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AGENDA CULTURAL

Retrospectiva de Niobe Xandó

No dia 20 de fevereiro de 2010, o Brasil perdia uma das maiores representantes de sua pintura: Niobe Xandó. Nascida em 1915, a múltipla artista atravessou um século de incertezas e intensas transformações, claramente prefiguradas em suas telas e desenhos por contornos que comunicam o choque de culturas e civilizações de nosso tempo:  entre o arcaico e o moderno, o primitivo e o futurista.

 

Para comemorar o centenário da artista, a Galeria Marcelo Guanieri, Jardins, São Paulo, inaugura, no dia 23 de maio, a exposição retrospectiva “A surpresa das coisas sempre novas”. Destaque para o lançamento, na ocasião, do livro de colecionador com organização assinada pelo curador Antonio Carlos Suster Abdalla e texto crítico inédito do jornalista Antonio Gonçalves Filho, além de cronologia ilustrada da artista, currículo selecionado e fortuna crítica com apreciações sobre sua obra por alguns dentre os principais críticos brasileiros no século XX, como Vilém Flüsser, Mário Schenberg, Theon Spanudis, Radhá Abramo, Ivo Zanini, Aracy Amaral e Laymert Garcia dos Santos.

 

Intitulada “A surpresa das coisas sempre novas”, a exposição traça um panorama da artista desde a sua fase figurativa nos anos 50, passando pelo amadurecimento nos anos 60, quando elabora composições em torno de mitos, antecipando os processos metamórficos de suas máscaras sugestivas de culturas ancestrais. Nos anos 60/70, com a arte sob influência do concretismo, Niobe mergulha na arte abstrata, sob uma profusão de signos híbridos. No final da vida, nos anos 90, retorna aos desenhos de autorretrato da década de 50, repintando-os. Desta vez, com traços de uma irônica desfiguração. Uma das características que mais individualizaram a artista foi a antecipação – por meio do chamado “letrismo” – de uma das expressões visuais que marcam as atuais metrópoles, as pichações extremas de muros e edifícios. Caminhando em distintos universos como a cerâmica, totens de madeira, colagens, xerografias, pinturas, desenhos e guaches, a exposição contempla toda a trajetória da artista, desde o início impregnada pelo figurativo, com pinturas de cenas e brinquedos infantis e botequins populares.

A virada em sua biografia acontece no início dos anos 1960. Niobe deixa de olhar para a realidade e passa a elaborar composições em torno de mitos. No transculturalismo que resulta destaca-se um “passeio” pela arte surrealista,com as flores e jardins fantásticos que antecipam os processos metamórficos de suas máscaras sugestivas de culturas ancestrais, mais adiante. “Articulação inconsciente entre a perplexidade do homem atual perante o mundo”, nas palavras do filósofo Vilém Flüsser, na qual uma espécie de realismo fantástico afirma-se com formas autenticamente brasileiras.

 

Se nos anos 1960/70, o mundo da artes visuais encontrava-se sob influência da arte concreta e, logo em seguida, conceitual, com características predominantemente intelectuais, frias, Niobe mergulhou, com olhar projetivo e visionário, em uma profusão de signos humanos híbridos. “Em certa medida, ela já suspeitava que a modernidade estava diante de uma mutação antropológica”, afirma o crítico Antonio Gonçalves Filho.

 

Atenta aos movimentos de contestação daquelas décadas, encontramos nessa fase a busca de uma “outra escrita”, como, por exemplo, na colagem com um rosto que nos remete ao cartaz do musical “Hair”, de Rado e Ragni. Nesse mesmo período, quando viveu e pintou entre Londres e Paris, a artista recebe proposta do astro Mick Jagger para assinar capa de disco da banda Rolling Stones.

 

Nos anos 1980, Niobe se investe como uma espécie de “arqueóloga do inconsciente”, recuperando o Construtivismo – até então não avaliado pela história da arte – presente na figuração de culturas ameríndias–, bem como sua possível relação com expressões contemporâneas, para pensar uma nova sintaxe visual. Em 1984/85, o diálogo entre o arcaico e o moderno revela-se numa radical mudança de rota, na qual as obras assumem caráter abstrato lírico e prenunciam novos alfabetos contemporâneos, a exemplo das pichações que hoje recobrem as metrópoles americanas.

 

Na ocasião da exposição será lançado o livro em homenagem ao centenário da artista, intitulado “A surpresa das coisas novas”, que abrange pesquisa minuciosa de Antonio Carlos Suster Abdalla e texto inédito do crítico do jornal “O Estado de São Paulo” Antonio Gonçalves Filho. São 264 páginas, com 194 reproduções de obras de todas as fases da artista, além de outras trinta ilustrações, e trechos dos principais textos críticos escritos a seu respeito.

 

“Este livro foi idealizado para comemorar o centenário de nascimento de Niobe. É um desafio às novas gerações. Mostra o trabalho de uma grande artista, com obras instigantes, repletas da mais variada e rica simbologia – obra analisada por quase cento e cinquenta textos críticos, mas, ainda assim, um pouco distante de todo o merecido reconhecimento”, sintetiza Antonio Carlos Suster Abdalla. Contempla-se, ainda, na esteira das homenagens à artista, a exibição de filme sobre as obras de Niobe dirigido por André Azevedo.

 

 

De 23 de maio a 27 de junho.

"Retrospectiva de Niobe Xandó"

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