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Marcelo Chardosim
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Patrick Rigon
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Marilice Corona
O MARGS, Museu de Arte do Rio Grande do Sul Ado Malagoli, Centro Histórico, Porto Alegre,
RS, apresenta como exposição complementar e em paralelo à mostra individual do artista
Alessando Del Pero, a coletiva temática “CARO, CARA”. Composta de retratos e autorretratos ,
o acervo exibe peças raras como “Retrato de Walmir Ayala”, de Inimá de Paula, “Retrato de
Maria Helena Lopes”, de Glauco Rodrigues A curadoria do evento é de André Venzon.
“CARO, CARA”:
Artistas participantes: Ado Malagoli, Aldo Locatelli, Alessandro Del Pero,
Alessandro Ruaro, Alexandre Pinto Garcia, Amália Cassullo, Ana Nunes, Arthur
Timótheo da Costa, Bea Balen Susin, Britto Velho, Bruno Goulart Barreto , Carla
Magalhães, Carlos Petrucci, Carlos Scliar, Cláudio Tozzi, Djalma do Alegrete, Edgar
Koetz Eduardo Cruz, Edy Carollo, Elaine Tedesco, Elle de Bernardini, Ernesto
Frederico Scheffel, Ernst Zeuner, Felipe Alonso, Flávio de Carvalho, Flavya Mutran,
Francisco Brilhante, Franz Von Lenbach, Gastão Hofstetter, Gilberto Perin, Gilda
Vogt, Glauco Rodrigues, Guignard, Heloisa Schneiders, Henrique Bernardelli,
Henrique Cavalleiro, Henrique Fuhro, Iberê Camargo, Inimá de Paula, J.C. Reiff
Jacintho Moraes, Jesus Escobar, João Bastista Mottini, João Fahrion, João Faria
Viana, João Otto Klepzig, Jorge Meditsch, José Carlos Moura, José de Souza Pinto,
Juan Uruzzola, Julio Gavronski, Julio Ghiorzi, Kira Luá, Leandro Selister, Leda Flores,
Leo Santana, Lepoldo Gotuzzo, Letícia Remião, Luiz Antônio Felkl, Luiz Carlos
Felizardo, Luiz Zerbini, Magliani, Marcelo Chardosim, Marcos Noronha, Maria
Leontina, Maria Tomaselli, Mariana Riera, Marilice Corona, Mario Agostinelli, Mario
Palermo, Mariza Carpes, Martin Heuser, Miriam Tolpolar, Neca Sparta, Nelson
Wilbert, Patrício Farias, Patrick Rigon Regina Ohlweiler, Ricky Bols, Roberto
Magalhães, Roberto Ploeg, Rochele Zandavali, Rodrigo Plentz, Roosevelt Nina,
Roseli Pretto, Sandra Rey, Sergio Meyer, Silvia Motosi, Sioma Breitmann, Sotero
Cosme, Telmo Lanes, Téti Waldraff, Theo Felizzola, Tiago Coelho, Trindade Leal,
Ubiratã Braga, Vasco Prado, Vitória Cuervo, Walter Karwatzki, Xico Stockinger, ZIP.
A palavra do curador
O retrato daquele que fica. Dos notáveis e dos anônimos. O
retrato de pompa, da classe dominante, da burguesia.
O retrato do oprimido. O retrato imponente e o impotente. A
rebeldia do retrato. O retrato de família. O nu retratado. O retrato
do ídolo e da criança. O autorretrato.
O retrato imaginário, o anti-retrato.
O retrato como obsessão.
Caro, Cara…
Retratos correspondentes no acervo MARGS e artistas convidados
O retrato enfoca o humano no que possui de mais marcante: o rosto. Seja de perfil, voltado a
três quartos, de corpo inteiro, da cintura ou dos ombros para cima, equestre, de nobres,
militares, políticos ou religiosos; de artistas, personalidades ou marginais, de mulheres e
crianças. O retrato pintado, esculpido em carrara e encarnado − ou cuspido e escarrado como
no popular − desenhado, gravado, fotografado, em preto e branco, colorido, lambe-lambe,
3×4, polaróide, still, grafitado, no Facebook, a selfie…
A intensidade e qualidade das obras em retratos e autorretratos do artista italiano Alessandro
Del Pero, serviram de ensejo para a presente exposição Caro, cara, que busca valorizar na
correspondência entre obras do acervo do MARGS e artistas convidados, o que identificam a si
mesmo e ao outro por meio do olhar. Portanto esta é uma curadoria endereçada mais aos
artistas do que às obras, pois seus retratos representam o lugar mais próximo que podemos
estar deles, aonde o Museu também quer estar: ao lado dos artistas.
São diversos os exemplos de quanto este tema fascina os artistas. A começar pela literatura,
podemos citar o polêmico “O retrato de Dorian Gray” (1890), de Oscar Wilde, que faz uma
crítica social e cultural da sociedade britânica à sua época; o autobiográfico “O retrato do
artista quando jovem” (1916), de James Joyce, em que recorre a fases da sua vida para
construir o personagem alter ego do autor; o épico “O retrato” (1951), da trilogia “O Tempo e
o Vento”, de Érico Verissimo, cuja atmosfera histórica evoca na passagem do tempo as
gerações que se sucedem; até o romance “O pintor de retratos” (2001), de Luiz Antônio de
Assis Brasil, que expõe os questionamentos e contradições de um pintor frente à sedução da
fotografia.
No cinema, no filme de Giuseppe Tornatore, Stanno tutti bene (1990), Marcello Mastroianni
interpreta um pai que ao sair em viagem para rever os filhos exibe vaidoso pelo caminho uma
foto das suas crianças, fantasiadas como atores de ópera. O diretor ao introduzir esta imagem
do retrato como objeto de construção da sua narrativa visual, além de fazer uma rica menção
ao teatro, coloca-nos no lugar do personagem, que ao sentir saudade recorre ao álbum para
lembrar-se do outro.
É claro que nas artes plásticas também são inúmeras as criações que têm o retrato como
assunto central, a começar pelo quadro mais célebre da história da arte a enigmática Mona
Lisa (1503-1517), de Leonardo da Vinci. Ainda, entre as 12 obras de arte mais famosas de
todos os tempos, figuram nove retratos, como o revelador “Retrato do artista sem barba”
(1889) de Vincent van Gogh e o zeloso “O retrato do Dr. Gachet” (1890) do mesmo artista,
além das pinturas “Garota com brinco de pérola” (1665), de Veermer, que revela a intimidade
de uma modelo anônima; a familiar cena “Mulher com sombrinha” (1875), de Monet, cujo
enquadramento mais casual já é uma influência direta da fotografia; assim como o
descontraído “O almoço dos remadores” (1881), de Renoir; ou o angustiante “O grito” (1893),
de Munch; em contraste ao apaixonado “O beijo” (1909), de Klimt; até a inspiradora “Dora
Maar com gato” (1941), musa e amante, do cubista Picasso.
Segundo o filósofo francês Merleau-Ponty (1908-1961) “o retrato celebra o enigma da
visibilidade”, pois cada um tem sua própria história e devaneios. Por isto mesmo, o interesse
em revelar o retrato do contemporâneo, a partir do retrospecto deste gênero artístico no
acervo do MARGS, foi desde o início o principal objetivo deste projeto curatorial, que mostra a
diversidade da face do artista e seus pares, ao longo de obras da coleção que recuam há um
século e meio, até chegar à contemporaneidade que faz do retrato, enquanto disfarce sua
faceta mais interessante da liberdade de expressão do nosso tempo.
Há que destacar, porém, que o contínuo processo histórico ao longo do século passado de
transformação do sujeito retratado − apesar de representar uma revolução visual, entretanto,
passou por períodos de exceção em que o retrato do indivíduo ficou marcado pela
deformação. Foi desfeito, para não dizer destruído, durante os períodos de guerra e regimes
totalitários, causando a perda da identidade, da voz e da imagem, como representação visual
da humanidade. A ponto de, a multidão prevalecer quase totalmente sobre o indivíduo, que
esteve sem nome, sem título, tornando-se precário, excluído, invisível, não sendo mais capaz
nem de ser associado ao rosto que lhe carrega. Uma verdadeira castração psicológica que
transformou o humano em coisa.
Contudo, o modo de lidar com a sociedade de hoje não é ignorando-a. Os novos valores
estabelecidos, as mudanças e a rebeldia atual, nos ensinam cotidianamente ver com olhos
mais perspicazes e críticos este mundo de imagens em que estamos imersos.
Então, o que a arte e uma exposição de retratos podem nos levar a pensar e imaginar sobre
nós mesmos e o outro?
No mundo super contemporâneo, todos carregamos um pedaço de plástico com uma tela de
vidro na mão o dia inteiro… É quase uma extensão do nosso corpo a produzir imagens mobile
compartilhadas via redes sociais. Este tipo de comportamento − se de forma alienada − investe
contra a imaginação e a potência da visualidade. Na contramão deste movimento, a criação
artística assegura a permanência dos signos visuais e ao suscitar múltiplas possibilidades
perceptivas faz da imagem uma força de resistência contra o arbítrio da padronização.
Todavia, no campo da arte os retratos e autorretratos permanecem a ser construções de
exposição absoluta do indivíduo, nas quais os artistas se valem do próprio corpo ou do outro
como objeto de representação e veículo expressivo, pelo qual revelam sutis e sensíveis
verdades. Evidenciando, ao final, que a única coisa que podemos salvar é o olhar do outro, e o
retrato − ou o autorretrato, é a imagem pela qual verdadeiramente nos vemos.
Até 26 de julho.