradas e de documentação de ações efêmeras, essenciais para ampliar a compreensão das muitas modernidades presentes no Brasil. O projeto surge a partir do trabalho de sete pesquisadores, dedicados a diferentes regiões do país, que têm larga experiência em discussões a respeito da arte moderna na interseção entre o local e o nacional. A partir dessas pesquisas, suas múltiplas vozes e interesses, a exposição será dividida em núcleos baseados em tópicos constantes a esse período histórico no Brasil, os quais serão apresentados ao público de forma didática. A intenção é levar ao público a certeza de que a noção de Arte Moderna, no Brasil, é tão diversa quanto as múltiplas culturas, sotaques e narrativas que compõem um país de dimensão continental.

A mostra integra o projeto Diversos 22, do Sesc São Paulo, que celebra o centenário da Semana de Arte Moderna e o bicentenário da Independência, refletindo criticamente sobre as diversas narrativas de construção e projeção de um Brasil, e traz cerca de 600 obras de 200 artistas, como Lídia Baís, Mestre Zumba, Genaro de Carvalho, Anita Malfatti, Tomie Ohtake, Raimundo Cela, Pagu, Alberto da Veiga Guignard, Rubem Valentim, Tarsila do Amaral, Mestre Vitalino, dentre outros.

Curadores: Aldrin Figueiredo, Clarissa Diniz, Divino Sobral, Marcelo Campos, Paula Ramos e Raphael Fonseca, curadoria-geral de Raphael Fonseca tendo como curadores-assistentes, Breno de Faria, Ludimilla Fonseca e Renato Menezes. Consultoria de Fernanda Pitta.

Curadoria de Artur Lescher

17/fev

Bernardo - Glogowski - Sublime Ordinário

A mostra intitulada “Sublime Ordinário” na CASANOVA, Jardim Paulista, São Paulo, SP, é uma coletiva proposta por Artur Lescher que reúne obras de 10 artistas que buscam o extraordinário em objetos e materiais comuns. Tecidos desfiados se tornam padrões geométricos, rebocos e retalhos de parede são expostos, livros se tornam motivos principais do debate artístico entre outros materiais familiares que são adequados de forma não natural à sua origem.

“Um aspecto importante da seleção dos trabalhos é que os artistas buscam a via de subtração. Eles retiram a matéria ao modo de um escultor, sublimando o que é comum”, menciona Lescher sobre sua curadoria. A exposição permanecerá em cartaz até o dia 19 de março, ocupando os dois andares da galeria.

Os artistas participantes são representados tanto pelas galerias integrantes do Espaço C.A.M.A. assim como artistas convidados pelo curador. São eles, Cao Guimarães, Bernardo Glogowski, Fábia Schnoor, Fernando Laszlo, Ignacio Gatica, Lucas Dupin, Manoela Medeiros, Marina Weffort, Martin Derner e Sofia Caesar.

 

Mestre Didi na Simões de Assis, SP

16/fev

 

 

A Simões de Assis apresenta, em parceria com Graham Steele, a individual “Mestre Didi: Panteão da Terra”, em seu espaço em São Paulo.

Mestre Didi, emergência mítica – olhar universal
Didi é um sacerdote-artista.
Expressa, através de criações estéticas, arraigada intimidade com seu universo existencial onde ancestralidade e visão de mundo africanas se fundem com sua experiência de vida baiana. Tradição e contemporaneidade, civilizações replantadas e recriadas. “Evoluir sem perder a essência”, nas suas próprias palavras. Completamente integrado com o universo nagô de origem iorubana, revela em sua obra sua inspiração mítica, formal, material. A linguagem nagô com a qual se expressa é um discurso sobre a experiência do sagrado.
Mestre Didi absorveu o significado das múltiplas relações do homem com seu meio ético, social e cósmico, assimilando esses valores e modos desde sua infância. Iniciado aos 8 anos de idade, conviveu com grandes mestres africanos e desenvolveu sua vida iniciática e gosto estético em bem-estruturadas comunidades nagôs.
Suas obras carregam a experiência, o hálito, a respiração dos mais antigos aos mais novos, de geração em geração. Condensando sua história pessoal e sua capacidade de transcender.
Didi veicula intencionalmente, para além de sua própria vida, a energia mítica de sua trajetória iniciática, inscrevendo-se na vertente mitológica das artes, projetando uma energia poética de caráter universal.
Esse aspecto de incorporar iniciaticamente, de transcender gerações e de expandi-las é fundamental para a compreensão da capacidade de retextualização dinâmica de seu fazer estético afro-brasileiro.
Suas obras têm o poder de tornar presente a linguagem abstrato-conceitual e emocional elaborada desde as origens pelos seus antecessores. Elas têm o poder de tornar presente os fatos passados, de restaurar e renovar a vida. Através de suas atividades e obras, Didi contribui para reconduzir e recriar todo o sistema cognitivo emocional comunitário, em relação tanto ao cosmos quanto à realidade humana.
Suas obras se inscrevem na vertente mitológica das artes, projetam uma energia poética de caráter universal. Extrapolam o tempo. Didi redimensiona sua existência de homem indivíduo inserindo-se na corrente da ancestralidade, nos constantes renascimentos perpetuados e cultuados no Panteão da Terra, lama genitora, terra molhada, fecundada.
Didi, o Assogba, sumo sacerdote do Panteon da Terra, executa objetos rituais desde sua infância e adolescência. O discurso manifesto de suas obras, constituído de formas, cores e matérias, transporta, latente, o eidos – o conhecimento vivido, a emoção, a afetividade, as elaborações profundas passadas e presentes, o conjunto de teofanias evocadas, restituindo e renovando criativamente os princípios e a linguagem de sua tradição.
Em um movimento de recriação simbólica, Didi transporta materiais e técnicas tradicionais para uma arte contemporânea, traduzindo um conhecimento mítico e universal do qual é herdeiro. Por isso seu trabalho é autêntico no sentido emocional, moral e visual, proporcionando uma profunda coerência formal a suas criações. O trabalho de Didi é tradicional e novo.
Discorrer sobre Didi e sua criatividade estética implica discorrer sobre a arte afro-brasileira, implica abrir um leque epistemológico sobre a tradição, o religare, a visão de mundo da qual ele emerge e faz parte indissoluvelmente. Sua trajetória e criação estética emergem e recompõem, na continuidade e na descontinuidade do Brasil, o conhecimento, o pensamento e as subjacências emocionais dos princípios inaugurais reelaborados desde épocas remotas; antes de serem formas de arte, são criações que se encarregam de significar as múltiplas relações do homem com seu meio cósmico, social e ético. O conjunto de atividades e produções de Mestre Didi contribuem para expressar e transmitir o conhecimento universal cósmico, teológico e tecnológico dos afro-brasileiros.
Discorrer sobre sua obra diz respeito não apenas ao sacerdote-artista Didi, mas implica visibilizar e discorrer sobre a cultura afro-brasileira que se manifesta e magnifica através de sua criatividade; significa abrir um leque de conhecimentos sobre a tradição, o religare, a espiritualidade, a visão de mundo, a capacidade de um povo de expressar sua origem e seu enorme potencial de diálogo; diálogo que compõe e contribui para a complexa pluralidade cultural brasileira.
Conscientizar a trajetória de Mestre Didi, Deoscoredes Maximiliano dos Santos, intelectual, sacerdote, transmissor cultural, recriador lúcido de uma arte mítica de estética contemporânea, Doutor Honoris Causa, entre inúmeros títulos e condecorações. Um afro-brasileiro de olhar universal.
As manifestações estéticas magnificando o sagrado permeiam a tradição afro-brasileira. As criações de Deoscoredes Maximiliano dos Santos, emergentes desse universo, enriquecem e singularizam o patrimônio nacional.
Juana Elbein dos Santos
1992 – Texto originalmente publicado no catálogo da exposição “O Alapini-Escultor da Ancestralidade Afro-Brasileira” em 2013 no Museu Afro Brasil, São Paulo, SP.

Karin Lambrecht na Galeria Nara Roesler

15/fev

 

 

A Nara Roesler anuncia a abertura de “Seasons of the Soul”, individual de Karin Lambrecht, com texto de David Anfam. A mostra, que inaugura o programa anual de exposições da galeria em São Paulo, apresenta uma seleção de cerca de vinte trabalhos da artista, entre pinturas e desenhos, desenvolvidos ao longo de 2021 e fica em exibição de 17 de fevereiro a 26 de março, na sede paulistana da galeria no Jardim Europa.

 

A produção recente de Karin Lambrecht é reveladora das transformações ocorridas em sua prática desde sua mudança de Porto Alegre para Broadstairs, na ilha de Thanet, no Reino Unido. As amplas superfícies de cor com as quais a artista reveste suas telas são reminiscências das impressões e sensações causadas pela paisagem local e suas especificidades de luz. Além da cor, outro elemento recorrente na prática da artista é a palavra. Em português, inglês, e, às vezes, em alemão, as palavras inscritas na tela, em muitos casos, dão título às obras. Esses, por sua vez, tanto podem evocar uma paisagem, como Lua Nova, Cliff (Penhasco), Cloud (Nuvem) e Céu, quanto uma esfera metafísica, como Ether, Cosmos e Pleasure (Prazer). Nesse sentido, o nome da mostra, Seasons of the Soul, ou estações do espírito, é indicativo desse entrelaçamento entre o mundo subjetivo e o natural do qual emergem os trabalhos de Lambrecht. As tonalidades terrosas e azuladas, típicas de sua pintura, são revisitadas em novos arranjos cromáticos e formais. Com uma luminosidade intensa, suas pinturas apresentam composições entre cores quentes e frias em um encontro harmônico de sutis gradações. Ao invés de contrastes marcados, nos deparamos com uma pintura matizada, menos matérica. Lambrecht ressalta, inclusive, que, agora, as tonalidades vermelhas têm menos relação com a terra, como em trabalhos anteriores, e muito mais a ver com o céu, já que uma das características que mais lhe chamou a atenção em Broadstairs é, justamente, a qualidade avermelhada que ele é capaz de adquirir ao fim do dia. Já em papéis tão delicados quanto tecidos de seda, a artista desenha com a linha de costura, criando formas, rasuras e palavras, enquanto, com um pincel, realiza delicadas manchas que maculam a brancura do suporte. Para a artista, esses trabalhos, de natureza mais meditativa, são um contraponto às pinturas, que permitem uma gestualidade mais expansiva e uma feitura mais rápida. “Seasons of the Soul” apresenta uma oportunidade de entrar em contato com a obra de Karin Lambrecht, através da qual a artista reafirma, em sua pintura, a constituição de uma linguagem singular e poética, voltada para as sublimes manifestações dos entrelaçamentos entre o espírito e a natureza. O texto de Anfam, por sua vez, escritor e curador especialista em pintura abstrata, em especial o expressionismo abstrato norte-americano, amplia as leituras críticas do trabalho da artista, de modo a compreender as especificidades de sua produção.

 

Sobre a artista

 

Toda a produção de Karin Lambrecht em pintura, desenho, gravura e escultura demonstra uma multifacetada preocupação com as relações entre arte e vida, compreendida em sentido abrangente: trata-se de vida natural, vida cultural e vida interior. Para o pesquisador Miguel Chaia, os processos técnico e intelectual de Lambrecht se inter-relacionam e se mantêm evidentes nas obras para criar uma “visualidade espalhada na superfície e direcionada para a exterioridade”. Seu trabalho é ação que funde corpo e pensamento, vida e finitude. Karin Lambrecht nasceu em 1957, em Porto Alegre, Brasil. Atualmente ela vive e trabalha em Broadstairs, Reino Unido. Algumas de suas exposições individuais incluem: Karin Lambrecht – Entre nós uma passagem, no Instituto Tomie Ohtake (ITO) (2018), em São Paulo, Brasil; Karin Lambrecht – Assim assim, no Oi Futuro (2017), no Rio de Janeiro, Brasil; Nem eu, nem tu: Nós, no Espaço Cultural Santander (2017), em Porto Alegre, Brasil; Pintura e desenho, no Instituto Ling (2015), em Porto Alegre, Brasil. Participou das 18ª, 19ª e 25ª edições da Bienal de São Paulo (1985, 1987 e 2002) e da 5ª Bienal do Mercosul, Porto Alegre (2005), todas no Brasil. Exposições coletivas de que participou nos últimos anos incluem: Alegria – A natureza-morta nas coleções MAM Rio, no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro (MAM Rio) (2019), no Rio de Janeiro, Brasil; Tempos sensíveis – Acervo MAC/PR, no Museu Oscar Niemeyer (MON) (2018), em Curitiba, Brasil; Clube da gravura: 30 anos, no Museu de Arte Moderna de São Paulo (MAM-SP) (2016), em São Paulo, Brasil; O espirito de cada época, no Instituto Figueiredo Ferraz (IFF) (2015), em Ribeirão Preto, Brasil. Sua obra está presente em importantes coleções institucionais como: Fundação Patrícia Phelps de Cisneros, Nova York, Estados Unidos; Ludwig Forum fur Internationale Kunst, Aachen, Alemanha; Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro (MAM Rio), Rio de Janeiro, Brasil; Pinacoteca do Estado de São Paulo, São Paulo, Brasil.

 

Sobre o curador

David Anfam é escritor, curador e especialista em arte moderna norte-americana. É curador e consultor sênior do Museu Clyfford Still, em Denver, Estados Unidos, onde é também diretor do Centro de Pesquisa. Suas publicações incluem: Abstract Expressionism (1990), o catálogo raisonné Mark Rothko: Works on Canvas (1998), que ganhou o prêmio Mitchell em 2000, bem como seus estudos sobre Anish Kapoor, Edward Kienholz e Wayne Thiebaud.

 

Sobre a Galeria Nara Roesler

Nara Roesler é uma das principais galerias brasileiras de arte contemporânea, representando artistas brasileiros e internacionais fundamentais que iniciaram suas carreiras na década de 1950, bem como artistas consolidados e emergentes cujas produções dialogam com as correntes apresentadas por essas figuras históricas. Fundada por Nara Roesler em 1989, a galeria tem consistentemente fomentado a prática curatorial, sem deixar de lado a mais elevada qualidade da produção artística apresentada.

 

Isso tem sido ativamente colocado em prática por meio de um programa de exposições criterioso, criado em estreita colaboração com seus artistas; a implantação e estímulo do Roesler Curatorial Project, plataforma de iniciativas curatoriais; assim como o contínuo apoio aos artistas em mostras para além dos espaços da galeria, trabalhando com instituições e curadores. Em 2012, a galeria ampliou sua sede em São Paulo; em 2014 expandiu para o Rio de Janeiro e, em 2015, inaugurou um espaço em Nova York, dando continuidade à sua missão de oferecer a melhor plataforma para seus artistas apresentarem seus trabalhos.

Renata Lucas na Gentil Carioca SP

14/fev

Renata - Lucas

A Gentil Carioca, em sua unidade Higienópolis, São Paulo, SP, apresenta “O Perde”, primeira individual de Renata Lucas no espaço da galeria na cidade. Se uma linha traçada no chão define um campo simbólico, ou de representação, essa mesma linha traçada também configura jogo, ao definir campos opostos.

Em sua exposição, Renata Lucas construiu seu campo de representação a partir da colocação de uma mesa de sinuca num estacionamento desativado na vila. Atualmente fechado, como quase tudo no entorno, o estacionamento se situa como ponto equidistante entre a galeria e o Cemitério da Consolação. A mesa instalada no estabelecimento ocioso se oferece como divisa de um jogo entre mundo operante e mundo inoperante, entre o território dos vivos e o território dos mortos.

Volpi no MASP

11/fev

 

 

O MASP, Museu de Arte de São Paulo, apresenta a mostra “Volpi popular”, dedicada a Alfredo Volpi, figura central da arte brasileira do século 20. A pintura do artista é caracterizada por um repertório único de experiências e influências como o trabalho artesanal, as festas populares, os temas religiosos e as fachadas da arquitetura colonial e vernacular brasileira.

A mostra abrangerá diversos períodos da carreira do artista e contará com cerca de 100 pinturas organizadas em torno do contínuo interesse de Volpi pelos temas do imaginário popular brasileiro, e será estruturada em seções temáticas, como paisagens do campo e do mar; fachadas; bandeiras e mastros; representações religiosas; festas populares; e retratos.

Com curadoria de Tomás Toledo, curador-chefe do MASP, e de Adriano Pedrosa, diretor artístico do museu, esta é a terceira mostra de uma série de individuais que o MASP vem organizando em torno de artistas modernistas brasileiros cujos trabalhos denotam o emprego de referências populares. De 25 de fevereiro a 05 de junho, a exposição ocupa o primeiro andar da instituição.

Fonte: Glamurama