Foi um longo período de espera para Mario Camargo, que teve a individual adiada quando a crise pandêmica impôs suas normas, fazendo com que os estabelecimentos fechassem as portas ao público. Dois anos depois, o artista irá inaugurar a primeira exposição inédita da Galeria de Arte Ibeu, Jardim Botânico, Rio de Janeiro, RJ, desde o início da pandemia: “No Campo das Beterrabas” que abre no dia 09 de novembro, às 17h, sob curadoria de Cesar Kiraly. Na ocasião, o Coral do Ibeu, apresentará algumas canções de seu repertório, às 19h.
Os trabalhos surgem como peles nas paredes, sustentadas por agulhas.
Em cerca de dez obras apresentadas, a tinta será a substituída pela costura industrial. Movimentos de encolhimentos e franzidos surgirão e substituirão a cor, de forma pictórica, deixando à mostra uma infinidade de buracos e rasgos, tais como arados, representados pelas costuras industriais, onde só faltam as sementes germinarem para revelar, futuramente as cores.
“São tantos os caminhos para esta germinação que quase perdermos o fôlego. A cor não é mobilizada na lógica dos pigmentos, mas do tingimento; a integridade da costura é a protagonista até o último momento. A despeito de todos esforços, a coloração não se sobrepõe à poética do acidente costurado e a abstração se pratica impura, provocando a imaginação a descobrir alternativas”, revela o artista.
Como quase todas as crianças, Mario Camargo demonstrou, desde sempre, interesse pelo desenho. Por convite de uma amiga pintora, fez sua primeira exposição e nunca mais parou. Esther Emílio Carlos, crítica de arte do Ibeu, se apaixonou pelo seu trabalho e abriu várias portas: ele chegou a expor em Santiago do Chile e depois em Paris. Quando participou da feira de arte MAC 2000, em Paris, foi o único brasileiro presente entre 100 artistas franceses. Chamou atenção neste evento sua forma de pintar, executada diretamente no chão, ao sol, usando tinta acrílica líquida. Mario interrompia a secagem com jato d’água e, neste processo de busca quase arqueológica, criava suas obras. Na ocasião, Pierre Restany, crítico de arte francês, profetizou: “você abandonará os chassis e sua pintura se tornará a pele das paredes”. Durante anos o artista conviveu com estas palavras, que se tornaram realidade há pouco tempo.
A palavra do curador
“Não são telas, não há molduras, nem esculturas, são entomologicamente presas por agulhas às paredes, há como ver que as partes das quais são feitas oscilam em origem, mais chegam à mão do artista do que o contrário, as costuras pouco têm de sutura, nem sempre o que costuram precisa ser costurado, apesar da feminilidade da linha e agulha, trata-se do uso não funcional da indústria e do trabalho, mais do que o carinho com o pano da roupa. Se o mundo não se tornar apenas um campo de beterrabas, arruinando a poética, é de tal endereçamento indeterminado que nasce sua beleza, porque é preciso sentir, na obra, as topografias sendo contornadas, aceitas, até certo ponto, o estabelecimento de sequências harmônicas que, depois, interrompidas, são retomadas, como numa frase cheia de apostos. Os tubérculos brotam, outras imagens germinam junto, concorrentes, mas elas não são arbitrárias, habitam o contexto, como ervas daninha. É um sonho, sim, no qual as acepções vizinhas tornam as demais fascinantes, não se esquivando delas”.
Cesar Kiraly é curador da Galeria de Arte Ibeu desde 2015, além de professor de Estética e Teoria Política da UFF.
Até 22 de dezembro.