Evento inédito na Casa Museu Carlos Scliar

12/fev

Com o objetivo de promover e dar visibilidade ao movimento LGBTQIAPN+, será realizado nos dias 20, 21 e 22 de fevereiro de 2025, o festival “Scliarizando – todos temos nome e sobrenome”, na Casa Museu Carlos Scliar, em Cabo Frio, RJ. O evento oferece ao público a oportunidade de assistir obras que tratam da cultura e da arte do movimento LGBTQIAPN+, tendo como pauta um mundo menos discriminatório e preconceituoso. A programação contará com exposição de trabalhos inéditos de Carlos Scliar (1920 – 2001), apresentações musicais, exibição de filmes e mesas de conversa com psicólogos, médicos, historiadores, etc. O evento é uma realização Governo Federal, Ministério da Cultura, Prefeitura de Cabo Frio, Secretaria Municipal de Cultura através da Lei Paulo Gustavo e toda a programação é gratuita.

“O evento transforma a Casa Museu Carlos Scliar em palco da arte LGBTQIAPN+, conferindo ao espaço museal responsabilidade na atuação por um mundo menos discriminatório”, diz a curadora do evento e coordenadora da Casa Museu Cristina Ventura.

Desenhos e estudos inéditos de Scliar, produzidos entre 1940 e 1960, estarão na exposição “Nus”. Artista plástico de personalidade multifacetada, humanista, Carlos Scliar participou ativamente de importantes manifestações sociais e acontecimentos culturais e políticos ocorridos ao longo do século XX. “A trajetória de Scliar nos permite afirmar que sua obra é decorrente do trabalho ininterrupto, compreendido pelo comprometimento com que tratava questões sociais de liberdade e respeito”, afirma Cristina Ventura, que completa: “Atento às relações humanas, onde há disciplina e provocação, liberdade e luta, beleza e cotidiano, valores raros encontrados no respeito ao homem, Scliar foi artista de trajetória singular, a ser revisitado”.

Também como parte do evento, será realizada uma oficina de gravura, utilizando frases presentes em obras de Scliar do período da ditadura militar, tais como: “Pergunte quem”, “Pergunte onde”, “Pergunte ainda” e “Pão e rosas para todos”, que serão impressas em tecido com as cores do arco-íris.

A programação também será animada com shows de Raisa Alves, Zarinho Mureb e das drag queens Rodrigo Rodrigues como Monayra Manon, Lenival Dantas como Susan Marx e Hugo Belford como PVC. Hugo Belford também será responsável pela oficina de Vogue, que, mais do que um estilo de dança, é um movimento de reafirmação de identidade de gêneros e sexualidade.

Haverá, ainda, a mesa de conversa “Instabilidade política e social”, com a participação da psicóloga autista Claridad Geraldel, que faz um trabalho clínico voltado à população queer e neurodivergente, e do médico psiquiatra David M. Achaval, especialista em ansiedade, depressão e deteriorações cognitivas. Também será realizada palestra com a doutora em história Eliza Toledo, que tem pesquisas voltadas para gênero, violência, história das mulheres, histórias das ciências e da saúde com ênfase na história da psiquiatria.

A programação também inclui a exibição dos filmes “Cabaré Eldorado: O Alvo dos Nazistas”, de Benjamin Cantu, “Retrato de uma Jovem em Chamas”, de Celine Sciamma, e do curta-metragem “Point 44”, de Marcio Paixão.

Sobre a Cas Museu Carlos Scliar.

O Instituto Cultural Carlos Scliar (ICCS) foi criado em 2001, mesmo ano da morte de seu patrono. O processo para criação da instituição foi acompanhado pelo artista, um acordo que fez com o filho Francisco Scliar para manter sua memória. Fundada por Francisco Scliar junto com os amigos: Cildo Meireles, Thereza Miranda, Anna Letycia, Regina Lamenza, Eunice Scliar, entre outros conselheiros, a instituição, aberta ao público em 2004, está sediada na casa/ateliê do pintor, em Cabo Frio, Rio de Janeiro. Trata-se de um sobrado oitocentista, com cerca de 1000m², adquirido em ruínas por Scliar, reformado em 1965 para abrigar seu ateliê e ampliado na década de 1970, com projeto de Zanine Caldas. A casa mantém a ambientação dos espaços deixada por Scliar, com seus objetos pessoais, acervo documental, bibliográfico, gravuras, desenhos e obras. A coleção resulta da produção do próprio artista ao longo de sua vida, somado a uma expressiva e representativa coleção de obras originais dos mais importantes artistas do cenário brasileiro do século XX, os amigos José Pancetti, Djanira, Cildo Meireles, Di Cavalcanti, Aldo Bonadei, entre outros, além de cerca de 10 mil documentos datados desde a década de 1930. Reforçando seu compromisso sociocultural, ao longo dos últimos três anos foram atendidos mais de 1000 estudantes do estado do Rio de Janeiro,em projetos educativos. Em 2023, a instituição foi agraciada com o Prêmio Darcy Ribeiro de Educação Museal, promovido pelo IBRAM.

 

Na Fundação Francisco Brennand.

12/dez

“Pancetti retratou amorosamente a nossa gente, a nossa luz e o nosso mar.”

Denise Mattar.

O Instituto Ricardo Brennand, Recife, PE, encerra sua agenda de exposições de 2024 com “Pancetti: o mar quando quebra na praia…”. A mostra ocupará um dos espaços nobres do centro de arte da Várzea, a Sala da Rainha, que integra à pinacoteca, com mais de 40 obras que revelam a importante trajetória artística do pintor brasileiro José Pancetti com sua obra representativa do Modernismo Brasileiro.

O artista nascido em Campinas, São Paulo (1902-1958) sempre demonstrou em sua obra grande interesse pelo nordeste brasileiro, a exibição conta Marinhas, Retratos, Naturezas – Mortas, Paisagens, que remetem diretamente ao mar, tanto por sua obra, quanto pela profissão de marinheiro que José Pancetti exerceu. A exposição já ocupou, com sucesso de público e crítica, a Casa Fiat, em Belo Horizonte e o Farol Sandander, em São Paulo

Pancetti é visto pelos estudiosos como um pintor singular em seu estilo, de formação quase autodidata, embora tenha circulado em meio de grandes influências artísticas.

“Pancetti: O mar quando quebra na praia….” tem a curadoria de Denise Mattar. “Essa seleção permite ao espectador apreciar as diversas facetas de Pancetti através de um conjunto de obras que nunca estiveram reunidas, até essa exposição. O Instituto Ricardo Brennand oferece, portanto, oportunidade aos pernambucanos de conhecerem melhor o artista e sua obra, sua arte”, afirma Denise Mattar que reuniu obras pertencentes à instituições parceiras, como o Acervo Museu de Arte Brasileira – MAB FAAP, Coleção Nilma Pancetti, Coleção Museu Nacional de Belas Artes, Instituto Casa Roberto Marinho, Acervo Banco Itaú, entre outros.

Sobre a curadoria

Denise Mattar. Como curadora independente realizou mostras retrospectivas de Di Cavalcanti, Flávio de Carvalho (Prêmio APCA), Ismael Nery (Prêmios APCA e ABCA), Pancetti, Anita Malfatti, Samson Flexor (Prêmio APCA), Frans Krajcberg, entre outras. As mostras temáticas: Traço, Humor e Cia, O Olhar Modernista de JK, O Preço da Sedução, O’ Brasil, Homo Ludens, Nippon, Brasília – Síntese das Artes, Tékhne e Memórias Reveladas, (Prêmio ABCA), Pierre Cardin, Mário de Andrade, Projeto Sombras, No Balanço da Rede, Duplo Olhar.

Até 16 de março de 2025.

A complexidade da Arte Brasileira.

02/dez

O MAM Rio reabriu ao público dia primeiro de dezembro com a mostra “Uma história da arte brasileira”, que foi vista pelos Chefes de Estado e líderes presentes no G20. Como legado do evento ao museu e à cidade, o Bloco Escola será entregue reformado, e é lá que a exposição está sendo remontada.

O icônico prédio do Bloco Escola, com seus característicos cobogós, foi o primeiro espaço do museu quando inaugurado, em 27 de janeiro de 1958. O bloco que passaria a alojar as futuras exibições só foi inaugurado em outubro de 1967, ou seja, nove anos depois de inaugurado o primeiro edifício.

Em 1959, lá aconteceram os primeiros cursos do Atelier de Gravura. Dentre as exposições ali realizadas, destacam-se algumas que marcaram não apenas a história do museu, mas também da própria História da Arte Moderna no Brasil, como a “Exposição Neoconcreta” (1959); as mostras “Opinião 65″ e “Opinião 66″ (realizadas respectivamente em 1965 e 1966); e a “Nova Objetividade Brasileira” (1967).

As obras realizadas pela prefeitura incluem, além da limpeza dos cobogós, a regularização das muretas da laje, que ganhou novas pedras em granito, a impermeabilização de pisos e jardineiras, a execução de infraestrutura elétrica; reformas em pisos, paredes e teto de salas internas e o restauro da sala onde era o antigo depósito de filmes no Bloco Escola, além do restauro do chafariz, ali em frente.

Com curadoria de Pablo Lafuente e Raquel Barreto, a exposição reúne aproximadamente 65 obras, incluindo pinturas, esculturas e fotografias, de nomes consagrados como Tarsila do Amaral, Cildo Meireles, Lygia Clark, Adriana Varejão, Di Cavalcanti e Tomie Ohtake. O objetivo é explorar a diversidade e a complexidade da Arte Brasileira ao longo de mais de um século.

Vale conferir a nova mostra (desenvolvida a partir do acervo do MAM Rio) e as novas instalações do prédio.

Lançamento do livro Reynaldo Fonseca

15/ago

No próximo sábado, dia 17 de agosto, às 16h, a Biblioteca Mário de Andrade, República, São Paulo, SP,  vai realizar o lançamento do livro “Reynaldo Fonseca” (1925 – 2019), de autoria de Denise Mattar e Maurício Redig de Campos. Reynaldo Fonseca é um dos mais importantes artistas pernambucanos de todos os tempos, e, ainda hoje, ocupa um lugar único no circuito de arte brasileiro. A curadora Denise Mattar e Mauricio Redig de Campos, que é sobrinho neto e gestor do acervo do artista, farão uma palestra sobre sua trajetória. Serão distribuídos 100 livros gratuitamente.

Sobre o artista

Pintor, muralista e ilustrador, Reynaldo Fonseca frequentou a Escola de Belas Artes de Pernambuco na década de 1930 onde foi aluno do também pintor Lula Cardoso Ayres. Em 1944 transferiu-se para o Rio de Janeiro para estudar com Cândido Portinari. No Rio estudou ainda com Henrique Oswald no Liceu de Artes e Ofícios e partiu para uma viagem de estudos na Europa. Em meados de 1952, torna-se professor catedrático de desenho artístico na Escola de Belas Artes da Universidade Federal do Pernambuco (UFPE), também frequentou o Ateliê Coletivo de Abelardo da Hora. Em 1964, realizou um mural para o Banco do Brasil, no Recife. Voltou para o Rio de Janeiro em 1969 e retornou ao Recife no início da década de 1980. Ilustrou diversos livros, entre eles “Pintura e Poesia Brasileiras”, com poemas de João Cabral de Melo Neto. Entre 1993 e 1994, o Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) promoveu no Rio de Janeiro e em São Paulo uma grande mostra retrospectiva de sua produção. Reynaldo Fonseca manteve, ao longo de sua carreira, temas recorrentes, como cenas familiares com crianças e animais, nas quais predominam um clima de sonho, inquietação e estranheza. O artista inspirava-se em pinturas do primeiro Renascimento italiano e flamengo, também nos pintores primitivos norte-americanos dos séculos XVIII e XIX e ainda no Surrealismo e na pintura metafísica. Sobre o artista o crítico Roberto Pontual escreveu: “Fonseca concentrava-se na armação de enigmas, a meio caminho entre o metafísico e o fantástico.  A retomada da história da arte era realizada de forma paciente, e por vezes com uma parcela de ironia.”

O livro “Reynaldo Fonseca” vem preencher uma lacuna na historiografia da arte brasileira, uma vez que todas as publicações sobre o artista estão inteiramente esgotadas. São apresentados trabalhos desde o início de sua carreira, no Recife, e das diversas temporadas no Rio de Janeiro.  Reynaldo Fonseca teve importante participação na cena artística recifense desde a década de 1940 e grande relevância no movimento de arte carioca.

Sobre a edição

O livro tem 272 páginas, bilíngue, português e inglês, edição capa dura, reunindo um conjunto de obras de toda a produção do artista, desde os anos 1930 até sua morte, em 2019. Uma cronologia ilustrada percorre toda a sua vida e sua significativa inserção na cena cultural brasileira, notadamente nos anos 1980, no Rio de Janeiro. A fortuna crítica com textos de Ariano Suassuna, Francisco Brennand, Frederico Morais, Geraldo Edson de Andrade, José Cláudio, Ladjane Bandeira, Olívio Tavares de Araújo, Olney Krüse, Roberto Pontual e Walmir Ayala permeia toda a publicação. A edição foi realizada com o patrocínio do REC Cultural, através da Lei de Incentivo à Cultura.

A autora do livro, a curadora Denise Mattar declarou: “Fazer este livro foi uma tarefa que se revestiu de extrema dificuldade, pela quantidade de material, de todas as ordens, guardadas pelo artista e conservadas pela família. Uma verdadeira avalanche de desenhos, cartas, entrevistas, catálogos, convites, e artigos de jornais e revistas. A pesquisa desse material revelou a marcante presença de Reynaldo na cena artística pernambucana, apesar de seu legendário retraimento. Como era hábito na época, os textos eram recortados sem referências de data e veículo e, embora tenhamos conseguido situar grande parte deles, outros não puderam ser devidamente catalogados mas, por sua importância, foram mantidos na publicação. Tenho certeza de que esta obra será de significativa contribuição para o entendimento da obra de Reynaldo Fonseca.”

Sobre os autores

Denise Mattar é curadora. Atuou no Museu da Casa Brasileira, SP de 1985 a 1987, do Museu de Arte Moderna de São Paulo, de 1987 a 1989 e do Museu de Arte Moderna RJ, de 1990 a 1997. Como curadora independente realizou mostras retrospectivas de artistas como Di Cavalcanti, Flávio de Carvalho (Prêmio APCA), Ismael Nery (Prêmios APCA e ABCA), Pancetti, Anita Malfatti, Samson Flexor (Prêmio APCA), Portinari, Alfredo Volpi, Guignard, Yutaka Toyota (Prêmio APCA). Mostras Recentes: 2022 O Gênesis segundo Eva, Museu de Arte Sacra de São Paulo, Armorial 50 Centro Cultural Banco do Brasil, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, São Paulo e Brasília. Magliani, Fundação Iberê Camargo, RS, Sandra Mazzini, Farol Santander, São Paulo, Tereza Costa Rêgo, Galeria Marco Zero, Recife, Modernismo Expandido, Museu Nacional, Brasília. 2023 Ianelli – 100 anos, Museu de Arte Moderna de São Paulo, Armorial 50, Museu de Arte Popular da Paraíba, Campina Grande, PB, Elke Hering, Instituto Collaço Paulo, Florianópolis, SC, Elas, Fundação Edson Queiroz, Fortaleza, CE, Fachinetti, Danielian Galeria de Arte, XXII Unifor Plástica, Fundação Edson Queiroz, Fortaleza, CE, A Máquina do Tempo – Museu da Fotografia, Fortaleza, CE, Armorial 50, Museu do Estado de Pernambuco, Recife, PE, Di Cavalcanti, 125 anos, Farol Santander, SP, Yutaka Toyota, Museu de Arte Moderna Aloísio Magalhães, Recife, PE. 2024 Pancetti, Farol Santander, SP, Armorial 50, Museu de Arte da Bahia, Iuri Sarmento, Farol Santander, SP.

Maurício Redig de Campos é sobrinho neto do pintor Reynaldo Fonseca. Bacharel em administração de empresas, com MBA em gestão de pessoas e especialização em comércio exterior. Atua em multinacionais e em empresas consolidadas no mercado nacional. É também proprietário da Redig Artes responsável por todas as atividades institucionais, avaliações de autenticidade, catalogação das obras e gestão do acervo da família.

Lançamento do livro Reynaldo Fonseca

Na ocasião haverá tarde de autógrafos e conversa com os autores. Serão distribuídos 100 livros gratuitamente

Palestra com os autores Denise Mattar e Maurício Redig de Campos: Sábado, 17 de agosto, às 16h: Biblioteca Mário de Andrade – Rua da Consolação 94 – República – São Paulo.

Mostra de Carlos Scliar e Cildo Meireles

24/jun

A Casa Museu Carlos Scliar, Cabo Frio, RJ, completa 20 anos com exposição imersiva que reúne até 25 de junho de 2025, obras de Carlos Scliar e Cildo Meireles.

Para marcar os 20 anos da Casa Museu Carlos Scliar, será inaugurada no dia 29 de junho de 2024, a exposição “Os Artivistas: Carlos Scliar e Cildo Meireles”, que une, pela primeira vez, a obra desses dois importantes artistas. “O Scliar foi fundamental na minha vida”, afirma Cildo Meireles sobre o amigo falecido em 2001. Com curadoria de Cristina Ventura, coordenadora da casa museu, serão apresentadas cerca de trinta obras, sendo algumas inéditas, que cobrem um período que vai desde a década de 1940 até 2021. Completam a mostra obras participativas, inspiradas nos trabalhos dos dois artistas. A exposição, que terá entrada gratuita até o final do mês de agosto, é apresentada pelo Governo Federal, Ministério da Cultura, Governo do Estado do Rio de Janeiro, Secretaria de Estado de Cultura e Economia Criativa do Rio de Janeiro através da Lei Paulo Gustavo.

“A ideia é provocar no espectador um convite á reflexão, instigada pela atualidade das questões tratadas pelos artistas em suas obras. Temas como: crimes de estado, meio ambiente, guerra, valor monetário, entre outros. Nosso propósito é que a pessoa pense sobre o seu papel no mundo de hoje”, diz a curadora Cristina Ventura.

As obras de Cildo Meireles e Carlos Scliar serão expostas juntas, como uma grande instalação, sem seguir uma ordem cronológica. São pinturas, desenhos, colagens, estudos, gravuras, objetos e vídeos. De Cildo, estarão as notas “Zero Dólar” (1984) e “Zero Cruzeiro” (1978), a instalação sonora “Rio Oir” (2011), o vídeo “15 segundos” (2021), em homenagem a Marielle Franco, entre outras obras. De Scliar, destacam-se os desenhos “Levante do Gueto de Varsóvia” (1957) e “SOS” (1989), além de desenhos e estudos, alguns inéditos, que tratam de temas como a cultura afro-brasileira e o holocausto. “Sou um grande admirador dos desenhos do Scliar, acho que ele era um desenhista dos mais talentosos do Brasil, verdadeiramente sensível”, afirma Cildo Meireles.

Na mostra, estará, ainda, a matriz da capa da Revista Horizonte, feita por Scliar em 1952, onde se lê: “Assine Apelo Paz”. “A Segunda Guerra Mundial o marcou muito, Scliar foi pracinha, atuou como cabo de artilharia. No período pós-guerra participa ativamente de movimentos a exemplo o Congresso pela Paz ocorrido na antiga Tchecoslováquia, a mensagem trazida na obra é fundamental”, diz a curadora. Uma reprodução tátil desta matriz fará parte da exposição para que o visitante possa manuseá-la. Também estará na exposição um texto inédito do artista, da década de 1980, narrado pela cantora e compositora Marina Lima. No documento, Scliar expressa sua indignação e cansaço diante da nossa construção histórica. A artista cresceu vendo obras de Scliar, colecionadas por seu pai, segundo Marina, “…uma imagem afetiva que nunca esqueço”. A gravação foi feita especialmente para a exposição.

Com trajetórias diversas, Carlos Scliar e Cildo Meireles se conheceram em 1966. “A partir do nosso primeiro encontro, onde mostrei meus desenhos, ele se interessou em mostrar esses trabalhos para alguns colecionadores e a partir daí praticamente me financiou. Sempre foi uma pessoa de uma generosidade muito grande, não só no meu caso, mas também com outros artistas jovens que estavam iniciando. Ele era uma pessoa de um entusiasmo intrínseco, estava sempre incentivando, sempre apoiando”, conta Cildo Meireles. Os dois foram muito amigos durante toda a vida e, em diversos momentos, tratam de questões similares em seus trabalhos, como no período da Ditadura militar. Outras questões também convergem na produção dos dois: a icônica obra “Zero Dólar”, de Cildo Meireles, traz a imagem do Tio Sam, personagem que aparece sobrevoando a Amazônia com asas pretas, como se fosse um urubu, na obra “SOS”, de Carlos Scliar.

Percurso da exposição

A mostra começa com uma linha do tempo sobre Carlos Scliar (1920-2001) e chega-se ao jardim, onde está a grande escultura “Volumes Virtuais”, de Cildo Meireles, doada em 2022 para a Casa Museu. Com seis metros de altura, é a primeira escultura da série feita em metal.  Ainda no pátio, estarão trechos do projeto inédito do painel em mosaico projetado para o Brasília Palace, em 1957, a pedido de Oscar Niemeyer (1907-2012), que nunca chegou a ser executado. A obra traz uma homenagem à cultura afro-brasileira, com elementos da religiosidade africana.

Na sala menor, próxima ao jardim, haverá uma grande caixa em perspectiva, inspirada nas famosas caixas criadas por Scliar, onde o público poderá entrar. Nela, estarão matérias de jornais onde o artista alertava para questões ambientais, trazendo manchetes como “A indignação do pintor”, fazendo um contraponto com o que está acontecendo hoje. “Em muitos momentos, Scliar aproveita o espaço na mídia não para falar de sua obra, mas sim para advertir sobre a forma destrutiva que tratamos nosso habitat. As matérias são atuais, as proporções é que são mais desastrosas”, ressalta a curadora. Ainda dentro da caixa haverá imagens do projeto educativo “Meu lugar, meu patrimônio”, onde adolescentes da rede pública de ensino de Cabo Frio e região, falam sobre questões ambientais, em consonância com a fala de Scliar na década de 1980 e o cenário atual.

Na antessala do salão principal estarão dois jogos interativos, um ilustrado com a obra de Carlos Scliar e outro Cildo Meireles, e a reprodução tátil da obra “Assine Apelo Paz”. Seguindo, chega-se à sala principal, onde estarão as cerca de trinta obras dos dois artistas, montadas como uma grande instalação, ambientada pela escultura sonora “Rio Oir”, de Cildo Meireles, na qual o artista coleta o som de algumas das principais bacias hidrográficas brasileiras, gravadas em vinil. Neste mesmo espaço estará o vídeo “15 Segundos”, no qual a vereadora Marielle Franco (1978-2018) é homenageada. Na mesma sala, haverá obras que destacam a atuação de Carlos Scliar na área gráfica, junto à redação das revistas culturais Horizonte (1950 a 1956) e na criação da revista Senhor (1959 a 1960), além de trabalhos do período da Ditadura militar, que trazem frases como: “pergunte quem”, “urgente”, “pense” e “leia-pense”, além do texto da década de 1980 narrado pela cantora e compositora Marina Lima. “A ideia é que o visitante entre num espaço que o absorva em vários aspectos, seja pelo som da água, seja pelo que está sendo visto ou pelo que não está sendo visto – haverá uma vitrola girando sem disco, denotando ausência, desconforto”, diz Cristina Ventura.

Na sala de cinema haverá a projeção de dois filmes: um de Carlos Scliar falando sobre o compromisso das pessoas com as questões do nosso planeta e outro de Cildo Meireles contando como conheceu Carlos Scliar e sua relação com ele. Para completar a experiência, no segundo andar da Casa Museu está a exposição permanente, onde se pode ver o ateliê de Carlos Scliar, que permanece exatamente como ele deixou.

Sobre a Casa Museu Carlos Scliar

O Instituto Cultural Carlos Scliar (ICCS) foi criado em 2001, mesmo ano da morte de seu patrono. O processo para criação da instituição foi acompanhado pelo artista, um acordo que fez com o filho Francisco Scliar para manter sua memória. Fundada por Francisco Scliar junto com os amigos: Cildo Meireles, Thereza Miranda, Anna Letycia, Regina Lamenza, Eunice Scliar, entre outros conselheiros, a instituição, aberta ao público em 2004, está sediada na casa/ateliê do pintor, em Cabo Frio, Rio de Janeiro. Trata-se de um sobrado oitocentista, com cerca de 1000m², adquirido em ruínas por Carlos Scliar, reformado em 1965 para abrigar seu ateliê e ampliado na década de 1970, com projeto de Zanine Caldas. A casa mantém a ambientação dos espaços deixada por Carlos Scliar, com seus objetos pessoais, acervo documental, bibliográfico, gravuras, desenhos e obras. A coleção resulta da produção do próprio artista ao longo de sua vida, somado a uma expressiva e representativa coleção de obras originais dos mais importantes artistas do cenário brasileiro do século XX, os amigos José Pancetti, Djanira, Di Cavalcanti, Aldo Bonadei, Cildo Meireles, entre outros, além de cerca de 10 mil documentos datados desde a década de 1930. Reforçando seu compromisso sociocultural, ao longo dos últimos três anos foram atendidos mais de 1000 estudantes do Estado do Rio de Janeiro, em projetos educativos. Em 2023, a instituição foi agraciada com o Prêmio Darcy Ribeiro de Educação Museal, promovido pelo IBRAM.

Di Cavalcanti no Farol Santander

23/out

O Farol Santander São Paulo, centro de cultura, lazer, turismo e gastronomia, inaugurou a exposição inédita “Di Cavalcanti – 125 anos”. A mostra apresenta um conjunto de obras raras e extraordinárias pertencentes a coleções particulares de São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador e Fortaleza. Com curadoria de Denise Mattar, a exposição “Di Cavalcanti – 125 anos” permanecerá em exibição até 07 de janeiro de 2024.

O grande destaque fica por conta da excepcional obra Carnaval (1929/30), que foi adquirida na década de 1930 por um colecionador em Paris, lá permanecendo até o ano passado, quando retornou ao Brasil. Trata-se de um trabalho impactante, relativamente desconhecido pelo público e que será exibido pela primeira vez em uma grande exposição.

A criação de Carnaval (1929/30) tem características que o situam na produção realizada entre os anos 1929 e 1931, quando a influência muralista toma corpo na obra de Di Cavalcanti. O artista tinha como proposta criar um muralismo diverso do mexicano, que é marcadamente político, preferindo se debruçar sobre o aspecto humanista. Os sambas, morros, favelas e danças que ele pintou são verdadeiros, quentes, amorosos e carnais – feitos de dentro.

“Partindo de um olhar marcante e afetivo, Emiliano Di Cavalcanti retratou o Brasil utilizando cores vibrantes e formas sinuosas. Sua obra é um registro do cotidiano do povo brasileiro em seus momentos de alegria e tristeza, lazer e trabalho, amores e dores”, comenta Maitê Leite, vice-presidente institucional do Santander Brasil.

A mostra ocupa toda a galeria do 22º andar do Farol Santander São Paulo. São ao todo quarenta e cinco trabalhos, incluindo um álbum com dezesseis gravuras, que traçam um percurso do artista de 1920 a 1970 por meio de seu tema favorito: o povo brasileiro, com suas festas, sambas e carnavais. O conjunto proporciona uma oportunidade única de ver algumas de suas obras-primas e de acompanhar sua trajetória pictórica, pesquisas estéticas, opções construtivas e afinidades eletivas.

Terminando pelo início, a exposição apresenta Fantoches da meia-noite, álbum realizado por Di Cavalcanti em 1921. O conjunto de 16 gravuras, acompanhado de texto do poeta Ribeiro Couto, foi editado por Monteiro Lobato num álbum extremamente moderno para a época e de grande impacto até hoje. Seu lançamento foi um dos pontos de partida da Semana de Arte Moderna de 22, na qual Di Cavalcanti teve um protagonismo às vezes subavaliado pelos estudiosos.

“Di Cavalcanti – 125 anos” vem assim apresentar o artista na sua integridade, um intelectual apaixonado, boêmio, sensual e romântico – autor de algumas das mais belas obras da nossa arte. Obras que têm o cheiro, o sabor e a cor do Brasil”, relata Denise Mattar, curadora da mostra.

Di Cavalcanti – 125 anos no Metrô SP

O Farol Santander São Paulo, em parceria com o Metrô SP, apresenta nas vitrines da estação Trianon-Masp (linha 2 – verde) reproduções das obras Seresta (1925) e Carnaval (1929/30). Assim, os paulistanos e turistas que circulam diariamente por um dos pontos mais tradicionais da cidade, na Avenida Paulista, poderão conferir durante o mesmo período expositivo réplicas de dois dos principais trabalhos exibidos na mostra do Farol Santander São Paulo.

A exposição “Di Cavalcanti – 125 anos” conta com o patrocínio do Santander Brasil, por meio da Lei Federal de Incentivo à Cultura do Ministério da Cultura.

Destaques das obras

“Seresta”, de 1925 foi criada logo após seu retorno ao Brasil, já exibia elementos característicos da vida carioca que dominariam sua obra posterior. Este trabalho antecipou as escolhas estéticas que ele aplicaria nos painéis decorativos do Teatro João Caetano (SP) em 1929.

A obra “Devaneio”, de 1927, busca pela expressão autêntica da cultura brasileira, Di Cavalcanti escolheu como seu tema as bordas da cidade, as pessoas comuns, os “suburbanos” retratados nas favelas, nos botecos, nas docas e nos bordéis. O título “Devaneio” ganha reforço na postura pensativa e um tanto melancólica da figura principal, uma mulher negra, perdida em sonhos, retratada ao lado de um barraco – um cenário que remete à época em que os morros se tornaram o “berço do samba”.

Seguindo para a obra “Nascimento de Vênus”, de 1940, Di Cavalcanti continuou a produzir no Brasil, mulheres olímpicas, quase clássicas, com toques picassianos, às quais adicionaram uma sensualidade tropical, mestiça e calor. Nessa obra, o artista compõe três mulheres com diversos tipos físicos que unem um olhar cúmplice diante da nudez e da beleza pura da protagonista.

Na criação, “Abigail”, de 1940, o lirismo e uma sensualidade vigorosa tomam conta das telas de Di Cavalcanti. É um período romântico, de retratos imaginados, no qual as mulheres têm olhos doces e os ambientes são cuidadosamente ornamentados. “Abigail” é um registro excepcional dessa fase.

“A espera”, de 1960, o artista é convidado a criar painéis e murais para a nova arquitetura de linhas simples e arrojadas que começava a se implantar no Brasil, encarnando o sonho da modernidade. A obra ilustra bem essa fase na qual os espaços vazios vão desaparecendo até que toda a tela é ocupada por elementos ornamentais, balcões, portas, janelas e vestidos que se mesclam a elementos florais e até animais.

A obra “Colombina, pierrô e arlequim”, de 1960, traz o universo carnavalesco que esteve presente ao longo da produção de Di Cavalcanti, tanto em seu aspecto sensual e debochado, quanto na lembrança das comemorações mais ingênuas dos carnavais antigos. Na obra, o artista empodera “Colombina”, retratada como uma bela mulher, coroada e presenteada com flores.

“Mulata na cadeira”, de 1970 (Coleção Santander Brasil), destaca o reconhecimento do artista. Na década de 1950, ele foi rotulado como o “pintor das mulatas”, o que, na verdade, simplifica muito seu talento. Di Cavalcanti retratou uma variedade de mulheres, independentemente de sua origem étnica, status social ou características físicas, em um contexto lírico e sensual. No entanto, suas obras sempre exalavam um toque de melancolia no ar. A representação das figuras femininas ao longo de sua vida artística acompanha sua evolução como pintor, suas explorações estéticas e suas decisões construtivas. Mesmo enfrentando problemas de saúde nos últimos anos de sua vida, Di Cavalcanti perseverou na criação de obras notáveis, como “Mulata na cadeira”. Esta pintura é um exemplo vívido de sua estética vibrante e colorida, permeada por elementos surrealistas.

Por fim, a obra “Fantoches da meia-noite”, de 1921. Di Cavalcanti era muito amigo de Paulo Barreto, o João do Rio, cronista famoso, tradutor de Oscar Wilde e autor de “A alma encantadora das ruas”. O escritor apresentou o submundo carioca ao artista, o que o levou a produzir a série “Fantoches da meia-noite”. O conjunto de 16 gravuras, acompanhado de um texto do poeta Ribeiro Couto, foi editado por Monteiro Lobato num álbum extremamente moderno para a época e de grande impacto até hoje.

Di Cavalcanti no Farol Santander

19/out

O Farol Santander São Paulo, centro de cultura, lazer, turismo e gastronomia, inaugurou a exposição inédita “Di Cavalcanti – 125 anos”. A mostra apresenta um conjunto de obras raras e extraordinárias pertencentes a coleções particulares de São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador e Fortaleza. Com curadoria de Denise Mattar, a exposição “Di Cavalcanti – 125 anos” permanecerá em exibição até 07 de janeiro de 2024.

O grande destaque fica por conta da excepcional obra Carnaval (1929/30), que foi adquirida na década de 1930 por um colecionador em Paris, lá permanecendo até o ano passado, quando retornou ao Brasil. Trata-se de um trabalho impactante, relativamente desconhecido pelo público e que será exibido pela primeira vez em uma grande exposição.

A criação de Carnaval (1929/30) tem características que o situam na produção realizada entre os anos 1929 e 1931, quando a influência muralista toma corpo na obra de Di Cavalcanti. O artista tinha como proposta criar um muralismo diverso do mexicano, que é marcadamente político, preferindo se debruçar sobre o aspecto humanista. Os sambas, morros, favelas e danças que ele pintou são verdadeiros, quentes, amorosos e carnais – feitos de dentro.

“Partindo de um olhar marcante e afetivo, Emiliano Di Cavalcanti retratou o Brasil utilizando cores vibrantes e formas sinuosas. Sua obra é um registro do cotidiano do povo brasileiro em seus momentos de alegria e tristeza, lazer e trabalho, amores e dores”, comenta Maitê Leite, vice-presidente institucional do Santander Brasil.

A mostra ocupa toda a galeria do 22º andar do Farol Santander São Paulo. São ao todo quarenta e cinco trabalhos, incluindo um álbum com dezesseis gravuras, que traçam um percurso do artista de 1920 a 1970 por meio de seu tema favorito: o povo brasileiro, com suas festas, sambas e carnavais. O conjunto proporciona uma oportunidade única de ver algumas de suas obras-primas e de acompanhar sua trajetória pictórica, pesquisas estéticas, opções construtivas e afinidades eletivas.

Terminando pelo início, a exposição apresenta Fantoches da meia-noite, álbum realizado por Di Cavalcanti em 1921. O conjunto de 16 gravuras, acompanhado de texto do poeta Ribeiro Couto, foi editado por Monteiro Lobato num álbum extremamente moderno para a época e de grande impacto até hoje. Seu lançamento foi um dos pontos de partida da Semana de Arte Moderna de 22, na qual Di Cavalcanti teve um protagonismo às vezes subavaliado pelos estudiosos.

“Di Cavalcanti – 125 anos” vem assim apresentar o artista na sua integridade, um intelectual apaixonado, boêmio, sensual e romântico – autor de algumas das mais belas obras da nossa arte. Obras que têm o cheiro, o sabor e a cor do Brasil”, relata Denise Mattar, curadora da mostra.

Di Cavalcanti – 125 anos no Metrô SP

O Farol Santander São Paulo, em parceria com o Metrô SP, apresenta nas vitrines da estação Trianon-Masp (linha 2 – verde) reproduções das obras Seresta (1925) e Carnaval (1929/30). Assim, os paulistanos e turistas que circulam diariamente por um dos pontos mais tradicionais da cidade, na Avenida Paulista, poderão conferir durante o mesmo período expositivo réplicas de dois dos principais trabalhos exibidos na mostra do Farol Santander São Paulo.

A exposição “Di Cavalcanti – 125 anos” conta com o patrocínio do Santander Brasil, por meio da Lei Federal de Incentivo à Cultura do Ministério da Cultura.

Destaques das obras

“Seresta”, de 1925 foi criada logo após seu retorno ao Brasil, já exibia elementos característicos da vida carioca que dominariam sua obra posterior. Este trabalho antecipou as escolhas estéticas que ele aplicaria nos painéis decorativos do Teatro João Caetano (SP) em 1929.

A obra “Devaneio”, de 1927, busca pela expressão autêntica da cultura brasileira, Di Cavalcanti escolheu como seu tema as bordas da cidade, as pessoas comuns, os “suburbanos” retratados nas favelas, nos botecos, nas docas e nos bordéis. O título “Devaneio” ganha reforço na postura pensativa e um tanto melancólica da figura principal, uma mulher negra, perdida em sonhos, retratada ao lado de um barraco – um cenário que remete à época em que os morros se tornaram o “berço do samba”.

Seguindo para a obra “Nascimento de Vênus”, de 1940, Di Cavalcanti continuou a produzir no Brasil, mulheres olímpicas, quase clássicas, com toques picassianos, às quais adicionaram uma sensualidade tropical, mestiça e calor. Nessa obra, o artista compõe três mulheres com diversos tipos físicos que unem um olhar cúmplice diante da nudez e da beleza pura da protagonista.

Na criação, “Abigail”, de 1940, o lirismo e uma sensualidade vigorosa tomam conta das telas de Di Cavalcanti. É um período romântico, de retratos imaginados, no qual as mulheres têm olhos doces e os ambientes são cuidadosamente ornamentados. “Abigail” é um registro excepcional dessa fase.

“A espera”, de 1960, o artista é convidado a criar painéis e murais para a nova arquitetura de linhas simples e arrojadas que começava a se implantar no Brasil, encarnando o sonho da modernidade. A obra ilustra bem essa fase na qual os espaços vazios vão desaparecendo até que toda a tela é ocupada por elementos ornamentais, balcões, portas, janelas e vestidos que se mesclam a elementos florais e até animais.

A obra “Colombina, pierrô e arlequim”, de 1960, traz o universo carnavalesco que esteve presente ao longo da produção de Di Cavalcanti, tanto em seu aspecto sensual e debochado, quanto na lembrança das comemorações mais ingênuas dos carnavais antigos. Na obra, o artista empodera “Colombina”, retratada como uma bela mulher, coroada e presenteada com flores.

“Mulata na cadeira”, de 1970 (Coleção Santander Brasil), destaca o reconhecimento do artista. Na década de 1950, ele foi rotulado como o “pintor das mulatas”, o que, na verdade, simplifica muito seu talento. Di Cavalcanti retratou uma variedade de mulheres, independentemente de sua origem étnica, status social ou características físicas, em um contexto lírico e sensual. No entanto, suas obras sempre exalavam um toque de melancolia no ar. A representação das figuras femininas ao longo de sua vida artística acompanha sua evolução como pintor, suas explorações estéticas e suas decisões construtivas. Mesmo enfrentando problemas de saúde nos últimos anos de sua vida, Di Cavalcanti perseverou na criação de obras notáveis, como “Mulata na cadeira”. Esta pintura é um exemplo vívido de sua estética vibrante e colorida, permeada por elementos surrealistas.

Por fim, a obra “Fantoches da meia-noite”, de 1921. Di Cavalcanti era muito amigo de Paulo Barreto, o João do Rio, cronista famoso, tradutor de Oscar Wilde e autor de “A alma encantadora das ruas”. O escritor apresentou o submundo carioca ao artista, o que o levou a produzir a série “Fantoches da meia-noite”. O conjunto de 16 gravuras, acompanhado de um texto do poeta Ribeiro Couto, foi editado por Monteiro Lobato num álbum extremamente moderno para a época e de grande impacto até hoje.

Arte Brasileira na Casa Fiat

11/out

Esta é a primeira vez que uma mostra de tamanha robustez é montada em Belo Horizonte, MG, fora do Museu de Arte da Pampulha (MAP) – algumas obras, inclusive, jamais foram vistas que não na icônica construção encravada às margens da Lagoa da Pampulha, pensada originalmente para abrigar um cassino aberto ao público. A exposição “Arte Brasileira” está organizada em seis núcleos inter-relacionados: Conjunto Moderno da Pampulha, Os Modernos, Pampulha Espiralar: Um Lar, Um Altar, Nossos Parentes: Água, Terra, Fogo e Ar, O Menino Que Vê o Presépio e Novos Bustos. Obras de Cândido Portinari, Guignard, Di Cavalcanti, Burle Marx, Mary Vieira, Oswaldo Goeldi, Antônio Poteiro, Yara Tupynambá, Cildo Meireles, Jorge dos Anjos, Vik Muniz, Nydia Negromonte, Froiid, Wilma Martins, José Bento, Eustáquio Neves e Luana Vitra, entre outros, são artistas de diferentes gerações e movimentos que agora se reúnem na exposição “Arte Brasileira: A Coleção do MAP na Casa Fiat de Cultura”, inaugurada em Belo Horizonte.

No terceiro e extenso andar da Casa Fiat de Cultura, cerca de 200 obras, entre gravuras, pinturas, fotografias, esculturas e cerâmicas, nunca antes expostas em conjunto, fazem um importante passeio pela produção artística brasileira dos séculos XX e XXI, ressaltando os principais deslocamentos da arte contemporânea do país. Ali, estão nomes que contribuíram para elevar não só o pensamento estético, mas também uma criação que lançou olhares inovadores e utópicos sobre o Brasil, a partir de uma elaboração da releitura de uma identidade nacional proposta pelo modernismo.

As obras expostas na Casa Fiat evidenciam, também, a característica vanguardista do MAP, como sublinha o curador do Museu de Arte do Rio (MAR), Marcelo Campos, que assina a curadoria ao lado de Priscila Freire, ex-diretora do museu, inaugurado em 1957: “Na arte brasileira, a palavra vanguarda foi inaugurada no modernismo e acompanha essa coleção do MAP, que sempre se mostrou com muita coragem ao constituir seu múltiplo acervo”.

Priscila Freire, que esteve à frente do MAP durante 14 anos, diz que pode contar um pouco dessa história por meio da exposição. “Indiquei obras que considero interessantes da coleção de um museu que passou pelo moderno, pós-moderno e contemporâneo sendo sempre contemporâneo”, comenta.

Fruto da parceria entre a Casa Fiat de Cultura e prefeitura de Belo Horizonte, por meio da Secretaria Municipal de Cultura e Fundação Municipal de Cultura, “Arte Brasileira: A Coleção do MAP na Casa Fiat de Cultura” fica aberta ao público até fevereiro do ano que vem e é parte das celebrações dos 80 anos do Conjunto Moderno da Pampulha, eleito Patrimônio Cultural da Humanidade pela Unesco.

Para a secretária de Cultura de Belo Horizonte, Eliane Parreiras, “a exposição é um marco para a história do MAP, abre portas para pesquisas futuras e olhares que até então não tinham sido feitos sobre o acervo e a instituiçao”. Por sua vez, o presidente da Casa Fiat, Massimo Cavallo enfatiza o aspecto ousado, grandioso e inovador da mostra, “que desvela novos ângulos que habitam esse Patrimônio Cultural da Humanidade, nutrindo vínculos de pertencimento e identidades”.

Vocação contemporânea

“Arte Brasileira” dialoga com as indagações que permeiam o que há de mais atual nos debates sociais e com a literatura de Conceição Evaristo, Ailton Krenak e Leda Maria Martins, homenageados e retratados no núcleo Novos Bustos. Muito antes de termos como decolonial ou pós-colonial se popularizarem no nosso vocabulário, as obras que serão vistas na mostra já traziam questionamentos que hoje encontram o pensamento contemporâneo. Quando Marcelo Campos e Priscila Freire propuseram que a exposição revelasse tal traço, perceberam que a coleção do MAP respondia a esse anseio e unia o que é considerado erudito, popular e contemporâneo.

“Só um acervo de vanguarda poderia nos dar insumos e elementos para constituir uma exposição com quantidade de arte popular que temos, com artistas negros e negras e também com muitas mulheres fundamentais para a arte brasileira. A exposição explicita isso, mas também busca renovar a leitura. Muitas obras aqui pertencem ao acervo, mas nunca tinham sido expostas. Isso é fundamental”, explica Campos.

Os quadros “Os acrobatas” (1958), de Candido Portinari, e “Espaço (da série Luz Negra)”, de Jorge dos Anjos, são dois destaques da exposição. “No Portinari é bonito porque a gente vê um artista modernista observando a cultura popular. Uma das utopias modernistas foi pensar uma sociedade mais justa, igualitária, com os ideais humanistas presentes. A grandeza de Portinari foi alertar para um Brasil que tinha na população suas riquezas culturais”, ressalta o curador.

Sobre Jorge dos Anjos, que tem outras duas obras expostas na Casa Fiat, Marcelo Campos salienta que o ouro-pretano ampliou tradições e “é um artista negro que olha para o seu tempo e, por outro lado, não esquece as discussões ancestrais”.

Entre as obras inéditas, vêm à tona o conjunto de pinturas populares e o presépio pertencente ao núcleo O Menino Que Vê o Presépio, montado em uma das pontas do terceiro andar da Casa Fiat. Exibido pela primeira vez ao público, a obra, inspirada em um conto de Conceição Evaristo, tem cerca de 300 peças e é composta por esculturas em cerâmicas originárias do Vale do Jequitinhonha, com autoria de Cléria Eneida Ferraz Santos e Mira Botelho do Vale.

“Esse é outro grande destaque, vamos colocar isso dentro de uma exposição que, em tese, seria de arte moderna e contemporânea. Esse gesto reforça a ideia de vanguarda do acervo do MAP”, afirma Marcelo Campos. Outra novidade fica por conta do restauro de duas obras: “Estandartes de Minas” (1974), de Yara Tupynambá, e “Tempos Modernos” (1961), de Di Cavalcanti, que se juntarão à mostra.

“Arte Brasileira: A Coleção do MAP na Casa Fiat de Cultura” joga luz na potência cromática da arte brasileira e faz as pazes com a diversidade e a força das cores, tão rechaçadas e inferiorizadas por uma leitura antiquada e elitista. Com a mostra, atual e tropicalista, o curador diz que esse trauma pode ser superado: “A cor é uma conquista, horizontaliza a arte”.

Programação paralela

No dia 29 de outubro, às 11h, o Encontros com o Patrimônio convida a diretora de museus da Fundação Municipal de Cultura de Belo Horizonte, Janaina Melo, para o bate-papo “Museu de Arte da Pampulha (MAP): Um Museu e Suas Histórias”. O evento é virtual e gratuito, com inscrição pela Sympla. Já no dia 07 de novembro, às 19h30, a Casa Fiat de Cultura realiza um bate-papo presencial com os curadores Marcelo Campos e Priscila Freire.

A exposição “Arte Brasileira: A Coleção do MAP na Casa Fiat de Cultura” fica aberta ao público, na Casa Fiat de Cultura (Praça da Liberdade, 10 – Funcionários), até 04 de fevereiro de 2024.

Simples e Sofisticado

21/set

Exposição do artista Paulo Roberto Leal é o atual cartaz da Galeria de Arte Ipanema, Rio de Janeiro, RJ, e obedece curadooria de Paulo Venancio Filho. Para o curador, a exposição “Simples/Sofisticado”, é uma reapresentação importante da obra de Paulo Roberto Leal, uma oportunidade ímpar de rever parte do seu legado, que dá prosseguimento à abstração geométrica pós neoconcretismo de uma maneira muito pessoal e, como o próprio artista costumava dizer, bastante lúdica. Tendo realizado algumas importantes exposições do artista, a Galeria de Arte Ipanema – inaugurada em 1971 com uma exposição de Paulo Roberto Leal – desta vez reúne mais de 20 trabalhos. Uma das precursoras do Modernismo e uma das mais longevas do Brasil, a galeria presta homenagem a Paulo Roberto Leal reunindo parte da coleção do acervo, entre pinturas e objetos, em um recorte que vai dos anos 1970 aos 80. Sua experiência anterior como artista gráfico deu intimidade para solucionar a ocupação de espaços especialmente bidimensionais, introduzindo uma certa liberdade cromática que imprime o clima do Rio de Janeiro dos anos 1970, mais extrovertido, diferente do neoconcretismo dos anos 1950.

À frente da galeria, Luiz Sève e sua filha Luciana Sève, falam sobre a relevância deste evento na sua cronologia: “Para nós, da Galeria de Arte Ipanema, esta exposição do Paulo Roberto Leal é motivo de grande orgulho e entusiasmo. Depois de 35 anos da última mostra conosco, Paulo continua sendo, através do seu trabalho, o mesmo jovem com quem convivemos: alegre e contagiante através de suas maravilhosas telas e esculturas. Temos muita satisfação em poder oferecer ao público o acesso às suas obras espetaculares”, afirmam.

A palavra do curador

A obra de Paulo Roberto Leal pode ser compreendida como uma inventiva continuidade pessoal aos processos abstrato geométricos neoconcretos, em especial, as suas escolhas e soluções cromáticas e ao tratamento que deu ao plano pictórico.  A novidade que introduz ao que seria possível de chamar de “pós-neoconcretismo” é a franca liberdade que concede às cores e ao material, em especial do papel. Sua atividade anterior como artista gráfico deu a ele uma intimidade e sensibilidade única com o papel – o elemento polivalente de sua obra. Para ele a materialidade própria do papel é simultaneamente suporte planar e fator “objetal”, pois podemos designar como objetos as tão conhecidas caixas de acrílico do artista nas quais o papel assume uma tridimensionalidade inusitada. Aí se percebe a inteligência do artista gráfico em articular e organizar o espaço pictórico – ou tridimensional -, tudo, imagina-se, deriva dessa convivência íntima com o planaridade. Nas cores que utiliza percebe-se uma determinada característica intimista e extrovertida, um possível paradoxo que articula a intimidade do exercício lúdico e extroversão cromática. O mesmo ocorre em certas reverberações cinéticas, como o movimento instável e gracioso do papel dentro das caixas e outros ritmos que permanecem ao longo da obra. O elemento constante, fundamental e que conduze toda obra é a presença da linha; não só sua presença como elemento divisório do espaço que tem inédita continuidade na costura que une as diversas partes da tela – costura que em alguns trabalhos é o único elemento que se apresenta na tela; só ela e mais nada.  Estas singelas inovações dão a dimensão do processo que se desenvolve até mesmo na presença efetiva da linha como elemento físico. Ela que também é a linha que costura, indica pluralidade de funções que executa – a linha costura e a costura é uma linha, mostrando a igualdade de uma e outra. Poderia se dizer que a linha que é um dos fundamentos do “pensamento gráfico ampliado” desenvolvido em diversas fases da obra do artista. Mesmo nas caixas, a vista privilegiada é aquela que oferece ao olhar as linhas sinuosas e ondulantes do papel recortado tocando a face do acrílico – esta a face “cinética” do trabalho que o artista encontrou na maleabilidade do papel, a espécie de “corpo” sensual que o papel forma dentro da caixa. O lirismo que percorre a escolha das cores – cores levemente pop -, especialmente os vermelhos e laranjas, extravasa uma cálida temperatura visual. Esta que deriva certamente do ambiente e da época – década de 1970 – da cidade do Rio de Janeiro. De uma simplicidade sofisticada – uma equação que é difícil solucionar -, despretensiosa e assertiva, implicada em seus delicados problemas, estendendo a abstração geométrica para uma absorção da experiência gráfica, de cuidadosa execução e disposição dos elementos geométricos, Paulo Roberto atraiu uma atenção que o levou a 36ª Bienal de Veneza e ampliou o interesse nacional e internacional por sua obra, que ainda persiste. A diversidade dos procedimentos que utilizou: costura, uso de linhas de seda, papel, acrílico, estabeleceram sua posição única naqueles anos de intensa experimentação das práticas artísticas onde começavam a prevalecer instalações, objetos e performances, colocando-o numa posição lateral, e não só ele. Nesse contexto sua obra não se alterou, permaneceu constante, reafirmando a cada momento a integridade da sua poética artística. E ainda hoje seu trabalho continua a sugerir uma singular intimidade ao estabelecer uma escala de pequena dimensão que circunscreve o espaço de uma convivência próxima, sugestiva ao jogo, ao interesse e prazer lúdico. Assim muitas de suas telas sugerem a disposição e a montagem das figuras geométricas, estabelecendo entre elas um convívio que manifesta a sensação do acerto buscado e encontrado: medida que o artista, desde sua experiência gráfica, tinha dentro de si. Uma obra, que vista depois de décadas, ainda exala um frescor intocado, rejuvenescido pelo tempo. (Paulo Venancio Filho).

A trajetória de Paulo Roberto Leal

Um dos ícones da expressão artística nos anos 1970, Paulo Roberto Leal (1946-1991) foi funcionário do Banco Central em 1967, tendo realizado os primeiros trabalhos de programação visual em 1969, produzindo catálogos de exposições de artes plásticas no Rio de Janeiro. Nesse mesmo ano, entra em contato com o neoconcretista Osmar Dillon e, na década 70, inicia experimentação com materiais ligados a seu trabalho no banco, como bobinas de papel. Ministra curso sobre criatividade com papel no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro – MAM/RJ e recebe prêmio na 11ª Bienal Internacional de São Paulo, em 1971. No ano seguinte, integra, com Franz Weissmann e Humberto Espíndola, a representação brasileira na 36ª Bienal de Veneza. Por ocasião da mostra O Gesto Criador, Olívio Tavares de Araújo realiza filme sobre sua obra em 1977. Trabalha como curador do Museu de Valores do Banco Central até 1980. Em 1984, em parceria com Marcus de Lontra Costa e Sandra Magger, faz a curadoria da mostra “Como Vai Você, Geração 80?”, na Escola de Artes Visuais do Parque Lage – EAV/Parque Lage, no Rio de Janeiro. É projetado em 1995 o Centro de Referência Iconográfica e Textual PRL no MAM/RJ, com a documentação deixada pelo artista sob a guarda de Armando Mattos. Em 2000, ocorre a exposição Projeto Concreto/PRL, no Centro Cultural da Light, no Rio de Janeiro, e, em 2007, 102 obras de sua autoria são reunidas na mostra Da Matéria Nasce a Forma, no Museu de Arte Contemporânea – MAC-Niterói. Dentre suas participações em exposições internacionais, merecem destaque “Unexpectedly” (Cloud Seven/Bruxelas), a coletiva “Afinidades Eletivas” (Galeria Esther Schipper/Berlim), com curadoria de Olivier Renaud-Clement, que em 2018 agrupou obras de Fernanda Gomes, Jac Leirner, Marcius Galan, Mira Schendel.

Sobre a Galeria de Arte Ipanema

A história da arte moderna e contemporânea brasileira se funde com a da Galeria de Arte Ipanema, que é reconhecida pelas importantes mostras de renomados artistas já realizadas ao longo dos seus 57 anos. Desde que surgiu, vem consolidando uma identidade própria e ocupa assim um espaço fundamental para o despontar artístico no Brasil. Considerada uma das mais relevantes e antigas galerias do país, reúne um acervo de peso e representatividade com obras de artistas internacionalmente reconhecidos, como Volpi, Cruz-Díez, Milton Dacosta, Lygia Clark, Sérgio Camargo, Di Cavalcanti, Portinari, Ivan Serpa, Guignard, Cícero Dias, Iberê Camargo, Antônio Bandeira, Pancetti, Tomie Ohtake entre outros. Tendo começado sua história no Copacabana Palace e ocupado endereço na Rua Farme de Amoedo, hoje está instalada no andar térreo de um belo prédio na Rua Aníbal de Mendonça, na quadra da praia, com projeto arquitetônico do escritório de Miguel Pinto Guimarães.

Heitor dos Prazeres no CCBB Rio

29/jun

Retrospectiva no CCBB, Centro, Rio de Janeiro, RJ, destaca perfil multimídia de Heitor dos Prazeres e a importância histórica de sua obra. A exposição “Heitor dos Prazeres é meu nome” reúne mais de 200 trabalhos, entre pinturas, desenhos e esboços, mobiliário, indumentárias, partituras e acervo documental

Décadas antes de o termo multimídia (ou mesmo “mídia”) se popularizar, Heitor dos Prazeres (1898-1966) já atuava em várias frentes artísticas, da música à pintura, da cenografia ao figurino, passando pelo mobiliário. Nascido dez anos após a abolição da escravatura, registrou, em suas composições e, a partir da década de 1930, com pincéis, tintas e suportes variados, da madeira à tela, crônicas do Rio suburbano da primeira metade do século XX.

Da mesma forma que frequentou as casas das tias da Praça Onze, como a da célebre Tia Ciata, e colaborou na fundação das primeiras escolas de samba da cidade, a exemplo de Mangueira, Portela e Deixa Falar (que originou a Estácio de Sá), sua produção nas artes visuais retratou temas ignorados na época pela academia, como os cultos de matriz africana, as primeiras rodas de samba e a transformação do subúrbio rural em cenário urbano, com o surgimento das primeiras favelas.

Com curadoria de Raquel Barreto, Pablo León de la Barra e Haroldo Costa, a seleção reúne obras de coleções particulares, incluindo telas pouco vistas, e de instituições como o Masp, a Pinacoteca de São Paulo, o MAM do Rio, o Ipeafro e os Museus Castro Maya.

Entre as raridades, estão duas de suas obras mais antigas, criadas poucos anos após seu início na pintura, em 1937: “O sonho” (1939) e “Caboclo”, da década de 1940. O título da mostra é retirado de uma fala do próprio pintor no documentário que leva seu nome, dirigido por Antônio Carlos da Fontoura em 1965. Uma apresentação que o situa entre os grandes nomes das artes brasileiras no século XX e, ao mesmo tempo, introduz sua produção ao público mais jovem.

– O título o reafirma como um homem negro que se coloca como sujeito de sua própria história e a representa assim. Ele foi nomeado de naïf, mas, se não fosse o racismo estrutural, um artista desta grandeza seria considerado um pintor moderno – acredita Raquel Barreto. – Outra importância da sua obra foi ter retratado a religiosidade afro-brasileira, que, neste momento, está sob ataque. Heitor era ogã, o responsável, no candomblé, por tocar para que o orixá desça à Terra. É uma função de mediador, um trânsito que ele também desempenhou em sua vida artística.

Curador de arte latino-americana do Guggenheim, de Nova York, Pablo León de la Barra destaca a importância histórica da mostra.

– A História da Arte tratou artistas como Heitor por muito tempo como primitivos ou ingênuos, o que é mais grave num país como o Brasil, onde o racismo dificulta o acesso à educação, o que tem de ser considerado numa releitura como a que estamos propondo – ressalta o curador. – A própria Tarsila (do Amaral) poderia ter sido considerava uma pintora naïf, pela forma como abordava os temas, como romantizava a realidade brasileira, mas isso não aconteceu, como no caso do Heitor.

Autodidata, Heitor começou a ser reconhecido também na pintura a partir da década de 1950, quando fica com o terceiro lugar para artistas nacionais na 1ª Bienal Internacional de São Paulo, em 1951, e ganha uma sala especial na 2ª Bienal, em 1953. Em 1966, participou do I Festival de Artes Negras em Dakar, no Senegal, meses antes de sua morte (a retrospectiva traz obras de Heitor e outros dois brasileiros na seleção, uma tela de Rubem Valentim e uma escultura de Agnaldo dos Santos). O evento marcou a memória de Haroldo Costa, que sentou ao lado do pintor no voo.

– Tive o privilégio de fazer parte da delegação brasileira para Dakar, e outro maior ainda de ir sentado ao lado do Heitor. Fomos conversando durante todo o voo e passei a admirá-lo ainda mais desde então – recorda Costa. – Ele é o melhor exemplar que conheço do “milagre brasileiro”. Tinha tudo para dar errado, mas foi grande em várias áreas. Muito graças à ultrassensibilidade que teve ao longo da vida, como pioneiro na observação do cotidiano da população negra e periférica, com a qual ele convivia.

Fundadora da MT Projetos de Arte, pela qual captou recursos para a exposição via Lei Federal de Incentivo à Cultura, a colecionadora Margareth Telles começou a planejar a mostra durante a pandemia, mas só no início do ano teve o projeto contemplado. Além de mostrar a uma nova geração de espectadores a obra de Heitor dos Prazeres, ela desejava fazer um paralelo com o momento atual da arte contemporânea brasileira, no qual questões sociais e relacionadas à diáspora africana estão no centro do debate.

– Além de ser apaixonada por seu trabalho, achava necessário fazer um recorte de sua produção agora, para colocá-lo em diálogo com artistas da nova geração, como o Dalton Paula, o Arjan Martins, o Maxwell Alexandre. Ele foi pioneiro em tudo, foi o primeiro artista negro a ser premiado numa Bienal, em 1951, ao lado do (suíço) Max Bill – contextualiza Margareth. – Foi o artista que abriu este caminho, retratando essa modernidade negra, da transição do rural para o urbano, das rodas de samba, do Brasil pós-abolição.

Ralação com a moda

Entre os legados da mostra, está a restauração da tela “Praça XV” (1965), da coleção Castro Maya, apresentada em 1966 no 1° Festival Mundial de Artes Negras, em Dakar, e do figurino do Balé do IV Centenário de São Paulo (1954), criado pelo pintor. Além das peças exibidas ao público pela primeira vez no CCBB, outra indumentária assinada por Heitor para a companhia de dança pode ser vista no Museu de Arte do Rio (MAR), na mostra “Carolina Maria de Jesus: um Brasil para os brasileiros”, que tem Raquel Barreto como uma das curadoras.

– Mostramos um pouco deste envolvimento dele com a moda, assinando o figurino do balé, uma coleção de tecidos da Rhodia, além do fato de ser um homem muito elegante, que se vestia sempre de forma impecável – destaca Raquel.

Para a curadora, a obra de Heitor dos Prazeres faz um registro precioso da realidade da população negra do Brasil em seu tempo, mas de forma diferente de outros pintores modernos que se debruçavam sobre o tema, como Di Cavalcanti e Portinari.

– Um dos aspectos que a gente quis destacar foram as cenas que ele pintou da infância de crianças negras. Isso era uma ideia muito nova, porque não existia durante a escravidão, e no pós-abolição essa infância era abreviada pela necessidade do trabalho – comenta Raquel. – E em várias telas com brincadeiras, vemos muito a imagem da pipa, do balão no céu, o que traz uma ideia de liberdade.

Fonte: Veja – por Por Nelson Gobbi.