Antes de falecer, em dezembro de 2013, o marchand Franco Terranova ainda teve tempo de concluir seu último e um dos mais brilhantes projetos. Reuniu poemas inéditos e antigos com suas impressões de toda uma vida. Conseguiu expressar desde as lembranças de sua longínqua Itália até a paixão por Ipanema, bairro que escolheu para viver em 1950. Todas as memórias estão reunidas no livro “Carma Carnadura”, que a Réptil Editora lançou em fevereiro, na Galeria Marcia Barrozo do Amaral, Copacabana, Rio de Janeiro, RJ. O tempo, elemento perene na obra de Franco, é soberano nas páginas de “Carma Carnadura”. Na sua influência nas relações humanas, na percepção dos afetos e, também, as marcas físicas por ele deixadas.
Com fotos feitas pelo filho, o fotógrafo Marco Terranova, o poeta aparece nu, num ensaio que mostra a decomposição do corpo de um homem em plena vida. “Ele ainda estava um pouco reticente e consegui convencê-lo a posar citando o final do filme 2001 – Uma Odisseia no Espaço, em que o personagem vai envelhecendo até que renasce para uma nova vida”, lembrou Marco. Dor, amor, ódio e outros sentimentos são apresentados nos poemas concretos, sem vírgulas ou pontos finais, o que torna a leitura uma experiência emocionante e profunda. “Poeta audacioso e original, Franco Terranova não se ajustava aos padrões usuais de linguagem”, disse dele o também poeta e amigo Ferreira Gullar. Fundador da memorável Petite Galerie, a primeira galeria de arte moderna no Brasil, que funcionou no Rio de Janeiro de 1954 a 1988, Franco apresentou ao país muitos dos artistas hoje renomados.
Conhecido pela sensibilidade e gentileza, deixou muitos amigos. “Era uma pessoa bondosa, muito mais idealista do que marchand. Ele acolhia os artistas”, diz Nelson Leiner. “Ele foi um marchand menos mercador e mais movido pelo afeto”, resume Daniel Senise. “Carma Carnadura” é o segundo livro de Franco Terranova lançado pela Réptil Editora – ele escreveu 14. Em outubro de 2012, a parceria com a editora Luiza Figueira de Mello resultou em “Sombras”, livro-objeto que contou com obras de arte de 73 artistas, entre eles, Tunga, Carlos Vergara, Antonio Dias, Millôr Fernandes, Emanoel Araújo, Avatar Morais, Anna Bella Geiger e Frans Krajcberg, criadas especialmente para ilustrar suas poesias. “O Franco é a pessoa mais íntegra e cheia de amor que conheci. Tenho muito orgulho destes trabalhos, sinto saudades dele todos os dias”, diz Luiza, que de tão amiga virou herdeira de seus direitos autorais.
SOBRE FRANCO TERRANOVA
Vindo da Itália em 1947, depois de lutar na Segunda Guerra Mundial, Franco Terranova criou – no Rio de Janeiro – a Petite Galerie, um diminuto espaço na Avenida Atlântica, em Copacabana. Seu último endereço de atividades, na Barão da Torre, em Ipanema, fechou ao longo de três dias de 1988, com um evento que Terranova batizou de “O eterno é efêmero”, com todos os artistas convidados que haviam trabalhado e exposto na galeria, artistas criando obras nas paredes, em seguida pintadas de branco. A galeria foi berço para muitos dos principais artistas plásticos do Brasil contemporâneo. O marchand também é reconhecido por introduzir no mercado brasileiro técnicas atualizadas de marketing cultural, realizar os primeiros leilões de arte moderna e fomentar a produção cultural no país. Com 14 livros publicados, Franco também dedicou-se a escrever poesias até seu falecimento, em dezembro de 2013.