A individual de José Resende na Galeria Millan, Vila Madalena, São Paulo, SP, pode ser
compreendida como um desdobramento da exposição realizada na Pinacoteca do Estado de
São Paulo, entre abril e junho de 2015. Até caberia dizer que a exposição vem a ser um
transbordamento através do espaço e do tempo.
Na Millan, a mostra também é composta apenas por esculturas recentes e inéditas. Mas
engana-se quem, apenas, antevê uma nova etapa do trabalho de José Resende – composta por
projetos e soluções inovadoras. Pois o caminho percorrido nos 50 anos de produção do artista
é de um “eterno retorno”; um continuum refletido e surpreendente. O humor, a tensão, as
oposições de sentido, o movimento latente e a sua inscrição no espaço público sempre
estiveram e estão presentes em sua obra.
É inegável que a escultura de José Resende explora as relações entre a cidade e o corpo. Seja
pela escolha de materiais– chapas e tubos metálicos, pedras, vidro, tecidos -, ou seja pelo
embate direto da obra – entre verticais, horizontais, diagonais e curvas – com o entorno.
Guiado por um rigoroso pensamento plástico e uma imaginação lúdica, o artista, através de
suas esculturas, provoca uma outra visibilidade sobre a paisagem urbana, a corporeidade e a
mobilidade do mundo.
Aliás, a ideia de imprecisão do movimento é algo que une as obras de Resende expostas na
Galeria Millan. A escultura Dobras (2015) é constituída pelo encaixe de duas chapas de aço:
uma circular, dobrada ao meio, com duas fendas em “v” e outra em formato de meia lua. A
densidade e a resistência das chapas inspiram uma permanência; uma estabilidade aparente.
Que logo cai por terra quando percebe-se que há uma multiplicidade de possibilidades
escultóricas dentro da mesma escultura – basta mudar o encaixe da chapa em v. É na ideia de
um obra aberta que reside seu movimento, sua tensão constante.
Vale ainda por fim, ressaltar que se na Pinacoteca, a obra Dobras (2015) estava disposta como
um par de esculturas idênticas, já na Galeria Millan, a peça se desmembra e aparece como um
conjunto de esculturas, em diversas dimensões.
A obra inédita Corpo de Prova II, 2015 alcança outro tipo de movimento. O título já faz uma
alusão ao que está em jogo na escultura. O cálculo e a precisão da engenharia são suficientes
para controlar a imprevisibilidade da imaginação e do caráter sugestivo da forma plástica? De
um lado, dois tubos de aço inox escovado de 4 metros, do outro, dois tubos de aço inox polido
também de 4 metros inclinados e, ambos, conjuntos estão ligados por um cabo de aço. Corpo
de Prova II remete a procedimentos anteriores – como nos vagões de trem suspensos por
cabos de aço e ainda em algumas esculturas da década de 1970 – mas apresenta novas
soluções: um balanço pressuposto e potente.
No átrio da galeria, a obra inédita Up Side Down, 2015 – constituída por tubos de latão
conectados por cabos de aço – impacta pela sua monumentalidade, pelo humor e pelo desafio
da gravidade. Mesmo a despeito da leveza e da qualidade aérea da obra que, aliás, parece
criar um volume virtual que avança em direção do corpo do observador, Up Side Down, com os
seus 6 metros de altura, tem como desafio se manter em pé. A escultura também excede em
termos de escala o ambiente onde está instalada; há uma tensão entre obra e arquitetura, as
dimensões dos espaços – como as colunas, a espessura das paredes, as passagens, os
revestimentos de parede, o piso, o teto – são revistas.
De 22 de agosto a 26 de setembro.