Karin Cagy tem no DNA a postura livre e destemida retratada nas telas de sua primeira exposição individual, “Beau Voir”, na Galeria Vertical do Centro Cultural Solar de Botafogo, Rio de Janeiro, RJ, sob curadoria de Alexandre Murucci. Oriunda de uma família de mulheres fortes, sua mostra é fruto da virada existencial e profissional que se confirmou no período sabático durante a pandemia, quando ela assumiu sua persona artística cultivada desde a juventude. Como grande diferencial de sua investigação temática, suas personagens são mulheres na faixa a partir dos anos 1960/70, quase sempre apresentadas em protagonismos inesperados. Em seu universo pictórico, as figuras escolhidas pela artista se mostram donas de seus percursos e escolhas, contrariando estereótipos e restrições naturalizadas pela sociedade ocidental, que, apesar de se mostrar cada vez mais aberta ao enfrentamento do ageísmo, ainda mantém o culto à juventude como seu maior ativo econômico e simbólico. A exposição vai até o dia 19 de outubro e reúne cerca de 20 obras em médios formatos, utilizando técnicas de tinta a óleo e acrílica, numa paleta “cupcake”, cores dóceis que contrastam com a atitude de suas personagens.
“Sempre desenhei mulheres. Sempre muito feminista. Minha pesquisa na pintura sobre ‘ageísmo’, um preconceito que atinge de forma mais contundente o sexo feminino, é onde sinto que meu trabalho mais tem a conectar as pessoas. E a imagem que eu tenho das mulheres de mais idade vem de minha mãe e avó, que sempre foram ativas e potentes, cheias de vida – é o meu parâmetro. Eu mesma não me imagino de outra forma e é assim que eu pretendo envelhecer. Por que envelhecer tem que ser feio, ser inexpressivo?”, diz Karin Cagy.
A palavra do curador Alexandre Murucci
“Apresentando uma série de trabalhos que falam de questões caras à sua sensibilidade e que envolvem o universo feminino, suas mulheres são fortes, destemidas, surpreendentes. Fruto de sua dinâmica de atelier nos últimos três anos, a mostra ‘Beau Voir’ brinca com suas acepções linguísticas, ao ser traduzida livremente como algo bonito de ver, certamente um contraponto quando nos deparamos com o ‘status quo’ estético vigente, ao mesmo tempo em que é uma expressão de afirmação e convicção na língua francesa, e flerta com a musa existencialista Simone de Beauvoir, autora do livro capital do feminismo – “O Segundo Sexo” (Le Deuxième Sexe) publicado em 1949, uma das obras mais celebradas e importantes para o movimento, analisando a condição feminina nas esferas sexual, psicológica, social e política. Karin Cagy elege um olhar solidário a uma mulher no seu entorno próximo – família, amigas e pessoas do universo profissional como designer e criadora de moda, onde atuou por três décadas, e onde estes aspectos são tratados com a crueza e dramaticidade de uma cultura ao corpo inóspita e impositiva, e que, mesmo não sendo seu lugar de fala presente, se coloca em seu horizonte de forma latente, em angústias e expectativas de seu lugar no mundo, que ela transforma em poesia libertadora ao criar Senhorinhas livres e donas de seus destinos. Realmente bonito de ver!”
Sobre a artista
Com o desenho presente em sua vida desde seus cinco anos, Karin Cagy já ministrava aos dezoito anos, aulas de pintura em seda no Club Med. Cursou Modelo Vivo no Parque Lage com Astrea El Jaick e Gianguido Bonfante e, posteriormente, Desenho Industrial na Faculdade da Cidade e Moda na Universidade Candido Mendes. Com ampla experiência na indústria da moda, onde trabalhou por mais de duas décadas em 2018, Karin realinhou sua investigação artística e voltou à Escola de Artes Visuais do Parque Lage, tendo como professores Luiz Ernesto, Bruno Miguel e Charles Watson, retornando a pintura de forma visceral e profícua.