Calder e Miró no Instituto Tomie Ohtake

21/jun

Com mais de 150 obras, Calder+Miró retoma a ligação entre os trabalhos de Alexander Calder e Joan Miró – assim como os desdobramentos dessa amizade na cena artística brasileira. “Calder+Miró” é uma exposição que reúne dois artistas incontornáveis para quem quer pensar com sensibilidade nos caminhos da arte moderna.

Ocupando quase todos os espaços expositivos do Instituto Tomie Ohtake, Pinheiros, São Paulo, SP, até 15 de Setembro, a mostra contempla a amizade entre um dos principais escultores modernos e um dos mais famosos pintores surrealistas: o escultor norte-americano Alexander Calder (1898-1976) e o catalão Joan Miró (1893-1983). Os dois foram, cada um em sua trajetória, embaixadores da ideia de que a abstração poderia ser um canteiro aberto de experimentação dinâmica, permeado pelos modos de criação intuitivos, de artistas circenses, da mecânica e da poesia.

Com curadoria de Max Perlingeiro, acompanhado pelas pesquisas de Paulo Venâncio Filho, Roberta Saraiva e Valéria Lamego, a mostra traz cerca de 150 peças – entre pinturas, desenhos, gravuras, esculturas, móbiles, stabiles, maquetes, edições, fotografias e jóias.

Acompanhando todo o período expositivo de Calder+Miró, o Instituto Tomie Ohtake oferece uma programação pública inteiramente gratuita e destinada a públicos diversos. Instigadas pelas obras e pelos processos criativos dos artistas, as diferentes atividades incluirão jogos e ativações lúdicas, oficinas práticas – como de desenho de observação em movimento e de construção de móbiles -, uma programação voltada à exploração sonora das obras, bem como cursos e rodas de conversa que exploram temas como a relação entre vanguarda brasileira e a abstração, o encontro entre a Arquitetura e artes visuais no Brasil, e a produção de artistas contemporâneos. Ainda, o Instituto promoverá uma série de ações voltadas especialmente à educação, oferecendo uma programação de abertura para professores da rede pública, um ciclo de conversas que discutirá a intersecção entre arte e educação, além das visitas mediadas e visitas ateliês oferecidas à escolas e outras instituições.

Ecos Nacionais

Uma seleção de trabalhos de nomes consagrados e influenciados direta ou indiretamente pelas produções de Calder e Miró – incluindo Tomie Ohtake – será colocada em diálogo com as obras dos dois artistas. Entram aí obras de Abraham Palatnik, Aluísio Carvão, Antonio Bandeira, Arthur Luiz Piza, Franz Weissmann, Hélio Oiticica, Ione Saldanha, Ivan Serpa, Mary Vieira, Milton Dacosta, Mira Schendel, Oscar Niemeyer, Sérvulo Esmeraldo e Waldemar Cordeiro.

No Brasil, as obras de Calder e Miró apresentam importantes desdobramentos nos debates estéticos e produções artísticas que, a partir da década de 1940, passaram a pautar a abstração de maneira mais enfática. A relevância das contribuições desses artistas no contexto nacional se mostra, ainda, na larga presença de seus trabalhos em coleções brasileiras – para esta exposição, todas as obras apresentadas são provenientes de coleções públicas e privadas do Brasil.

Brasil Visual

20/jun

No dia 22 de junho, a partir das 17h, acontece a pré-estreia na Praça Luís de Camões (Praça do Russel), Glória, RJ, um evento gratuito, com exibição de três episódios, DJs convidados e conversas com participantes.

Como os acontecimentos ocorridos nos últimos anos impactaram as artes visuais brasileiras? Este é o recorte da série “Brasil Visual”, dirigida por Rosa Melo, que estreia no dia 25 de junho de 2024, às 20h30, no canal Curta! além de pocket show com o artista Cabelo. Partindo das artes visuais, a série aborda temas que impactaram toda a sociedade, como a pandemia de COVID-19, as manifestações que tomaram o país, a inteligência artificial, passando por temas como espiritualidade, a dualidade do mundo dos vivos e dos mortos, entre outros.

“Esse projeto fala sobre a vida através da arte, mostrando um pouco como a produção artística foi atravessada por questões tão importantes do nosso cotidiano”, afirma Rosa Melo, diretora-geral da série, que tem codireção de Lia Letícia e realização de Rosa Melo Produções Artísticas e AC Produções, BRDE, Ancine, FSA e Secretaria de Cultura e Economia Criativa do Rio de Janeiro através da Lei Paulo Gustavo.

A pré-estreia será com a apresentação do DJ Galo Preto, seguido da exibição do primeiro episódio da série e de conversa com Aline Motta, Bruno Balthazar e Paulo Paes. Em seguida, haverá a apresentação da DJ Onciã, exibição do segundo episódio, bate-papo com Ana Lira, Carmem Ferreira, Mônica Benício e Pâmela Carvalho, seguida de show do artista Cabelo, exibição do terceiro episódio e conversa com Laura Lima, Lia Letícia e Novíssimo Edgar. A noite termina com o karaokê de Martha Rodrigues. A programação completa por ser conferida no Instagram @brasilvisual.arte.       

Brasil Visual

Com treze episódios, com duração de 26 minutos cada um, “Brasil Visual” traz entrevistas com artistas, pesquisadores, povos indígenas, povos de terreiro, entre outros. Dentre os 36 entrevistados, estão artistas contemporâneos e especialistas de todas as regiões do país, incluindo nomes de destaque, como os artistas Cildo Meireles e Rosana Paulino, o curador e artista indígena Denilson Baniwa, a liderança do MSTC, educadora e urbanista Carmen Silva, a curadora, ativista indígena Guarani Sandra Benite, os artistas Lourival Cuquinha, Paulo Paes, Rose Afefé e Novíssimo Edgar, o neurocientista Sidarta Ribeiro, o pedagogo Luiz Rufino, a curadora, pesquisadora e crítica de cinema Kênia Freitas, a autora, educadora e diretora da Redes da Maré Eliana Sousa Silva, o sacerdote, artista e pesquisador de simbologias e mitologias afro-brasileiras Bruno Balthazar, o Alápini, (sacerdote do culto dos Egunguns)  Balbino Daniel de Paula, entre outros.

Luiz Zerbini no CCBB Rio

14/jun

Retrospectiva da carreira de Luiz Zerbini (São Paulo, 1959), um dos principais nomes da arte contemporânea latino-americana, cujo trabalho faz uso de uma variedade de materiais e suportes e aponta para temas como ecologia e ancestralidade, urgentes dos tempos atuais. Composta por obras que traçam um panorama da sua atuação nas últimas décadas, a exposição oferece ao público a oportunidade de travar contato com uma produção que é referência na cena artística nacional e internacional. A mostra apresenta trabalhos inéditos do artista no Rio de Janeiro. Trata-se de um recorte amplo da sua atividade nas últimas décadas e configura um percurso poético por sua obra. A exposição também é um manifesto contemporâneo sobre cosmopolítica, a relação entre arte e ecologia e os saberes dos povos originários. O artista coloca em discussão fatos históricos, refletindo sobre a nossa origem e ancestralidade e ressignificando símbolos. A curadoria é de Clarissa Diniz.

Sobre o artista

Luiz Zerbini nasceu em São Paulo, em 1959. Iniciou sua atividade artística no final dos anos 1970. Expoente da chamada Geração 80, é conhecido por fazer pinturas em grande escala de colorido exuberante, em geral figurativas e com incursões no abstracionismo geométrico. Suas composições incluem a paisagem e as formas da natureza. Sua obra transita entre a pintura, a escultura, a instalação, a fotografia, a produção de textos e vídeos. É um dos integrantes do grupo Chelpa Ferro. Entre as exposições recentes, destacam-se: Siamo Foresta, Triennale Milano, Milão (2023); Dry River, Sikkema Jenkins & Co, New York (2022); A mesma história nunca é a mesma, MASP, São Paulo, Brasil (2022); Fire, Stephen Friedman Gallery, Londres, Reino Unido (2020); Nous Les Arbres, Fondation Cartier, Paris (2019); Intuitive Ratio, South London Gallery, Londres (2018); Dreaming Awake, House for Contemporary Culture, Maastricht (2018); Luiz Zerbini, Stephen Friedman Gallery, Londres, Reino Unido (2017); Perhappiness, Sikkema Jenkins & Co, New York (2016); Natureza Espiritual da Realidade, Galpão Fortes Vilaça, São Paulo (2015); Pinturas, Casa Daros, Rio de Janeiro (2014); amor lugar comum, Centro de Arte Contemporânea Inhotim (2013); Amor, MAM – Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, (2012); dentre outras.

Sobre a curadora

Clarissa Diniz é curadora, escritora e educadora em arte. Graduada em artes pela UFPE, mestre em história da arte pela UERJ e doutoranda em antropologia pela UFRJ. É professora da Escola de Artes Visuais do Parque Lage, no Rio de Janeiro. Além de alguns livros publicados, tem textos incluídos revistas e coletâneas sobre arte e crítica de arte, a exemplo de Criação e Crítica – Seminários Internacionais Museu da Vale (2009); Artes Visuais – coleção ensaios brasileiros contemporâneos (Funarte, 2017); Arte, censura, liberdade (Cobogó, 2018); Amérique Latine: arts et combats (Artpress, março 2020). Desenvolve curadorias desde 2008 e, entre 2013 e 2018, atuou no Museu de Arte do Rio – MAR, onde realizou projetos como Do Valongo à Favela: imaginário e periferia (cocuradoria com Rafael Cardoso, 2014); Pernambuco Experimental (2014) e Dja Guata Porã – Rio de Janeiro Indígena (cocuradoria com Sandra Benites, Pablo Lafuente e José Ribamar Bessa, 2017). Em 2019, organizou a mostra À Nordeste (cocuradoria com Bitu Cassundé e Marcelo Campos, Sesc 24 de Maio, São Paulo) e, em 2022, integrou a curadoria das exposições Histórias Brasileiras (MASP, São Paulo) e Raio-que-o-parta: ficções do moderno no Brasil (Sesc 24 de Maio, São Paulo)

Até 02 de Setembro.

Uma exibição em conjunto para Iberê Camargo

Após quase 30 dias de portas fechadas, a Fundação Iberê Camargo, Porto Alegre, RS,  reabre suas portas no dia 20 de junho, com entrada gratuita até o final de julho.

“Iberê e o MARGS” – uma exposição conjunta durante a maior catástrofe ambiental do RS

Em uma parceria inédita, a Fundação Iberê Camargo e o Museu de Arte do Rio Grande do Sul inauguram, na FIC, no dia 27 de julho, a exposição “Iberê e o MARGS: trajetórias e encontros”. Com curadoria de Francisco Dalcol e Gustavo Possamai, a mostra apresentará mais de oitenta obras do artista pertencentes aos acervos das duas instituições. O título foi inspirado em um dos mais importantes eventos no MARGS relacionados ao artista: a mostra “Iberê Camargo: trajetória e encontros”, realizada em 1985. Ela se deu no lastro das comemorações de seus 70 anos, que incluíram uma retrospectiva apresentada pelo próprio MARGS em 1984 e o lançamento do livro Iberê Camargo em 1985, considerado ainda hoje uma das mais completas publicações de referência sobre o artista.

No MARGS, Iberê ganhou mostras individuais, participou de inúmeras exposições coletivas e ministrou cursos. Teve também o ingresso de outras obras suas no acervo por meio de compra, transferências e doações, além de um espaço de guarda de parte de seu arquivo pessoal, o qual destinou à instituição em 1984. Foi também no MARGS que ocorreu sua despedida, com o velório público que teve lugar nas Pinacotecas, o espaço mais nobre e solene do Museu.

Além de trazer novos sentidos a esta exposição, o trágico contexto do Rio Grande do Sul ressoa no posicionamento público de Iberê Camargo, um crítico ferrenho dos governantes pelo descuido irresponsável com a natureza. “Entendemos que a exposição não poderia ocorrer em uma espécie de vácuo factual e histórico, sem situá-la no momento e na realidade em que nos encontramos. Assim, a mostra nos permite refletir sobre esses temas através da perspectiva de Iberê, que sempre criticou veementemente a negligência com a natureza, diante dos processos de dominação e destruição ambiental. É pelo olhar dele que podemos renovar o apelo, em nome das instituições de memória e enquanto sociedade, a um compromisso definitivo com a preservação da arte e do meio ambiente”, comentam os curadores.

Os anéis de tecidos de Lidia Lisbôa

A artista Lidia Lisbôa apresenta sua nova individual no Museu de Arte do Rio – MAR, Praça Mauá, Centro, Rio de Janeiro, RJ, até 08 de Setembro.

A exposição “Têta”, apresenta cerca de trinta obras, em sua maioria inéditas, abarcando diferentes aspectos e técnicas que constituem a produção de Lidia Lisbôa (1970, Terra Roxa, PR, Brasil). O ponto de partida da seleção são as obras “Tetas que deram de mamar ao mundo”, série iniciada em 2011, nas quais Lidia Lisbôa crocheta e sobrepõe anéis de tecidos, formando esculturas de grandes dimensões que pendem do teto até próximo ao chão.

Uma gestualidade semelhante é constituinte das esculturas Cupinzeiros, outra longeva série da artista que integra a mostra. Além desses, são apresentados trabalhos comissionados especialmente para a ocasião.

A curadoria é de Amanda Bonan, Marcelo Campos, Thayná Trindade e Jean Carlos Azuos.

A arte de Tadáskia

13/jun

Ave preta mística de Tadáskía alça voo e chega ao MoMA de Nova York

Uma vigorosa composição de desenhos coloridos em movimentos expansivos, que tomou as paredes de uma sala circular na edição da Bienal de São Paulo no ano passado, ganhou um novo pano de fundo em exposição no Museu de Arte Moderna (MoMA), em Nova York. A obra ave preta mística mystical black bird (2022), da artista carioca Tadáskía (1993), foi recentemente adquirida pela instituição nova iorquina, uma das mais relevantes dedicadas à arte moderna e contemporânea no mundo.

Muitas vezes localizada entre as canônicas definições formais abstrato e figurativo, a prática artística de Tadáskía não cabe somente nesse tipo de parâmetro. A tenuidade evocada pela artista ao produzir é encontrada também em uma dança entre o visível e invisível, o místico e o mundano, o inteligível e o indecifrável. Formada em Artes Visuais e Licenciatura pela UERJ (2012-2016) e mestra em Educação pela UFRJ (2019-2021), a artista já realizou individuais em São Paulo, Lisboa e Barcelona, e participou de coletivas em Amsterdam, Marselha e Nova York, além de sua cidade natal, Rio de Janeiro. A obra ave preta mística mystical black bird (2022) é composta por 61 páginas soltas de um livro bilíngue, com uma poética que se materializa em desenho e escrita. Quando exposta, é acompanhada por desenhos expandidos – e intuitivos – que envolvem o ambiente no qual é instalada. Em proposição site-specific – criada especialmente para cada ambiente expositivo -, os desenhos feitos com carvão e pastel seco adaptam-se ao espaço e surgem a partir de uma relação criada entre o corpo da artista com o espaço.

Na 35ª Bienal de São Paulo – coreografias do impossível, Tadáskía também incluiu um grupo de esculturas feitas de bambu, palha e taboa, postas em bases circulares e acompanhadas de elementos como frutas, cascas de ovos costurados e pintados, e pó facial. Segundo declaração da artista, “a ave preta mística é uma população negra reunida além do tempo-espaço conhecido. Livre interpretação de Sankofa, um pássaro preto olhando para trás com um ovo em seu bico. Mística, a ave preta se transforma, tal como na ampliação de seus voos, nos mostrando um desejo incansável de liberdade”. Em participação no Em obras, podcast produzido pela Bienal de São Paulo, a artista relatou como o processo de produção do desenho nas paredes da Bienal exigiu de forma intensa uma entrega do seu corpo ao longo de 15 dias. Sem um projeto prévio para ocupar a sala circular, a artista se entregou a um processo orgânico, sem um ponto de partida e chegada pré-definido, desenhando de olhos fechados em muitos momentos, o que ela chama de “desenho cega”, buscando um estado meditativo e aberto ao inesperado.

Projects: Tadáskía

A aquisição da obra de Tadáskía para o acervo do MoMA é seguida por sua exibição a partir do The Elaine Dannheisser Projects Series, um programa criado pela instituição em 1971 com o intuito de apresentar artistas contemporâneos em ascensão. Atualmente, o projeto acontece em parceria com o the Studio Museum in Harlem, iniciativa que tem como missão o suporte e difusão de artistas afrodescendentes. À frente do the Studio Museum, a Diretora e Curadora Chefe Thelma Golden celebra a presença de Tadáskía enquanto representante da arte brasileira no exterior: “há e sempre houve uma arte incrível vindo do Brasil e estou emocionada que Tadáskía, com seus desenhos e esculturas imaginativas, irá transpor esse dinamismo criativo e fundamentá-lo em uma instalação site-specific para o espaço de projetos do MoMA. Esta colaboração especial é uma oportunidade notável para defender uma voz emergente na arte contemporânea e promove o compromisso do the Studio Museum com artistas de ascendência africana em todo o mundo. Sou infinitamente grata a Glenn Lowry e ao Museum of Modern Art pela parceria, que durante cinco anos garantiu a continuação do trabalho fundamental do the Studio Museum”. Com sua primeira exposição individual ocorrendo em Nova York, Tadáskía se junta a Ernesto Neto, Lygia Clark, Roberto Burle Marx e Tarsila do Amaral, o seleto grupo de artistas brasileiros que já tiveram suas obras expostas em individuais no museu. Em comunicado à imprensa, a artista revela a sensação de estar apresentando sua obra em Nova York: “é como se eu tivesse em um desenho animado, indo para uma terra estrangeira em que nunca estive e realizando um sonho de expor em um dos maiores e mais importantes museus do mundo, o MoMA”.

A relação com a ideia de estrangeiro está fortemente presente nas pesquisas da artista que, a partir de elementos familiares e íntimos, elabora sobre a diáspora negra. Artista negra e trans, Tadáskía utiliza as linguagens do desenho, fotografia, instalação e matéria têxtil, para desdobrar uma poética que dança nas esferas micro e macro, partindo muitas vezes de elementos particulares e íntimos, como sua família, todavia com capacidade de abordar questões mais amplas e coletivas.  Tanto nos poemas e desenhos presentes no livro, como nas esculturas e na instalação site-specific, os conceitos de mudança e efemeridade pavimentam a poética de Tadáskía. A múltipla narrativa em torno da ave preta mística, por exemplo, acompanha as mudanças vividas pela ave, seja pela influência de outras aves em convívio, seja através de adornos por ela utilizados, e sua forma, que se aproxima de outros elementos como estrelas e montanhas. Com uma visão bem resolvida sobre a importância do erro no processo artístico, bem como uma relação menos impositiva com as expectativas de finalização da obra, Tadáskía abre espaço para deixar fluir o pensamento em ação. Seus desenhos e materiais orgânicos escolhidos refletem um estado de espírito buscado pela artista.

Diogo Barros é curador, arte educador e crítico, formado em História da Arte, Crítica e Curadoria pela PUC SP.

Os 91 anos de Anna Bella Geiger

03/jun

O Sesc RJ, apresenta (até 08 de Setembro) na Galeria do Sesc Copacabana – 1° andar a exposição “Anna Bella Geiger – Entre o relevo e o recorte”. Mostra inédita que celebra os 75 anos de carreira da artista, que também completa 91 anos. A mostra inédita mergulha no universo multifacetado de Anna Bella Geiger, uma das mais influentes artistas brasileiras do século XX. A individual é realizada pela Agência Dellas e produzida pela Atelier Produtora, e conta com a curadoria de Ana Hortides. A mostra foi contemplada pelo Edital de Cultura Sesc RJ Pulsar 2024.

A mostra apresentará 29 trabalhos fundamentais que datam da década de 1960, especificamente no período entre 1960 e 1966. Destacando-se a obra Sem título, de 1961, vencedora do 1º Concurso Interamericano de Grabado, na Casa de las Americas, em Havana, Cuba, no ano de 1962.  “Anna Bella Geiger – Entre o Relevo e o Recorte” destaca especificamente a fase inicial da artista como gravadora, revelando a sua ousadia ao desafiar as convenções do meio. Um aspecto crucial da exposição é a exploração da técnica de recorte da chapa de metal da gravura, uma prática não usual na época, que sinalizava a direção de suas futuras experimentações.

Uma iniciação

Lembro-me bem de quando cheguei a uma compreensão mais plena e profunda dos princípios abstracionistas na minha própria obra em meados do ano de 1952. Estávamos num momento cultural em que alguns e algumas de nós, artistas, vínhamos buscando, individualmente, radicalizar essas  transformações, fosse aqui no Brasil, como internacionalmente. Isso após uma longa iniciação, desde 1949, no ateliê da artista Fayga Ostrower, através de incansáveis estudos e pesquisas baseados nos princípios cubistas de Pablo Picasso e Georges Braque, assim como nos exercícios propostos nos Notebooks de Paul Klee na Bauhaus. Incluiria aí também estudos sobre o uso da cor e da composição estrutural na gravura japonesa do século XVIII e na complexidade da escultura africana em suas diversas regiões. Naquele turbilhão de ideias, comecei a encontrar soluções próprias, individuais, em meus desenhos, guaches e gravuras abstratas. Nessa época, alguns de nossos pioneiros na área gráfica, como Osvaldo Goeldi, Lasar Segall, Lívio Abramo, inclusive a própria Fayga Ostrower (até 1952), eram artistas figurativos, não viam o mundo somente do ponto de vista estético, mas sim sob os seus aspectos sociais e humanos. Havia um conflito, um verdadeiro tabu, na questão da eliminação da figura humana na Arte. As desavenças eram profundas, e, no Brasil, ainda tínhamos uma questão extra-artística, como a do regionalismo ou do realismo. As questões desenvolvidas na minha obra, eram denominadas no vocabulário internacional como abstração informal ou lírica, com certa identidade com os pintores da Escola de Nova Iorque e de Paris, bem como as  levantadas pela  Fayga,  Iberê Camargo, Yolanda Mohalyi, entre outros. Desses artistas internacionais, podem ser citados, por exemplo, Franz Kline, Willem De Kooning, Robert Motherwell, Philip Guston, Jackson Pollock, assim como o franco-alemão Hans Hartung e o espanhol Antoni Tàpies. Em 1965, a minha própria concepção sobre a arte abstrata começa a se radicalizar, assumindo recortes e relevos na sua composição. É o caso de duas gravuras sem título, que diferem das outras anteriores porque recorto uma forma trapezóide na própria placa de latão, e assim, o relevo surge impresso no papel branco, vazio. É interessante notar que, apesar de não termos tido contato naqueles mesmos anos com os artistas abstratos internacionais, principalmente os da Escola de Nova Iorque, ocorreu uma certa concomitância com a obra internacional numa identidade de princípios, por exemplo, por certas posições políticas semelhantes do pós-guerra, culminando numa semelhança formal. Não devemos nos esquecer que a arte abstrata surge também em consequência da 2ª Guerra Mundial e adota um pensamento baseado na filosofia existencialista, do individualismo, do conceito de liberdade individual em Jean-Paul Sartre. Em fevereiro de 1953, organizou-se a Primeira Exposição Nacional de Arte Abstrata, no Hotel Quitandinha, em Petrópolis, da qual participei com três obras. Podemos dizer que ali, pela primeira vez no Brasil, os artistas abstratos marcariam posição contra as principais tendências da arte no país, compreendidas pela primeira vez do ponto de vista plástico-formal e não a partir de questões extra-artísticas, como o regionalismo e o realismo social. Já sobre o abstracionismo na minha obra, ele se desenvolveu até 1965, período em que participei de inúmeras Bienais Internacionais, como a de São Paulo (de 1961,1963,1965 até o ano de 1967), quando eu aderi ao boicote contra o AI-5. Ao longo de 1962 a 1966, integrei exposições, como o 1º Concurso Interamericano de Grabado, em Havana, Cuba, 1962, onde recebi o primeiro e único Prêmio “Casa de Las Américas”; o Brazilian Art Today, no Royal College of Art, Londres, em 1965; a 1ª Bienal Latino-Americana de Grabado, Santiago do Chile, em 1966, da qual recebi menção honrosa; a 1ª Exposição Jovem Gravura Nacional, do programa Jovem Arte Contemporânea (JAC), do Museu de Arte Contemporânea (MAC) de São Paulo no qual ganhei o 1º Prêmio de gravura. Além dessas, participei de exposições   individuais e coletivas, como a EL ARTE en America y España, em 1963, no Instituto de Cultura Hispânica, Madrid, entre outras. Em 1978, fui convidada por Paulo Sérgio Duarte, da recém-criada FUNARTE, para escrever uma publicação sobre o Abstracionismo no Brasil, que intitulei de Abstracionismo geométrico e informal: a vanguarda brasileira nos anos 50, publicada em 1987. Na ocasião, convidei o crítico de arte Fernando Cocchiarale para colaborar no livro. O Abstracionismo é considerado internacionalmente o último “ismo” da história da Arte Moderna.

Anna Bella Geiger.

O Ato Institucional Número Cinco (AI-5) foi o quinto de dezessete grandes decretos emitidos pela Ditadura militar nos anos que se seguiram ao golpe de estado de 1964 no Brasil, promovendo inúmeras ações arbitrárias que reforçaram a censura e a tortura como práticas da ditadura.

Texto curatorial

A mostra propõe uma viagem no tempo para o início da produção de uma das maiores artistas brasileiras, a carioca Anna Bella Geiger. Apresentando, pela primeira vez ao público, um recorte considerável dos seus primeiros trabalhos abstratos realizados em gravura e desenho ao longo da década de 1960, sendo muitos deles nunca expostos anteriormente. Anna Bella, ainda uma jovem artista com os seus 16 anos, em 1949 e ao longo dos primeiros anos da década de 1950, inicia os estudos em arte frequentando o ateliê da artista Fayga Ostrower no Rio de Janeiro, de quem Lygia Pape também fora aluna no mesmo período. Ambiente que lhe proporcionou uma aproximação com a produção de arte brasileira e estrangeira por meio de exercícios práticos e discussões teóricas. Já em 1953, participou com grandes nomes da época, como Lygia Clark, Antônio Bandeira, Abraham Palatnik e Ivan Serpa, da 1ª Exposição Nacional de Arte Abstrata, que se deu no Hotel Quitandinha, em Petrópolis, reunindo a vanguarda dos artistas das mais diversas tendências do abstracionismo brasileiro. Ao longo dos anos 1960, a artista começa a frequentar o ateliê de gravura do Museu de Arte Moderna (MAM) do Rio de Janeiro, quando se detém à produção, aprofundamento e experimentação plástica e conceitual em torno do processo de produção das suas gravuras abstratas. Radicalizando, por volta de 1965, o seu processo criativo por meio do corte da chapa de metal da gravura e assumindo nas suas composições a ideia do relevo e do recorte de forma expressiva e experimental. Logo, podemos observar que o espaço vazio, predominantemente o do recorte, se faz presente na sua impressão gráfica. Apontando, assim, para um processo artístico arrojado, de uma artista que, já no início de sua trajetória, explora a técnica e a subverte. Uma pioneira nos campos da gravura e, também, da videoarte brasileiras por sua ousadia e experimentalismo da época. Além de uma educadora fundamental que esteve sempre em companhia e colaboração com os seus estudantes ao longo dos processos artísticos e educacionais que propunha e desenvolvia. Anna Bella contribuiu para a formação das gerações mais recentes de artistas e curadores da cena contemporânea carioca. Ministrou aulas como professora e compôs o conselho administrativo do MAM Rio nos anos 1970, promovendo cursos, encontros e acompanhamentos com artistas dentro e fora da instituição. Posteriormente, nas últimas décadas e até hoje, promove encontros e cursos na Escola de Artes Visuais do Parque Lage e no Hoger Instituut Voor Schone Kunsten, na Bélgica. A artista é autora e responsável pela organização da mais relevante publicação sobre arte abstrata que conhecemos até a atualidade. O livro “Abstracionismo Geométrico e Informal: a Vanguarda Brasileira nos anos 50” foi realizado em pesquisa conjuntamente com o curador e crítico de arte Fernando Cocchiarale e lançado pela editora da Funarte em 1987. Traçando um panorama dos primórdios da vanguarda abstrata geométrica e informal no Brasil, do pós-guerra até a retomada da figuração com a Nova Objetividade, a publicação se estrutura por meio de uma introdução, entrevistas e textos selecionados. Contribuindo, desse modo, por seu teor histórico e didático para a difusão e fortalecimento das questões fundamentais do debate em torno do abstracionismo no período. Feita essa nossa viagem no tempo, pudemos percorrer parte da sua produção em gravura e desenho, nos surpreender com o seu processo de trabalho e pesquisa, vislumbrar a sua atitude audaz e empírica. Hoje, com seus 75 anos de carreira e ativa no campo da arte e da educação, celebramos o legado da artista Anna Bella Geiger, que com sua genialidade e coragem, transformou os rumos da arte e se tornou uma inspiração para todos nós.

Ana Hortides.

A arte introspectiva de Eleonore Koch

27/maio

O silêncio e a elegância na obra de Eleonore Koch

Cadeiras, xícaras, uma máquina de costura, flores. Esses são alguns dos elementos que aparecem com frequência nos quadros de Eleonore Koch, artista que viu o início do reconhecimento de sua obra poucos anos antes de falecer, em 2018. Hoje, 6 anos depois de sua morte, essa valorização só cresce e tem alcançado cifras milionárias no mercado de arte, além de exposições e documentários. No Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo (MAC-USP), 190 pinturas estão expostas em sua primeira grande retrospectiva. Com curadoria de Fernanda Pitta e obras de coleções públicas e privadas,  “Eleonore Koch: Em cena” reúne décadas de produção da artista, incluindo trabalhos nunca antes exibidos. Abordando os gêneros tradicionais da pintura explorados por ela (paisagens, naturezas-mortas e interiores), a mostra evidencia a simplicidade, o silêncio e a elegância retratados por meio de suas telas.

O início de tudo

Eleonore Koch nasceu em Berlim, em 1926, e veio para o Brasil ainda criança, aos 12 anos de idade. Imigrantes judeus-alemães, seus familiares fugiam do regime nazista. Desde cedo ela sonhava em trabalhar com arte, mas seu desejo era visto como uma ambição distante, já que todos os seus parentes levavam a vida difícil de quem precisa escapar do próprio país e se estabelecer em um novo local. Mesmo assim, Eleonore manteve sua vontade e recebeu apoio da família.

Em meados de 1940, ela frequentou os ateliês de personalidades como Yolanda Mohalyi, Elizabeth Nobiling, Samson Flexor e Bruno Giorgi. Depois, viajou à Europa e teve aulas com o pintor húngaro Arpad Szenes e o escultor francês Roberto Coutin. De volta ao país tropical, Eleonore viveu períodos nas capitais de São Paulo e do Rio de Janeiro e experimentou diferentes métodos artísticos. Foi somente em 1953, quando conheceu Alfredo Volpi, que ela começou a desenvolver a técnica da têmpera a ovo. Ao conviver com o mestre visitando seu ateliê, discutindo arte e observando sua forma de produzir, Eleonore incorporou a têmpera em seu processo criativo e passou a se preocupar cada vez mais com as cores e composições. Embora não tenha aprendido exatamente a “receita” empregada pelo artista, ficou conhecida como sua única discípula. O conjunto de pigmentos utilizados por ela – minerais, vegetais e alguns poucos sintéticos, alguns herdados de Volpi – hoje integra a coleção do Núcleo de Conservação e Restauro da Pinacoteca de São Paulo. No arquivo do MAC USP, há diários da artista com breves anotações sobre sua prática de pintura. Em seus estudos, ela registrava os pigmentos e misturas realizadas para conseguir os matizes de seu interesse.

Na década de 1950, também conviveu com grandes nomes do movimento concretista, dentre eles o paulista Geraldo de Barros, e observou o diálogo de Volpi com esses artistas. Apesar disso, não abandonou a figuração para se tornar “abstrata”, como muitos de sua geração fizeram. Sua predileção por objetos fez com que sua obra avançasse nos gêneros pictóricos da natureza-morta e dos interiores.

Certa de que deveria se dedicar ao ofício, Eleonore optou por não casar e nem ter filhos. Para garantir sua independência financeira enquanto a arte não lhe rendia tantos frutos, Koch trabalhou como vendedora de livros, assistente de cenógrafa, secretária e tradutora. Foi apenas em 1968, ao se mudar para Londres, que conseguiu viver da pintura. Na cidade nova, o empresário e colecionador Alistair McAlpine, tocado pelas obras, passou a ser seu mecenas. Antes de partir para a capital inglesa, Eleonore conquistou, sim, espaços importantes no circuito da arte brasileira. Em 1961, por exemplo, teve seu trabalho aceito pela Bienal de São Paulo, depois de muitas recusas. Mas de forma geral, a inserção no mercado de arte foi custosa para uma mulher que não seguia as vertentes daquele momento – nem a arte concreta, nem a pintura figurativa de caráter social.

Em cena

No MAC USP, os quadros de paisagens aparecem com certo destaque. Eles foram feitos depois de visitas da artista a parques de Londres, Versailles e outras localidades da Europa. Combinando observações, fotografias e uma mistura de realidade e fantasia, Eleonore criou algo de encenado – daí o título da exposição. Como explica o texto curatorial, “essas paisagens se assemelham a cenários ou imagens do pensamento, […] nas quais se “intrometem” elementos da memória e do afeto: a cadeira predileta, plantas azuis, um chão como a superfície do mar”. A sensibilidade de Koch é expressa principalmente pelos objetos colocados nas telas. Mais do que pela combinação minuciosa de cores, é por meio dos cômodos e das praças vazias que ela se comunica com o público. São os elementos da memória e do afeto – os cafés, os brinquedos, a casca da laranja e as cadeiras desocupadas – que fazem o observador se identificar com a introspecção da artista. Não se trata da mera figuração por ela mesma, mas da abertura às sensações que ela provoca.

Na mostra do MAC USP, é possível conhecer, ainda, todo o processo criativo de Eleonore, que documentava cada um de seus trabalhos. Em grandes vitrines, estão expostos os registros fotográficos de suas pinturas finalizadas – este era um modo de documentar e inventariar sua produção de forma independente. Entre os negativos, estão algumas das trinta pinturas de propriedade do Barão Alistar McAlpine, que se perderam em um incêndio na West Green House, na Inglaterra.  Além da mostra que permanece em cartaz até 17 de julho, o trabalho de Eleonore Koch tem ganhado destaque também em outros meios. Em abril deste ano, o festival de cinema “É tudo verdade” fez quatro exibições do documentário “As cores e os amores de Lore”, sobre a vida íntima e a trajetória profissional da artista. Com 80 minutos, o filme dirigido pelo cineasta Jorge Bodanzky apresenta um retrato dos últimos anos da artista, que faleceu aos 92 anos. Em breve, a película deverá chegar aos cinemas. Para o segundo semestre, está previsto, ainda, o lançamento de um livro sobre sua obra, com imagens e textos críticos.

Publicado por  Victoria Louise

Fonte: Artsoul.

A arte da Xadalu no MNBA

23/maio

Artista indígena Xadalu conseguiu sair de Porto Alegre para realizar a residência artística no Museu Nacional de Belas Artes, Centro, Rio de Janeiro, RJ, que será aberta ao público, a partir desta quinta-feira, 23 de maio. Está em cima da hora, mas Xadalu quase não chega por causa da tragédia no Rio Grande do Sul. Ele mora em Porto Alegre, a casa dele inundou e só conseguiu chegar ao Rio, porque o presidente da Associação de Amigos do MNBA foi até lá de carro levar doações e trouxe o artista para a residência no museu. A residência está aberta à visita pública e tem roda de conversa no sábado, dia 25, com Xadalu, Carlos Vergara e a curadora Sandra Benites. O artista Xadalu Tupã Jekupé fará uma residência artística em uma das salas do museu e, o trabalho que resultar desta residência, será doado ao Museu Nacional.

O ateliê temporário estará aberto à visitação do público, nos dias 23, 24, 28 e 29 de maio, das 15 às 17h. O número permitido é de até 15 pessoas, em razão de o Museu seguir em obras de restauração. Devido ao alagamento da casa e ateliê de Xadalu em Porto Alegre, foi preciso remarcar o evento, que aconteceria, a partir de 16 de maio, coincidindo com a Semana Nacional de Museus.

Como artista indígena, nascido no leste do pampa gaúcho, Xadalu descreve seu trabalho como questionador da História, buscando sua releitura decolonial, mas usando o suporte das imagens coloniais que estão disponíveis em livros e nas pinturas da coleção do Museu Nacional de Belas Artes.

– Para mim é um privilégio imenso e um sonho trabalhar dentro do MNBA, para fazer esse trabalho e contar a história do meu povo em uma narrativa que ainda não foi vista, e trazer o pensamento do povo da terra para dentro do museu, para espaços educativos e outros, diz o artista.

Xadalu propõe o questionamento do processo de catequização imposta pelo invasor com uma releitura em pintura, a “arte indígena contemporânea”, como ele descreve. Durante a residência no museu, a intenção do artista é fazer uma ligação entre o espírito do homem e os objetos coloniais, pelos quais havia apego sentimental e de fé. “É o barroco jesuíta guarani agora com roupagem de pintura indígena contemporânea”, define Xadalu. O artista avalia, porém, que sendo uma residência, é preciso deixar a linha de pensamento aberta, porque haverá modificações a todo momento.

Para a diretora Daniela Matera, a residência artística de Xadalu, com a possibilidade de visitação pública, “é um prelúdio para reabertura do Museu Nacional de Belas Artes, que terá uma exposição individual do artista”. Matera prevê para o futuro próximo uma atualização “da importância do Museu Nacional de Belas Artes no cenário cultural do Brasil, tornando-o uma instituição mais aberta, engajada socialmente, plural e porosa, ampliando seu alcance para a cultura dos séculos XX e XXI, para acolher as múltiplas histórias contadas e manifestadas através da Arte”.

Roda de conversa

No sábado, 25 de maio, de 11h às 13h, acontece uma roda de conversa entre Xadalu, o artista Carlos Vergara e a curadora Sandra Benites. A mediação é de Simone Bibian, técnica em Assuntos Educacionais do Museu Nacional de Belas Artes. Serão distribuídas 30 senhas meia hora antes do início do evento.

Sobre o arista

Xadalu Tupã Jekupé é um artista indígena. Nascido em Alegrete (RS), no pampa gaúcho, tem sua origem ligada aos indígenas que historicamente habitavam as margens do Rio Ibirapuitã, na antiga terra Ararenguá: os Guarani Mbyá, Charrua, Minuano, Jaros e Mbone.  O artista trabalha com serigrafia, pintura, fotografia e diversos objetos para abordar a tensão entre a cultura indígena e ocidental nas cidades, tendo sua pesquisa voltada aos processos coloniais de catequização dos povos nativos.  Xadalu tem obras nos acervos do Museu Nacional de Belas Artes (RJ), Museu de Arte Moderna de São Paulo (SP) e Museu Nacional (RJ), entre outros. Como artista residente, já esteve na França, Espanha, Itália e no território Mapuche, no Chile, pela 35ª Bienal de São Paulo (2023), entre outros.

Artistas brasileiros em Viena

21/maio

 

O Desacordo: Um Teatro de Declarações, no Neuer Kunstverein, Viena, Áustria, com ação de Maurício Ianês.

Artistas participantes

Vivian Caccuri | Andressa Cantergiani | Maurício Ianês | Daniel Lannes | Cinthia Marcelle e Tiago Mata Machado | Ana Mazzei | Ventura Profana | Luís Roque | Tadáskia | Allan Weber com curadoria de Bernardo José de Souza.

A palavra do curador

A discordância: um teatro de declarações reúne onze artistas brasileiros contemporâneos cujas práticas artísticas provêm de uma ampla variedade de origens culturais e, portanto, apontam para um amplo espectro de preocupações estéticas e políticas. O conjunto de obras desta exposição aborda, portanto, não apenas a sociedade estratificada e sincrética do Brasil, mas também as contradições ideológicas inerentes às práticas artísticas contemporâneas a partir de uma perspectiva transcultural.

Esta exposição coletiva é composta por obras criadas em diversos suportes – escultura, instalação, colagem, vídeo, pintura e performance – e confronta narrativas que refletem sobre a impossibilidade de encontrar um léxico comum. Um léxico para discutir questões políticas inevitáveis, como a luta de classes, as alterações climáticas, as políticas de identidade, os sistemas de crenças heterogêneas, o legado da cultura simbólica e material e outras questões prementes do presente.

Porque vivemos num mundo onde as narrativas hegemónicas foram historicamente forjadas para manter o status quo da desigualdade – tanto étnica, cultural e socioeconómica – o país hoje conhecido como Brasil é apresentado aqui como um palco político no qual as forças capitalistas criaram zonas de extrema desigualdade social. Ex-colónia portuguesa, o Brasil transformou-se num império monárquico independente, cujas enormes ambições desencadearam mais tarde um impulso de modernização para construir uma economia global imbuída de noções positivistas de progresso tecnológico, apesar das infra-estruturas sociais precárias e do empobrecimento massivo da população.

Embora não seja uma exposição que examine a história ou a produção artística brasileira, O Desacordo parte das contradições inerentes a este país – e a qualquer outro país ex-colonizado – para explorar o cultural e exacerbar os conflitos políticos que moldam indiscriminadamente a contemporaneidade. manifestações políticas, artísticas ou não.

Bernardo José de Souza