O Paço Imperial, Centro, Rio de Janeiro, RJ, exibe a exposição “A Pintura com a Pintura”, do artista Carlos Zilio, sob curadoria de Ronaldo Brito. A mostra apresenta um conjunto de obras que reafirmam a pintura como um campo de embate e investigação contínua. Em telas monocromáticas de presença sutil, Carlos Zilio conduz o espectador ao limite da percepção, onde o visível se sustenta no paradoxo da quase ausência. Para Ronaldo Brito, essa busca pelo Nada não implica vazio, mas sim a condensação máxima do pensamento pictórico, na qual cada obra se apresenta como uma presença radical.
Ao longo de sua trajetória, Carlos Zilio transitou por diversas abordagens artísticas, da exuberância cromática ao rigor formal, sem se fixar em categorias rígidas. A Pintura com a Pintura convida o público a um exercício de contemplação e imersão, destacando a autonomia da pintura enquanto linguagem e sua capacidade de gerar significados além da representação tradicional. A exposição reafirma o compromisso de Carlos Zilio com a experimentação e a pintura como um território vivo, em constante transformação.
Pintura com a Pintura
O pintor veterano, aquele que se empenha diariamente em sua prática, sempre termina sozinho com a pintura. E não porque se aliene do mundo ao redor: a própria pintura acaba por metabolizar o mundo com suas operações específicas. Chega um momento em que esse processo, ao mesmo tempo intuitivo e metódico, condensa a vivência do artista a um ponto tal que dispensa quaisquer chamados extrínsecos, absorvido por inteiro no embate prazeroso porém exigente, sempre em aberto, com uma atividade por assim dizer interminável. Daí que o artista não tenha nos surpreendido tanto ao mencionar de passagem que, daqui para frente, pretendia pintar o Nada. E estamos falando de um pintor experimental, sem temas ou estilos definidos. Em sua carreira, entre outras incursões, ele passou de telas exuberantes, matissianas, a uma última série em preto e branco envolvendo a figura pitoresca do Tamanduá, que obcecava o seu imaginário familiar. Tampouco o cansativo dilema abstração/figuração encontra mais lugar entre as preocupações teóricas desse pintor culto, professor universitário e agente cultural inovador no que se refere ao destino da História da Arte no Brasil. Sem esquecer o início vanguardista, ainda nos anos 1970, quando produzia objetos nada “artísticos” e Instalações de caráter político, em confronto mais ou menos direto com a famigerada ditadura militar vigente.
A História da Arte para o pintor Carlos Zilio, naturalmente, significa muito mais do que matéria simbólica social – é parte constitutiva de sua personalidade pictórica. Nela comparecem, por exemplo, Malevitch, Barnett Newman e Jasper Johns, figuras à primeira vista incompatíveis. Mas ninguém se obrigue a rastreá-las nessas telas recentes , ocupadas que estão em alcançar o Nada. Tais presenças, em meio a outras poucas, já se tornaram fantasmas amigos, que sem dúvida contribuíram para a conversa atual da Pintura com a Pintura. O que importa agora é o embate frontal com essas telas quase vazias, monocromáticas, quase todas no mesmo formato médio. Completam uma série, um conjunto no sentido estrito do termo. Cada uma é uma, no entanto, pedem leitura cuidadosa. Por um lado, francas e diretas, parecem de pronta assimilação. Contudo, logo que as assimilamos elas prendem nossa atenção, excitando a percepção ao acompanharmos seu soberano fazer pictórico.
Ronaldo Brito
Até 22 de maio.