Um ato de criação libertário, exercido dentro de um sistema opressivo, isto é, numa cela de manicômio. Uma obra ao mesmo tempo única e feita de múltiplas partes, que exibe, sem hierarquias, mantos, estandartes, esculturas e objetos comuns, mas ressignificados. Uma representação do mundo para ser apresentada a Deus no Dia do Juízo. A partir de 18 de maio – Dia Nacional da Luta Antimanicomial -, o Itaú Cultural, Avenida Paulista, apresenta a exposição “Bispo do Rosario – eu vim: aparição, impregnação e impacto”, que reúne centenas de trabalhos de Arthur Bispo do Rosario (1911-1989), em paralelo com outros artistas, modernos e contemporâneos.
Sobre o artista
Nascido em Sergipe, Arthur Bispo do Rosario se mudou para o Rio de Janeiro aos 14 anos. Na cidade, foi empregado pela Marinha brasileira – as referências ao trabalho no mar estão presentes na sua obra – e pela companhia de eletricidade Light, além de atuar como boxeador. Em dezembro de 1938, após ter se apresentado no Mosteiro de São Bento como juiz dos vivos e dos mortos, foi diagnosticado como esquizofrênico-paranoico. Primeiro, foi levado ao Hospital dos Alienados; depois, à Colônia Juliano Moreira, instituição em Jacarepaguá voltada para os loucos e outros excluídos. Entre 1940 e 1960, alternou períodos de internação e de moradia em outros lugares. Em 1964, voltou para a colônia em definitivo.
Nessas décadas posteriores ao seu episódio místico, Bispo construiu sua obra. Na colônia, desfazendo uniformes dos funcionários, além de lençóis, conseguia os fios para tecer as suas invenções. Por meio do escambo com outros internos, juntava diversos itens. Tanto recuperava memórias suas quanto representava acontecimentos da época, colhidos nos jornais, em seu trabalho. Na década de 1980, essa atuação – em meio a debates da luta antimanicomial e de questões da arte de então – passou a impactar o pensamento social e artístico brasileiro. Nesse contexto, suas criações surgiram com uma potência nova.
Diálogos modernos e contemporâneos
“Bispo do Rosario – eu vim: aparição, impregnação e impacto” conta também com trabalhos de artistas cujas perspectivas criativas têm afinidades com as de Bispo. Nesse sentido, um dos destaques são os integrantes do Ateliê Gaia, coletivo formado por pessoas que tiveram passagem pelo serviço de saúde mental da Colônia Juliano Moreira. Do grupo, mostram-se, entre outras, obras de Arlindo Oliveira e de Patrícia Ruth, que conviveram com Bispo. Entre os outros artistas contemporâneos presentes estão Carmela Gross, Leonilson, Sônia Gomes, Jaime Lauriano, Fernanda Magalhães, Paulo Nazareth, Rosana Paulino, Rick Rodrigues, Rosana Palazyan e Maxwell Alexandre. Além deles, a mostra traz nomes que marcaram o cenário das artes brasileiras ao longo do século XX, como Abraham Palatnik, Regina Silveira, Aurora Cursino, Flávio de Carvalho, Djanira, Geraldo de Barros, Maria Leontina, Edgar Koetz, Antônio Bragança, Carlos Pertuis, Ivan Serpa, Mônica Nador, Maria Aparecia Dias e Ubirajara Ferreira Braga.
Esta exposição é realizada em uma parceria do Itaú Cultural (IC) com o Museu Bispo do Rosario, do Rio de Janeiro, e tem curadoria de Diana Kolker e Ricardo Resende.
Minidocumentário e entrevistas
Acompanhe o nosso canal no YouTube, em que serão publicados conteúdos exclusivos que aprofundam a experiência da mostra: um minidocumentário sobre Arthur Bispo do Rosario que descreve a sua trajetória e as características da sua produção, e uma série de entrevistas com artistas que participam da mostra, como Maxwell Alexandre, Arlindo Oliveira e Patrícia Ruth. Esses materiais serão vinculados também neste texto
Até 02 de outubro.