A exposição coletiva “Desmedida” é o novo cartaz da Zipper Galeria, Jardim América, São Paulo, SP, com abertura para o próximo dia 17 de maio. O título da exposição é tomado emprestado do livro “Desmedida”, do escritor angolano Ruy Duarte de Carvalho. Trata-se de um relato poético de viajante quando de sua prospecção pelo Brasil, a partir de excursão pela bacia do Rio São Francisco. “Vários artistas estabelecem relações poéticas e visuais semelhantes ao escritos de Ruy. Há uma geração de artistas trabalhando com a ideia de redescobrimento. O interior do país passou por transformação sócio econômica radical nos últimos 20 anos”, afirma o curador Diego Matos.
Na exposição coletiva “Desmedida”, prelúdio de uma pesquisa curatorial mais ampla desenvolvida na última década, o curador Diego Matos reúne um conjunto de trabalhos que retratam o Brasil, seu lastro histórico e suas múltiplas realidades à luz de um imaginário construído nas duas últimas décadas do século XXI. Na contramão aos parâmetros de uma história oficial baseada nas ideias grandiosas de progresso e civilização e na atenção ao desenvolvimento das grandes metrópoles, as investidas dos artistas aqui selecionados conflagram largo interesse em explorar, reconhecer territórios grandiosos mas invisíveis. Trata-se desse mesmo Brasil que, no momento, seja por temor, ignorância ou elitismo, é dado as costas.
Em busca de narrativas que refletem sobre outros entendimentos do que seria o chamado “Brasil profundo”, “o grande sertão”, a dimensão da floresta ou a errônea percepção da natureza “selvagem”, a seleção contempla produções de André Penteado (São Paulo, 1973), Daniel Frota (Rio de Janeiro, 1988), Haroldo Sabóia (Fortaleza, 1985), João Castilho (Belo Horizonte, 1978), Marcelo Gomes (Recife, 1963), Karim Aïnouz (Fortaleza, 1966), Regina Parra (São Paulo, 1981), Romy Pocztaruk (Porto Alegre, 1983) e Tuca Vieira (São Paulo, 1974). “Muitas destas pesquisa encontram nas profundezas do interior, deste íntimo do país, alguma condição universal, um sentimento comum demasiadamente humano. O interesse é este: confrontar o íntimo e o universal, o micro e o macro, confundindo escalas”, afirma.
De Tuca Vieira, a série fotográfica “Viagem ao Brasil” (2013) faz um retrato deste novo habitus construído sob a égide do desenvolvimento econômico e que se sobrepõe aos discursos globalizantes e homogeneizadores. Dois vídeos de Haroldo Sabóia – “Carta à Solidão (2016)” e “Na medida em que caminho” (2017) – fazem uma espécie relato poético sobre paisagens interioranas do Nordeste do país. Também o faz o vídeo “Sertão de Acrílico Azul Piscina” (2004), da dupla Marcelo Gomes e Karim Aïnouz, com tom documental e prospectivo, mas de caráter eminentemente experimental e poético. É por ele que a própria narrativa expositiva começa. O último vídeo da coletiva, “Barca Aberta” (2016), de João Castilho, reflete sobre deslocamentos de trabalhadores no interior mineiro, perpetuando a idéia permanente de movimento enquanto forma de sobrevivência.
De André Penteado, fotografias da série “Missão Francesa” (2017) desvendam o processo civilizatório e cultural de “catequizar” o Brasil a partir de referências ocidentais. Talvez seja esse contexto registrado que demarca a primeira ação de caráter simbólico no país, na construção de uma modernidade forjada. E, de Romy Pocztaruk, trabalhos da série “A Última Aventura” (2014) investigam os vestígios materiais e simbólicos remanescentes da construção da rodovia Transamazônica, um projeto faraônico, utópico e ufanista, relegado ao abandono e esquecimento. Regina Parra é a única artista a apresentar uma pintura da mostra. “Um Perigo um Chance” (2017), pintura de escala monumental, vem de uma pesquisa da artista que reflete sobre temas como imigração, iminências de transformação e condições inóspitas, colocando o espectador em real situação de desequilíbrio. Por fim, Daniel Frota, com sua peça sonora “It’s a Perpetual Way”, investindo na natureza circular e mântrica da musica popular brasileira, manipula a canção de Caetano Veloso, “It’s a Long Way”, de 1972, abrindo alas aos que chegam à galeria, o que põe em contato o público e o privado.
Sobre o curador
Diego Matos nasceu em Fortaleza, CE, 1979), é pesquisador e curador; mestre (2009) e doutor (2014) pela FAU-USP. Foi um dos curadores do 20o Festival de Arte Contemporânea Sesc-Videobrasil, Sesc Pompéia, 2017. É organizador, com Guilherme Wisnik, do livro “Cildo: estudos, espaços, tempo”, pela Ubu Editora, 2017. Foi assistente de curadoria da 29ª Bienal de São Paulo (2010); membro do Núcleo de Pesquisa e Curadoria do Instituto Tomie Ohtake (2011 – 2013); curador assistente do 18º Festival de Arte Contemporânea Sesc-Videobrasil (2013); e curador das exposições Da Próxima Vez Eu Fazia Tudo Diferente (Pivô, 2012) e Quem nasce pra aventura não toma outro rumo (Paço das Artes, 19º Videobrasil), todos em São Paulo, entre outras. Foi coordenador de Acervo e Pesquisa da Associação Cultural Videobrasil (2014-2016). Foi curador de exposições individuais de artistas como: Michel Zózimo, Rafael Pagatini, Raquel Garbelotti, Yiftah Peled, entre outros. Atuou também como professor em centros de ensino de arte e arquitetura em São Paulo (Instituto Tomie Ohtake, Escola São Paulo, Centro de Pesquisa e Formação e outras unidades do Sesc São Paulo). Ademais, escreve textos para catálogos de exposições; livros e exposições de artistas e colabora com revistas acadêmicas e de arte.
Até 16 de junho.