Com a presença do consagrado nome da arte cinética mundial, a Galeria Nara Roesler, Ipanema, Rio de Janeiro, RJ, inaugurou “Julio Le Parc: obras recentes”, em homenagem aos 90 anos do artista, completados dia 23 de setembro. A exposição traz pinturas inéditas da série “Alchimie”, uma escultura da série “Torsion’ (2004), um móbile da série “Continuel”, e “A l c h i m i e V i r t uel”, com tecnologia que permite ao espectador adentrar o universo do artista. A obra, em realidade virtual, atualiza a questão da virtualidade que Le Parc vem explorando há mais de 50 anos, como nas pinturas “Réels et virtuels”, da série “Surface noir et blanc” (anos 50), “Volume Virtuel” (anos 70), e nas esculturas “Cercle Virtuel” (anos 60). Por antecipar essa discussão, Le Parc tornou-se reconhecidamente um visionário que sempre acreditou no poder libertário que a arte tem em despertar nossas faculdades perceptivas.
“Retomar contato com as obras e as ideias de Le Parc quando ele completa seus 90 anos é uma oportunidade de reativar essa crença no papel emancipatório da arte – hoje sem o dogmatismo que regia suas ideias iniciais junto ao grupo de arte cinética – e a esperança de que ela seja portadora de uma oportunidade de transformação”, escreve Rodrigo Moura, em seu texto para a exposição.
As “alquimias” atuais, em acrílica sobre tela, são trabalhos em grande escala, concebidos a partir de vários estágios de desenhos e de pinturas menores que se expandem em composições modificadas progressivamente. “Em algumas pinturas vemos um grande centro preto que, circulado por uma sobreposição de cores agrupadas e sobrepostas, parece atomizado, o que provoca um efeito simultaneamente desorientador e hipnótico”, diz Le Parc. A série “Alchimie” foi iniciada em 1988, em forma de pequenos esboços surgidos a partir de observações fortuitas do artista e que, aos poucos, foram concretizadas. “Aqui Le Parc está mais uma vez interessado na ideia de permutação cromática e de refração da luz na superfície, criando possibilidades de vibração a partir de planos sobrepostos, círculos concêntricos, espirais e fitas de Moebius”, afirma Moura. O crítico também destaca “a capacidade de evocação ambiental, como se cada tela fosse um corpo espacial com profundidade e luminosidade próprios, reativando o dilema olho/corpo, um antigo problema colocado pela obra de Le Parc”.
Em “Torsion”, o artista reafirma essa persistência em uma experimentação contínua, em que cada novo conjunto de obras tem suas raízes no que já desenvolveu. A série de esculturas às quais o artista se dedica desde o fim da década de 1990, está ligada ao espírito dos primeiros relevos, especialmente dos “volumes virtuais” desenvolvidos nos anos de 70. A contundente presença do aço inox, esse material de superfície acetinada, permite múltiplas mudanças devido a sua maneira de atrair a luz. Para Rodrigo Moura, a questão que se coloca de forma mais evidente é a da incidência da luz do ambiente sobre os filetes de aço inoxidável. “Evoca-se uma dimensão de duração à medida que nos deslocamos em torno delas, como se fossem micro espelhos imperfeitos ou fragmentos de labirintos. Por isso, quanto mais extensão, maiores as possibilidades”.
Sobre o artista
Julio Le Parc (n. 1928, Mendoza, Argentina) vive e trabalha em Cachan, França. O artista apresenta ao espectador uma visão divertida e desmistificada da arte e sociedade por meio de suas pinturas, esculturas e instalações perceptualmente ilusórias. Le Parc faz interagir cor, luz, sombra e movimento de modo que as formas aparentem movimento, estruturas sólidas se desmaterializem, e a própria luz pareça plástico. Como co-fundador do Groupe de Recherche d’Art Visuel (GRAV), trabalhou para romper os limites na arte e a participação de espectadores contribuiu diretamente com suas famosas esculturas cinéticas e ambientes de luz. A partir de 1960, no entanto, começou a desenvolver uma série de obras distintas que utilizavam a luz “leitosa”: esses objetos, geralmente construídos com uma fonte lateral de luz branca que era refletida e quebrada por superfícies metálicas polidas, combinavam um alto grau de intensidade com uma expressão sutil de movimento contínuo. As obras de Le Parc foram tema de inúmeras exposições individuais na Europa, América Latina e Estados Unidos, em instituições como o Pérez Art Museum, Miami, EUA (2016); Museum der Kulturen Basel, Basel, Suíça (2015); Bildmuseet, Umea, Suécia (2015); Malba, Buenos Aires, Argentina (2014); Palais de Tokyo, Paris, França (2013); Biblioteca Luiz Angel Arango, Bogotá, Colômbia, (2007); Laboratorio Arte Alameda, Cidade do México, México (2006); Castello di Boldeniga, Brescia, itália (2004) entre outras. O artista também fez parte de diversas exposições coletivas e bienais como: a Bienal Internacional de Curitiba, Curitiba, Brasil (2015); Bienal do Mercosul, Porto Alegre, Brasil (1999); Bienal de Havana, Havana, Cuba (1984); Bienal de São Paulo (1967), a Bienal de Veneza em 1966 (quando recebeu o Prêmio) e a polêmica exposição do MoMA, The Responsive Eye (1965). Como ato de protesto contra o regime militar repressivo no Brasil, ele se juntou a artistas no boicote da Bienal de São Paulo em 1969 e publicou um catálogo alternativo de Contrabienal em 1971. As obras coletivas posteriores de Le Parc incluem a participação em movimentos antifascistas no Chile, El Salvador e Nicarágua. Recentemente, Le Parc tem sido objeto de grandes retrospectivas, como Form into action no Pérez Art Museum, Miami, EUA (2016), Julio Le Parc na Serpentine Gallery, Londres, Reino Unido (2014); Le Parc: Lumière no MALBA, Buenos Aires, Argentina (2014); Soleil froid no Palais de Tokyo, Paris, França (2013); Le Parc lumière na Casa Daros, Rio de Janeiro, Brasil (2013); e da exposição Dynamo no Grand Palais, Paris, França (2013
Até 14 de novembro.